Heróis esquecidos

Há muitas pessoas, algumas até muito próximas, que, até hoje, não engolem o meu discurso de posse. Por causa dele, nunca me perdoaram. Sei disso. Sinto isso.

Desde o discurso – ou mesmo antes deles, por eu ser uma pessoa muito convicta na defesa das minhas ideias – atraí a antipatia de muitos.

Eu sei perfeitamente disso. Eu sinto isso. Eu respiro isso. Sei que não foi fácil assimilar a minha, digamos, ousadia. É que, sem que as pessoas tenham sofrido na carreira os reveses que sofri, elas jamais compreenderão as razões que me levaram a fazer aquele discurso. Todavia, espero que tenham percebido, não ataquei ninguém. Fiz um discurso limpo, me limitando a narrar fatos. Nada mais que isso.

O certo é que, se é verdade que muitos não engolem a minha ousadia, consegui, sem perceber, galvanizar a simpatia de parte da população. Por todos os lugares por onde ando tenho sido bem recebido, e há sempre alguém a dizer que me admira, que gosta do meu trabalho e que sou um cidadão respeitado.

Que bom que seja assim! É bom, sim, ser reconhecido, ser respeitado, considerado…

Mas, atenção!, eu não sou herói. Não nasci pra ser herói.

Digo isso porque, desde que cheguei ao Tribunal, tenho recebido cartas anônimas, denunciando pessoas importantes, e pedindo providências. E muitos são os que dizem que fazem isso porque confiam em mim. Há muitos que, inclusive, fazem menção ao meu discurso de posse, porque a partir dele teria nascido a admiração.

Contudo, repito: não sou herói e não sou inconsequente. Eu jamais adotarei qualquer providência, contra quem quer que seja, sem que a denúncia se apresente com pelo menos indícios da prática de um crime ou de um ilícito administrativo, e com a identificação do seu autor.

Dizem, jocosamente, que o inferno está cheio de bem-intencionados e de heróis. Eu não pretendo me juntar aos heróis inconsequentes.

Por falar em herói, pergunto se algum dos senhores já ouviu falar do Marechal Carlos Machado Bittencourt?

Pois saiba que Carlos Machado Bittencourt, em 1897, evitou que o presidente Prudente de Morais fosse assassinado, se interpondo entre ele e seu algoz, Marcelino Bispo. Resultado, recebeu as facadas que se destinavam a Prudente de Morais, morrendo em seguida.

Carlos Machado Bittencourt, como se vê, é mais um daqueles heróis que sucumbem e sobre o qual a história silencia.

Definitivamente, não tenho vocação suicida.

É isso.

Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

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