Sentença condenatória. Roubo duplamente qualificado. Continuidade delitiva.

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jose.luiz.almeida@globo.com  ou  jose.luiz.almeida@folha.com.br 

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O acusado, importa dizer, tinha total domínio do fato, sabia o que estava fazendo, não tinha a sua capacidade psíquica diminuída, não foi submetido a nenhuma força física irresistível.
A conduta do acusado não foi resultado de um ato involuntário, mas do desejo, de ultrajar a ordem jurídica, de violar o patrimônio das vítimas.

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Cuida-se de sentença condenatória, em face do crime de roubo duplamente qualificado.

O lamentável na decisão é que o acusado deixou de ser responsabilizado em face de alguns crimes, em virtude da omissão do Ministério Público.

A propósito, sobre a denúncia assim me manifestei, antes do exame das provas amealhadas:

  1. Devo grafar, preliminarmente, que a denúncia, mais uma vez, peca pela falta de detalhes acerca dos crimes que ocorreram, em continuidade delitiva, e pelo displicência em face das provas que pretendia produzir o Ministério Público.
  2. Com efeito, colho das provas que E. D. A. teve seus pertences roubados, mas não foi mencionado tal fato na denúncia, daí por que, em face desse crime, o acusado não pode ser responsabilizado.
  3. Mais uma vez displicente, a denúncia aponta V. G. R. como mais uma das vítimas do assalto, mas sequer o arrola como testemunha, cumprindo anotar que, por isso, acerca desse crime nenhuma prova foi produzida.

Da mesma sentença destaco a continuidade delitiva, sobre a qual expendi as seguintes considerações:

  1. Convém sublinhar, agora, que os assaltos se deram, desde meu olhar, em continuidade delitiva, ou seja, com uma ação, dividida em vários atos, o acusado e comparsas praticaram dois crimes da mesma espécie, sendo o subseqüente, pelas condições de tempo, lugar e maneira de execução, uma continuação do primeiro.
  2. No caso presente estão presentes, a caracterizar a continuidade delitiva, além da pratica de dois crimes da mesma espécie, o nexo de continuidade delitiva, as condições de tempo, lugar e maneira de execução.
  3. O acusado, em continuidade delitiva, atentou contra os patrimônios do Posto Milênio e de D. de J. P. F., certo que ambos os crimes guardam entre si conexões no tocante ao tempo, ao lugar e ao modo de execução, revelando, de efeito, homogeneidade de condutas, evidenciando ser a última ação pura continuação da primeira.

 

Sobre a consumação dos crimes, sublinhei:

  1. Devo dizer, conquanto seja da sabença comum, que, para consumação do crime de roubo não se exige o efetivo locupletamento por parte dos agentes. Mas é imprescindível, como se deu no caso presente, tenha ocorrido a posse desvigiada da res, ainda que por pouco tempo.
  2. Para consumação do roubo, todos sabemos, basta que se constitua nova posse, excluindo a posse da vítima, de tal sorte que ela não possa, ainda que por pouco tempo, dispor da res.
  3. O acusado, parafraseando Aníbal Bruno, alcançou a fase última do atuar criminoso, realizou todos os termos do tipo penal, lesionando o bem jurídico protegido penalmente. (Direito Penal, Parte Geral 4ª edição, t. II/254, 1984)

 

A  seguir, a sentença, por inteiro.


Processo nº 1111622008

Ação Penal Pública

Acusado: R. dos S. A.

Vítima: D. de J. P. F. e outro

Vistos, etc.

Cuida-se de ação penal que move o Ministério Público contra RSA, devidamente qualificado nos autos, por incidência comportamental no artigo 157,§2º, I e II, do Digesto Penal, em face de, no dia 26/04/2008, por volta das 11h40, acompanhado de mais dois elementos – menores infratores ASS e LSF – , com emprego de arma de fogo, ter assaltado D. de J. F. F., que trabalhava no Posto Milênio, localizado na Av. dos Portugueses, nesta cidade, de quem subtraiu a importância de R$ 180,00 (cento e oitenta) reais, para, logo em seguida, evadir-se do local, em companhia dos demais meliantes.

A persecução criminal teve início com a prisão em flagrante do acusado.(fls.07/15)

Auto de apresentação e apreensão às fls. 17.

Termo de restituição às fls. 24 e 31.

Recebimento da denúncia às fls. 74/75.

O acusado foi qualificado e interrogado às fls. 94/98.

Defesa prévia às fls. 101103.

Exame em armas de fogo.(fls.126/128)

Durante a instrução E. D. A. (fls.109/110), D. de J. P. F. (fls. 111/112), L. S. F. (fls. 131) e J. B. C. B.. (fls. 132)

Na fase do 499 nada foi requerido. (fls. 133)

O Ministério Público, em razões finais, pediu a condenação do acusado nos termos da denúncia. (fls.151/154)

A defesa, de seu lado, pediu a absolvição do acusado, nos termos do inciso VI, do artigo 386, do CPP. (fls. 159/161)

Relatados. Decido.

01.00. Tratam os autos sub examine de crime de roubo duplamente qualificado, cuja prática o Ministério Público imputa a RSA.

02.00. Colho da denúncia que o acusado – em companhia dos menores Ass e Lsf -, com emprego de armas de fogo, assaltou:

I – o Posto Milênio, localizado na Av. dos Portugueses, de cujo patrimônio subtraiu a importância de R$ 180,00 (cento e oitenta) reais.

II – D. de J. P. F., de quem levou o relógio de pulso, para, em seguida, ser preso, ainda de posse da arma instrumento do crime e da importância de R$ 214,00 (duzentos e quatorze reais), além de outros objetos e

III – V. G. R., de quem também levou um relógio de pulso.

03.00. O autor do fato, consta ainda da proemial, foi preso ainda de posse de parte da res mobilis e com uma das armas de fogo utilizadas na prática dos crimes, além de munições.

04.00. Preso e autuado em flagrante, iniciou-se à persecução criminal, tendo sido amealhado provas nos dois momentos da persecução.

05.00. Na fase preambular, o acusado invocou o direito constitucional ao silêncio, reservando-se o direito de só falar em sede judicial.(fls.12/13)

06.00. Além do acusado, destaco em sede extrajudicial o depoimento do ofendido D. de J. P. F., empregado do Posto Milênio, o qual, dentre outras coisas, disse:

I – que se encontrava no Posto Milênio quando se deu o assalto.

II – que foi surpreendido com uma coronhada na cabeça, quando estava abastecendo uma carreta.

III – que, anunciado o assalto, disse ao roubador que não guardava dinheiro.

IV – que, enquanto isso, viu mais dois assaltantes rendendo os seus colegas frentista E. e R. M..

V – que L. puxou sua carteira porta-cédulas.

VI – que L. exigiu do frentista E. que lhe entregasse todo dinheiro.

VII – que viu E. entregar ao adolescente uma determinada quantia em dinheiro.

VIII – que L. subtraiu o seu relógio de pulso do eletricista V. G. R..

07.00. Os menores – ASS e LSF -, a exemplo do acusado, também invocaram o seu direito ao silêncio. (fls.14 e 15)

08.00. Na primeira fase da persecução foi formalizada a apreensão de parte da res furtiva, além de uma revólver calibre 32, Taurus, com duas munições intactas.(fls.17)

09.00. Na mesma sede foi devolvida parte da res substracta.(fls.24)

10.00. Finalizando a instrução preambular foi ouvido o frentista E. D. A., que, a seu tempo e modo, informou:

I – que no dia do fato estava trabalhando no Posto Milênio, quando ocorreu o assalto, praticado por três indivíduos, sendo que dois deles estavam armados.

II – que um deles colocou o revólver em sua cabeça, determinando que lhe entregasse o dinheiro.

III – que entregou o dinheiro do posto e o seu, bem como um aparelho celular Motorola, modelo V3.

11.00. Com esses dados encerrou-se a fase preambular da persecução criminal.

12.00. Tendo às mãos o caderno administrativo, o Ministério Público denunciou Rsa, por incidência comportamental no artigo 157,§2º, I e II, do CP.

13.00. O acusado foi citado, qualificado e interrogado, tendo, na oportunidade, atribuído a autoria do crime aos menores.(fls.94/98)

14.00. Do depoimento do acusado apanho os seguintes excertos, verbis:

Juiz: E quanto a esse assalto, que estão lhe imputando. Você participou ou não?

Acusado: Participei. Eu estava bebendo num bar quando chegou esses dois rapazinhos menores.

Juiz: O L. e o A.?

Acusado: Foi.

Juiz: Então você os conhece?

Acusado: Não senhor. Olhei nesse dia no bar. Eles estavam bebendo perto de mim, na mesa ao lado. Ai foram se chegando pra perto de mim e ficaram bebendo comigo. Ai eles falaram: – Ei vai dar uma volta ali? – Ai eu perguntei pra onde. E eles disseram que iam no “Tuba”. Ai eu acompanhei. Só que quando eles passaram pelo posto, eles anunciaram assalto e estavam com duas armas.

Juiz: Você está me dizendo então, que foi pego de surpresa?

Acusado: Foi. Eu não sabia disso não.

Juiz: Então eles te convidaram pra ir pra outro bar, encostaram no posto e anunciaram assalto e você ficou surpreso com aquela situação. É isso?

Acusado: Isso mesmo.

Juiz: Quem estava armado?

Acusado: Os dois.

Juiz: Quais as armas?

Acusado: Revolver.

Juiz: Havia bala?

Acusado: Não sei.

Juiz: E você não estava armado?

Acusado: Não senhor.

Juiz: Nenhum tipo de arma? Nem faca?

Acusado: Não. Não tinha nada.

Juiz: E vocês estavam de carro ou estavam a pé?

Acusado: A pé.

Juiz: E eles te falaram que iam fazer o quê no posto? Tinha alguma lojinha?

Acusado: Não. Não tinha nada. Eles só chegaram lá e já foram dizendo que era um assalto. Só isso.

Juiz: E só naquela hora que você ficou sabendo que era um assalto?

Acusado: Foi.

Juiz: E o que eles levaram?

Acusado: Pegaram um dinheiro lá. E como tinha um frentista lá. Eles me mandaram segurar o frentista e pegar o que tinha no bolso dele. Ai eu peguei uns trocados lá e uma aparelho celular.

Juiz: E os outros pegaram celular também?

Acusado: Pegaram. Celular e dinheiro.

Juiz: E saíram de lá?

Acusado: Foi. Quando a gente ia saindo tinha uma viatura. Começaram a correr atrás da gente.

Juiz: Logo após a pratica do crime apareceu uma viatura?

Acusado: Foi. Logo depois que a gente pegou o dinheiro. Ai a gente saiu pulando muro, até que eu entrei num quintal que não tinha mais como eu sair. Ai a policia cercou, mandou eu deitar no chão e atirou na minha perna. A bala furou de um lado para outro.

Juiz: E você ainda estava com as coisas roubadas no bolso?

Acusado: Estava. Ai eles pegaram as coisas do meu bolso.

Juiz: Quer dizer então que com os rapazes que você praticou esse crime, você não teve mais nem um contato?

Acusado: Nunca soube de nada deles.

Juiz: Eles idealizaram o assalto, foram na linha de frente para praticar o assalto, conseguiram se safar e você ficou no prejuízo?

Acusado: Isso mesmo.

Juiz: Você estava bêbado na hora desse assalto?

Acusado: Eu já havia tomado algumas.

Juiz: Mas tinha consciência ou não do que estava fazendo?

Acusado: Eu tinha consciência.

Juiz: Você usou drogas nesse dia?

Acusado: Usei.

Juiz: E eles usaram também?

Acusado: Não sei.

Juiz: Vocês se encontraram por acaso? Não tem como dizer quem são e nem como dá informações a respeito deles?

Acusado: Isso mesmo.

Juiz: Vocês praticaram alguma violência contra os frentistas?

Acusado: Eu mesmo não fiz nada violento.

Juiz: E eles?

Acusado: Eu não vi não.

Juiz: Você conhecia antes o D. F., E. D., L. S. e J. B. C.?

Acusado: Não conheço ninguém.( fls. 94/98)(com a supressão de fragmentos tidos como irrelevantes para o deslinde da quest

15.00. Além do acusado foi ouvido o frentista E. D. A., que, de sua parte, disse:

I – que é frentista do Posto Milênio.

II – que foi assaltado por três elementos.

III – que o acusado levou o seu aparelho celular e mais de cinqüenta reais em dinheiro.

IV – que o acusado também levou do frentista D. cento e oitenta reais, de propriedade dele.

V – que subtraiu do frentista R. uma determinada quantia em dinheiro.

VI – que ainda levou um relógio e um celular dos pedreiros que estavam no local.

VI – que dois dos assaltantes estavam armados, sendo que um lhe abordou e o outro ficou de longe.

16.00. Na mesma sede foi ouvida a vítima D. de J. P. F., que, dentre outras coisas,às fls. 111/112, afirmou:

I – que e frentista do Posto Milênio.

II – que foi assalto por três elementos, sendo que dois deles estavam armados com revólveres, calibres 38 e 32.

III – que estava abastecendo quando um indivíduo chegou por trás e botou o revólver em sua cabeça, chamando-o de miserável e mandando que passasse o dinheiro.

IV – que foi levado pela gola até onde estavam os frentistas.

V – que teve subtraída a carteira com a quantia de 180,00 (cento e oitenta reais)

VI – que fez o reconhecimento dos assaltantes na delegacia.

17.00. Dando sequencia a instrução foi ouvido o menor LSF, o qual, a seu tempo, às fls. 131, afirmou:

I – que, de fato, participou do assalto com o acusado R. S. A., acompanhado, também, de A. S. S., também menor de idade.

II – que apenas ele, depoente, e E. estavam armados.

III – que foi ele que teve a idéia do assalto, pois estava precisando comprar algo para seu filho.

IV – que levaram do posto um aparelho celular, um relógio e dinheiro.

V – que o revólver apreendido lhe pertencia.

VI – que o outro revólver, calibre 32, era de propriedade do menor A..

VII – que a participação de R. foi recolher os objetos roubados.

VIII – que Roberto limitou-se a recolher os objetos que foram roubados.

18.00. J. B. C. B., de seu lado, disse:

I – que foi informado de um assalto ao posto Milênio.

II – que diligenciaram e foram informados pelos frentistas que o assalto foi realizado por três elementos, todos armados.

III – que localizaram os assaltantes na Rua da Felicidade, na Vila Embratel.

IV – que deram voz de prisão e determinaram que todos soltassem as armas, tendo os mesmos obedecido.

V – que as armas foram encontradas em poder dos menores L. e A..

VI – que com R. foram encontrados alguns objetos roubados.

19.00. Encerrando a instrução, vejo acostada as autos a prova pericial realizada nos revólveres apreendidos em poder dos acusados, tendo concluídos os senhores peritos que as armas tinham eficiência para produzir disparos.(fls.144/146)

20.00. Essas as provas produzidas ao longo da instrução.

21.00. Passo, a seguir, a expender as minhas conclusões, em face da prova colacionada.

22.00. Devo grafar, preliminarmente, que a denúncia, mais uma vez, peca pela falta de detalhes acerca dos crimes que ocorreram, em continuidade delitiva, e pelo displicência em face das provas que pretendia produzir o Ministério Público.

23.00. Com efeito, colho das provas que E. D. A. teve seus pertences roubados, mas não foi mencionado tal fato na denúncia, daí por que, em face desse crime, o acusado não pode ser responsabilizado.

24.00. Mais uma vez displicente, a denúncia aponta V. G. R. como mais uma das vítimas do assalto, mas sequer o arrola como testemunha, cumprindo anotar que, por isso, acerca desse crime nenhuma prova foi produzida.

25.00. Feito o registro, passo ao expender minhas conclusões, em face da prova produzida.

26.00. À luz da denúncia e em homenagem à ampla defesa, devo redizer que aos acusados são imputados os seguintes assaltos:

I – contra o patrimônio do Posto Milênio;

II – contra o patrimônio de D. de J. P. F. e

III – contra o patrimônio de V. G. R..

27.00. De tudo que examinei posso concluir que fatos criminosos efetivamente existiram. É dizer: os crimes narrados na denúncia efetivamente ocorreram, conquanto deve ser absolvido o acusado em face do crime contra o patrimônio de V. G. R., em razão do qual nenhuma prova foi produzida.

28.00. Acerca dos demais crimes – contra o patrimônio do Posto Milênio e de D. de J. P. F. – as provas dos autos sobejam.

29.00. Impende grafar que o próprio acusado confessa a existência dos crimes, conquanto tente demonstrar que deles não participou, negativa que, nada obstante, restou desprestigiada em face das demais provas produzidas.(cf. fls.94/98)

30.00. O depoimento do acusado, viu-se acima, está posto de modo ao não deixar dúvidas de que participou, sim, do assalto, dados que, repito, se comprova em face do conjunto probatório.

31.00. A testemunha/vítima E. D. A., consignei acima, confirma a ocorrência dos crimes e narra, em detalhes, a ação do acusado e seus comparsas.

32.00. E. D. A. confirmou, v. g., a ocorrência do assalto a D. de J. P. F., de quem subtraíram cerca de R$ 180,00 (cento e oitenta reais).

33.00. D. de J. P. F., também anotei acima, confirmou a ocorrência os crimes, narrando, também em detalhes, a ação do acusado e comparsas.

34.00. LSF, comparsa do acusado, reafirmou a ocorrência dos crimes, dizendo, inclusive, que o menor Arielson Sousa Seguins também participou da execução dos mesmos.

35.00. LSF, inclusive, viu-se acima, declinou os bens subtraídos e qual a participação de cada um dos autores do crime.

36.00. De tudo que restou apurado e analisado, posso reafirmar, sem enleio, que comprovado está, a mais não poder, o assalto ao Posto Milênio e a D. de J. P. F..

37.00. Na mesma toada devo dizer, à luz, também, do que restou amealhado nas duas fases da persecução, não restou comprovado o crime em detrimento do patrimônio de V. G. R..

38.00. Convém sublinhar, agora, que os assaltos se deram, desde meu olhar, em continuidade delitiva, ou seja, com uma ação, dividida em vários atos, o acusado e comparsas praticaram dois crimes da mesma espécie, sendo o subseqüente, pelas condições de tempo, lugar e maneira de execução, uma continuação do primeiro.

39.00. No caso presente estão presentes, a caracterizar a continuidade delitiva, além da pratica de dois crimes da mesma espécie, o nexo de continuidade delitiva, as condições de tempo, lugar e maneira de execução.

40.00. O acusado, em continuidade delitiva, atentou contra os patrimônios do Posto Milênio e de D. de J. P. F., certo que ambos os crimes guardam entre si conexões no tocante ao tempo, ao lugar e ao modo de execução, revelando, de efeito, homogeneidade de condutas, evidenciando ser a última ação pura continuação da primeira.

41.00. Releva anotar que as circunstâncias objetivas da continuidade delitiva devem ser analisadas individualmente, mas valoradas em seu conjunto, do que se infere que a ausência de qualquer delas, por si só, não desnatura a ficção legal.

42.00. De importância que se anote, ademais, que, ao que consta dos autos, o réu não é multirreincidente , de modo a descaracterizar a continuidade delitiva, sabido que a continuidade delitiva não alcança quem faz do crime a sua profissão.

43.00. De relevo que se diga, agora, que os crimes em comento, ademais, restaram consumados, tendo em vista que os bens subtraídos saíram da esfera de disponibilidade dos ofendidos.

44.00. O roubo, como o furto, todos sabem, consuma-se quando a coisa é retirada da esfera de disponibilidade dos ofendidos e fica em poder tranqüilo, ainda que de forma passageiro, dos agentes.

45.00. In casu sub examine, viu-se da prova amealhada, o acusado e seus comparsas realizaram a subtração, para, só depois, serem localizados ainda de posse de parte da res furtiva e das armas utilizadas na prática dos crimes.

46.00. O acusado e comparas, após renderem os frentistas, promoveram a subtração da res e fugiram do local, para, somente algum tempo depois, serem presos, ainda de posse da res, do que resulta a constatação de que, efetivamente, aqui se está a cuidar de crimes de roubo consumados.

47.00. Devo dizer, conquanto seja da sabença comum, que, para consumação do crime de roubo não se exige o efetivo locupletamento por parte dos agentes. Mas é imprescindível, como se deu no caso presente, tenha ocorrido a posse desvigiada da res, ainda que por pouco tempo.

48.00. Para consumação do roubo, todos sabemos, basta que se constitua nova posse, excluindo a posse da vítima, de tal sorte que ela não possa, ainda que por pouco tempo, dispor da res.

49.00. O acusado, parafraseando Aníbal Bruno, alcançou a fase última do atuar criminoso, realizou todos os termos do tipo penal, lesionando o bem jurídico protegido penalmente. (Direito Penal, Parte Geral 4ª edição, t. II/254, 1984)

50.00. Definidas a existência do crime e sua autoria, haverá o acusado de suportar, agora, as conseqüências de sua ação, traduzidas em penas privativa de liberdade e multa, tal como preconizado no preceito secundário do tipo penal malferido.

51.00. A pena, agora, será a retribuição do estado que decorre dos ilícitos praticados pelo acusado, como forma rigorosa e inevitável de controle social;

52.00. O acusado, com sua ação, transgrediu uma norma penal, devendo, agora, receber a correspondente sanção penal, com o que se pretende que comportamentos desse jaez se repitam.

53.00. Do que restou apurado nos autos, devo reafirmar que a ação do acusado se amolda, perfeitamente, ao tipo penal declinado na incoativa.

54.00. O albergado na prefacial, com efeito, se apresenta na integridade de seus elementos constitutivos.

55.00. A conduta do acusado, salto aos olhos, se enquadra, perfeitamente, no tipo abstrato descrito na lei penal.

56.00. O fato narrado na exordial, depois de coligidas as provas, se enquadra na descrição legal da norma incriminadora do artigo 157, o que justifica a potestas coercendi dos órgãos do procedimento penal.

57.00. O acusado RSA, ao subtrair os bens da vítima, o fez com a vontade, com a finalidade de ter a coisa para si (animus furandi ou animus rem sibi habendi), que independe do intuito de lucro (abemos lucri faciendi).

58.00. De se registrar que o acusado não se limitou a planejar, a pensar ou assalto, hipótese em que não haveria que cogitar-se da prática de crime. O acusado pensou e colocou em prática a sua vontade de atentar contra o patrimônio dos ofendidos.

59.00. O acusado, importa dizer, tinha total domínio do fato, sabia o que estava fazendo, não tinha a sua capacidade psíquica diminuída, não foi submetido a nenhuma força física irresistível.

60.00. A conduta do acusado não foi resultado de um ato involuntário, mas do desejo, de ultrajar a ordem jurídica, de violar o patrimônio das vítimas.

61.00. A conduta do acusado se realizou mediante a manifestação da vontade dirigida a um fim, qual seja a de desfalcar o patrimônio das vítimas – e com violência, o que é mais grave.

62.00. O acusado, conquanto tivesse plena consciência da ilegalidade do ato que praticara, não se comportou como era de se esperar, devendo, por isso, suportar os efeitos da ilicitude, consubstanciados no preceito secundário do artigo 157.

63.00. Desobedecida a norma preceptiva pelo acusado e atingindo o mesmo bens jurídicos tutelados penalmente, fez nascer para o Estado, disse-o acima, o direito de penetrar no seu status libertatis, para privá-lo, através da medida sancionadora correspondente, de um bem –a liberdade – até então garantido e intangível.

64.00. O acusado, em face de sua ação réproba, deve suportar a ira estatal, não só em resposta ao crime que praticou, mas também para prevenir futuras condutas delitivas.

65.00. Para que não existam dúvidas acerca desta decisão e tributo à ampla defesa, anoto que, ao esposar tese diametralmente oposta à da defesa, não se pode alegar, em sede recursal, que aqui não se a tenha enfrentado, quantum satis.

66.00. Tudo de essencial posto e analisado, julgo, parcialmente, procedente a denúncia, para, de consequencia, condenar o acusado RSA,brasileiro, solteiro, lavrador, filho de M. de J. S. N. e F. A. da S., atualmente foragido, residente e domiciliado, antes, no Povoado Bananal/Morro/Ma por incidência comportamental no artigo 157, §2º, I e II, do Digesto Penal, em face dos crimes praticados em detrimento do patrimônio do Posto Milênio e de Daniel de jesus Pereira França, cujos penas passo a fixar a seguir, individualizamente, para os fins do artigo 71 do Codex Penal.

67.00. Para o crime praticado em detrimento do patrimônio do Posto Milênio fixo a pena-base em 04(quatro) anos de reclusão e 10(dez)DM, à razão de 1/30 do SM vigente à época do fato, sobre as quais faço incidir mais 1/3, em face as majorantes previstas nos incisos I e II, §2º, do artigo 157 do CP, perfazendo 05(cinco) anos e 04(quatro) meses de reclusão e 13(treze)DM, sobre as quais faço incidir mais 1/6, em face da causa geral de aumento de pena prevista no artigo 71, parágrafo único, do Codex Penal, totalizando, definitivamente, 06(seis) anos, 02(dois)meses e 20(vinte)dias de reclusão, e 15(quinze)DM, devendo a pena privativa de liberdade ser cumprida , inicialmente, em regime semi-aberto, ex vi legis; e

68.00. Para o crime praticado em detrimento do patrimônio de D. de J. P. F. fixo a pena-base em 04(quatro) anos de reclusão e 10(dez)DM, à razão de 1/30 do SM vigente à época do fato, sobre as quais faço incidir mais 1/3, em face as majorantes previstas nos incisos I e II, §2º, do artigo 157 do CP, perfazendo 05(cinco) anos e 04(quatro) meses de reclusão e 13(treze)DM, devendo a pena privativa de liberdade ser cumprida , inicialmente, em regime semi-aberto, ex vi legis.

69.00 As penas, viu-se acima, foram fixadas considerando cada crime de per si.

69.01. É que, para fins de prescrição, v.g., os crimes, in casu, consideram-se isoladamente.

69.01.01. Nesse sentido sigo a esteira da melhor interpretação jurisprudencial, segundo a qual, em caso de continuidade delitiva, “É indispensável que se examine e se fixe, primeiramente, a pena relativa a cada um dos delitos para, só então, aplicar-se o respectivo aumento. Isto decorrente do princípio constitucional da individualização das penas (CP, art.71), além de ser necessário para análise da prescrição de cada um dos crimes (CP, art.119), bem, como para verificar se a pena, acrescida pela fixação ditada pelo instituto, não excede a soma das sanções dos crimes-membros”. (TAMG, ap.416.963-7, j.12.11.20003, in Bol. IBCCr 138/800)

70.00. Digo mais, na mesma linha de raciocínio, que compete ao juiz da execução penal “a soma ou a unificação de penas”, ex vi legis.

71.00. Nesse sentido têm decidido os nossos Sodalícios, como se confere nas ementas a seguir transcritas, verbis:

Em tema de adequação de pena, a competência originária é do Juízo da Execução.( JUTACRIM 58/100)

72.00. No mesmo diapasão:

Competente para o exame de unificação de penas e livramento condicional é o Juízo da Execução(JUTACRIM 87/89)

73.00. Na mesma alheta:

O cálculo da pena total, como resultado da unificação, deverá ser realizado pelo Juízo das Execuções, devendo, para tal fim, ser atendida a proporcionalidade com a pena unificada do co-réu antes beneficiado.( STF – RT 647/363)

74.00. Navegando nas mesmas águas:

Crime de roubo qualificado – Unificação das Penas – O pedido de unificação de penas deve ser dirigido, originariamente, ao Juízo das Execuções Criminais (art.66, III, a, da Lei de Execução Penal – Lei 7.210/84)

75.00. No caso do chamado crime continuado qualificado, que é o que cuidamos nos autos presentes, entendo, na esteira de entendimento de Rogério Greco, “o juiz, após considerar a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias, poderá aumentara pena de um só dos crimes, se idênticas, a mais grave, se diversas, até o triplo”.( Rogério Greco. Código Penal Comentado, 2008, Impetus, p. 264)

76.00. Mais adiante, o mesmo doutrinar indaga,

“E qual seria o aumento mínimo?”

77.00. O mesmo autor, mais adiante, responde:

“Fazendo-se uma interpretação sistêmica do Código Penal, chegamos à conclusão de que o aumento mínimo será de um sexto, o mesmo previsto para o caput do artigo 71, uma vez que não seria razoável que o juiz procedesse o aumento inferior ao determinado na hipótese de crime continuado simples que, em tese, se configura em situação menos grave do que a do parágrafo único”

78.00. Quanto às penas-base, anoto que foram fixadas no mínimo legal, daí por que deixei de considerar eventual circunstância atenuante.

79.00. Acerca da continuidade delitiva reitero, finalmente, que “presente a pluralidade de condutas e de crimes dolosos da mesma espécie, praticados com emprego de armas, nas mesmas condições de tempo, lugar e maneira de execução, ocorre a hipótese de crime continuado qualificado ou específico, previsto no parágrafo único do artigo 71 do Código Penal”.(STF – HC 72.280-6)

80.00. Ainda sobre a fixação das penas, sublinho que, em face do contido no parágrafo único do artigo 71 do CP, a pena de um só dos crimes – contra o patrimônio do Posto Milênio – foi majorada, porque idênticas, já que aqui se cuida, repito, de crime continuado qualificado específico.

81.00. O acusado esteve preso durante parte da instrução criminal, uma vez que fugiu do ergástulo.

82.00. De se concluir, à luz do exposto, que a prisão do acusado se impõe, agora, também, para que possa suportar as consequencias penais dos crimes que praticou.

83.00. Com as considerações supra, revigoro, aqui e agora, os efeitos da prisão em flagrante do acusado.

84.00. Anoto, antevendo a rediscussão da em face dessa decisão, que o só fato de o acusado ser primário e possuidor de bons antecedentes, à luz da ordem constitucional em vigor, não desautoriza, com a abstração de qualquer outro critério, a mantença de sua prisão para recorrer, pois que despontam dos autos, à farta, motivos para o encerramento, estes, sobretudo agora que fugiu.

85.00. Releva gizar, portanto, que os motivos que renderam ensanchas à manutenção da prisão provisória do acusado permanecem inalterados, a eles se aduzindo o fato de que fugiu do distrito da culpa.

86.00. Com as considerações supra, mantenho a prisão do acusado RSA.

87.00. Oficie-se á autoridade policial dando-lhe ciência desta decisão e para que diligencie no sentido de capturar o acusado.

P.R.I.C.

Custas, ex vi legis.

Após o trânsito em julgado desta decisão, lance-se o nome do acusado no rol dos culpados.

Encaminhem-se os autos, depois, à distribuição, para os fins de direito, com a baixa em nossos registros.

São Luís, 25 de março de 2009.

José Luiz Oliveira de Almeida

Titular da 7ª Vara Criminal.

Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

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