A PARTICIPAÇÃO DA MULHER NA POLÍTICA

A fraude à cota de gênero tem sido, no dias atuais, indubitavelmente, um tema
candente do Direito Eleitoral, pelos objetivos a que ela se propõe, no sentido de incentivar a
participação feminina na política, em tributo ao pluralismo político.
Inobstante a proteção legal à cota de gênero, a verdade que se manifesta, translúcida
e inquietante, é, contraditoriamente, a disseminação, em todo o país, de fraudes escancaradas e
acintosas às reservas de gênero, disso resultando que, em lugar da promoção da participação
feminina, o que temos testemunhado é a reafirmação da exclusão da mulher da política
Importa consignar, a propósito, que a necessidade de estímulos à participação política
das mulheres ganhou força com a Constituição Federal de 1988, mas a realização desse
desiderato acabou se revelando uma verdadeira guerra, realidade fática que se pode inferir em
face das várias provocações à Justiça Eleitoral em face da disseminação das chamadas
candidaturas laranjas, pífias, fictas ou fraudulentas.
A verdade é que, ao final de duas décadas, o progresso resultante das medidas
legislativas, visando o estimula à participação feminina, foi muito tímido, a demonstrar a
necessidade de reação dos atores institucionais. Nesse afã, a missão cabe, também e
precipuamente, à Justiça Eleitoral, através de sua atuação jurisdicional e regulamentar, donde
se espera atuação determinada no afã de coibir os abusos.
A conclusão, em face do que tenho testemunhado como ator institucional com atuação
na Corte Eleitoral do Maranhão, lamentável dizer, porque isso se traduz em inaceitável
menoscabo à mulher, é que muitas candidaturas femininas passaram a compor as listas
partidárias como mera formalidade, ou seja, apenas para que os partidos se adéqüem à
legislação.
Nesse cenário, a Justiça Eleitoral deve, sim, com equilíbrio e sensatez, mas de forma
determinada, adotar uma postura evolutiva, progressiva e adaptativa – a considerar que as
fraudes tendem à sofisticação -, de modo a, sem descurar de sua responsabilidade e sem
excessos, lançar os seus tentáculos em face dos protagonistas das fraudes, ainda que tenha que
decidir contramajoritariamente.

Tenho reafirmado que somente a interpretação evolutiva do direito, consentânea com
os dias presentes, nos levará à sua atualização, pois é dever do intérprete estar atento à
evolução da sociedade e, no caso das cotas de gênero, a sofisticação das ações ilícitas está a
exigir, que, na análise do caso concreto, a lei seja analisada evolutivamente, isto é, não em face
do ambiente em que foi criada, mas em face do cenário em que foi infringida, sob pena de
restar inviabilizada a punição dos fraudadores.
É preciso ter em conta, a propósito das fraudes em comento, que a construção
jurisprudencial atual se consolidou em um ambiente que aos poucos foi se sofisticando – e
tende a se sofisticar ainda mais –, daí as dificuldades que temos de definir o que seja uma
candidatura ficta/laranja, a exigir que evoluamos na análise dos fatos, bem assim no que condiz
com a sua subsunção à normativa, ante a óbvia constatação de que uma interpretação que era
correta num determinado momento, pode ter-se tornado inapropriada em ocasião posterior,
disso resultado que não se pode dar a mesma solução a um problema que sofreu mutação em
razão das alterações no plano da realidade fática.
E a realidade fática, quando se trata de fraude eleitoral, todos sabemos, muda com o
tempo, se sofistica em busca do aperfeiçoamento, a exigir das instâncias de controle uma
interpretação progressiva, evolutiva e, no mesmo passo, destemida, sem descurar, claro, do que
efetivamente restar apurado, pois ao julgador não é dado o direito de agir em face de suas
convicções, de suas idiossincrasias, conquanto não se possa perder de vista um inevitável
coeficiente de subjetividade em suas decisões.
É isso.

Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

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