A CRISE PRISIONAL É CULPA DE TODOS

Carrlos Eduardo Pinheiro Rocha

Bacharel em Direito – Pós-Graduando em Direito Penal e Processo Penal pela Estácio -Servidor do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão.

Em meio ao caos que se instalou no sistema carcerário brasileiro, observo, após a leitura de vários sites, revistas, blogs e colunas, a busca incessante pela responsabilização do atual momento vivenciado.

Culpa-se o Executivo porque nunca investiu no sistema. O Judiciário se mantém determinado indivíduo preso de forma prolongada, é moroso, e se o põe em liberdade é conivente com a criminalidade.

Culpa-se ainda o Ministério Público e sua “sede” por condenação, além da polícia que é mal preparada e corrupta. Sobra até para Defensoria Pública, pois a mesma não é capaz de atender a demanda crescente. Aos advogados reserva-se o estigma de mercenários que por dinheiro defendem os piores criminosos.

Por fim, vem o poder Legislativo, responsável em elaborar leis penais brandas, o que estimula o crescimento da criminalidade. Resumindo, o problema, genericamente falando, é das autoridades e do sistema como um todo, independente do poder a qual pertençam.

Pronto. Encontrou-se a causa das mazelas atuais. A crise é lá e não aqui, afinal, eu não tenho a caneta em minhas mãos para autorizar, nomear, decidir, requerer, determinar, denunciar, peticionar ou executar qualquer ato inerente às autoridades públicas no cumprimento de seu dever. Sou apenas um cidadão de bem e nada disso me diz respeito.

A questão crucial, a meu ver, e que muitos devem se indagar principalmente na hora de atribuírem a culpa a determinado órgão é: porque que não se investe no sistema carcerário? Porque o governo não constrói presídios se a superlotação prisional debatida exaustivamente é de conhecimento de todos?

A resposta é simples: presídio não dá voto. Imagine você, um candidato em plena campanha, tendo como um dos seus temas “NO MEU GOVERNO, IREI INVESTIR 200 MILHÕES NA CONSTRUÇÃO DE NOVOS PRESÍDIOS”. Puro suicídio político. Derrota certeira. Num estado (e país) onde a carência por serviços básicos é precária, a educação é falha e a saúde pública é uma verdadeira antecipação de morte, não há espaço para se investir um real na melhoria de morada provisória de preso.

A população anseia por melhores condições de vida, saúde, educação, infraestrutura e, na rabeira dos investimentos públicos, melhorar o sistema carcerário não deve sequer fazer parte da lista de investimentos a serem efetuados.

Sinceramente, não quero a construção de presídios quando inexistem hospitais e escolas para atender a população de forma eficaz, e tenho certeza que este pensamento reflete o de muitos cidadãos. Porém, esta postura me responsabiliza, em conjunto com as demais autoridades, pelos fatos vivenciados atualmente.

Conforme dito antes, presídio não dá voto, não elege, e, via de consequência, não é importante para aqueles que estão ou pretendem um dia exercerem um cargo eletivo, sendo dispensável para o destinatário final de uma campanha política, o eleitor. Uma boa forma de um marqueteiro político perder seu emprego é informar ao candidato que parte de seu programa de governo será voltado para a melhoria carcerária. Demissão imediata.

A melhoria no sistema prisional não se dá apenas por parte de investimentos, se dá pela mudança no pensamento de todo cidadão, tendo a consciência de que a questão carcerária é de importância fundamental para toda a sociedade, afinal, ninguém que está privado de sua liberdade ficará eternamente neste estado de custodia, ou seja, um dia você estará do lado de uma pessoa que já permaneceu detida.

Agora vejamos, de quem é a culpa? Do governo que não investe ou da população que não quer este investimento? Quem votaria num candidato ao afirmar, em plena campanha, que pretende executar o maior investimento da história em presídios, quando o Estado sequer garante o mínimo de atenção básica para a população?

Como cidadão, confesso que passei a refletir um pouco mais sobre a complexidade do atual momento em que vive o sistema prisional brasileiro, mas infelizmente, e como já é praxe, determinadas questões só são debatidas após mortes, dor e sofrimento. É aquela máxima brasileira de que todo mundo sabe do problema, mas é preciso que uma desgraça aconteça para que se discuta. Vou dar um exemplo pontual para não fugir do tema. Redução da maioridade penal. Aparece e depois some. Discute-se para logo em seguida cair no esquecimento (exemplos: caso Liana Friedenbach de 2003, Victor Hugo Deppman, abril de 2013, universitário morto com um tiro na porta de sua casa e o da dentista Cynthya Magaly, que teve o corpo tomado por chamas após um menor lhe atear fogo, e mais recente, o estupro coletivo em Castelo/PI, dentre inúmeros). Infelizmente e com pesar, eu afirmo que vai ser necessário que um adolescente mate algum cidadão de forma chocante e trágica para que essa discussão volte à pauta, já que a “bola da vez” são os presídios.

Voltando. Praticar um crime é uma opção individual (generalizando, sem adentrar nas questões sociais) e a nossa insensibilidade e desprezo pelo sistema carcerário ocorre pelo fato da imensa maioria dos brasileiros serem pessoas corretas e trabalhadoras, fato que impõe a sensação de relativa imunidade de um dia fazermos parte do contingente carcerário deste país. Mas, se um de nós tivesse algum amigo ou parente preso neste atual momento, a nossa mentalidade provavelmente seria outra e, assim como se faz necessária a melhoria nos serviços públicos básicos, também se mostra urgente e indispensável a realização de investimentos no sistema prisional, afinal, quem está preso, um dia esteve solto e, infelizmente, a custódia restritiva de liberdade deixa sequelas insanáveis que são descontadas em toda a sociedade (reincidência delitiva).

Ademais, foi-se o tempo de nos considerarmos alheios a situação prisional no Estado. Além de cobrar por hospitais e escolas, a população deve cobrar também a melhoria no sistema carcerário, não devendo renegar aqueles que penalmente e provisoriamente, repita-se, foram excluídos do convívio social.

PS: Escrevi esse texto em março de 2014 quando ocorreu o massacre de Pedrinhas. Fiz essas observações de forma particular, apenas como reflexão própria. Incrível como quase três anos depois, tudo que foi redigido se aplica ao atual momento e penso, será que esse texto ainda será atual nos anos vindouros?

Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

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