Por que o mal existe?

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“[…]O mal só deve ser compreendido  quando o protagonista da maldade não tenha consciência do mal que pratica. Por isso Santo Agostinho pregava que, sendo os humanos racionais – essa é a regra – devem ser capazes de saber escolher entre o bem e o mal[…]”

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Por que o mal existe? Essa era a pergunta que inquietava Santo Agostinho.  Indagava-se o Santo: se Deus é inteiramente bom e todo-poderoso, por que há o mal no mundo?

Claro que a mim – e a todo mundo, afinal – também inquieta a maldade do ser humano. Todavia, o que mais me inquieta mesmo é testemunhar que muitos dos que vivem fazendo mal ao semelhante, ao que parece, estão sempre levando vantagem; pelo menos essa é a sensação que todos temos. A maioria das pessoas bem-sucedidas, no campo econômico sobretudo, parece sempre deixar algum rastro de maldade ou de práticas pouco recomendáveis.

A propósito, leio, no jornal o Globo, de hoje, a tragédia que envolveu a costureira Gonçala Gomes Caetano, de 81 anos. Segundo a matéria em comento, ela morava na avenida Rodrigo Otávio, na Gávea, em apartamento próprio, comprado com as economias de uma vida inteira de trabalho.

Pois bem. Solitária, diz a matéria, ela acolheu uma vizinha, que tratava como afilhada, e um sobrinho. Mas os hóspedes, valendo-se da fragilidade de dona Gonçala,  que se acentuava com o passar do tempo, acabaram expulsando-a de casa. Inicialmente, dona Gonçala virou moradora de rua. Passava o dia vagando ou no carro de um camelô que fazia ponto em praça da Gávea. Posteriormente, foi levada pelo camelô para comunidade Parque da Cidade.

Um sobrinho denunciou o fato, e ela foi resgatada por uma equipe do Centro de Referência Especializado da Assistência Social. Embora tenham agido com certa rapidez, Dona. Gonçala não voltou mais ao seu lar. Fragilizada, morreu na semana passada.

Esse é apenas um episódio, apanhado ao acaso, que é exemplar do que seja a maldade do ser humano, do quando ele é capaz de, conscientemente, fazer maldades aos semelhantes.

O mal só deve ser compreendido, quando o protagonista da maldade não tenha consciência do mal que pratica. Por isso Santo Agostinho pregava que, sendo os humanos racionais – essa é a regra – devem ser capazes de saber escolher entre o bem e o mal.

No caso que acabo de narrar, tudo indica que os malfeitores tinham plena consciência do mal que faziam a dona Gonçala. É dizer: retribuíram o bem que ela lhes fez com a maldade; merecem, sim, punição pela maldade que praticaram.

Fatos como esses fazem os incrédulos  duvidarem da existência de um Deus todo-poderoso e benevolente; dúvida que, afinal, também inquietou Santo Agostinho. Todavia, os que acreditam na existência de Deus bom, certamente encontrarão explicação para as maldades que as pessoas fazem, muitas vezes contra aquelas que só lhes fazem o bem.

Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

Um comentário em “Por que o mal existe?”

  1. É quase que impossível afirmar que o mal não existe..

    Observando sua matéria, remontamos a historia da filosofia, uma das personalidades mais atraentes: Decididamente Santo Agostinho; uma figura de destaque entre Aristóteles e Tomás de Aquino.

    Em Agostinho, seu platonismo e neoplatonismo incorporaram-os com o cristianismo de um modo que teria conseqüências de incalculável importância. Além das suas reflexões filosóficas, fundir a tradição platônica da filosofia com o cristianismo, fora um casamento bem-sucedido, porém não se tratavas de haver uma filosofia platônica de um lado e, do outro lado, a divergente dela, a filosofia cristã.

    S. Agostinho acreditava que a filosofia platônica continha verdades importantes sobre os aspectos que a Bíblia negligenciava, sustentava que Deus é Eterno, e, portanto, está fora do tempo.
    Para nós, o tempo começou quando o mundo foi criado. Para Deus, sempre existiu, num Eterno Presente.

    Com essa afirmação Agostinho coloca que só o presente realmente existe. O passado existe como lembrança presente, e o futuro apenas como uma expectativa presente.

    Por outro lado, o título da sua Crônica é uma indagação..Eis uma breve síntese da teoria maniquéia: Para os maniqueus, havia duas divindades supremas a presidir o universo: o princípio do Bem e o do Mal – a luz e as trevas. Como conseqüência moral, afirmavam ter o homem duas almas. Cada uma presidida por um desses dois princípios. Logo, o mal é metafísico e ontológico. A pessoa não é livre nem responsável pelo mal que faz. Este lhe é imposto..Ao grande problema do mal, conseguiu Agostinho apresentar uma explicação que se tornou ponto de referência durante séculos e ainda hoje conserva a sua validade. (p.15 do livro “A Patrística.

    “- Se tudo provém de Deus, que é o Bem, de onde provém o mal? ”

    Depois Agostinho de ter sido vítima da explicação dualista maniquéia, como vimos, ele encontra em Plotino a chave para resolver a questão: o mal não é um ser, mas deficiência e privação de ser..”(..)Não fazemos os mal..aprendemos a criar o mal..”

    Ainda, atendendo certamente, a forma da narrativa que Vossa Excelência destaca, o mal moral é o pecado. Esse depende de nossa má vontade; e
    a má vontade não tem “causa eficiente”, e sim muito mais, “causa
    deficiente”. O que temos então? UMA COMPLETA SUBMISSÃO DA RAZÃO ÀS
    PAIXÕES..

    Vejamos: Parece-nos, que a Lei foi escrita para governar os povos e autorizar, com razão, atos que a Providência divina pune.. Isso porque a lei humana está encarregada de reprimir crimes; logo, em vista, de manter a paz entre os homens carentes de experiência, isso é Hobbesiano. E por imperativo categórico, é o contrato social..para que os homens possam vivem em harmonia na nossa sociedade..e o quanto estiver ao alcance do governo, constituído de homens mortais, a Justiça irá prevalecer e será promissora para reger a sociedade civil. Quanto às outras faltas, é certo que existem para elas penalidades adequadas, as quais, a minha simples subjetividade, só mesmo a sabedoria divina pode libertar.

    Santo Agostinho conceitua o mal como uma privação de bem no homem, ou seja, é a “perda daquilo que não foi bem usado, quando seria possível tê-lo feito” (1995, p.210).

    O elemento de verdade por trás disso tudo, elemento que as pessoas estão tão dispostas a repudiar, é que os homens não são criaturas gentis que desejam ser amadas e que, no máximo, podem defender-se quando atacadas; pelo contrário, são criaturas entre cujos dotes instintivos deve-se levar em conta uma poderosa quota de agressividade..sem o seu consentimento,
    apoderar-se de suas posses, humilhá-lo, causar-lhe sofrimento, torturá-lo e por fim, matá-lo.

    A civilização tem de utilizar esforços supremos a fim de estabelecer limites para os instintos agressivos do homem e manter suas manifestações sob controle por formações psíquicas reativas.

    Gosto da frase Agostiniana: ” O mal não existe..o que existe, é a carência do Bem”..

    Fontes:
    Agostinho, Santo, Bispo de Hipona, 354-430. A fé e o símbolo [tradução Fabrício Gerardi]; Primeira catequese aos não cristãos [tradução D. Paulo A. Mascarenhas, Roxo, Opraem]; A disciplina cristã [tradução Fabrício Gerardi]; A continência [tradução Gerson F. de Arruda Jr. e Marcos Roberto N. Costa]. – São Paulo: Paulus, 2013 (Coleção Patrística; 32.
    O Livre Arbítrio. Tradução Nair de Assis Oliveira. São Paulo. 1995.

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