Processo nº 139892009
Ação Penal Pública
Acusado: C. da C. M. N.
Vítima: E. de L. M.
Vistos, etc.
Cuida-se de ação penal que move o Ministério Público contra C. da C. M. N., devidamente qualificado, por incidência comportamental no artigo 157, §2º, I, do Codex Penal, de cuja denúncia sorvo os excertos abaixo, litteris:
Consta no inquérito policial em epígrafe, iniciado por auto de prisão em flagrante delito, que o denunciado acima qualificado, perpetrou na data de 17/05/2009, por volta das 11h00, o crime capitulado no artigo 157, §2º, I, do CPB, em desfavor da vítima, E. de L. M., no momento em que a ofendida transitava, próximo ao Hospital Materno Infantil, no Centro desta capital (Sic)
Adiante, verbis:
Segundo os autos, na data, hora e local supracitados, quando a vítima encontrava-se na companhia de seu filho de 05(cinco) anos de idade, R. P. e de sua prima, C. dos S., após ter feito saque de uma pequena quantia em dinheiro, na agência CEF, localizada na praça Deodoro, rumaram, a vítima, seu filho e sua prima, para o Hospital Materno Infantil, quando o denunciado aproximou-se de E. e puxou a bolsa, para logo em seguida, apontar uma arma de fogo ( pistola plástica na cor preta apreendida às fls. 08), agredindo-a também com um empurrão; neste ínterim, sua prima, C. tomou certa distância do meliante e da vítima,levando consigo o menino, R. P.. Tendo observado que o denunciado conseguiu subtrair a bolsa de E., que ficou caída no chão, após a agressão, enquanto o meliante empreendeu fuga, em direção ao bairro da Camboa (Sic).
A persecução criminal teve início com o auto de prisão em flagrante lavrado em desfavor do acusado (fls. 08/12).
Auto de apresentação e apreensão às fls. 14.
Termo de Restituição às fls. 15
Recebimento da denúncia às fls. 58/59.
Defesa preliminar às fls. 84.
Durante a instrução foram ouvidas as testemunhas E. de L. M. (fls. 106), R. N. P. G. (fls. 107), G. R. de A. (fls. 108) e L. R. B. P. (fls.121).
O acusado foi qualificado e interrogado às fls.122/123.
O Ministério Público, em alegações finais, pediu a condenação do acusado, por incidência comportamental no artigo 157, caput, do CP. (fls.125)
A defesa, de seu lado, pediu que fosse o acusado absolvido, em face da insignificância, ou que, subsidiariamente, seja reconhecido o crime tentado e suspensão condicional da pena (fls.126/129).
Relatados. Decido.
01.00. Os autos sub examine noticiam desvio de conduta relevante, fato da vida real que o legislador definiu como crime (roubo duplamente qualificado), que teria sido protagonizado por C. da C. M. N., em detrimento do patrimônio de E. de L.M..
02.00. É ressabido que o enquadramento de um fato da vida real na descrição legal de norma incriminadora deve estar presente em todos os momentos da persecutio criminis, sem o que não se justifica a potestas coercendi e a potestas cognoscendi das diversas instâncias formais que atuam na esfera penal.
03.00. A Justiça Penal, também é por demais sabido, só sai de sua inércia quando se noticia a prática de um fato criminoso, para possibilitar, alfim, a inflição de pena ao autor – ou autores – desse mesmo fato.
04.00. No primeiro momento, com a notícia da prática de um crime, desde que relevante o fato (mínima non curat praetor), a investigação criminal se instaura (informatio delicti), sem que se possa aferir, em princípio, a culpabilidade do seu autor, o que só se dará, é consabido, quando da conclusão das diversas etapas do procedimento penal.
05.00. Faz-se necessário, no entanto, que essa mesma conduta seja praticada por alguém dotado de capacidade de entendimento e que o faça, ademais, voluntariamente.
06.00. Do descumprimento, pelo autor do delito, da obrigação derivada da norma incriminadora, faz nascer para o Estado o direito concreto de punir.
06.01. Bem por isso é que a regra secundária da norma penal incriminadora se apresenta como uma dupla e clara direção, qual seja, a de impor ao Estado a obrigação de punir, e, ao réu, a obrigação de se submeter à inflição de pena.
07.00. A norma incriminadora é, assim, uma garantia que o réu tem de não ser punido além dos limites estabelecidos no preceito sancionador, direito a que corresponde, de parte do Estado, o dever de se abster de impor outras sanções que não aquelas previstas no preceito secundário da norma incriminadora.
08.00. Mas a lesão ao bem jurídico, cuja existência se verificará no plano normativo da antijuridicidade, está condicionada à existência, no plano naturalístico da conduta, de uma ação ou omissão, que constitui a base do resultado lesivo.
09.00. Na conduta humana, além disso, só adquire relevância jurídico-penal, como elemento do fato típico, a ação voluntária, como antecipei acima.
09.01. Somente a conduta lastreada pela vontade tem relevância na tipificação do ato e é isso que as provas devem demonstrar, pena de ter-se que absolver o acusado.
10.00. Onde não há dinamismo volitivo, mas simples automatismo mecânico, não existe ação.
11.00. Para existir ação causante de um resultado, é necessário que a esse querer interno suceda uma conduta corporal a que se ligue o resultado.
11.01. Sem que a vontade, ou ato psíquico interno, se incorpore a um ato externo, não há fato punível nem ação delituosa.
12.00. Cogitationis poenam nemo patitur: o simples querer, a voluntas acti não exteriorizada em ato concreto no mundo físico, fica impune por não constituir fato típico.
13.00. Essas diretrizes não se perderão de vista quando do exame dos fatos que ensejaram a movimentação da máquina estatal in casu sub examine.
14.00. Nos autos sub examine, disse-o acima, o Ministério Público dirigiu os seus tentáculos contra o acusado C. da C. M. N., porque ele, com sua ação (dinamismo volitivo), teria atentado contra o patrimônio de E. de L. M., protegido juridicamente.
15.00. A persecução criminal (persecutio criminis) se desenvolveu em dois momentos distintos, ou seja, em sedes administrativa e judicial, tal como preconizado no direito positivo brasileiro.
16.00. Na primeira fase da persecução avulta de importância o auto de prisão em flagrante, do qual consta, dentre outros dados relevantes para definição da autoria do crime noticiado na denúncia, a confissão do acusado, que admite, inclusive, que usava uma pistola de brinquedo (fls.11).
17.00. Da mesma sede assomam, também com especial importância, o depoimento da ofendida (fls.10), a apreensão da res furtiva e da arma utilizada na prática do crime (fls.14) e devolução (fls.15) da res furtiva.
18.00. Com esses dados proeminentes, encerrou-se a fase periférica da persecução, com fortíssimos indícios de que o acusado, com emprego de arma de fogo de brinquedo, atentou, sim, contra o patrimônio de E. de L. M..
19.00. O Ministério Público, de posse do caderno administrativo, deflagrou (deflagrare) a persecução penal em seu segundo momento (artigo 5º, LIV, da CF) (nemo judex sine actore; ne procedat judex ex officio) tendo, na proemial (nemo in indicium tradetur sine accusatione), denunciado o acusado, por incidência comportamental no artigo 157,§2º, I , do Digesto Penal.
20.00. Em sede judicial, a ofendida foi ouvida, de cujo depoimento apanho os seguintes fragmentos:
I – que, uma rua antes do Materno Infantil, foi abordada pelo acusado, o qual puxou a sua bolsa tiracolo;
II – que, antes, disse que era um assalto;
III – que reagiu ao assalto, tendo o autor do fato sacado de uma arma de fogo;
IV – que, apesar disso, saiu correndo com a sua bolsa, tendo sido, por isso, empurrado pelo acusado, que a jogou no chão;
V – que, inclusive, ralou o joelho, tendo o acusado se aproveitado da situação para subtrair-lhe a bolsa;
VI – que, de posse da bolsa, o acusado saiu correndo;
VII – que na bolsa havia R$17,00 reais;
VIII – que um chamou a polícia, tendo, a viatura saído à procurado do acusado, tendo sido auxiliados pela população;
IX – que o acusado foi encontrado algum tempo depois da subtração;
X – que o acusado tinha deixado a sua bolsa debaixo de um carro;
Xi – que o próprio acusado disse onde se encontravam os seus pertences.
21.00. Em seguida foi inquirida o PM R. N. P. G., que estava de serviço, e que informou acerca das diligências realizadas no sentido de prender o acusado (fls.107).
22.00. Referida testemunha disse, dentre outras coisas, que o acusado, ao ser preso, trazia consigo uma pistola de brinquedo e uma faca de serra (ibidem).
23.00. A mesma testemunha disse, ademais, que a bolsa da vítima foi encontrada debaixo de um carro e que a arma de brinquedo parecia real (ibidem).
24.00. Do mesmo depoimento destaco, finalmente, o excerto no qual a testemunha afirma que a vítima, ao ver o acusado, não teve dúvidas em apontá-lo com autor do fato (ibidem).
25.00. O depoimento de R. N. P. G. foi ratificado, no essencial, pela testemunha G. R. de A., também policial militar que diligenciou no sentido de localizar o autor do fato (fls.108).
26.00. Do rol da defesa foi ouvida a testemunha L. r. B. P., às fls. 121, que nada soube informar acerca do fato imputado ao acusado.
27.00. Encerrando a instrução foi ouvido o acusado, o qual, sem titubeio, confessou a autoria do crime, admitindo, inclusive, que usou uma pistola de brinquedo e que, cinco minutos depois, foi preso de posse da res mobilis (fls.122/123).
28.00. Resulta do exame das provas produzidas nas duas fases da persecução que o crime, efetivamente, ocorreu, cujo autor foi o acusado, o qual, registre-se, confessou a sua autoria nos dois momentos nos quais foi ouvido.
29.00. Das mesmas provas resulta, ademais, a constatação de que o crime não restou qualificado pelo emprego de arma, pois que a arma usada, conquanto tenha quebrantado a resistência da ofendida, não tinha potencialidade lesiva.
30.00. Do contexto probatório, consigno, avulta de importância, a dar conforto à confissão do acusado, o depoimento da ofendida, exaustivamente examinado acima.
31.00. O crime, posso concluir do exame das provas, restou consumado, em face de o acusado ter se apoderado da res mobilis, ainda que o fizesse por pouco tempo, vez que foi preso em flagrante logo após a prática do crime.
32.00. A consumação do crime de roubo, todos sabemos, se dá no exato instante em que o agente se torna possuidor da res mobilis, subtraída mediante violência ou grave ameaça, independentemente de sua possa mansa e pacífica.
33.00. A mais judiciosa doutrina segue na mesma direção, como se verá a seguir.
34.00.Guilherme de Souza Nucci, a propósito, afirma direto, sem delonga, incisivo, que o momento consumativo do roubo se dá
“quando o agente retira o bem da esfera de disponibilidade e vigilância da vítima”( in Manual de Direito Penal, editora revista dos tribunais, 2005, p. 664)
35.00.Júlio Fabbrini Mirabete, de seu lado, afirma, espancando, de vez, a tese da posse tranqüila da res, que
“o crime de roubo somente se consuma, como o furto, com a inversão da posse, ou seja, nos termos da jurisprudência francamente dominante, se o agente tem a posse mais ou menos tranqüila da coisa, ainda que por breve momento, fora de esfera de vigilância da vítima”( in Código Penal Anotado, ob. Cit. P. 951).
36.00.Rene Ariel Dotti, a seu tempo e modo, ensina que o crime de roubo restará consumado,
“quando o sujeito ativo realiza em todos os seus termos a figura delituosa, em que o bem jurídico penalmente protegido sofreu efetiva lesão ou a ameaça de lesão que se exprime no núcleo do tipo”(in Curso de Direito Penal, parte geral, 2ª edição, forense, p. 325/326).
37.00. Na mesma direção é a lição de Fernando Capez, para quem
“o roubo se consuma no momento em que o agente subtrai o bem do ofendido”. (in Curso de Direito Penal, Parte Especial, Vol. II, Saraiva, p. 399).
38.00. Prossegue o celebrado professor afirmando que “
subtrair é retirar contra a vontade do titular”(ibidem)
39.00. Para, mais adiante, concluir que
“ levando-se em conta esse raciocínio, o roubo estará consumado tão logo o sujeito, após o emprego de violência ou grave ameaça, retire o objeto material da esfera de disponibilidade da vítima, sendo irrelevante se chegou a ter a posse tranqüila ou não da res furtiva
40.00. Na mesma toada é a lição do preeminente e notável professor Luiz Regis Prado, segundo o qual
“o roubo próprio consuma-se com o efetivo apossamento da coisa, ainda que por lapso temporal exíguo, na posse tranqüila do sujeito ativo, que dela pode dispor” (in Curso de Direito Penal brasileiro, vol. II, editora Revista dos Tribunais, 5ª edição, 2005, p. 440).
41.00. Na mesma senda é a ensinança do egrégio José Henrique Pierangeli para quem
“o delito de roubo próprio consuma-se quando a coisa sai do âmbito de proteção do sujeito passivo e o sujeito ativo tem a sua posse tranqüila, ainda que por pouco tempo”(in Manual de Direito Penal brasileiro, Parte Especial, editora Revista dos tribunais, 2005, p. 375).
42.00. Os Tribunais têm decidido, iterativamente, na mesma senda, ao proclamarem, à exaustão, que
“a consumação do roubo se dá no momento da apreensão da coisa pelo agente, independentemente de haver ele exercido ou não posse duradoura e tranqüila. A rápida recuperação da coisa e a prisão do autor do delito não constituem motivos para operar-se a desclassificação do crime de roubo para a sua forma tentada” ( TJAP – ACr 171003 – (6781) – C.Única – Rel. Des. Honildo Amaral de Mello Castro – DOEAP 02.06.2004 – p. 22).
43.00. No mesmo rumo é a decisão segundo a qual para a caracterização do roubo, na forma consumada, basta que haja a
“inversão da posse da coisa subtraída, ainda que por breve momento, mediante a cessação da grave ameaça ou violência à pessoa”( TJAP – ACr 146502 – C.Ún. – Rel. Juiz Conv. Luciano Assis – DJAP 19.04.2004 – p. 12).
44.00. Não destoa a decisão que proclama que
“o crime de roubo se consuma quando a coisa subtraída sai da esfera de proteção e disponibilidade da vítima, ingressando na do agente, estando, ainda que por breve tempo, em posse mansa e tranqüila deste …”(TJES – ACr 035980222133 – 1ª C.Crim. – Rel. Des. Sérgio Luiz Teixeira Gama – J. 30.06.2004)
45.00. No mesmo rumo já decidiu, incontáveis vezes, o Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo, segundo o qual
“o crime de roubo se consuma a partir do momento em que a vítima tem o bem subtraído mediante violência ou grave ameaça, não se exigindo que o agente tenha posse tranqüila da res furtiva, sendo irrelevante que o acusado seja detido logo em seguida ao início da fuga”. (Apelação nº 1.330.205/0, Julgado em 03/10/2.002, 8ª Câmara, Relator: Roberto Midolla, RJTACRIM 63/128)
46.00. Importa grafar, a guisa de reforço, que, tratando-se de crime material, o que se exige, para sua consumação, é, tão-somente, a real e concreta diminuição do patrimônio do sujeito passivo, ainda que essa diminuição se dê de forma passageira.
47.00. O acusado, subjetivamente, queria e alcançou o resultado (fim especial) que buscava, qual seja, o de subtrair do ofendido coisa móvel, mediante ameaça exercida com o emprego de fogo, pouco importando, para caracterização da qualificadora, que a arma tenha sido apreendida e periciada.
48.00. Convém lembrar que a legislação, in casu, protege dois bens jurídicos distintos, quais sejam, o patrimônio (posse, propriedade, detenção) e a integridade física e psíquica do indivíduo, daí, a fortiori, a tipificação do crime de roubo no caso em comento.
49.00. O acusado, agora, em face de sua ação, tem que suportar a inflição de penas (privativa de liberdade e multa), em face da prática de fato concreto que o legislador definiu como crime.
50.00. O acusado, em face da mesma ação, deve suportar a majoração da resposta penal, porque, para consecução do crime, fez uso de arma e contou com o concurso de pelo menos mais um meliante, demonstrando, com efeito, toda a sua perigosidade.
51.00. Estabelecido, quantum satis, que o acusado, com o seu comparsa, atentaram contra a ordem pública,devo, agora, deter-me em duas questões que compreendo relevantes.
52.00. Primeiro, a tese da defesa.
53.00. Nesse sentido, compreendo que, com os argumentos suso elencados, a tese da defesa resultou enfrentada, quantum sufficit, razão pela qual entendo não deve mais expender quaisquer considerações adicionais.
54.00. A propósito da quaestio, anoto que os Tribunais têm decidido, à estafa, que
a sentença que, ao acolher a tese da acusação, contém satisfatória menção aos fundamentos de fato e de direito a ensejar o Decreto condenatório, não é nula, apenas pelo fato de não se referir explicitamente à tese da defesa, mormente se, pela sentença condenatória, restou claro que o Juiz adotou posicionamento contrário.(STJ – HC 34618 – SP – 5ª T. – Rel. Min. Felix Fischer – DJU 13.12.2004 – p. 00388) JCF.5 JCF.5.XI ).
55.00 No mesmo sentido é a decisão de que
não é omissa a decisão que, fundamentadamente, abraça tese contrária à da defesa…” (STJ – HC 35917 – MS – 5ª T. – Rel. Min. Felix Fischer – DJU 08.11.2004 – p. 00261) JCP.214 JCP.224 JCP.224.A JLCP.61).
56.00. Na mesma linha de pensar é o aresto no sentido de
“inocorre nulidade da sentença, por suposta não apreciação, pelo Magistrado, de teses levantadas pela Defesa, em suas alegações finais, se o Juiz, ao formar seu convencimento e elaborar sua decisão, não respondeu, ponto a ponto, a todos os argumentos mas, na estrutura final, desenvolveu adequadamente a prestação jurisdicional solicitada, afastando, implicitamente, as teses apresentadas” (Apelação nº 1.305.327/9 – São Paulo – 11ª Câmara – Relator: Pires de Araújo – 24.6.2002 – V.U. (Voto nº 7.263).
57.00. No que concerne, especificamente, ao princípio da insignificância, invocado pela defesa para alcançar a absolvição do acusado, sublinho que tal princípio é incompatível com crimes praticados com violência ou ameaça de violência contra a pessoa.
58.00. Os Tribunais têm decidido, iterativamente, no mesmo sentido, como se colhe da ementa a seguir transcrita, verbis:
Supremo Tribunal Federal. 1ª Turma
Título RE 454394 AgR / MG – MINAS GERAIS
Data 02/03/2007
EMENTA: 1. Princípio da insignificância e crime de roubo É da jurisprudência do Supremo Tribunal que o princípio da insignificância não se aplica ao delito de roubo (v.g. AI 557.972, 2ª T., 07.03.03, Ellen Gracie, DJ 31.03.06). 2. Recurso extraordinário: descabimento: controvérsia relativa à incidência do princípio da insignificância, que demanda a prévia análise da legislação ordinária pertinente (C. Penal, art.157): incidência, mutatis mutandis, da Súmula 636.
59.00. Na mesma senda:
Supremo Tribunal Federal. 2ª Turma
Título HC 96671 / MG – MINAS GERAIS
Data 31/03/2009
Ementa HABEAS CORPUS. CRIME DE ROUBO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. LESÃO AO PATRIMÔNIO E À INTEGRIDADE FÍSICA DA VÍTIMA. PRECEDENTES. ORDEM DENEGADA. 1. A questão tratada no presente writ diz respeito à possibilidade de aplicação do princípio da insignificância ao crime de roubo. 2. Como é cediço, o crime de roubo visa proteger não só o patrimônio, mas, também, a integridade física e a liberdade do indivíduo. 3. Deste modo, ainda que a quantia subtraída tenha sido de pequena monta, não há como se aplicar o princípio da insignificância diante da evidente e significativa lesão à integridade física da vítima do roubo. 4. Ante o exposto, denego a ordem de habeas corpus.
60.00. Enfrentadas todas as possíveis questões que pudessem ser rediscutidas em sede recursal, devo reafirmar, agora, que o acusado, com sua ação, afrontou, hostilizou a ordem jurídica, devendo, por isso, suportar a inflição de penas, em face do crime que praticou.
61.00. A propósito, importa anotar que crime, no plano material, se define como a violação de bem jurídico penalmente tutelado, violação que se dá através da conduta de um homem que vem definida e configurada no preceito primário da norma penal, sabido que, em face do princípio da legalidade dos crimes e das penas não existam ações ou comportamentos do homem, relevantes para o Direito Penal, sem prévia descrição legal.
62.00. O acusado, com sua conduta, violou, sim, o comando normativo penal do artigo 157, em seu momento preceptivo, devendo, por isso, se sujeitar à punição prevista no seu preceito secundário.
63.00. O elemento subjetivo do tipo é o dolo, que se traduz na vontade de subtrair, com a finalidade expressa no comando legal, que é o de ter a coisa para si ou para outrem (animus furandi ou animus rem sibi habend).
64.00. A norma jurídica resulta violada pela conduta humana através de um “facere” (ação), ou de um “non facere” (omissão).
65.00. O acusado, pese lhe fosse defeso fazê-lo, fez (facere), ou seja, atentou contra o patrimônio da vítima, afrontando, no mesmo passo, a ordem pública.
66.00. É consabido que nem todo ato humano, ainda que se enquadre numa descrição típica, é ação delituosa.
66.01. Para que a conduta se apresente com a marca da delituosidade, é preciso que seja voluntária, como o foi, efetivamente, a conduta do acusado, lastreada que foi pela vontade de transgredir, de vilipendiar, de afrontar a ordem jurídica.
67.00. O acusado não foi impelido por uma força física irresistível.
67.01. Ao contrário, o ato psíquico interno se incorporou a um ato externo, que se materializou na agressão ao patrimônio da vítima.
68.00. A prova amealhada nos autos, induvidosamente, fez chegar ao meu espírito a crença de estar de posse da verdade, da reconstrução histórica dos fatos, da verdade material tão buscada e, quase nunca, encontrada.
69.00. O fato narrado na exordial, depois de coligidas as provas, se enquadrando na descrição legal da norma incriminadora do artigo 157 do CP, justifica, legitima a potestas coercendi dos órgãos do procedimento penal.
70.00. O acusado, ao atentar contra o patrimônio da vítima, o fez com a consciência de que se tratava de um ato ilícito, e com a clara intenção de subtrair coisa alheia móvel, para incorporar ao seu patrimônio, daí o elemento subjetivo.
71.00. Dolo, sabe-se, é
“consciência e a vontade de realização da conduta descrita em um tipo penal. O dolo é constituído por dois elementos: um cognitivo, que é o conhecimento do fato constitutivo da ação típica, e um volitivo, que a vontade de realizá-la. O primeiro elemento, o conhecimento, é pressuposto do segundo, que é a vontade, que não pode existir sem aquele” (César Roberto Bittencourt, in Código Penal Comentado, Editora Saraiva, edição 2002, p. 55).
72.00. O acusado não se limitou planejar, a pensar o roubo, hipótese em que não haveria que se cogitar da prática de crime, pois que
“o pensamento e o querer humanos não preenchem as características da ação enquanto não tenha iniciado a manifestação exterior dessa vontade” ( Júlio Fabbrini Mirabete, Manual de Direito Penal, Vol. 7ª edição, Atlas, p. 100).
73.00. O acusado não teve a motivar a sua ação, a sua conduta, nenhum agente externo.
73.01. Nenhuma força exógena o impulsionou para o delito.
73.01.01. Tinha total domínio do fato, sabia o que estava fazendo, não tinha a sua capacidade psíquica diminuída, não foi submetido a nenhuma força física irresistível.
73.01.02. Por força física irresistível entenda-se
“aquelas hipóteses em que opera sobre o homem uma força de tal proporção que o faz intervir como mera massa mecânica”( Eugênio Raúl Zaffaroni e outro, ob. cit. p. 433).
74.00. A conduta do acusado não foi resultado de um ato involuntário, mas do desejo de vilipendiar, de ultrajar a ordem jurídica, de afrontar o patrimônio da vítima.
75.00. Desobedecida a norma preceptiva pelo acusado e atingindo o mesmo bem jurídico tutelado penalmente, fez nascer para o Estado, disse-o acima, o direito de penetrar no seu status libertatis, para privá-lo, através da medida sancionadora correspondente, de um bem – a liberdade – até então garantido e intangível.
76.00. O acusado, por atingir, com sua ação, com sua conduta,
“um interesse penalmente tutelado, um valor social cuja relevância para a vida coletiva impele ao Estado a garanti-lo com as sanções penais – sofrerá a perda ou diminuição de um bem jurídico” (José Frederico Marques, ob. Cit. P. 133).
77.00. Infere-se, assim, do que foi exposto,
“que a sanção penal, como toda e qualquer outra sancionadora, é a conseqüência de um comportamento contrário ao direito e aos preceitos imperativos da ordem jurídica”.(ibidem).
78.00. O acusado deve, em face de sua ação, suportar a inflição de pena, pena traduzida como
“sanção aflitiva imposta pelo Estado, através de processo, ao autor de um delito, como retribuição de seu ato ilícito e para evitar novos delitos” (Sebastião Soler, Derecho Penal Argentino, Vol. III, p. 399, apud José Frederico Marques, ob.cit. p, 136).
79.00. O acusado tem maus antecedentes.
79.01. O acusado, com efeito, responde a mais três ações penais neste juízo – processos nºs 107292002, na Vara de Entorpecentes, 49202004, na 3ª Vara Criminal, e 212592004, na 4ª Vara Criminal (fls. 41).
79.01.01. O acusado, ademais, tem em seu desfavor um título executivo judicial, cujo processo se encontra, hoje, na Vara de Execuções e Penas Alternativas (ibidem).
80.00. À luz do exposto, posso afirmar que o acusado tem maus antecedentes e não é mais primário, daí que a resposta penal deve ser majorada, ex vi legis.
81.00. É cediço que quem tem contra si em curso vários processos criminais e quem, ademais, tem contra si um título executivo judicial, deve suportar a ira estatal de forma exacerbada, pois que faz do crime uma habitualidade e não tem senso moral.
82.00. Tudo de essencial posto e analisado, julgo procedente a denúncia, para, de conseqüência,
Condenar C. da C. M. N., brasileiro, solteiro, jardineiro, filho de C. A. R. M. e M. B. M. dos S., residente na 2ª Travessa da Rua Nova, nº 71, Camboa, nesta cidade, por incidência comportamental no artigo 157, §2º, I e II, do CP, cujas penas-base fixo em 07(sete) anos de reclusão e 20(vinte)DM, à razão de 1/30 do SM vigente à época do fato, das quais reduzo 01(um) ano de reclusão e 05(cinco)DM, em face da circunstância atenuante prevista no artigo 65, III, letra d, do CP, totalizando, assim, 06(seis) anos de reclusão e 15(quinze)DM, sobre as quais faço incidir, finalmente, mais 1/3, em face da causa especial de aumento de penas prevista nos inciso I, §2º, do artigo 157 do CP, totalizando, definitivamente, 08(oito) anos de reclusão e 20(vinte)DM, devendo a pena privativa de liberdade ser cumprida, inicialmente, em regime fechado, ex vi do §3º, do artigo 33, do CP.
83.00. O acusado esteve preso durante toda instrução, e assim deve ser mantido, pois que de sua liberdade pode resultar, sim, prejuízo à ordem pública.
84.00. O acusado, viu acima, quando da análise das circunstâncias judiciais do artigo 59 do Codex Penal, é contumaz infrator, daí que, em liberdade, pode, sim, com muita probabilidade, voltar a vilipendiar a ordem pública.
85.00. Com as considerações supra e sem mais delongas, revigoro, aqui e agora, os efeitos da prisão em flagrante do acusado, para que, preso, aguarde o trânsito em julgado desta decisão.
86.00. Recomende-se o acusado, pois, na prisão em que se encontra.
PR.I.C.
Custas, na forma da lei.
Com o trânsito em julgado desta decisão, lance-se o nome do réu no rol dos culpados e extraia-se carta de sentença.
Após, arquivem-se os autos, com a baixa em nossos registros.
São Luis, 15 de outubro de 2009.
Juiz José Luiz Oliveira de Almeida
Titular da 7ª Vara Criminal
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