Sentença condenatória.Roubo duplamente qualificado

 

Processo nº 128852007

Ação Penal Pública

Acusado: M. dos P. A.

Vítima: V. G. P. C.

M

 

Vistos, etc.

Cuida-se de ação penal que move o Ministério Público contra M. dos P. A., devidamente qualificado, por incidência comportamental no artigo 157,§2º, I e II, do Codex Penal, de cuja denúncia sorvo os excertos abaixo, litteris:

Consta na narrativa dos autos, que na data de 29.05.2007, por volta das 16:00 h, a vítima, que trabalha como camelô ambulante, encontrava-se realizando vendas em companhia de seu colega de trabalho, F. F. de S., precisamente, na Rua da TV Difusora, no bairro da Camboa, nesta capital, quando se viu surpreendida por dois elementos, estando um deles armado com um faca, com a qual passou a ameaçar V., enquanto o outro elemento, identificado nos autos como M., retirava a carteira porta-cédulas, o celular e uma capa de sofá pequena branca da vítima.(Sic)

A persecução criminal teve início com o auto de prisão em flagrante lavrado em desfavor do acusado (fls. 07/13).

Recebimento da denúncia às fls.37/38.

Defesa preliminar às fls. 103/104.

Durante a instrução foi ouvida apenas a testemunhas M. A. C. (fls.149/15).

O acusado foi qualificado e interrogado às fls. 151/152.

O Ministério Público, em alegações finais, pediu a condenação do acusado, por incidência comportamental no artigo 157, §2º, I e II, do CP. (fls.)

A defesa, de seu lado, pediu a absolvição do acusado, por falta de provas de que tenha concorrido para infração, ou então que, em caso de condenação, seja a pena aplicada no mínimo legal (fls.157/160)

Relatados. Decido.


01.00. Nos autos sub examine, disse-o acima, o Ministério Público dirigiu os seus tentáculos contra o acusado M. dos P. A., porque ele, com sua ação (dinamismo volitivo), teria atentado contra o patrimônio de V. G. P. C., protegido juridicamente, fato que teria ocorrido no dia 29 de maio de 2007, por volta das 16h00, com emprego de arma branca e contando com o concurso de outro indivíduo, não identificado.

02.00. A persecução criminal (persecutio criminis) se desenvolveu em dois momentos distintos, ou seja, em sedes administrativa e judicial, tal como preconizado no direito positivo brasileiro.

03.00. Na primeira fase da persecução avulta de importância o auto de prisão em flagrante, do qual consta, dentre outros dados relevantes para definição da existência do crime e de sua autoria a palavra do ofendido, o qual, inclusive, reconhece o acusado como um dos indivíduos que o assaltaram, com emprego de arma branca (fls.11).

04.00. O acusado, na mesma oportunidade, negou a autoria do crime, atribuindo-a ao indivíduo Araponga, com quem admite ter estado na companhia, no dia do fato (fls.12).

05.00. O acusado, noutro excerto, admite que após o assalto, deixou o local rapidamente, ao perceber a aproximação da Polícia (ibidem).

06.00. O acusado, depois, reinquirido, admitiu ter dado o nome errado, à época de sua prisão e que, diferente do que informara, já tinha sido preso outras vezes, em face do crime de roubo (fls.22).

07.00. Noutro excerto, no mesmo depoimento, o acusado confessa, ademais, já ter cumprido pena de 07(sete) anos, na Penitenciária de Pedrinhas (ibidem).

08.00. Com esses e outro dados de menor relevância, encerrou-se a fase preambular da persecução criminal, tendo o Ministério Público, de posse do caderno administrativo, ofertado denúncia contra M. G. P. C., imputando a ele a prática do crime de roubo duplamente qualificado – pelo concurso de pessoas e pelo emprego de arma branca.

09.00. Com o recebimento da denúncia, inaugurou-se a segunda fase da persecução criminal, da qual vejo assomar apenas do depoimento da testemunha M. A. C. (fls.149) e o interrogatório do acusado (fls.151/152).

10.00. Do depoimento M. A. C., policial militar que, à época, diligenciou no sentido de prender o acusado destaco o excerto no qual afirma que, depois de preso, o acusado foi levado a presença da vítima, que o apontou, sem nenhuma dúvida, como uma das pessoas que praticaram o assalto (fls. 149).

11.00. Dando prosseguimento a colheita de provas, foi o acusado interrogado, o qual começa por admitir que, ao tempo do fato, estava em companhia de Araponga, que teria sido o verdadeiro autor do crime (fls.151/152).

12.00. O acusado admite, ademais, que Araponga lhe convidou para praticar o crime e que não aceitou, tendo decidido seguir em direção a uma favela, enquanto Araponga decidia-se pela prática do assalto (ibidem).

13.00. O acusado, noutro fragmento, admite que, na primeira fase da persecução criminal, a vítima lhe reconheceu como autor do fato criminoso (ibidem).

14.00. Mais adiante, o acusado admitiu que Araponga portava uma faca, ao tempo do crime, e que os bens da vítima foram levados por Araponga (ibidem).

15.00. Esses os principais dados amealhados ao longo da jornada probatória.

16.00. Depois de analisar as provas produzidas nas duas sedes da persecução criminal – administrativa e judicial – não tenho a mais mínima dúvida de que o acusado teve, sim, participação no assalto narrado na denúncia, inobstante tente jogar a responsabilidade nos ombros do alcunhado Araponga, que foi, afinal, quem se beneficiou do resultado criminoso.

17.00. Para chegar a essa conclusão, valho-me, dentre outras, da palavra da ofendida, colhida em sede extrajudicial, que pode, sim, ser buscada para compor o quadro probatório, em face do depoimento de M. A. C. e do interrogatório do acusado.

18.00. Impende anotar que a testemunha M. A. C., conquanto não afirmasse ter sido o acusado o autor do crime, compreensível em face das várias diligências que participa, disse que a vítima, defronte do acusado, depois de efetuada a sua prisão, não teve dúvidas em reconhecê-lo como um dos autores do roubo.

19.00. Cediço, à luz do exposto, que, com esse respaldo, posso, sim, chamar a prova amealhada em sede administrativa, para compor o quadro probatório.

20.00. A palavra da vítima, em crimes desse jaez, todos sabem, tem especial importância para definição da autoria, pois que aqui se está a tratar de um dos chamados crimes clandestinos.

21.00. A vítima, sem titubeio, sem dúvidas, decisivamente, apontou o acusado como um dos autores do assalto sob retina.

22.00. A vítima, da mesma forma, confirmou que o acusado agiu contando com o concurso de outro indivíduo e que, ademais, fez uso de arma branca para molificar a sua resistência.

23.00. O depoimento da vítima, com essa riqueza de detalhes, respaldada, de mais a mais, pela prova judicial, pode – e deve – ser chamado para compor, integrar, fortalecer o conjunto probante.

24.00. Em face da sua relevância para o deslinde da questão, consigno, mais uma vez, que a vítima, em sede extrajudicial, disse que foram dois os assaltantes e que um deles usava arma branca (cf. fls.11).

25.00. A ofendida foi além: declinou, até, a participação individual de cada um dos assaltantes.

25.01. Assim é que, em determinado excerto, disse que um dos autores do fato – moreno, magro e alto – o ameaçava com faca, enquanto que o outro – moreno, magro, altura mediana, bem vestido, trajando calça social de cor branca e camisa escura (o acusado) – recolhia os seus pertences.

26.00. Pode-se ver, a par das provas colacionadas, que não há dúvidas, mínimas que sejam, da existência do crime e de sua autoria.

27.00. O acusado, agora, deve suportar a inflição de penas, em decorrência de sua ação réproba, cumprindo anotar, nesse passo, que tinha plena capacidade de compreender o caráter do fato e de se determinar de acordo com esse entendimento.

28.00. O acusado, é bem de se ver, ameaçou o ofendido com arma branca, o fazendo em concurso com outro meliante, a impossibilitar qualquer reação tendente a proteger o seu patrimônio, daí a tipificação do crime de roubo e a duplicidade de qualificadoras (artigo 157,§2º, I e II, do Codex Penal).

29.00. Definido que o acusado malferiu a ordem jurídica, devo, a seguir, expender considerações acerca das circunstâncias judiciais do artigo 59 do Digesto Penal, para fins de fixação das penas-base.

30.00. O acusado, por ocasião do seu interrogatório, admite já ter sido preso umas três vezes, que responde a mais duas ações penais e que já cumpriu pena.

31.00. Dando busca no banco de dados desta comarca (Sistema Themis), pude concluir que o acusado, verdadeiramente, responde aos seguintes processos: nºs 128852007, na 7ª Vara Criminal; 117922001, na 3ª Vara Criminal; e 72071998 , na 1ª Vara Criminal.

32.00. O acusado, ademais, tem contra si editado um título executivo judicial, em curso na Vara de Execuções Criminais, sob o nº 172901996.

33.00. Posso afirmar, em face dessas informações, que o acusado tem, pra dizer o mínimo, maus antecedentes, lato sensu, a autorizar, desde o meu olhar a majoração da resposta penal.

34.00. É claro que haverá quem argumente que o acusado goza da presunção de inocência e que, por isso, para majorar as penas-base, não pode o magistrado se valer de processos sem decisão condenatória transitada em julgado.

35.00. Antevendo esses argumentos, consigno que, desde o meu ponto de observação, não se pode tratar quem tem várias incidências penais, ainda que sem decisão transitada em julgado, da mesma forma que se trata quem não tenha nenhuma incidência penal anterior.

36.00. Desde a minha compreensão, tratar igualmente duas situações antípodas, é fazer pouco do princípio da igualdade.

36.01. Não se pode, com efeito, dispensar a um acusado contumaz infrator, o mesmo tratamento que se deve dispensar a quem não tenha registros penais anteriores.

37.00. É preciso convir, nessa linha de argumentação, que a autoridade policial não instaura procedimento administrativo sem indícios de autoria.

38.00. Nessa mesma senda, importa dizer, o Ministério Público, de seu lado, também não denuncia sem a prova da existência do crime e sem que haja veementes indícios de autoria.

39.00. Nessa mesma linha de pensar, convém anotar que nenhum juiz recebe uma denúncia, sem que vislumbre a existência de um crime e indícios de autoria.

40.00. De se convir, pois, que o fato de um acusado responder a quatro ações penais é indicativo de que tem, sim, uma conduta predadora em sociedade e que, por isso, deve, sim, suportar a majoração da resposta penal.

42.00. Para mim, reitero, enfaticamente, a vida pregressa do acusado não pode ser desprezada, quando da fixação da pena-base, sob pena de se dar a ele tratamento privilegiado e diferenciado, o que, para mim, é uma ignomínia.

43.00. Reafirmo, agora definitivamente, que do exame das provas produzidas nas duas fases da persecução resulta a constatação de que o crime, efetivamente, ocorreu, cujo autor foi o acusado.

44.00. Das mesmas provas resulta, ademais, a constatação de que o crime restou duplamente qualificado, pelo emprego de arma de fogo e pelo concurso de pessoas.

45.00. É verdade que a arma instrumento do crime não foi apreendida. Todavia, não se pode afastar a qualificadora em face disso, pois que as provas acerca de sua utilização são plenas e estremes de dúvidas.

46.00. Vou retomar o tema, mais adiante.

47.00. Além das provas demonstrarem, quantum satis, ter sido o acusado o autor do crime narrado na denúncia e de tê-lo praticado em concurso e com emprego e arma, ter-se-á que concluir, a par do mesmo quadro probatório, que o crime restou consumado, em face de a res furtiva ter saído da esfera de vigilância do ofendido.

48.00. A consumação do crime de roubo, todos sabemos, se dá no exato instante em que o agente se torna possuidor da res mobilis, subtraída mediante violência ou grave ameaça, independentemente de sua posse mansa e pacífica.

49.00. O crime de roubo, como o furto, é consabido, se consuma com a inversão da posse. É dizer: se o agente tem a posse mais ou menos tranqüila da coisa, ainda que por breve momento, fora de esfera de vigilância da vítima, tem-se que o crime restou consumado.

50.00. A verdade é que o acusado realizou, com sua ação, todos os seus termos da figura delituosa, razão pela qual posso afirmar que o bem jurídico penalmente protegido sofreu efetiva lesão.

51.00. Subtrair, pode-se concluir, sem esforço, é retirar algo contra a vontade do titular, do que se pode inferir que o roubo restará consumado tão logo o sujeito ativo, após o emprego de violência ou grave ameaça, retire o objeto material da esfera de disponibilidade da vítima, sendo irrelevante se chegou a ter a sua posse tranqüila.

52.00. O que se viu no caso presente, à luz da prova amealhada, foi o efetivo apossamento da coisa pelo acusado, que, no caso presente, a roborar a consumação do crime, não foi sequer recuperada e reintegrada ao patrimônio do ofendido.

53.00. A verdade, no caso sub examine, é que a res mobilis saiu, definitivamente, do âmbito de proteção do ofendido, passando à posse tranquila do autor do fato – ou do seu comparsa, pouco importa.

54.00. Os Tribunais têm decidido, iterativamente, na mesma alheta, ao proclamarem, à exaustão, que

a consumação do roubo se dá no momento da apreensão da coisa pelo agente, independentemente de haver ele exercido ou não posse duradoura e tranqüila. A rápida recuperação da coisa e a prisão do autor do delito não constituem motivos para operar-se a desclassificação do crime de roubo para a sua forma tentada” ( TJAP – ACr 171003 – (6781) – C.Única – Rel. Des. Honildo Amaral de Mello Castro – DOEAP 02.06.2004 – p. 22).

55.00. No mesmo rumo é a decisão segundo a qual para a caracterização do roubo, na forma consumada, basta que haja a

inversão da posse da coisa subtraída, ainda que por breve momento, mediante a cessação da grave ameaça ou violência à pessoa”( TJAP – ACr 146502 – C.Ún. – Rel. Juiz Conv. Luciano Assis – DJAP 19.04.2004 – p. 12).

56.00. Não destoa a decisão que proclama que

o crime de roubo se consuma quando a coisa subtraída sai da esfera de proteção e disponibilidade da vítima, ingressando na do agente, estando, ainda que por breve tempo, em posse mansa e tranqüila deste …”(TJES – ACr 035980222133 – 1ª C.Crim. – Rel. Des. Sérgio Luiz Teixeira Gama – J. 30.06.2004)

57.00. No mesmo rumo já decidiu, incontáveis vezes, o Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo, segundo o qual

o crime de roubo se consuma a partir do momento em que a vítima tem o bem subtraído mediante violência ou grave ameaça, não se exigindo que o agente tenha posse tranqüila da res furtiva, sendo irrelevante que o acusado seja detido logo em seguida ao início da fuga”. (Apelação nº 1.330.205/0, Julgado em 03/10/2.002, 8ª Câmara, Relator: Roberto Midolla, RJTACRIM 63/128)

58.00. Importa grafar, a guisa de reforço, que, tratando-se de crime material, o que se exige, para sua consumação, é, tão-somente, a real e concreta diminuição do patrimônio do sujeito passivo, ainda que essa diminuição se dê de forma passageira.

59.00. O acusado, subjetivamente, queria e alcançou o resultado (fim especial) que buscava, qual seja, o de subtrair do ofendido coisa móvel, mediante ameaça exercida com o emprego de arma branca, pouco importando, para caracterização da qualificadora, que a arma tenha sido apreendida.

60.00. Convém lembrar que a legislação, in casu, protege dois bens jurídicos distintos, quais sejam, o patrimônio (posse, propriedade, detenção) e a integridade física e psíquica do indivíduo, daí, a fortiori, a tipificação do crime de roubo no caso em comento.

61.00. O acusado, agora, em face de sua ação, tem que suportar a inflição de penas (privativa de liberdade e multa), em face da prática de fato concreto que o legislador definiu como crime.

62.00. O acusado, em face da ação delituosa que praticou, deve suportar a majoração da resposta penal, porque, para consecução do crime, fez uso de arma e contou com o concurso de pelo menos mais um meliante, demonstrando, com efeito, toda a sua perigosidade.

63.00. Estabelecido, quantum satis, que o acusado, com o seu comparsa, atentaram contra a ordem pública,devo, agora, deter-me em duas questões que compreendo relevantes.

64.00. Primeiro, a tese da defesa.

65.00. Acerca dessa questão compreendo que, com os argumentos suso elencados, a tese da defesa resultou enfrentada, quantum sufficit, razão pela qual entendo não deve mais expender quaisquer considerações adicionais.

66.00. A propósito da quaestio, anoto que os Tribunais têm decidido, à estafa, que

a sentença que, ao acolher a tese da acusação, contém satisfatória menção aos fundamentos de fato e de direito a ensejar o Decreto condenatório, não é nula, apenas pelo fato de não se referir explicitamente à tese da defesa, mormente se, pela sentença condenatória, restou claro que o Juiz adotou posicionamento contrário.(STJ – HC 34618 – SP – 5ª T. – Rel. Min. Felix Fischer – DJU 13.12.2004 – p. 00388) JCF.5 JCF.5.XI ).

67.00 No mesmo sentido é a decisão de que

não é omissa a decisão que, fundamentadamente, abraça tese contrária à da defesa… (STJ – HC 35917 – MS – 5ª T. – Rel. Min. Felix Fischer – DJU 08.11.2004 – p. 00261) JCP.214 JCP.224 JCP.224.A JLCP.61).

68.00. Na mesma linha de pensar é o aresto no sentido de

“inocorre nulidade da sentença, por suposta não apreciação, pelo Magistrado, de teses levantadas pela Defesa, em suas alegações finais, se o Juiz, ao formar seu convencimento e elaborar sua decisão, não respondeu, ponto a ponto, a todos os argumentos mas, na estrutura final, desenvolveu adequadamente a prestação jurisdicional solicitada, afastando, implicitamente, as teses apresentadas” (Apelação nº 1.305.327/9 – São Paulo – 11ª Câmara – Relator: Pires de Araújo – 24.6.2002 – V.U. (Voto nº 7.263).

69.00. A segunda questão relevante, como antecipei acima, condiz com a qualificadora decorrente do emprego de arma para execução do crime, em face da sua não apreensão, tema sobre o qual já antecipei acima algumas considerações.

70.00 Nessa senda, importa dizer que a não apreensão da arma utilizada na prática do crime não tem o condão de afastar a qualificadora, pois que, viu-se na análise das provas, sobre a sua utilização pelo acusado não se tem dúvidas, em face mesmo da palavra do ofendido, que ganha realce nos chamados crimes clandestinos.

70.01. O fato de a arma não ter sido apreendida, por isso mesmo, não se traduzirá em prejuízo do reconhecimento da qualificadora decorrente do seu emprego.

71.00. Enfrentadas todas as possíveis questões que pudessem ser rediscutidas em sede recursal, devo reafirmar, agora, que o acusado, com sua ação, afrontou, hostilizou a ordem jurídica, devendo, por isso, suportar a inflição de penas, em face do crime que praticou.

72.00. A propósito, importa anotar que crime, no plano material, se define como a violação de bem jurídico penalmente tutelado, violação que se dá através da conduta de um homem que vem definida e configurada no preceito primário da norma penal, sabido que, em face do princípio da legalidade dos crimes e das penas não existam ações ou comportamentos do homem, relevantes para o Direito Penal, sem prévia descrição legal.

73.00. O acusado, com sua conduta, violou, sim, o comando normativo penal do artigo 157, em seu momento preceptivo, devendo, por isso, se sujeitar à punição prevista no seu preceito secundário.

74.00. O elemento subjetivo do tipo é o dolo, que se traduz na vontade de subtrair, com a finalidade expressa no comando legal, que é o de ter a coisa para si ou para outrem (animus furandi ou animus rem sibi habend).

75.00. A norma jurídica resulta violada pela conduta humana através de um “facere” (ação), ou de um “non facere”(omissão).

76.00. O acusado, pese lhe fosse defeso fazê-lo, fez (facere), ou seja, atentou contra o patrimônio da vítima, afrontando, no mesmo passo, a ordem pública.

77.00. É consabido que nem todo ato humano, ainda que se enquadre numa descrição típica, é ação delituosa.

77.01. Para que a conduta se apresente com a marca da delituosidade, é preciso que seja voluntária, como o foi, efetivamente, a conduta do acusado, lastreada que foi pela vontade de transgredir, de vilipendiar, de afrontar a ordem jurídica.

78.00. O acusado não foi impelido por uma força física irresistível.

78.01. Ao contrário, o ato psíquico interno se incorporou a um ato externo, que se materializou na agressão ao patrimônio da vítima.

79.00. A prova amealhada nos autos, induvidosamente, fez chegar ao meu espírito a crença de estar de posse da verdade, da reconstrução histórica dos fatos, da verdade material tão buscada e, quase nunca, encontrada.

80.00. O fato narrado na exordial, depois de coligidas as provas, se enquadrando na descrição legal da norma incriminadora do artigo 157 do CP, justifica, legitima a potestas coercendi dos órgãos do procedimento penal.

81.00. O acusado, ao atentar contra o patrimônio da vítima, o fez com a consciência de que se tratava de um ato ilícito, e com a clara intenção de subtrair coisa alheia móvel, para incorporar ao seu patrimônio, daí o elemento subjetivo.

82.00. Dolo, sabe-se, é

consciência e a vontade de realização da conduta descrita em um tipo penal. O dolo é constituído por dois elementos: um cognitivo, que é o conhecimento do fato constitutivo da ação típica, e um volitivo, que a vontade de realizá-la. O primeiro elemento, o conhecimento, é pressuposto do segundo, que é a vontade, que não pode existir sem aquele(César Roberto Bittencourt, in Código Penal Comentado, Editora Saraiva, edição 2002, p. 55).

83.00. O acusado não se limitou planejar, a pensar o roubo, hipótese em que não haveria que se cogitar da prática de crime, pois que

o pensamento e o querer humanos não preenchem as características da ação enquanto não tenha iniciado a manifestação exterior dessa vontade( Júlio Fabbrini Mirabete, Manual de Direito Penal, Vol. 7ª edição, Atlas, p. 100).

84.00. O acusado não teve a motivar a sua ação, a sua conduta, nenhum agente externo.

84.01. Nenhuma força exógena o impulsionou para o delito.

84.01.01. Tinha total domínio do fato, sabia o que estava fazendo, não tinha a sua capacidade psíquica diminuída, não foi submetido a nenhuma força física irresistível.

84.01.02. Por força física irresistível entenda-se a

aquelas hipóteses em que opera sobre o homem uma força de tal proporção que o faz intervir como mera massa mecânica”( Eugênio Raúl Zaffaroni e outro, ob. cit. p. 433).

85.00. A conduta do acusado não foi resultado de um ato involuntário, mas do desejo de vilipendiar, de ultrajar a ordem jurídica, de afrontar o patrimônio da vítima.

86.00. Desobedecida a norma preceptiva pelo acusado e atingindo o mesmo bem jurídico tutelado penalmente, fez nascer para o Estado, disse-o acima, o direito de penetrar no seu status libertatis, para privá-lo, através da medida sancionadora correspondente, de um bem –a liberdade – até então garantido e intangível.

87.00. O acusado, por atingir, com sua ação, com sua conduta,

“um interesse penalmente tutelado, um valor social cuja relevância para a vida coletiva impele ao Estado a garanti-lo com as sanções penais – sofrerá a perda ou diminuição de um bem jurídico” (José Frederico Marques, ob. cit. P. 133).

88.00. Infere-se, assim, do que foi exposto,

“que a sanção penal, como toda e qualquer outra sancionadora, é a conseqüência de um comportamento contrário ao direito e aos preceitos imperativos da ordem jurídica”.(ibidem).

89.00. O acusado deve, em face de sua ação, suportar a inflição de pena, pena traduzida como

“sanção aflitiva imposta pelo Estado, através de processo, ao autor de um delito, como retribuição de seu ato ilícito e para evitar novos delitos” (Sebastião Soler, Derecho Penal Argentino, Vol. III, p. 399, apud José Frederico Marques, ob.cit. p, 136).

90.00. Tudo de essencial posto e analisado, julgo procedente a denúncia, para, de conseqüência,

condenar M. dos P. A., brasileiro, solteiro, camelô, filho de J. D. dos S. A. e T. P. P. A., residente XXX, Camboa, nesta cidade, por incidência comportamental no artigo 157 do Código Penal, cujas penas-base fixo em 05 (cinco) anos de reclusão e 15(quinze)DM, à razão de 1/30 do SM vigente à época do fato, sobre as quais faço incidir mais 1/3, em face das causas especiais de aumento de penas prevista nos incisos I e II, §2º, do artigo 157, totalizando, definitivamente, 06(seis) anos e 08 meses de reclusão e 20 (vinte)DM, devendo a pena privativa de liberdade ser cumprida, inicialmente, em regime fechado, em face do que estabelece o §3º, do artigo 33, do CP.

 

91.00. O acusado foi preso em flagrante, preso permanece e preso deve permanecer, pois que é perigoso e, em liberdade, não tenho dúvidas, poderá, mais uma vez, voltar a afrontar a ordem pública.

92.00. O acusado, viu-se acima, quando da análise das circunstâncias judiciais do artigo 59, responde a mais três ações penais e tem contra si editado um título executivo judicial, daí que, com essa vida ante acta, deixa entrever a sua nenhuma consideração para com a ordem pública.

93.00. A prisão do acusado, ou melhor, a manutenção da prisão do acusado, pode-se inferir, é mais do que uma necessidade, é uma premente necessidade, ainda que se tenha que considerar todos os efeitos deletérios do cárcere.

94.00. Com as considerações supra e sem mais delongas, revigoro, aqui e agora, os efeitos da prisão em flagrante do acusado, que ergastulado provisoriamente deve permanecer, até que sobrevenha o trânsito em julgado desta decisão.

P.R.I.C.

Fixo os honorários da Defensora dativa em R$ 2.250,00 (dois mil e duzentos e cinquenta reais), os quais deverão ser pagos pelo Estado, na forma da lei, que deverá ser intimado para esse fim.

Transitada em julgado a decisão, expeça-se carta de sentença.

Lance-se, ademais, o nome do réu no rol dos culpados.

Arquivem-se após.

Custas, na forma da lei.

São Luis, 16 de outubro de 2009.

 

Juiz José Luiz Oliveira de Almeida

Titular da 7ª Vara Criminal

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Artigo publicado no site www.joseluizalmeida.com

Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

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