Sentença condenatória. Concurso Material

Cuida-se de sentença condenatoria, em face do crime de roubo, duplamente qualificado.

Destaco que, in casu, tratam-se de dois crimes de roubo, praticados em concurso material.

A propósito do concurso de crimes, em determinado excertos anotei, verbis:

Após o exame da prova colacionada posso concluir que, dos crimes imputados ao acusados, só dois restaram provados em sede judicial, quais sejam, os praticados em detrimento do patrimônio de M. de O. P. e P. de P. S. S..

Das provas coligidas concluo que o acusado, e seus comparsas, com emprego de arma de fogo, em concurso material, promoveram a subtração de um revólver Taurus, calibre 38, que estava na posse de M. de O. P..

O mesmo acusado, contando com o concurso de outros meliantes e com o emprego de armas de fogo, também atentou contra o patrimônio de P. S. M. P., de quem subtraiu que, além do veículo Celta, um aparelho de telefone celular, marca Nokia, uma carteira porta-cédulas, documentos e R$ 50,00 (cinquenta reais).

A seguir, a sentença, por inteiro.

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PODER JUDICIÁRIO

FORUM DA COMARCA DE SÃO LUIS-MA

JUIZO DA 7ª VARA CRIMINAL

SÃO LUIS-MARANHÃO

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Acesse meu blog – http://www.assimdecido.blogspot.com – e saiba o que penso e como decido.

Processo nº 102312007

Ação Penal Pública

Acusado: C.

Vítimas: M. de O. P. e outros

Desabafo[1]

Escrito por Jose Luiz Oliveira de Almeida em Setembro 16, 2009

Aqui e acolá, hora sim e hora também, deparo-me com pessoas nos corredores do Fórum se regozijando – mais do que eu próprio – com a proximidade de minha promoção.

Aqui e acolá, hora sim e hora também, ouço comentários de que os maledicentes comentam que, empossado, externarei o meu rancor, as minhas mágoas com o Tribunal de Justiça.

Devo dizer, a propósito, que não faço planos para promoção. Não vivo essa obsessão.

Não faz parte da minha perspectiva de vida nenhuma promoção. Eu só acredito nela quando ela se formalizar.

Portanto, que fique muito bem estabelecido que o meu projeto de vida profissional, no momento, é apenas cumprir a Meta II do CNJ. Nada mais que isso.

E que se pare, definitivamente, de especular acerca de minha promoção. Ninguém está autorizado a cuidar dela por mim.

Eu não sei do futuro; só sei do presente. Como posso, então, viver, previamente, algo que nem sei se acontecerá?

Quanto ao rancor e as mágoas, importa dizer, mais uma vez, que não sou um ser humano vingativo.

Eu aprendi muito cedo a perdoar, releva gizar.

Os que me fizeram algum mal, que fique claro, definitivamente, estão todos perdoados.

Sobreleva anotar, a guisa de esclarecimento, que, se não sabem, ter sido “recusado” pelo Tribunal de Justiça foi, para, mim, quase um dádiva.

Hoje, com a visão que tenho, concluo que a minha “recusa” pelo Tribunal foi mais que um favor: foi tudo de bom. Mesmo porque, agora tenho certeza, aquele não era o momento da minha promoção.

Quem pensa que sofro em face de ter sido alijado de uma promoção que parecia possível- e que nem sei mesmo se merecia -, está muito equivocado.

Eu estou bem! Estou em paz! Sou feliz! Tenho saúde! Tenho família!Tenho as coisas materiais que um cidadão classe média pode ter.

Tenho amigos! Tenho fé! Tenho quase tudo, enfim.

Se, por hipótese, se concretizar a minha promoção, o que desejo mesmo é trabalhar em benefício da instituição e, por via reflexa, da coletividade. Essa tem sido a minha prática de vida. É assim que vou ser – sempre.

O poder que tanto fascina os pobres de espírito, para mim só serve para fazer o bem a quem de direito.

Eu nunca trabalhei em causa própria. Eu tenho espírito público.

Quem convive comigo sabe que não sou de bravatear.

E que fique estabelecido, definitivamente, que não confundo o institucional com o pessoal.

Se necessário, sentarei, quantas vezes forem necessárias, com o meu pior inimigo – se por acaso existisse – , para deliberar acerca de questões do interesse público.

Quem exerce cargo público não tem inimigos – tem metas.

Ao ensejo, reitero o que tenho dito em todos os meus artigos, não abro mãos dos meus ideais. Não abro mão dos meus valores.

Promovido, releva dizer, tentarei colocar em prática, no Tribunal de Justiça, o meu discurso, que, afinal, tem sido a minha prática de vida na primeira instância.

Parem, por favor, de me estigmatizar. Não suporto o estereótipo de rancoroso, brigão e vingativo.

Será que não basta o ferrete de arrogante?

Vistos, etc.

Cuida-se de ação penal que move o Ministério Público contra C. devidamente qualificado, por incidência comportamental no artigo 157,§2º, I e II, c/c artigo 69, ambos do Codex Penal, cujos fatos estão narrados na denúncia, em detalhes, a qual, por isso, passa a compor o relatório desta decisão.

A persecução criminal teve início com o auto de prisão em flagrante lavrado em desfavor do acusado (fls. 08/13).

Auto de apresentação e apreensão às fls. 22.

Termo de entrega às fls. 23 e 24.

Recebimento da denúncia às fls. 43/44.

O acusado foi qualificado e interrogado às fls. 85/86.

Defesa preliminar às fls. 54/55.

Durante a instrução criminal foram ouvidas a vítima (fls.70) e as testemunhas M. de O. P. (fls.71), E. M. da R. (fls.72), P. S. M. P. (fls.83) e P. de P. S. S. (fls.84).

O acusado fugiu do distrito da culpa, razão pela qual não foi interrogado e teve decretada a sua revelia, ex vi do artigo 367 do Digesto de Processo Penal (fls.97)

O Ministério Público, em alegações finais, pediu a condenação do acusado, nos termos da denúncia (fls.98)

A defesa, de seu lado, pediu a absolvição do acusado, alegando que toda a ação delituosa foi comandada pelo alcunhado Juju. (fls.99)

Relatados. Decido.

01.00. Importa consignar, preliminarmente, que a denúncia é uma peça mais do que confusa.

01.01. Em face da confusão estabelecida na narração dos fatos, tive que fazer um exercício mental singular para decodificá-la para identificar as vítimas da ação do acusado.

02.00. Posso afirmar, pois, que, desde a minha compreensão, ao acusado o Ministério Público imputa a prática de três assaltos, contra o patrimônio de

I – P. S. M., fato ocorrido no dia 13 de janeiro de 2009, de quem teria subtraído um Celta, cor preta, placa NHF 2997/MA;

II- P. de P. S. S., fato ocorrido no dia 14/01/2009, por volta das 21 horas, de quem teria subtraído um veículo gol, placa NHM 6486/MA, um celular marca Nokia, mod. 5200, a carteira porta-cédulas e R$ 50,00 (cinquenta) reais, e, finalmente;

III – M. de O. P., fato que teria ocorrido no dia 15 de janeiro de 2009, por volta das 21 horas, de quem foi subtraído um revólver Taurus, 38, seis tiros.

03.00. Cediço, à luz do exposto, que somente esses três fatos serão objetos de exame, em face das provas produzidas.

04.00. A persecução criminal desenvolveu-se em dois momentos – fases administrativa e judicial.

05.00. A fase administrativa teve início com a prisão em flagrante do acusado, o qual manifestou o desejo de só falar em sede judicial (fls.13)

06.00. Na mesma sede foi ouvido o ofendido M. de O. P., às fls. 10, o qual confirmou a subtração de uma arma de fogo de sua propriedade, crime praticado pelo acusado com mais dois indivíduos (fls.10)

07.00. Em seguida foi ouvida a vítima P. de P. S. S., que confirmou que foi assaltado e que lhe subtraíram veículo gol, placa NHM 6486/MA, um celular marca Nokia, mod. 5200, a carteira porta-cédulas e R$ 50,00 (cinquenta) reais.(fls.12

08.00. O mesmo ofendido disse, ademais, que o crime foi praticado por quatro ou cinco pessoas, todas armadas de revólver e pistola (ibidem)

09.00. O ofendido P. S. M. P. não foi ouvido em sede extrajudicial.

10.00. Na mesma sede foi formalizada a apreensão de parte da res furtiva (fls.23), posteriormente devolvidas aos respectivos proprietários (fls. 23 e 24)

11.00. Tendo às mãos o caderno administrativo, o Ministério Público formulou denúncia contra C. A. dos S., a quem imputou a prática dos crimes de roubo qualificados, praticados em detrimento do patrimônio de P. de P. S. S., P. S. M. e M. de O. P..

12.00. Durante a instrução criminal foram ouvidas várias testemunhas/vítimas, cujos depoimentos passo a analisar a seguir.

13.00. O primeiro depoimento colhido, às fls. 70, foi o de J. A. P. R., que teria sido vítima de uma tentativa de homicídio, perpetrado por Juju, comparsa do acusado, de cujo depoimento não colho nenhum dado digno de destaque, em face dos assaltos ao acusado imputado.

14.00. Em seguida, foi ouvida a vítima M. de O. P., de cujo depoimento, às fls.71, apanho os seguintes fragmentos:

I – que, ao tempo do fato, era empregado da Cefor e estava de serviço no Tropical Shopping, quando, no dia 14 de janeiro ou fevereiro, por volta das 21h00, foi assaltado por três pessoas;

II – que foi-lhe subtraído um revólver calibre 38, marca Taurus;

IV – que, depois de preso, o acusado foi levado a sua presença e foi reconhecido como um dos autores do fato;

V – que o acusado foi quem lhe retirou a arma do coldre;

VI – que todos os assaltantes estavam armados com arma de fogo e ameaçaram lhe matar, caso não largasse a arma.

15.00. O Policial Militar E. M. da R., de seu lado, às fls. 72, descreveu o momentos anteriores e posteriores à prisão do acusado, fazendo menção às informações que tivera no local acerca dos assaltos por ele e comparsas praticados.

16.00. Nesta sede também foi ouvido o ofendido P. S. M. P., às fls. 83, donde vejo e destaco os seguintes excertos:

I – que teve um veículo de sua propriedade (celta) subtraído por quatro elementos que se encontravam num Eco Sport branco;

II – que os autores do fato deixaram o Esco Sport e fugiram no Celta de Propriedade do depoente;

III – que os autores do fato estavam todos armados com arma de fogo;

IV – que o seu veículo foi reavido dois ou três dias depois do evento; e

V- que não tem condições de afirmar que o acusado tenha sido um dos autores do fato.

17.00. Encerrando a instrução foi inquirido o ofendido P. de P. S. S., às fls. 84, cumprindo destacar do depoimento os seguintes fragmentos:

I – que foi assaltado no dia 14 de janeiro do corrente, por volta das 21h00;

II – que eram cinco os assaltantes;

III – que foi-lhe subtraído um veículo Gol, cor preta, placa HNM 6436/M;

IV – que, na Refesa, reconheceu o acusado como autor do delito;

V – que, além do veículo, lhe subtraíram um aparelho de telefone celular, marca Nokia, uma carteira porta-cédulas, documentos e R$ 50,00(cinquenta reais)

18.00. Essas, as provas produzidas.

19.00. Vou, a seguir, expender as minhas conclusões, à luz do almanaque probatório.

20.00. Após o exame da prova colacionada posso concluir que, dos crimes imputados ao acusados, só dois restaram provados em sede judicial, quais sejam, os praticados em detrimento do patrimônio de M. de O.P. e P. de P. S. S..

21.00. Das provas coligidas concluo que o acusado, e seus comparsas, com emprego de arma de fogo, em concurso material, promoveram a subtração de um revólver Taurus, calibre 38, que estava na posse de M. de O. P..

22.00. O mesmo acusado, contando com o concurso de outros meliantes e com o emprego de armas de fogo, também atentou contra o patrimônio de P. S. M. P., de quem subtraiu que, além do veículo Celta, um aparelho de telefone celular, marca Nokia, uma carteira porta-cédulas, documentos e R$ 50,00 (cinquenta reais).

23.00. No que se refere ao assalto praticado em desfavor de P. S. M. P., apesar de ter certeza de que o fato ocorreu, não disponho de dados que me permitam concluir que o acusado tivesse sido autor do crime, em face de a própria vítima informar que não o reconhece como autor do fato.

24.00. A prova produzida ficou circunscrita à palavra dos ofendidos.

24.01. Não podia ser diferente, pois que aqui se cuidam de crimes clandestinos, cuja principal testemunha são as vítimas, bem se sabe.

25.00. As duas vítimas antes mencionadas – P. S. M. e M. de O. P. – não tiveram dúvidas em noticiar a pratica dos crimes e de apontarem o acusado como seu autor, o qual se fez acompanhar de outros meliantes, os quais usavam arma de fogo.

26.00. Definido que o acusado atentou contra o patrimônio de P. S. M. P. e M. de O. P., importa consignar, agora, que os crimes restaram consumados, pois que saíram da esfera de disponibilidade dos ofendidos.

27.00. Posso afirmar, agora, definitivamente, que o acusado, com sua ação, atentou, em concurso material, contra o patrimônio de P. S. M. e M.de O. P. , cujos crimes restaram duplamente qualificados – pelo concurso de pessoas e pelo emprego de arma de fogo.

28.00. Os crimes, antecipei acima, foram praticados em concurso material. É que o acusado – e seus comparsas – , mediante duas ações, praticou dois crimes contra o patrimônio de duas vítimas diferentes.

29.00. A propósito do concurso material, releva gizar que

“ se por bem sucedido no primeiro assalto o agente pensa no segundo crime e, encontrando capo favorável o executará, estará cometendo novo crime autônomo, embora exista alguma circunstância ligando as infrações” (JUTACRIM 59/38)

30.00. Sobreleva anotar, na mesma linha de entendimento, que,

“Roubos resultantes de impulsos criminosos independentes praticados em diferentes datas, como meio de vida, de modo a demonstrar que os agentes são criminosos habituais, não podem ser catalogados como ocorridos em continuidade delitiva, mas em concurso material” (RJD 16/72).

31.00. Digo mais, na mesma senda:

“Se dois crimes de roubo são praticados sem aproveitamento de uma mesma situação, não decorrendo as ações de um mesmo impulso criminoso, e sendo diversos os seus modos de execução, não cabe reconhecer a continuidade delitiva, mas simples reiteração da conduta ilícita, ocorrendo, na hipótese, concurso material de delitos, com a aplicação cumulativa de penas” (RJD 23/102).

32.00. Tudo de essencial posto e analisado, julgo procedente, parcialmente, a denúncia, para, de conseqüência, condenar C.,brasileiro, representante comercial, filho de M. e Wi., residente e domiciliado na Rua XX, s/n, Anjo da Guarda, nesta cidade, por incidência comportamental no artigo 157,§2 º I e II, do CP, em face de ter atentado contra o patrimônio de P. S. M. P. e M. de O. P., cujas penas fixarei a seguir.

I – para o crime praticado em detrimento do patrimônio de P. S. M. P., fixo as penas-base em 04(quatro) anos de reclusão e 10(dez)DM, à razão de 1/30 do SM vigente à época do fato, sobre as quais faço incidir mais 1/3, em face das causas gerais de aumento de penas previstas nos inciso I e II, §2º, do artigo 157, totalizando, definitivamente, 05(cinco) anos e 04(quatro)meses de reclusão e 13(treze)DM, devendo a pena privativa de liberdade ser cumprida, inicialmente, em regime semi-aberto, ex vi legis;

e

II – para o crime praticado em detrimento do patrimônio de M. de O. P., fixo as penas-base em 04(quatro) anos de reclusão e 10(dez)DM, à razão de 1/30 do SM vigente à época do fato, sobre as quais faço incidir mais 1/3, em face das causas gerais de aumento de penas previstas nos inciso I e II, §2º, do artigo 157, totalizando, definitivamente, 05(cinco) anos e 04(quatro)meses de reclusão e 13(treze)DM, devendo a pena privativa de liberdade ser cumprida, inicialmente, em regime semi-aberto, ex vi legis.

33.00 Em face do cúmulo material, fixo as penas, definitivamente, em10(dez)anos e 08(oito)meses de reclusão e 26(vinte e seis)DM, ex vi do artigo 69 do Codex Penal.

P.R.I.C.

Com o trânsito em julgado, lance-se o nome do réu no rol dos culpados e expeça-se carta de sentença.

Após, arquivem-se, com a baixa em nossos registros.

Custas, na forma da lei.

São Luis, 17 de setembro de 2009.

Juiz José Luiz Oliveira de Almeida

Titular da 7ª Vara Criminal


[1] Esse e outros artigos estão publicados no meu blog – www.joseluizalmeida.com

Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

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