Cansaço

Estou quase encerrando mais  uma semana de trabalho. Estou me sentido cansado. Cansaço mental, registre-se.

No exercício da função judicante, de há muito constatei,  não há como manter as emoções controladas. Eu sou, sim, muita emoção, conquanto, por imperativo, seja muito mais razão.

Confesso que não sei de onde vem essa máxima de que desembargador não trabalha. É possível, sim, que existam os que não trabalham. Todavia, se efetivamente existem, são exceção. O certo é que nunca trabalhei tanto. A responsabilidade do cargo, o fato de ser, na  prática, a última instância para definição da situação jurídica de um acusado, posso afirmar, me agasta,  me preocupa, me faz  soturno algumas vezes.

Dirão: ossos do oficio!  Direi: ossos do oficio,sim!  Mas eles bem que podiam  ser mais palatáveis.

Vou em frente, todavia, dando a minha contribuição ao Poder Judiciário, ainda que modesta.

Vou seguindo adiante, até onde a minha lucidez me permitir. Perdendo-a, devo recolher as armas e voltar para casa.

Para o desprazer de alguns, não tenho tido nenhuma dificuldade de convivência com os meus pares. Hoje sei que muitos  são mais profissionais, mais humanos e mais solidários do que eu supunha. É a reafirmação, pura e simples,  de que só se pode emitir um conceito daquilo que se conhece.

Quando decido por  fazer esse tipo de reflexão, o faço para que os leitores do meu blog saibam que, diferente do que se pensa, vida de desembargador não é uma patuscada, um simples folguedo.

Enganam-se os que pensam que aqui se cultiva apenas a vaidade.

No meu caso, posso afirmar que  o limite da minha vaidade é poder fazer, é construir, é elaborar bons votos, reparar alguma injustiça.

Confesso que se tivesse a capacidade de não me envolver emocionalmente com o que faço, se pudesse chegar em casa e romper as amarras com o meu trabalho, não estaria  tão cansado mentalmente.

Mas não tenho essa capacidade. Eu ainda sou do tipo que acorda pela madrugada e passa a refletir sobre  fatos que se relacionem com o meu trabalho.

É, simplesmente, o medo, o quase pavor de, podendo, não reparar uma injustiça, não mudar o rumos dos acontecimentos.


Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

6 comentários em “Cansaço”

  1. Pois é meu querido, que esse post sirva de resposta àqueles, que dizem por aí, que ‘desembargador’ é uma espécie híbrida chique de despachante do “Rei”…

    Um abraço!!!

  2. Prezado amigo,
    assim vc se faz “humano” e isso é o mais importante: a humanidade do Juiz!
    Mais uma vez, parabéns por dizer tanto em poucas tecladas.
    Abraço.

  3. Quero parabenizar Vossa Excel~encia e lhe dizer que sou juridicamente um fã, Vossa Excelência tem sido um espelho para meus estudos e conhecimentos juridicos os quais muitas das vezes tenho a honra de servir de parametro para minha vida juridica que está só começando,´sou um estudante e me causa muita satisfação quando vejo que mesmo antes de ser Desembargador Vossa Excelência disse em uma de suas decisões que estava homenajeando a Constituição Federal, daquele momento em diante tornei-me um fã incondicional sei que um dia quando Advogado for se me contrariar juridicamente entenderei pois descobrir em Vossa Excelência que ainda é possivle acreditar que existe pessoas honestas e pessoa em que se pode confiar quando o assunto é a JUSTIÇA, foi um prazer ler e estudar mais essa lição, que Deus lhe Abençoe sempre!, Um ABRAÇO do Estudante CLAUDIO BARCELOS.

  4. Brilhante seu texto !

    Às vezes, me pego pensando que muitos profissionais do direito, até eu já tive esse posicionamento, que vemos os processos como apenas um intricado jogo processual ou um trabalho enfadonho que anseiamos para terminar e curtir o descanso! Às vezes esquecemos de todas as implicações que uma decisão judicial pode causar!

    Tenho você por exemplo !!

    parabéns

  5. “No meu caso, posso afirmar que o limite da minha vaidade é poder fazer, é construir, é elaborar bons votos, reparar alguma injustiça.”
    “[…]É, simplesmente, o medo, o quase pavor de, podendo, não reparar uma injustiça, não mudar o rumos dos acontecimentos.”
    Caríssimo Dr. José Luiz,
    Afirmações como estas contribuem para reforçar dentro de nós a certeza de que ainda existem pessoas dispostas a fazer diferença no seu fazer diário.
    Que o seu exemplo de magistrado possa ser seguido pelas gerações futuras, e que o Poder Judiciário do Maranhão continue a contar (por muitos anos) com a sua “modesta” contribuição.
    Um grande abraço,
    Azenate

  6. Azenate, é sempre bom começar o dia ouvindo as suas palavras de incentivo. Não sei se consigo fazer a diferença. A única certeza que tenho é que sempre decido impregnado pela melhor intenção, movido pelo melhor sentimento.
    Um abraço fraternal.

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