Começo essas reflexões admitindo que, assim como qualquer ser humano, tenho muitos defeitos, incontáveis até. Em contrapartida, também tenho muitas virtudes, é claro; e essas, quase sempre, passam despercebidas pelas pessoas que só me conhecem superficialmente. Posso afirmar, por exemplo, que sou leal, sei ser grato e, até onde vai a minha escala de valores, também procuro, obstinadamente, ser correto na lida com a coisa pública, conquanto admita que, na condição de ser humano, também cometo os meus deslizes, ou equívocos nas minhas avaliações e nos meus conceitos, ainda que não o faça de má fé ou para alcançar vantagens ilegítimas ou ilegais.
Como virtude que imagino possuir, posso afirmar que nunca, em nenhuma oportunidade, usei o poder para perseguir, para fazer maldades, para proteger ou contemplar imerecidamente quem quer que seja, para ser simpático ou obsequioso com o amigo ou rigoroso e vingativo em face de eventual desafeto, fossem quais fossem as circunstâncias ou os interesses em jogo.
Além disso, tenho me limitado a julgar o semelhante sem me deixar influenciar pela sua posição social ou pelos deslizes que ele tenha cometido no passado, abominando, a mais não poder, o famigerado Direito Penal do Inimigo, que condiz, necessariamente, com a flexibilização dos direitos e garantias fundamentais, algo que me recuso a fazer, ainda que a pretexto de enfrentar a criminalidade. Afinal, conforme tenho dito inúmeras vezes, não sou justiceiro e esconjuro, por isso mesmo, os justiçamentos, sobretudo os institucionalizados, que equivalem, num Estado de Direito, a jogar no lixo todas as conquistas e garantias consolidadas na Carta Política em vigor.
Retomando o tema objeto destas reflexões, anoto, de mais a mais, que nas minhas relações com o semelhante, procuro, na medida do possível, evitar os pré-julgamentos, as avaliações precipitadas. Não sou do tipo que julga ao primeiro olhar, que acha que a primeira impressão é a que fica. Portanto, não sou do tipo que dá crédito à primeira informação. Ao contrário disso, gosto de checar, de ponderar, de perscrutar, de aprofundar, para, finalmente, firmar as minhas convicções, sem deixar que a maldade ganhe força nos meus julgamentos, ainda que compreenda que juízes neutros são uma inviabilidade antropológica (ZAFFARONI).
Acho que é pelo fato de ser assim que sou feliz. Tenho dito e faço questão de reafirmar, sobretudo em face dos que julgam o meu modo de ser pela defesa que faço das minhas convicções, que entre os habitantes da terra não há ninguém mais feliz do que eu; feliz com a minha maneira de ser, com as minhas conquistas, com a minha paz interior, com as amizades que construí, com a credibilidade que julgo ser merecedor e com a forma com que tenho julgado os meus semelhantes, tratando-os simplesmente como sujeitos de direitos; direitos que me recuso espezinhar, sejam quais forem as incompreensões dos que pensam de forma diferente.
Diferente de muitos, gosto das coisas simples, dos lugares despojados, ao mesmo tempo em que repugno a ostentação, a maldade, a aleivosia, a pantomima, o escárnio, a fofoca, o despudor, a invencionice, o puxa-saquismo, os elogios dos oportunistas e dos bajuladores de ocasião. Abomino, no mesmo passo, o esnobe, o exibido, o que se julga o mais esperto, o mais correto, ou os que se imaginam donos da verdade, os que pensam que, por exercerem o poder, são superiores aos seus semelhantes.
Mas a virtude da qual mais me ufano é a capacidade que tenho de perdoar. Não sou de guardar mágoas, conquanto possa não parecer aos olhos dos desavisados. Perdoar é, para mim, a maior das virtudes. Mas perdoar não é, pura e simplesmente, passar uma borracha no passado, viver a vida como se o passado nunca tivesse existido. Pode-se perdoar, mas esquecer é impossível (BALZAC).
Segundo a minha forma de entender, não se pode exigir de uma pessoa que ela esqueça as maldades que lhe infligiram no passado, pois, a permanente lembrança dessa má ação, funcionará como uma espécie de advertência para que, no presente, possa se prevenir das maldades antes praticadas contra ela, e para que possa, ademais, pensar mil vezes antes de repetir uma injustiça que tenha sido praticada por ela em algum momento da sua vida.
Quando perdoo, eu o faço porque isso me afaga, faz bem à minha alma, faz de mim um ser humano melhor. O perdão me deixa de bem comigo mesmo. Daí porque não sigo o entendimento dos que pregam esse ato como uma forma de vingança, como um instrumento para constranger o semelhante, vez que o perdão, até onde alcança a minha compreensão, não deve ser um instrumento para aborrecer o inimigo (OSCAR WILDE).
De minha parte, portanto, simplesmente perdoo, e ponto.
Prezado José Luiz, que bela tese. Se mais pessoas tivesse a parcimônia em suas vidas, acharia menos, julgaria menos, condena-se-ia menos e crucificaria menos!! Eu, que fui vitima de achismos e duramente espezinhado sei o quanto dói ser vitima de altroses heroísmo.
A felicidade de um às vezes, é a infelicidade de muitos..
Descobri seu blog por um acaso virtual e agora me vejo na situação de TODOS OS DIAS vir aqui na tentativa de encontrar atualizações.
Parabéns pelas crônicas, Doutor. Oxalá todos tivessem a oportunidade de lê-las.
Que sabedoria!
(Sem falar que, ao ler seus trechos, meu vocabulário se enriquece brilhantemente.)
Receba, aqui, o abraço de uma simples estudante mas que já cultiva muita admiração pela sua pessoa.