Duas frases me fizeram refletir sobre a aceleração da vida, sobre a passagem implacável do tempo. A primeira delas da atriz Fernanda Montenegro: “A coisa mais dolorosa pela qual tenho passado é ver a minha geração morrer”. A segunda, de José Dirceu: “Para mim é uma tragédia ser preso aos 66 anos. Eu vou sair da cadeia com 70 anos”.
Além dessas lancinantes manifestações, que condizem, repito, com a aceleração da vida, ouvi de meu pai, há uns 12 dias, o seguinte: “ Meu filho, eu resolvi que não bebo mais. É muito bom viver. Eu tenho 82 anos, mas ainda quero viver muito. Assim como deixei o cigarro, agora deixo a bebida, por que sem ela vou poder viver muito mais”.
As três mensagens me levam a algumas conclusões – todas muito óbvias -, que quero compartilhar com os leitores do meu blog: (i) a certeza que todos temos de que a nossa vida na terra é passageira, (ii)que, mais dias menos dias, portanto, todos iremos partir, e que, em face da nossa racionalidade, (iii) – devemos perceber quando a vida começa a se esvair, quando não dá mais para fazer planos a longo prazo, que amanhã é agora, que tudo urge, que as sementes que plantarmos agora não colheremos no futuro, porque não haverá porvir.
A mim me angustia, sim, a passagem inclemente do tempo, tema sobre o qual já tive a oportunidade de refletir aqui mesmo, neste mesmo espaço.
É que, olhando para trás, fico com a sensação de que, até aqui, (i) a minha estada na terra não tem sido profícua como poderia sê-lo, (ii) que, do muito que podia realizar, pouco fiz, (iii) que, muitas vezes, podendo – e devendo – falar, calei, optei pelo silêncio dos insensíveis (iv) que, em certas ocasiões, podendo agir como herói, me acovardei, (v) – que, quando tive a oportunidade, não fui capaz de dizer “eu te amo”, à conta de uma timidez injustificável, na suposição, ademais, de que a manifestação do amor se dá muito mais nos gestos que nas palavras.
Eu também tenho testemunhado a partida definitiva de pessoas da minha geração; uma geração um pouco mais nova que a de Fernanda Montenegro, é verdade. Mas tem ocorrido, sim. E eu tenho lamentado. E vejo, com os olhos de quem quer ver, que estou sendo levado, celeremente, para o mesmo destino, que, afinal, é inescapável, inexorável.
Eu também lamentaria se, ao 59 anos, tivesse, de alguma maneira, que me recolher para assistir, trancafiado, a vida passando por uma janela, como lamenta José Dirceu, sobretudo por entender que não se deveria, sejam quais forem os deslizes cometidos, separar, nem por um dia, as pessoas que se amam.
Uma corrente filosófica dos anos 30 e 50, chamada existencialismo, definiu o ser humano ou o homem como “um ser para a morte”, isto é, um ser que sabe que termina e que precisa encontrar em si mesmo o sentido de sua existência ( Convite à Filosofia, Marilena Chaui, 1998).
Apesar de me inquietar a sensação de não ter cumprido bem o meu papel, e de, na minha (exigente) avaliação, não ter justificado, como deveria, a razão da minha existência, ainda assim sou instado a pedir clemência a quem de direito: eu quero, como tantos, viver muito mais, para, quem sabe, realizar um pouco mais ou, pelo menos, para ter tempo de, sem timidez, olhar nos olhos das pessoas amadas e dizer, sem enleio: “eu te amo”.