Ambição pelo poder

poder202_0Há uma teoria segundo a qual todas as nossas motivações, todas as nossas energias, enfim,  não passam de aspirações pelo poder. Essa seria, pois, segundo a teoria, a essência da energia humana.

Hobbes, nessa linha de compreensão, entendia que o movimento primário de todo ser humana é, sim,  em direção ao poder.

É de Hobbes a conclusão: “[…]evidencio uma inclinação geral de toda humanidade, um perpétuo e incansável desejo de poder após poder, que só cessa com a morte”. Por causa disso, entendia que devia haver um poder absoluto para controlar o homem[…]” ( apud Martin Cohen, Casos Filosóficos, 2012, p.135)

Sei não…Acho que comigo não ocorre bem assim!

Em verdade, posso afirmar, eu não tenho nenhuma ambição de poder. Sinto-me, essa é a verdade, acanhado no poder.

Estranho, não!?

Não peçam para eu explicar porque não saberei fazê-lo.

Não é nada patológico, inobstante. Vou me contorcendo e vou levando.

Não chego, pois, a me angustiar.

Aliás, acho que nem mesmo na minha casa eu sei exercer o poder. Tenho dúvidas, sim, se sei exercer o poder de pai, pois eu sempre compreendi – e compreendo – que o melhor que posso fazer é dar exemplo. Mais do que isso me julgo incapaz de fazer.

Não sei repreender.

Não sei gritar.

Não sei castigar.

Não dou murro na mesa.

Não dou contraordem.

Não desmancho o que está feito.

Não falo alto e  não fomento discórdia.

Alias, digo, com a necessária ênfase: não tolero discórdia.

Quem apostar na discórdia vai perder comigo, pois, os que estão em volta de mim sabem que  só sei viver em paz; sou viciado em paz.

Qualquer desentendimento, mínimo que seja,  me agasta, me tira do sério, me faz soturno, sorumbático…

Eu gosto de seguir dando o exemplo; de preferência, claro, bom exemplo. Pelo menos, penso assim.

Mas posso estar equivocado. Aliás, para ser bem sincero, eu nem sei se dou bons exemplos, a considerar os valores morais atuais e a considerar que, como qualquer pessoa, eu também posso me deixar levar pelas tentações do mundo.

Mas retomando a teoria em comento, anoto que ela proclama que até mesmo o sexo pode se traduzir em categorias de poder, “seja porque queremos possuir o corpo de outra pessoa – e, portanto, possuímos a pessoa completamente -, seja porque achamos que, ao possuí-lo, impedimos outros de fazê-lo; ambas as situações nos permitem a satisfação do poder que exercemos sobre alguém” ( Leszek Kolakowki, in Pequenas palestras sobre grandes temas, editora UNESP, p. 12)

Apesar da teoria, reafirmo que não me dou com o exercício do poder; há muitas razões para isso.

Vou tentar elencar mais algumas que me ocorrem agora.

Sou tímido; sou acanhado.

Não sei dominar; quando julgo ter dominado, na verdade eu é que  estou quase sempre dominado.

Não sei traficar influência.

Não sei pedir – nem para mim, nem para ninguém.

Não sei influenciar.

Não gosto de deixar transparecer que eu possa estar  podendo.

Não me apraz os excessos de cortesia em face do meu cargo.

Não gosto de ser o alvo das atenções.

Tenho medo de parecer arrogante.

Piso sem firmeza quando percebo que estou chamando a atenção.

Não gosto de solenidades.

Não quero ser presidente do Tribunal de Justiça.

Não quero ser Corregedor.

Não tenho aptidão para mandar em ninguém.

Não sei fazer cobranças.

Não sei passar reprimenda nas pessoas.

Não gosto de ser deselegante.

Não gosto de parecer que sou melhor do que ninguém.

Não tenho fascínio de carro preto.

Não faço questão de andar com motorista.

Sou do tipo que se acanha quando é servido.

Não gosto de privilégios.

Não gosto de furar filas.

Não sei quando vou usar as minhas prerrogativas de idoso, pois me constrange ver pessoas saudáveis fazendo uso da prerrogativa por entender que direito é direito e ponto final.

Se entro num restaurante, piso em ovos com medo de ser reconhecido.

Não suporto quando me apresentam em algum lugar priorizando o cargo que exerço.

Fico muito mal quando constato que sou pouco importante como ser humano  e que, em certas ocasiões,  não fosse pelo cargo, não seria sequer cumprimentado.

Para mim, essa história de poder é muito complicada.

Prefiro ser apenas eu; nada mais.

Tudo o mais, para mim, parece excesso.

Gosto das coisas simples.

Gosto, até, de fazer  compras na Rua Grande.

As situações que envolvem poder sempre deixam mal.

Na verdade, me sinto fragilizado diante do poder.

O poder me assusta e me impulsiona na direção da minha casa, onde me sinto revitalizado.

Indago: uma pessoa que esse perfil pode se dar bem com o poder?

Como amar o poder  se o poder me assusta?

Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

2 comentários em “Ambição pelo poder”

  1. Caro amigo,

    Pela primeira vez, que me recorde, vou discordar de você. Continuo concordando com Hobbes que todos os seres humanos, absolutamente todos, almejam o poder, até como forma de exercício do direito primário e legitimo de defesa.
    A diferença está na forma de poder que cada um almeja. O poder que repudias é esse do senso comum, básico e que, em regra, aprisiona por um tempo os que são subalternos a ele. Porém há um outro tipo de poder, dentre inúmeros, que, ao contrário, não constrange ninguém e ainda liberta. Esse para mim é o verdadeiro poder, pois não é passageiro, ele é imortal, sem que o detentor precise fazer parte de qualquer academia de letras, por exemplo, que diz erroneamente que os eleitos são imortais.
    Esse outro tipo de poder, que liberta, você exerce a cada minuto da sua vida, seja decidindo por critérios de justiça, seja escrevendo no seu blog, de uma forma que desmistifica esse poder passageiro, chama as coisas pelos seu verdadeiro nome e mostra a importância de certos valores humanos, como ética, tão em desuso nos dias de hoje.
    Aqueles que pensam que ter poder é aquilo que você tão bem elencou, após a perda do cargo, serão esquecidos e quiçá distratado por quem antes lhe fazia deferência. Isso, desculpa, não é poder, isso é arbitrariedade, pois poder não se impõe, se conquista. Só com a conquista ele é legitimo e será eterno.
    Por tudo isso, desculpa mais uma vez, você exerce um poder absurdo e duradouro, mesmo sem reconhecer.
    Um grande abraço
    Sônia

  2. Tenho que concordar com as palavras sapientes de Sua Excelência Desembargador, bem como devo acolher o comentário acima, ambos tem coerência e acredito que, pela vivência, possuem também certeza em seus argumentos.
    Ademais, adorei a parte em que o Sr. diz que adora ir à Rua Grande fazer compras, rs, não menosprezando quem lá sempre vai, pois também sou adebita deste “hobby”, mas isto demonstra a simplicidade de alguém que tem tudo pra ostentar um “status” que lhe deveria ser peculiar, haja vista o cargo que exerce na sociedade.
    Mas,confesso que não ficaria assustada se lhe encontra-se em um sabádo em plena Rua Grande, rs!

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