Olha que Febrônio te pega!

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Eles, os assaltantes, infernizam a nossa vida. Ninguém que saia de casa nos dias de hoje, tem certeza se vai voltar. 
Os assaltantes, todos percebemos, são quem decidem os nossos rumos, a nossa conduta. Eles determinam os lugares que devemos frequentar, a hora de entrar no carro, de chegar em casa, de visitar um amigo.
Paz, já sentimos, não existe mais, por causa deles, assaltantes.
E quando os puno com sofreguidão, quando os mantenho presos provisoriamente, me chamam de justiceiro. 

juiz José Luiz Oliveira de Almeida

Titular da 7ª Vara Criminal

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01.Em 1984, fui Promotor de Justiça em Cururupu/Ma. Tinha sido promovido, de São João dos Patos, a minha primeira comarca como representante do Ministério Público. 

02.Para Cururupu mudei-me com malas, periquito, papagaio – e esposa. Ainda não tinha filhos.

03.A paz, a tranqüilidade daquela cidade hospitaleira me encantaram de logo. Era tanta a tranqüilidade, que se podia dormir de portas e janelas abertas. Ainda não havia a violência dos dias atuais.

04.Só havia uma pessoa reconhecidamente perigosa por aquelas paragens: um tal Aliquida. Se Aliguida estivesse preso ou fosse visto em outro município, pronto, a paz era total. Não se tinha medo de nada. Cansei de dormir pelos corredores da casa avarandada de meu sogro, onde fixei residência, como tudo aberto, aproveitando a brisa da manhã e me deleitando com o gorjear dos pássaros.

05.Sim, é verdade! Acredite! Diferente de muitos, quando fui Promotor de Justiça, morei nas minhas comarcas. Só não morei em São João dos Patos porque não consegui a transferência de minha mulher. Mas dava toda assistência à comarca – e às circunvizinhas, quando era designado para responder por elas.

06.Voltando ao tema central desta crônica, reafirmo que na sede do município de Cururupu nada se temia. Presos de justiça eram poucos. Aqui e acolá, um crime de homicídio, uma lesão corporal, um estelionato. Tudo dentro do razoável em uma sociedade. Nada, no entanto, que assombrasse, que tirasse o sono.

07.Em 1927, no Rio de Janeiro, existia um assassino – um tarado, melhor dizendo -, que seviciara dois meninos. O nome dele: Febrônio Índio do Brasil. Febrônio, pelos crimes que praticara, foi preso e trancafiado num manicômio judiciário. Mas durou pouco. Conseguiu fugir e passou a assombrar a cidade, novamente. Febrônio era o Aliquida do Rio de Janeiro. Como Aliquida, era temido. Com uma diferença: Aliquida não era, ao que eu saiba, um pervertido sexual, um tarado, um seviciador de crianças.

08.Pois bem. As mães do Rio de Janeiro, ressabiadas, com medo de Febrônio, trancavam as crianças em casa. Ninguém saía de casa depois que escurecia. Era muito mais que medo. Era pânico, mesmo.

09.Mas Febrônio acabou sendo capturado na Floresta da Tijuca. Contudo seu nome já tinha entrado para a história. O nome Febrônio passou a ser uma ameaça para os garotos que vivessem pelas ruas da bela capital carioca. Sempre que saiam, as mães os atormentavam, alertando-os, sob ameaça: cuidado com Febrônio! Ou, então: Olha que Febrônio de pega!

10.Nos dias atuais, não se tem mais dúvidas, os Febrônios e os Aliquidas estão em todos os lugares, infernizando a nossa vida. Os Febrônios e Aliquidas de hoje são os assaltantes. Eles esparramam violência em todos os  cantos da cidade. Em todos os lugares, sejam grande, média ou pequena a cidade.

11.Diante dos assaltantes  somos todos iguais. Para eles não existem diferenças entre pobres e ricos, brancos ou negros, homens ou mulheres, velhos ou novos. Todos somos vítimas em potencial dos assaltantes.

12.Mais grave, ainda: eles não escolhem hora e local. Pode ser na rua, no bar, numa loja, na escola, no carro, no lotação, em casa ou em qualquer outro lugar Eles são, definitivamente, o flagelo dos dias presentes. E são destemidos e arrogantes. Diante de uma vítima indefesa, eles são petulantes.

13.Eles, os assaltantes, infernizam a nossa vida. Ninguém que saia de casa nos dias de hoje, tem certeza se vai voltar. Pode, sim, sucumbir diante da arma de um assaltante.

14.Os assaltantes, todos percebemos, são quem decidem os nossos rumos, a nossa conduta. Eles determinam os lugares que devemos frequentar, a hora de entrar no carro, de chegar em casa, de visitar um amigo.

15.Paz, já sentimos, não existe mais, por causa deles, assaltantes.

16.E quando os puno com sofreguidão, quando os mantenho presos provisoriamente, me chamam de justiceiro.

17.Quero dizer que essa é apenas mais uma das muitas etiquetas que grudaram em mim. Pouco importa. Não tenho pena mesmo de quem sai por aí assaltando e matando.

18.Ou agimos, todos, com rigor, em relação aos assaltantes, ou, mais cedo do que se imagina, a vida em sociedade se tornará inviável.

 

Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

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