Sentença Condenatória. Concurso de Pessoas

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“[…]Em adição aos argumentos acima lançados, a propósito do concurso de pessoas, anoto, a par do quadro de provas, que os acusados tiveram participação efetiva na execução material do crime, cada a um, a seu modo, dando a sua contribuição para a consecução dos fins colimados[…]”

Juiz José Luiz Oliveira de Almeida

Titular da 7ª Vara Criminal da Comarca de São Luis, Estado do Maranhão

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Cuida-se de ação penal, em face do crime de roubo, mediante concurso de pessoas.

Antecipo, a seguir, excerto relevante da decisão, no qual destaco a importância da palavra da vítima, prova mais relevante das produzidas nos autos:

A palavra do ofendido, não se pode deslembrar, em crimes desse matiz, tem especial relevância, máxime se, como ocorreu no caso presente, a vítima não tinha nenhuma razão de ordem pessoal para prejudicar os acusados e,também, quando não resta insulada no conjunto probatório.

Todos sabemos que, em crimes de jaez, cuidando-se de um dos chamados crimes clandestinos, a pedra de toque para definição da autoria é a palavra do ofendido, muitas vezes a principal – quando não a única – testemunha ocular do crime.

Se essa prova não se mostra frágil e, ademais, encontra respaldo em outros dados colhidos ao longo da instrução, aí não se tem mesmo nenhuma dúvida acerca da autoria.

No caso sub examine, além da palavra do ofendido, destaca-se a palavra de sua companheira, que foi, inclusive, agredida fisicamente com uma garrafa.

A seguir, a sentença, por inteiro.


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PODER JUDICIÁRIO

FORUM DA COMARCA DE SÃO LUIS

JUIZO DA 7ª VARA CRIMINAL

SÃO LUIS-MARANHÃO

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Acesse meu site – www.joseluizalmeida.com – e saiba o que penso e como decido.

Processo nº 261292007

Ação Penal Pública

Acusado: C. outro

Vítima: Ribamar Silva Batista

Desabafo[1]

Escrito por Jose Luiz Oliveira de Almeida em Setembro 16, 2009

Aqui e acolá, hora sim e hora também, deparo-me com pessoas nos corredores do Fórum se regozijando – mais do que eu próprio – com a proximidade de minha promoção.

Aqui e acolá, hora sim e hora também, ouço comentários de que os maledicentes comentam que, empossado, externarei o meu rancor, as minhas mágoas com o Tribunal de Justiça.

Devo dizer, a propósito, que não faço planos para promoção. Não vivo essa obsessão.

Não faz parte da minha perspectiva de vida nenhuma promoção. Eu só acredito nela quando ela se formalizar.

Portanto, que fique muito bem estabelecido que o meu projeto de vida profissional, no momento, é apenas cumprir a Meta II do CNJ. Nada mais que isso.

E que se pare, definitivamente, de especular acerca de minha promoção. Ninguém está autorizado a cuidar dela por mim.

Eu não sei do futuro; só sei do presente. Como posso, então, viver, previamente, algo que nem sei se acontecerá?

Quanto ao rancor e as mágoas, importa dizer, mais uma vez, que não sou um ser humano vingativo.

Eu aprendi muito cedo a perdoar, releva gizar.

Os que me fizeram algum mal, que fique claro, definitivamente, estão todos perdoados.

Sobreleva anotar, a guisa de esclarecimento, que, se não sabem, ter sido “recusado” pelo Tribunal de Justiça foi, para, mim, quase um dádiva.

Hoje, com a visão que tenho, concluo que a minha “recusa” pelo Tribunal foi mais que um favor: foi tudo de bom. Mesmo porque, agora tenho certeza, aquele não era o momento da minha promoção.

Quem pensa que sofro em face de ter sido alijado de uma promoção que parecia possível- e que nem sei mesmo se merecia -, está muito equivocado.

Eu estou bem! Estou em paz! Sou feliz! Tenho saúde! Tenho família!Tenho as coisas materiais que um cidadão classe média pode ter. Tenho amigos! Tenho fé! Tenho quase tudo, enfim.

Se, por hipótese, se concretizar a minha promoção, o que desejo mesmo é trabalhar em benefício da instituição e, por via reflexa, da coletividade. Essa tem sido a minha prática de vida. É assim que vou ser – sempre.

O poder que tanto fascina os pobres de espírito, para mim só serve para fazer o bem a quem de direito.

Eu nunca trabalhei em causa própria. Eu tenho espírito público. Quem convive comigo sabe que não sou de bravatear.

E que fico estabelecido, definitivamente, que não confundo o institucional com o pessoal. Se necessário, sentarei, quantas vezes forem necessárias, com o meu pior inimigo – se por acaso existisse – , para deliberar acerca de questões do interesse público.

Quem exerce cargo público não tem inimigos – tem metas.

Ao ensejo, reitero o que tenho dito em todos os meus artigos, não abro mãos dos meus ideais. Não abro mão dos meus valores.

Promovido, releva dizer, tentarei colocar em prática, no Tribunal de Justiça, o meu discurso, que, afinal, tem sido a minha prática de vida na primeira instância.

Parem, por favor, de me estigmatizar. Não suporto o estereótipo de rancoroso, brigão e vingativo.

Será que não basta o ferrete de arrogante?

Vistos, etc.

Cuida-se de ação penal que move o Ministério Público contra C. e M., devidamente qualificados, por incidência comportamental no artigo 157,§2º, I e II, do Digesto Penal, de cuja denúncia transcrevo o excerto abaixo, verbis:

Narram os autos do inquérito policial em epígrafe que na madrugada de 18 de novembro de 2007, os denunciados adentraram na Nova Choperia Olímpica, de propriedade do Sr. J. R. S. B., localizada na Avenida 01, s/n, bairro Cidade Olímpica, nesta cidade, de onde subtraíram a quantia de R$ 160,00(cento e sessenta reais), um aparelho DVD, alguns discos de DVD, e a bolsa porta-cédula da vítima. (Sic).

Mais adiante, outro excerto relevante:

Segundo reltado da vítima, no dia e hora acima mencionados, os denunciados entrara no referido estabelecimento e pediram cervejka e uma carteira de cigarros para srª Â. M., esposa da vítima. Após serem atendidos anunciaram o assalto e levaram os objetos supra mencionados. Registre-se que um deles portava uma arma branca.(Sic).

O Ministério Público aduz, adiante:

Durante a ação criminosa os denunciados ainda tentaram lesionar o Sr. J. R. com golpes de faca, momento em que a esposa desre tentou interferir, sendo então agredida com uma garrafa na cabeça. (Sic).

A persecução criminal teve início com a prisão em flagrante do acusado. (fls.06/15)

Termo de apresentação e apreensão às fls. 26.

Termo de entrega às fls. 27.

Termo de reconhecimento às fls. 53.

Recebimento da denúncia às fls.116/119.

O acusado M. foi qualificado e interrogado às fls. 132/133; C., às fls. 134/135.

Na fase de diligências nada foi requerido pelas partes (fls.180)

Durante a instrução criminal foram ouvidas as testemunhas Â. M. T. dos S. (fls.183/186), M. F. S. F. (fls.187/188) e J. R. S. B.

Prova pericial às fls. 214.

Nas as alegações finais o Ministério Público pediu a condenação do acusado nos termos da denúncia. (fls.223/226)

A defesa de M., de seu lado, pediu a absolvição do acusado e, subsidiariamente, que possa o acusado, no caso de condenação, recorrer em liberdade. (fls.242/246).

A defesa de C., a seu tempo e modo, pediu a sua absolvição, em face da fragilidade das provas produzidas.(fls255/259)

Relatados. Decido.

01.00. O Ministério Público denunciou C. e M., devidamente qualificados, por incidência comportamental no artigo 157, §2º, I e II, do Digesto Penal.

02.00. Ressai da prefacial que os acusados, na madrugada de 18 de novembro de 2007, assaltaram o senhor J. R. S. B., proprietário da Choperia Olímpica, de quem subtraíram a quantia de R$ 160,00 (cento e sessenta reais), um aparelho DVD, alguns discos de DVD, e uma bolsa porta-cédulas.

03.00. As provas, em face da ação dos acusados, foram produzidas em dois momentos distintos: sedes administrativa e judicial.

04.00. Na fase inaugural da persecução criminal destaca-se o auto de prisão em flagrante, no qual vê-se que os acusados negaram a autoria do crime(fls. 12 e 13).

05.00. O ofendido também foi inquirido nesta fase, tendo confirmado a ocorrência do crime (fls.09).

06.00. Destaque-se da mesma fase a apreensão ( fls.26) e devolução (fls.27) de parte da res mobilis.

07.00. Digno de destaque, outrossim, o depoimento de Â. M. T. dos S., companheira do ofendido, que confirmou a ocorrência do crime e identificou os acusados como autores do fato (fls.51/52)

08.00. Na mesma fase foi formalizado o reconhecimento dos acusados pelo ofendido e por sua companheira (fls.53).

09.00. De posse destes dados, o Ministério Público ofertou denúncia contra C. P. A. e M. S. P., imputando aos mesmos o malferimento do artigo 157,§2º, I e II, do Digesto Penal.

10.00. O acusado M. S. P. foi qualificado e interrogado, de cujo depoimento vê-se que nega a autoria do crime (fls. 132/133).

11.00. O acusado C. P. A. também foi interrogado nesta sede, donde se vê que, a exemplo de M. S. P., também negou a autoria do crime (fls.134/135).

12.00. Dando prosseguimento à instrução criminal, foi ouvida nesta sede a testemunha Â. M. T., de cujo depoimento apanho os seguintes fragmentos:

I – que os acusados, com mais uma pessoa, se dirigiram ao bar do ofendido e passaram a ingerir cervejas;

II – que, de repente, já dentro de sua casa, anunciaram o assalto;

III – que dos três, dois estavam armados;

IV – que, em seguida, passaram a agredir as pessoas presentes no bar;

V –que tentaram furar o seu companheiro;

V – que um dos assaltantes, além de agredir as pessoas presentes, ainda lhe deu uma garrafada na cabeça;

VI – que, depois, os acusados foram presos; e

VII – que conseguiram reaver somente parte da res furtiva.

13.00. M. F. S. F., policial militar que prendeu os acusados, disse que os mesmos, ao serem localizados perto da Chopperia Gonçalves, foram reconhecidos pela vítima, que estava no interior da viatura (fls.187/188).

14.00. Encerrando a instrução foi ouvida a vítima J. R. S. B., às fls. 189/191, de cujo depoimento destaco os seguintes excertos:

I – que, no dia do fato, os acusados e mais uma terceira pessoa, chegaram no seu bar e pediram cerveja;

II – que já sabia da procedência dos acusados e que iriam praticar o assalto;

III – que quanto se espantou já estava sendo agarrado;

IV – que um dos acusados agarrou sua companheira;

V – que estavam usando faca;

VI –que M. P. lhe agarrou e pediu dinheiro, chamando-o de vagabundo;

VII – que foi derrubado por M.;

VIII – que C. era muito violento;

IX – que C. queria que M. lhe furasse;

X – que um deles tacou uma garrafa de cerveja em sua mulher;

XI – que levaram um DVD, 170 reais, umas Brahmas, um carteiro e dois litros de bebidos quentes;

XII – que reconhece os acusados como autores do fato; e

XIII – que só conseguiu recuperar setenta reais.

15.00. Essas, as provas amealhadas.

16.00. Passo, a seguir, a expender minhas considerações acerca da imputação feita aos acusados, a par das provas consolidadas nos dois momentos da persecução.

17.00. Nos dois momentos nos quais foram formalizadas provas sobejam informações acerca da ação dos acusados.

18.00. Posso ver, pois, à luz das provas, que os acusados, com sua ação, malferiram, sim, o preceito primário do artigo 157 do CP.

19.00. Posso inferir, ademais, que o crime em comento restou consumado, vez que somente parte da res furtiva foi recuperada.

20.00. De se concluir, ademais, sempre com arrimo nas provas produzidas, que o crime restou duplamente qualificado, em face do emprego de arma branca e pelo concurso de pessoas.

21.00. Os acusados, pois, com sua ação, voluntariamente, subtraíram para si coisa alheia móvel, ou seja, dinheiro, DVDs e bebidas alcoólicas, bens que, viu-se acima, não foram reincorporados ao patrimônio do ofendido, exceção feita a R$ 70,00 (setenta reais).

22.00. Os acusados, é de relevo que se diga, foram reconhecidos, ainda em sede extrajudicial – pelo ofendido e sua companheira – como autores do fato; reconhecimento que foi reiterado em sede judicial, daí a nenhuma dúvida acerca da autoria do crime.

23.00. A palavra do ofendido, não se pode deslembrar, em crimes desse matiz tem especial relevância, máxime se, como ocorreu no caso presente, a vítima não tinha nenhuma razão de ordem pessoal para prejudicar os acusados e também quando não resta insulada no conjunto probatório.

24.00. Todos sabemos que, em crimes de jaez, cuidando-se de um dos chamados crimes clandestinos, a pedra de toque para definição da autoria é a palavra do ofendido, muitas vezes a principal – quando não a única – testemunha ocular do crime.

24.01. Se essa prova não se mostra frágil e, ademais, encontra respaldo em outros dados colhidos ao longo da instrução, aí não se tem mesmo nenhuma dúvida acerca da autoria.

25.00. No caso sub examine, além da palavra do ofendido, destaca-se a palavra de sua companheira, que foi, inclusive, agredida fisicamente com uma garrafa.

26.00. Anoto que o reconhecimento formalizado em sede extrajudicial foi confirmado, depois, em sede judicial.

27.00. A verdade, sobranceira e indene de dúvidas, é que, ao que entrevejo da palavra do ofendido e de sua companheira, os acusados, depois de fingirem que pretendiam consumir cervejas, decidiram subtrair os bens da vítima, usando, reafirmo, de violência física.

28.00. Os acusados, agora, em face de sua ação, deverão receber do Estado a correspondente sanção penal, preconizada no preceito secundário do artigo antes mencionado, traduzida em penas privativa de liberdade e multa.

29.00. Os acusados, com sua ação, atentaram contra o patrimônio do ofendido, bem jurídico protegido pelo Direito Positivo brasileiro.

29.01. É que, mediante ameaça e violência física, os acusados impossibilitaram o ofendido de esboçar qualquer reação em defesa do seu patrimônio, dele subtraindo coisa móvel, o fazendo com a clara intenção de incorporá-la a seu patrimônio.

31.00. Os objetivos dos acusados, ao que dimana das provas consolidadas, era apoderarem-se, injustamente, dos bens do ofendido, sendo irrelevante, nessa perspectiva, os motivos do crime.

32.00. Em adição aos argumentos acima lançados, a propósito do concurso de pessoas, anoto, a par do quadro de provas, que os acusados tiveram participação efetiva na execução material do crime, cada a um, a seu modo, dando a sua contribuição para a consecução dos fins colimados.

33.00. Tudo de essencial posto e analisado, julgo procedente a denúncia, para, de consequencia, condenar

I – C., brasileiro, solteiro, maranhense, ajudante de pedreiro, filho de E. , residente XXXnesta cidade,

e

II – M., brasileiro, maranhense, pintor, filho de E. e M., residente XXX, nesta cidade, por incidência comportamental no artigo 157, §2º I e II, do CP.

34.00. A seguir, passo à fixação das penas, individualizadamente:

I – para o acusado C., antes qualificado, fixo as penas-base em 04(quatro) anos de reclusão e 10(dez)DM, à razão de 1/30 do SM vigente à época do fato, sobre as quais faço incidir mais 1/3, em face das causas de aumento de penas previstas no §2º, I e II, do artigo 157, totalizando, definitivamente, 05(cinco) anos e 04(quatro)meses de reclusão, devendo a pena privativa de liberdade ser cumprida, inicialmente, em regime semi-aberto, ex vi legis;

e

II – para o acusado M., antes qualificado, fixo as penas-base em 04(quatro) anos de reclusão e 10(dez)DM, à razão de 1/30 do SM vigente à época do fato, sobre as quais faço incidir mais 1/3, em face das causas de aumento de penas previstas no §2º, I e II, do artigo 157, totalizando, definitivamente, 05(cinco) anos e 04(quatro)meses de reclusão, devendo a pena privativa de liberdade ser cumprida, inicialmente, em regime semi-aberto, ex vi legis.

35.00. Anoto que deixei de considerar eventuais circunstâncias atenuantes em favor dos acusados, em face de as penas terem sido fixadas no mínimo legal.

P.R.I.C.

Custas, na forma da lei.

Com o trânsito em julgado, extrai-se carta de sentença.

Lance-se, antes, no nome dos réus no rol dos culpados.

Arquivem-se, em seguida, com a baixa em nossos registros.

São Luis, 17 de setembro de 2009.

Juiz José Luiz Oliveira de Almeida

Titular da 7ª Vara Criminal


[1] Esse e outros artigos estão publicados no meu blog – www.joseluizalmeida.com

Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

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