As ações violentas sobre o psiquismo humano

Tenho dito e vou repetir, hic et nunc, que do magistrado se pode e se deve exigir que seja imparcial. Do magistrado, no entanto, não se pode exigir parcimônia, insensibilidade, indiferença, pusilanimidade. O magistrado deve estar plugado nas aspirações da sociedade. A sociedade, as pessoas de bem, já não suportam tanta licenciosidade, tanta relaxação. Ninguém, em sã consciência, aceita que um assaltante perigoso seja mantido em liberdade, inculcando nas pessoas o sentimento nefasto da impunidade.
Juiz José Luiz Oliveira de Almeida
Titular da 7ª Vara Criminal

 

Cuida-se de pedido de liberdade provisória formulado por I.R.A, acusado da prática de roubo duplamente qualificado, o qual foi indeferido.

Ao indeferir o pleito, fiz algumas anotações acerca da quase insuportabilidade da vida em sociedade, em face da violência.

No mesmo despacho fiz menção à nossa qualidade de vida, em face da absorção dos hormônios do estresse, decorrente da violência urbana.

A seguir, antecipo alguns excertos da decisão, sempre no mesmo diapasão das decisões anteriores.

 

    1. Vivemos sob uma verdadeira guerra urbana. Os meliantes infernizam a vida das pessoas de bem. Assalta-se, mata-se, estupra-se, atenta-se contra o pudor, furta-se, lesiona-se, mata-se, sem controle, sem peias. Não se pode, pois, em face desse quadro, fazer concessões a quem sai por aí matando, roubando, estuprando, afrontando a ordem pública. Nem a condição de primário, nem o fato de ser possuidor de bons antecedentes, nem a eventual definição de uma profissão, de um endereço e outras coisas que tais autorizam a mantença da liberdade de quem tem uma vida perniciosa em sociedade.
      Tenho dito e vou repetir, hic et nunc, que do magistrado se pode e se deve exigir que seja imparcial. Do magistrado, no entanto, não se pode exigir parcimônia, insensibilidade, indiferença, pusilanimidade. O magistrado deve estar plugado nas aspirações da sociedade. A sociedade, as pessoas de bem, já não suportam tanta licenciosidade, tanta relaxação. Ninguém, em sã consciência, aceita que um assaltante perigoso seja mantido em liberdade, inculcando nas pessoas o sentimento nefasto da impunidade.
    2. O medo e a insegurança minam, acabam com o nosso bem estar, com a nossa qualidade de vida. Todos sabemos disso. As vítimas da violência jamais recuperam o seu estado anterior, diferente dos réus, os quais, insensíveis, não se martirizam em face de uma prisão. Quando eles se definem por um crime, por exemplo, já perscrutaram todas as possibilidades, inclusive a de ser preso. Não há mais espaço pra esse tipo de gente em nossa sociedade. Esse tipo de pessoa tem que ser afastado do nosso convívio, pouco importando que seja primário, tenha bons antecedentes – strictu sensu – ou coisas que tais.
      A violência urbana nos desgasta fisicamente, pois que absorvemos, constantemente, os hormônios do stress. A violência, porque mexe com a nossa psique, também muda a forma como vemos o mundo. Todo mundo que se posta à nossa frente passa, por isso, a ser uma ameaça, um inimigo em potencial. Por tudo isso, não é justo, não é razoável que se deixe em liberdade quem agride a ordem pública, o fazendo de forma acerba, como o fizeram os acusados.

 

Agora, a decisão, por inteiro.

PROCESSO Nº 33252/2008
PEDIDO DE LIBERDADE PROVISÓRIA
REQUERENTE: ISRAEL RAMOS ANDRADE
FRAGMENTOS PARA REFLETIR.
Vivemos sob uma verdadeira guerra urbana. Os meliantes infernizam a vida das pessoas de bem. Assalta-se, mata-se, estupra-se, atenta-se contra o pudor, furta-se, lesiona-se, mata-se, sem controle, sem peias. Não se pode, pois, em face desse quadro, fazer concessões a quem sai por aí matando, roubando, estuprando, afrontando a ordem pública. Nem a condição de primário, nem o fato de ser possuidor de bons antecedentes, nem a eventual definição de uma profissão, de um endereço e outras coisas que tais autorizam a mantença da liberdade de quem tem uma vida perniciosa em sociedade.
Tenho dito e vou repetir, hic et nunc, que do magistrado se pode e se deve exigir que seja imparcial. Do magistrado, no entanto, não se pode exigir parcimônia, insensibilidade, indiferença, pusilanimidade. O magistrado deve estar plugado nas aspirações da sociedade. A sociedade, as pessoas de bem, já não suportam tanta licenciosidade, tanta relaxação. Ninguém, em sã consciência, aceita que um assaltante perigoso seja mantido em liberdade, inculcando nas pessoas o sentimento nefasto da impunidade.
Juiz José Luiz Oliveira de Almeida
Titular da 7ª Vara Criminal
Vistos, etc.
Cuida-se de pedido de LIBERDADE PROVISÓRIA formulada por ISRAEL RAMOS ANDRADE, devidamente qualificado, preso em flagrante e denunciado neste juízo ( processo nº 271332008), por incidência comportamental no artigo 157, §2º, I e II, c/c artigo 14, II, ambos do CP, em face de, no dia 17 de outubro de 2008, por volta das 02h50, no bairro Cohatrac, nesta cidade, em companhia de CARLOS EDUARDO MIRANDA MELA, ter tentado assaltar a FARMÁCIA EXTRAFARMA, localizada na Av. Leste Oeste, com emprego de arma de fogo, crime que não se consumou, no entanto, em face da ação da Polícia Militar.
O MINISTÉRIO PÚBLICO, instado a se manifestar, opinou pelo indeferimento do pleito. (fls. 24/25)
Vieram-me os autos conclusos para deliberar.
O requerente, vejo da proemial, com emprego de arma de fogo e contando com o concurso do também acusado CARLOS EDUARDO MIRANDA MELO, tentou assaltar a FARMÁCIA EXTRAFARMA, crime que não se consumou por circunstâncias alheias à sua vontade.
O requerente e seu comparsa, demonstrando toda a sua perigosidade, além da arma de fogo, levaram consigo um esmeril e um pé-de-cabra, com os quais tentou arrombar o cofre da farmácia.
Pode-se inferir do exposto, que o requerente e seu comparsa não podem ser chamados de amadores; já estão agindo com certo profissionalismo, do que se infere que são perigosos e que, por isso, não podem ser mantidos em liberdade.
O requerente, posso dizer, a considerarem-se os fatos albergados nos autos, é do tipo que não pode retornar ao convívio social, pois que a sua perigosidade é evidente.
É consabido que a prisão provisória só deve ser implementada como ultima ratio. A regra, pois, é que os réus respondam ao processo em liberdade. Mas a verdade é que aqui se está diante de uma excepcionalidade. Está-se defronte de um meliante perigoso, o qual, por isso, não pode retornar, por enquanto, ao convívio social.
É ressabido, outrossim, que o requerente, até que sobrevenha uma sentença condenatória, com trânsito em julgado, goza da presunção de inocência. Mas é verdade, também, que a presunção de não-culpabilidade nunca foi óbice à prisão preventiva, na medida em que ela se mostre necessária. E, no caso sub examine, ela, a prisão provisória, a meu juízo, é uma necessidade premente, sobretudo em face da perigosidade do acusado e em tributo à ordem pública.
Tenho dito e reafirmado que o meliante perigoso não pode ser preso hoje e liberado amanhã, com um passaporte, chancelado pelo PODER JUDICIÁRIO, para, mais uma vez, voltar a vilipendiar a ordem pública.
Tenho redito que quem se arma para assaltar, disposto a matar ou morrer, não pode ser agraciado com a sua liberdade, ademais porque, todos sabemos, nenhum direito é absoluto; e o direito à liberdade, como tal, é, também, relativo.
A ordem pública, posso concluir em face da leitura que faço do processo principal, está a reclamar a prisão do requerente. A ordem pública, todos sabem, não pode ficar à mercê da ação marginal de quem quer que seja, ainda que seja primário e possuidor de bons antecedentes e outros predicados que tais.
Uma das finalidades da prisão provisória, sabe-se, não é a punição do individuo; é impedir que, dentre outras coisas, em liberdade, possa voltar a hostilizar a ordem pública. E não tenho a mais mínima dúvida de que o requerente, em liberdade, a considerar o crime pela qual foi denunciado, voltará a, outra vez, vilipendiar a ordem pública.
É de relevo que se diga que, para manutenção da prisão provisória do acusado, basta que haja receio – receio e não certeza – de que possa voltar a agredir a ordem pública. Nesse sentido, posso dizer que o acusado, à luz do que dos autos ressai, pode, sim, com muita probabilidade, voltar a profanar a ordem pública.
Há controvérsia, doutrina e na jurisprudência, se a gravidade do crime, de per si, autoriza a privação da liberdade. Para mim, no que discrepo da maioria, a gravidade do crime não pode ser deslembrada no exame dessas questões.
A verdade é que vivemos todos agastados com a violência que grassa. Ninguém tem mais paz. Os assaltantes nos cercaram e nos fizeram reféns de suas ações. Na rua, vivemos todos apavorados, à espera de, a qualquer momento, ser atacado por um meliante; em nossa casa, somos reféns de nós mesmos. Não nos permitimos sequer manter uma porta aberta, sem nos assombrar com a possibilidade de um ataque.
A ordem pública, nesse contexto, precisa ser sublimada. Nessa senda é a lição de GUILHERME DE SOUZA NUCCI, segundo o qual entende-se por garantia pública ” a necessidade de se manter a ordem na sociedade, que, em regra, é abalada pela prática de um delito. Se este for grave, de particular repercussão, com reflexos negativos e traumáticos na vida de muitos, propiciando àqueles que tomam conhecimento da sua realização um forte sentimento de impunidade e de insegurança, cabe ao Judiciário determinar o recolhimento do agente”. (Código de Processo Penal Comentado, 4ª edição, São Paulo, RT, p. 581)
Na mesma balada a ensinança de VICENTE GRECO FILHO, segundo o qual “A garantia da ordem pública tem sentido amplo. Significa a necessidade de se preservar bem jurídico essencial à convivência social como, por exemplo, a proteção social contra o réu perigoso que poderá voltar a delinquir, a proteção das testemunhas ameaçadas pelo acusado ou á proteção da vítima”. (Manual de Processo Penal, 4ª Edição, São Paulo, Editora Saraiva, p. 274/275)
Ninguém pode, gozando de higidez mental, dizer que o acusado e seu comparsa, pela maneira que agiram, não sejam perigosos, perigosidade que também reclama o carcer ante tempus.
Ninguém que tenha o mínimo de lucidez pode dizer que assalto a mão armada não é crime grave com graves repercussões e com reflexos negativos para a vítima e o conjunto da sociedade. Só mesmo um insensato, um positivista incorrigível pode pensar e agir de forma diferente do que penso e ajo, em torno dessas questões.
Sei – e não precisam que me digam – que vivemos num paralisante estado de letargia. Sei – e não preciso que me lembrem – que o Direito Penal é discriminador. Sei – e não preciso ser advertido – que as nossas instituições estão quase falidas. Sei – sou mais do que consciente – que os órgãos persecutórios só exercem controle sobre a criminalidade baixa. Sei que a criminalidade contra a economia, a ordem tributária e outras, não tem merecido de nós outros maiores atenções. Sei que o PODER JUDICIÁRIO serve, muitas vezes, para mascarar esse quadro de injustiça que se posta sob nossos olhos.
Conquanto reconheça as anomalias, as omissões, a letargia, a inoperância dos órgãos persecutórios, a minha consciência profissional não me permite me omitir em face da ação deletéria do acusado, o qual, em face de sua ação, não pode retornar ao convívio social.
Claro que a prisão provisória é uma medida de força, da qual só se deve lançar mão como ultima ratio. Creio que, no caso presente, está-se diante de um quadro que não permite tergiversação. A prisão do acusado, em face de sua ação censurável, é uma homenagem que se presta à ordem pública.
É de relevo que se anote que a prisão provisória não maltrata o princípio da presunção de inocência, inserido em nossa Carta Polícia, mesmo porque a própria Constituição a prevê, o que não impede, nada obstante, de que, aqui e acolá, se alegue que a medida em comento afronte a ordem constitucional.
A condição para que se legitime a prisão provisória é a presença dos seus pressupostos legais, quais sejam, o fumus boni iuri e o periculum in libertatis, os quais estão presentes, à vista fácil, na hipótese em comento. Presentes tais pressupostos, pouco importa a presunção de não-culpabilidade, que deve ceder diante do interesse da ordem pública, da instrução criminal e da aplicação da lei.
A propósito, os Tribunais, enfrentando questões do mesmo matiz, têm sido pródigos em decisões que chancelam a medida antecipatória, como se colhe abaixo, litteris:
PRISÃO PREVENTIVA – Art. 5o, LVII, da Constituição Federal – Óbice ao deferimento da custódia – Não ocorrência:
– O art. 5o, LVII, da Constituição Federal, segundo o qual ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória, não impede a prisão preventiva ou cautelar do acusado, uma vez que sua decretação não ofende o princípio da presunção de inocência.( Habeas Corpus nº 482.740/5 – São Paulo – 7a Câmara – Relator: Salvador D’Andréa – 19.8.2004 – V.U. (Voto nº 5.401)
Na mesma senda:
PRISÃO PREVENTIVA – Decretação – Requisitos:
– No vigente sistema constitucional, tratando-se de prisão cautelar, instituiu-se como regra a liberdade e como exceção a prisão, conforme se verifica no art. 5º, LXVI, da Constituição Federal. Assim, a custódia preventiva só pode ser decretada se presentes os requisitos ensejadores, quais sejam, o fumus boni iuris, o periculum in mora e estar o caso concreto enquadrado em uma das hipóteses arroladas no art. 313 do CPP. (Habeas Corpus nº 473.238/8 – Porto Feliz – 1ª Câmara – Relator: Guilherme G. Strenger – 13.5.2004 – V.U. (Voto nº 1.424)

Todos sabemos, disse-o acima, que a privação cautelar da liberdade individual é qualificada pela nota da excepcionalidade. Não obstante o caráter extraordinário de que se reveste, a prisão preventiva pode efetivar-se, desde que o ato judicial que a formalize tenha fundamentação substancial, com base em elementos concretos e reais que se ajustem aos pressupostos autorizadores da decretação dessa modalidade de tutela cautelar penal
Não é por outra razão que neste juízo, forte na melhor doutrina, tenho decidido, iterativamente, que, provada a existência do crime e presentes os indícios de autoria e despontando, ademais, a necessidade da medida excepcional, a medida de força pode e deve ser implementada, sem que se possa inquinar de excessiva e/ou abusiva a medida.
Registre-se, mais uma vez, que a mera condição de primário dos acusados não pré-exclui, só por si, a possibilidade de decretação da medida cautelar constritiva da liberdade individual. (RTJ 99/651 – RT 649/275 – RT 662/347)
À guisa de reforço anoto que o SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, tem decidido no mesmo diapasão, como se colhe da ementa abaixo, verbis:

“A mera condição de primariedade do agente, a circunstância de este possuir bons antecedentes e o fato de exercer atividade profissional lícita não pré-excluem, só por si, a possibilidade jurídica de decretação da sua prisão cautelar , pois os fundamentos que autorizam a prisão preventiva – garantia da ordem pública ou da ordem econômica, conveniência da instrução criminal ou necessidade de assegurar a aplicação da lei penal (CPP, art. 312) – não são neutralizados pela só existência daqueles fatores de ordem pessoal, notadamente quando a decisão que ordena a privação cautelar da liberdade individual encontra suporte idôneo em elementos concretos e reais que se ajustam aos pressupostos abstratos definidos em sede legal e que demonstram que a permanência em liberdade do suposto autor do delito poderá frustrar a consecução daqueles objetivos.” HC 79.857-PR, Rel. Min. CELSO DE MELLO

Na mesma senda a decisão no sentido de que “A primariedade, os bons antecedentes e a existência de emprego não impedem seja decretada a prisão preventiva, porquanto os objetivos a que esta visa (garantia da ordem pública, conveniência da instrução criminal ou segurança da aplicação da lei penal) não são necessariamente afastados por aqueles elementos. O que é necessário é que o despacho – como ocorre no caso – demonstre, com base em fatos, que há possibilidade de qualquer destas finalidades não ser alcançada se o réu permanecer solto.”( RTJ 121/601, Rel. Min. Moreira Alves)
É inquestionável que a antecipação cautelar da prisão – qualquer que seja a modalidade autorizada pelo ordenamento positivo (prisão temporária, prisão preventiva ou prisão decorrente da sentença de pronúncia) – não se revela incompatível com o princípio constitucional da presunção de não-culpabilidade. ( RTJ 133/280 – RTJ 138/216 – RTJ 142/855 – RTJ 142/878 – RTJ 148/429 – HC 68.726-DF, Rel. Min. NÉRI DA SILVEIRA)
É de relevo que se anote que a prisão que ora se mantém não se confunde com a antecipação de uma condenação (carcer ad poenam). Não traduz, a prisão cautelar, em face da estrita finalidade a que se destina, qualquer idéia de sanção. O que se pretende, com esta decisão, é, tão-somente, atuar em benefício da ordem pública.
A finalidade da prisão provisória que ora mantenho é apenas e tão-somente, não permitir que o acusado, perigoso que é permaneça solto, afrontando a ordem pública. A medida sob retina não visa, portanto, promover a antecipação satisfativa da pretensão punitiva do Estado, pois, se assim fosse razoável entender, subverter-se-ia a finalidade da prisão preventiva, daí resultando grave comprometimento do princípio da liberdade.
Os Tribunais, é cediço, não têm tolerado a PRISÃO PROVISÓRIA como antecipação da pena – à frente o SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL -, os quais, por isso, têm impedido a subsistência dessa excepcional medida privativa da liberdade, quando inocorrente hipótese que possa justificá-la.
O direito à liberdade – que possui dignidade constitucional( CF, artigo 5º, LXI e LXV) – não pode ser ofendido por atos arbitrários do Poder Público, ainda que se impute ao réu um crime etiquetado hediondo(HC 80.379-SP), razão pela qual pode-se compreender que a medida excepcional que ora se mantém não resulta de uma irresponsabilidade, mas de sua efetiva necessidade, em face da perigosidade do acusado e de seus parceiros.
Tenho dito, iterativamente, que não se faz concessão a quem comete crime com violência contra a pessoa e a quem é contumaz em agressão à ordem pública.
Vivemos sob uma verdadeira guerra urbana. Os meliantes infernizam a vida das pessoas de bem. Assalta-se, mata-se, estupra-se, atenta-se contra o pudor, furta-se, lesiona-se, mata-se, sem controle, sem peias. Não se pode, pois, em face desse quadro, fazer concessões a quem sai por aí matando, roubando, estuprando, afrontando a ordem pública. Nem a condição de primário, nem o fato de ser possuidor de bons antecedentes, nem a eventual definição de uma profissão, de um endereço e outras coisas que tais autorizam a mantença da liberdade de quem tem uma vida perniciosa em sociedade.
Tenho dito e vou repetir, hic et nunc, que do magistrado se pode e se deve exigir que seja imparcial. Do magistrado, no entanto, não se pode exigir parcimônia, insensibilidade, indiferença, pusilanimidade. O magistrado deve estar plugado nas aspirações da sociedade. A sociedade, as pessoas de bem, já não suportam tanta licenciosidade, tanta relaxação. Ninguém, em sã consciência, aceita que um assaltante perigoso seja mantido em liberdade, inculcando nas pessoas o sentimento nefasto da impunidade.
Todos que militam nesta vara sabem que não faço concessão a criminosos, máxime aos violentos. Não tergiverso. Não sou insensível. Uso, por isso mesmo, com responsabilidade e sofreguidão, os poderes que me foram outorgados, para, se for o caso, segregar provisoriamente quem tenha uma convivência perniciosa , malsã, em sociedade, ainda que primário e possuidor de bons antecedentes.
O medo e a insegurança minam, acabam com o nosso bem estar, com a nossa qualidade de vida. Todos sabemos disso. As vítimas da violência jamais recuperam o seu estado anterior, diferente dos réus, os quais, insensíveis, não se martirizam em face de uma prisão. Quando eles se definem por um crime, por exemplo, já perscrutaram todas as possibilidades, inclusive a de ser preso. Não há mais espaço pra esse tipo de gente em nossa sociedade. Esse tipo de pessoa tem que ser afastado do nosso convívio, pouco importando que seja primário, tenha bons antecedentes – strictu sensu – ou coisas que tais.
A violência urbana nos desgasta fisicamente, pois que absorvemos, constantemente, os hormônios do stress. A violência, porque mexe com a nossa psique, também muda a forma como vemos o mundo. Todo mundo que se posta à nossa frente passa, por isso, a ser uma ameaça, um inimigo em potencial. Por tudo isso, não é justo, não é razoável que se deixe em liberdade quem agride a ordem pública, o fazendo de forma acerba, como o fizeram os acusados.
Vivemos e adotamos uma postura tensa nos ambientes públicos, por conta da ação desmensurada de pulhas que nos afrontam em todas as camadas sociais. Temos, até, dificuldades em nossos relacionamentos, pois que, aos poucos, vamos nos isolando, nos limitando a viver em nosso ambiente familiar. A nossa capacidade produtiva já está prejudicada, pois que boa parte de nossa energia tem sido gasta nesse contínuo processo de preparação para nos defender dos meliantes.
Não se pode, diante desse quadro, fazer concessões a quem nos afronta a todos, sem pena e sem dó, disposto a matar ou morrer.
O medo, sabe-se, pode matar. Isso todos sabemos. A ansiedade, versão moderna do medo, também mata. A violência – coletiva ou individualizada – é uma espécie de câncer da alma. As vítimas de violência – diretas ou indiretas – correm o risco de desenvolverem algum transtorno emocional.
Diante dessas e de outras evidências, só mesmo um juiz sem compromisso com a ordem pública em geral permitiria que o acusado se mantivesse em liberdade.
Ações violentas sobre o psiquismo humano, não se pode deixar de refletir, são aquelas que afetam profundamente a vida psíquica do ser humano, isto é, que prejudicam o conforto psíquico. Submetida a essas ações violentas sobre o psiquismo humano, a pessoa deixa de ser dona e senhora de seu eu, deixa de governar-se e determinar-se a si mesma, perdendo, conseqüentemente, o domínio de seu ser e de sua liberdade.
Não se pode, por tudo isso, deixar em liberdade quem faz ameaças, quem rouba, quem mata, que estupra, que afronta a sociedade, surrupiando a liberdade e a tranqüilidade das pessoas de bem.
Pelas razões expostos, indefiro o pedido de LIBERDADE PROVISÓRIA formulado por ISRAEL RAMOS ANDRADE, para que o mesmo, preso, aguarde o seu julgamento, o fazendo, sobretudo e fundamentalmente,e em homenagem à ordem pública.

São Luís, 18 de março de 2008.

Juiz JOSÉ LUIZ OLIVEIRA DE ALMEIDA
Titular da 7ª Vara Criminal

Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

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