Com essa frase, que tomo de empréstimo para dar título a este artigo, o ditador Sila pretendia diminuir o jovem Júlio César junto a opinião pública romana, na época em que ele se preparava, intelectual e fisicamente, para o poder. Desmerecê-lo, desacreditá-lo, diminuí-lo perante a opinião pública eram armas do ditador, antevendo a projeção política de Caio Júlio César. Como não tinha argumentos para fazê-lo, valeu-se do fato de Júlio César usar o cinto em volta da túnica, mas colocado de maneira frouxa, para fazer-se notar.
No dia-a-dia das corporações as coisas funcionam assim. Os canalhas, os sem brilho, o sem viço e projeção, para achincalhar os diferenciados pela retidão, pela dedicação e pelo brilho, procuram as coisas mais irrelevantes para tentar destratá-los, sobretudo diante dos seus acólitos.
Nas corporações e no exercício da política partidária, essa prática é de usança mais comum e mais repetida do que se imagina, ou seja, procura-se desacreditar o trabalho do colega, imputando a ele um defeito que não tem. É a prática da baixaria tupiniquim traduzida na máxima: “se o inimigo não tem defeito, nós arranjamos um”.
Quem vive em corporações sabe do que estou falando. Se o colega não tem defeito, arranja-se um para desacreditá-lo, nem que seja para dizer que ele não sabe fazer uso do cinto, como fez Sila para diminuir Júlio César. Nas corporações é preciso, muitas vezes, estereotipar o colega que de alguma forma se sobressai dos demais. É preciso grudar uma etiqueta em sua testa, para que todos que o vejam se dêem conta de que ele é defeituoso. É o preço que se paga por ter o mínimo de lucidez. Ou não é assim? Claro que os que adotam essa prática haverão de discordar; os que são vítimas dessa prática, por óbvias razões, concordarão com o articulista.
No caso da magistratura, tenho tido essa experiência. Cá, como em qualquer lugar, o juiz que profere uma sentença rica em citações, esmerada, trabalhada, fruto de pesquisa exaustiva e criteriosa, é acusado de se ser, desnecessariamente, prolixo; se, ao reverso, faz uma sentença enxuta, é acusado de ser preguiçoso. Se elabora um decreto de prisão preventiva fundamentado, narrando fatos e fazendo citações doutrinárias e jurisprudências, é acusado de ter prejulgado; se, noutro giro, faz um decreto sem citações, e acusado de fazê-lo sem fundamentação e, por isso, o réu estaria submetido a constrangimento ilegal. Se faz uma audiência longa é cansativo; se, lado outro, limita-se a perguntar o estritamente necessário, é porque não se dedica ao trabalho, é preguiçoso. Se recebe os jurisdicionados para orientá-los, é acusado de perder tempo dando explicações desnecessárias; se não atende a ninguém ou o faz rapidamente, é deselegante e não respeita o ser humano. Se conduz a audiência tratando o réu com urbanidade e respeito, sem gritar e sem humilhar, é frouxo e não sabe tratar o réu como ele merece; se trata o réu com frieza e distanciamento, é acusado de não lhe dá chance de falar com liberdade. Se se veste bem, é dândi e vaidoso ; se se veste despojadamente, não tem cara de magistrado. Se recebe um mulher de portas fechadas, está exercitando uma conquista; se a recebe de portas abertas, é porque tem medo de mulher e tem a masculinidade colocada em xeque. Se chega cedo ao trabalho, é exibido, quer parecer melhor que os colegas; se chega tarde, é relapso. Se dá entrevistas ou escreve em jornais, está sedento de fama; se se recusa a fazê-lo, é porque não tem competência para falar ao público e para escrever. Se visita o Tribunal, ta querendo promoção; se não o faz, é por pura arrogância. Se escreve com muitos adjetivos, que parecer o intelectual que não é; se escreve sem rebuscamento, assim o faz porque não tem cultura.
É, não é fácil mesmo viver em uma corporação. Dúvida? Então experimenta.