Prescrição virtual e a Súmula 438, do STJ

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No voto que publico a seguir voltei a tratar da prescrição virtual, agora na condição de juiz do segundo grau e em vista da súmula 438, do Superior Tribunal de Justiça.

Abaixo, antecipo excertos do voto.

“[…]Já tive a oportunidade de utilizar deste instituto na lida forense, contudo, reconheço que o fiz imbuído de um senso “utilitarista”, e na ocasião, diferentemente do caso sob testilha, o próprio Ministério Público, titular da ação penal, formulou o pedido.

Nada obstante, após refletir, com maior detença e vagar, sou compelido a reconhecer que o instituto da prescrição antecipada não repousa com tranqüilidade no ordenamento jurídico pátrio, e as razões para tanto, as quais já explicitei supra, parecem-me de maior relevo do que o propalado utilitarismo prático.

Isso porque, na minha compreensão, o reconhecimento da prescrição virtual acaba por resvalar em garantias constitucionais inafastáveis do processo penal, ferindo-as frontalmente. O devido processo legal é uma delas, cuja observância, já reconheceu o STF, deve ser observada, inclusive, nas relações de cunho eminentemente privado, no que se convencionou denominar de eficácia horizontal dos direitos fundamentais. Despiciendo dizer, pois, que no processo penal, de feição eminentemente pública, a incidência de seus preceitos é de absoluto rigor.

Não se pode olvidar, também, que o iter procedimental pode resultar em uma sentença absolutória, e o atalhamento desta marcha pode retirar do réu o seu direito a um pronunciamento judicial definitivo sobre o fato criminoso a si imputado, ou seja, de saber se é, efetivamente, culpado, ou inocente, por não ter, v. g., praticado a conduta.

A certeza de uma sentença absolutória, estou convicto disto, confere ao imputado uma sensação de justiça muito mais patente, do que o reconhecimento de que, o Estado-Juiz, diante de sua inércia, não conseguiu exercer o jus puniendi em tempo hábil.

De outro viés, deixo consignado, apenas a título de ilustração, que alguns doutrinadores da seara processual penal apontam pela viabilidade da prescrição virtual, como fundamento hábil ao reconhecimento da falta de interesse de agir, na modalidade interesse-utilidade, o que permitiria ao julgador decidir pelo arquivamento do inquérito policial, ou não recebimento da inicial acusatória, em razão da notória inutilidade da ação penal, cujo desfecho implicaria, inevitavelmente, no reconhecimento da prescrição retroativa com base na pena aplicada[…]”

Agora, a decisão por inteiro.

PRIMEIRA CÂMARA CRIMINALNº Único: 0015042-34. 2003.8.10.0000

Apelação Criminal Nº. 017487/2010 – São Luís-MA

Apelante Promotor de Justiça

Apelado

Incidência Penal

Vara

Relator

Acórdão Nº

: Ministério Público do Estado do Maranhão: L. F. C. B. J.

: A. J. B. C.

: Art. 54, caput, da Lei 9.605/98

: 9ª Vara Criminal da Comarca de São Luís-MA

: Desembargador José Luiz Oliveira de Almeida

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Ementa: PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. EXTINÇÃO DE PUNIBILIDADE. PRESCRIÇÃO VIRTUAL. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. APELO CONHECIDO E PROVIDO.

1. A prescrição virtual não pode ser utilizada como fundamento extintivo de punibilidade, por ausência de previsão legal expressa no ordenamento jurídico pátrio. Inteligência da Súmula 438 do STJ.

2. Afigura-se, em tese, viável o reconhecimento da prescrição virtual, apenas para rejeição da denúncia, ou arquivamento do inquérito policial, por evidenciar ausência de interesse processual, na modalidade interesse-utilidade.

3. Apelo conhecido e dado provimento.

Acórdão – Vistos, relatados e discutidos estes autos, ACORDAM os Senhores Desembargadores da Primeira Câmara Criminal, por unanimidade, de acordo com o parecer da Procuradoria Geral de Justiça, em dar provimento ao recurso, nos termos do voto do Desembargador Relator.

Participaram do julgamento Excelentíssimos Senhores Desembargadores Antonio Fernando Bayma Araujo (Presidente), Raimundo Nonato de Souza e José Luiz Oliveira de Almeida. Presente pela Procuradoria Geral de Justiça o Dr. Eduardo Jorge Nicolau

São Luís, 26 de outubro de 2010.

DESEMBARGADOR Antônio Fernando Bayma Araujo

PRESIDENTE

DESEMBARGADOR José Luiz Oliveira de Almeida

RELATOR


Relatório – O Sr. Desembargador José Luiz Oliveira de Almeida (relator): Cuida-se de recurso de apelação criminal interposto pelo órgão de base do Ministério Público Estadual, em face de decisão absolutória extintiva de punibilidade do apelado A. J. B. C., dimanada do juízo da 9ª Vara Criminal da Comarca da Capital.

Observo da inicial acusatória que o apelado A. J. B. C. é proprietário de um estabelecimento comercial, denominado “Toca do Sá Viana”, onde explora atividade de entretenimento, reproduzindo músicas através do uso de aparelhagem de som, cuja emissão, segundo alegou o Parquet, extrapola os níveis de ruído estabelecidos pela legislação vigente, trazendo transtornos e riscos à saúde dos moradores que residem nas proximidades.

Colho da peça preambular que foi realizada perícia no local, onde constatou-se, através de medição com um decibelímetro, que o ruído total emitido no local alcançou a média de 82,20 decibéis, ultrapassando os limites fixados pela Lei Estadual n. 5715/93.

Vejo, por fim, da denúncia, que o delito ocorreu de forma contínua, prejudicando sobremaneira os moradores circunvizinhos ao estabelecimento.

Ao fim, o Ministério Público ofertou proposta de sursis processual, consistente em encerramento das atividades.

A denúncia foi instruída com os autos do inquérito policial n. 016/2003 da Delegacia de Costumes e Diversões Públicas da Capital, notadamente, com o laudo de vistoria de fls. 13/16.

A denúncia foi recebida pelo despacho de fls. 44, e o apelado, embora não tenha sido citado, conforme se vê pela certidão do Meirinho de fls. 51, compareceu na audiência de qualificação e interrogatório designada às fls. 52, a qual não ocorreu, em razão do membro do Parquet não ter sido pessoalmente intimado para o ato processual, o qual fora redesignado, todavia, sua realização restou inexitosa, conforme se vê pelas assentadas de fls. 55 e 62.

Após dois anos paralisado, por motivos não declinados na certidão cartorária de fls. 64, deu-se vista dos autos ao Ministério Público, em cuja manifestação de fls. 64v. requereu o prosseguimento do feito, mediante designação de data para realização de audiência.

Através do despacho de fls. 67, o juízo de base chamou o feito à ordem, a fim de adequar o procedimento à nova sistemática então operada no CPP, e determinou a intimação do apelado para oferecer defesa preliminar, nos termos do art. 396 e 396-A, daquele diploma, tendo apresentado a respectiva petição às fls. 73/74, na qual aduziu, em suma, fragilidade das provas que instruíram a denúncia, e que não tem notícia de que os níveis de ruído excessivo de seu estabelecimento prejudiquem algum morador da localidade do Sá Viana.

Na audiência de fls. 90/92, foram inquiridas três testemunhas arroladas pelo Ministério Público, e, em seguida, procedida à qualificação e interrogatório do apelado às fls. 93/93v. A defesa, por seu turno, dispensou a oitiva de testemunhas, e o Ministério Público requereu a realização de nova perícia no local, conforme consignado em ata às fls. 89.

Laudo de vistoria de levantamento de poluição sonora acostado às fls. 97/100 dos autos.

O juízo de base determinou, às fls. 101, a intimação das partes para apresentarem razões finais, no prazo de cinco dias, entretanto, o representante do Parquet manifestou-se às fls. 102v., pugnando pela realização de nova perícia, argumentando que não foram observadas as exigências técnicas previstas na legislação de regência, pleito este que foi deferido pelo Juízo, às fls. 104, estabelecendo-se o prazo de 15 (quinze) dias para a nova perícia.

Decorrido o prazo, sem resposta, conforme certificado às fls. 107, o juízo a quo exarou a sentença extintiva de punibilidade de fls. 108/110, arrimado na ocorrência da prescrição virtual ou em perspectiva, aduzindo, em suma, que a pretensão punitiva estatal estava fadada ao insucesso, tendo em vista que, aplicando-se a pena mínima colimada ao delito, em razão de, num juízo prévio, considerar circunstâncias judiciais favoráveis ao apelado, a reprimenda estaria prescrita, tendo em vista o longo lapso temporal já decorrido, desde o recebimento da denúncia.

Contra esta decisão, o órgão de base do Parquet Estadual interpôs recurso de apelação, às fls. 113, com as inclusas razões (fls. 120/125), no qual aduziu que tal decisão nega vigência ao art. 42 do CPP, por não existir previsão legal no direito pátrio da chamada prescrição virtual ou antecipada.

Em suas sucintas contrarrazões às fls. 130, o apelado limitou-se a dizer que o juízo de base agiu acertadamente ao extinguir a sua punibilidade, com base na prescrição, pugnando pela manutenção da decisão.

Em seu douto parecer, o Procurador de Justiça Eduardo Jorge Hiluy Nicolau opinou pelo conhecimento do apelo e reconheceu, na condição de custos legis, a nulidade do feito, tendo em vista que não se oportunizou às partes a apresentação de alegações finais, vez que não foram efetivamente intimadas para tal desiderato. Não se pronunciou acerca da matéria objetada no apelo ministerial – extinção da punibilidade pela prescrição virtual.

Os autos vieram conclusos.

É o relatório.

Voto – O Sr. Desembargador José Luiz Oliveira de Almeida (relator): Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do presente apelo. Trata-se de recurso de apelação interposto pelo membro de base do Parquet Estadual, irresignado com a sentença que declarou extinta a punibilidade do apelado A. J. B. C., com base na prescrição virtual.

Ao que observo das razões recursais, o Ministério Público concentrou suas insubmissão ao decisum ora guerreado, na alegação de inexistência da prescrição virtual. Transcrevo, a seguir, o núcleo argumentativo (fls. 121), a fim de delimitar o âmbito de devolutividade da matéria impugnada:

“Os arts. 109 e 110 do Código Penal indicam apenas duas modalidades de prescrição intercorrente. Aquela que se conta da pena máxima em abstrato e a prescrição retroativa, calculada com base na pena aplicada, da qual não exista recurso da acusação. Não existe prescrição com base em pena que seria imposta, prescrição antecipada, ou virtual.”

(Negritos no original).

De fato, não há qualquer dúvida quanto à ausência de previsão legal do instituto da prescrição virtual ou antecipada.

Nada obstante, é consabido que sua utilização é corrente na praxe forense, razão pela qual não se pode ignorar tal situação, pois, é consabido, muitos institutos jurídicos têm sua gênese através de um processo dinâmico, de autoconstrução e oxigenação da ciência jurídica, que é renovada por inovadoras teses, expostas por advogados e membros do Ministério Público, e por construções jurisprudenciais, as quais, paulatinamente, se incorporam na consciência jurídica dos operados do direito, e são, por vezes, definitivamente albergadas pelos Tribunais Superiores.

Pois bem.

A prescrição virtual, como já apontamos, de fato, não encontra previsão legal expressa no ordenamento jurídico pátrio. Trata-se de uma criação jurisprudencial e doutrinária.

Nas esclarecedoras palavras da doutrina[1]:

“A prescrição retroativa antecipada, também chamada de ‘virtual’ ou ‘em perspectiva’, é uma criação de parte da doutrina e da jurisprudência brasileira mais recente.

Consiste no reconhecimento da prescrição retroativa antes mesmo do oferecimento da denúncia ou queixa e, no curso do processo, anteriormente à prolação de sentença, sob o raciocínio de que eventual pena a ser aplicada em caso de hipotética condenação traria a lume um prazo prescricional já decorrido.

Argumenta-se, pois, pela inutilidade da providência jurisdicional, que, a seu término, inevitavelmente ensejaria o reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva.”

De outra banda, os argumentos contrários à existência da prescrição virtual não são poucos. Somado ao principal deles já indicado (falta de previsão legal), destacam-se:

I – violação ao princípio constitucional da tripartição das funções estatais, pois estaria o Judiciário legiferando, criando nova hipótese de prescrição, com base em pena hipotética, e consequente extinção de punibilidade, não previstos no ordenamento;

II – malferimento ao devido processo legal e seus consectários, mediante uma prévia condenação hipoteticamente considerada, sem a observância das garantias ínsitas ao iter procedimental; e

III – usurpação da utilidade da persecução penal, pois, ao final desta, poderá o acusado ser absolvido.

Inobstante reconheça que a questão é deveras controversa, o C. Superior Tribunal de Justiça, no âmbito de sua jurisprudência majoritária, editou a súmula n. 438, cujo teor diz:

É inadmissível a extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva com fundamento em pena hipotética, independentemente da existência ou sorte do processo penal.

Esta Corte, ao que entrevejo dos julgados abaixo, caminha neste rumo de orientação:

“(…) Anula-se, entretanto, declaração de extinção da punibilidade de outro acusado, fundada em prescrição virtual, por falta de amparo na legislação vigente.”[2]

“EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. EFEITOS INFRINGENTES. PROCESSUAL PENAL. PRESCRIÇÃO VIRTUAL. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 438 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. DESVIRTUAMENTO DOS ACLARATÓRIOS. EMBARGOS REJEITADOS.”[3]

Registro, por oportuno, que não visualizei decisões desta C. 1ª Câmara acerca da matéria.

Já tive a oportunidade de utilizar deste instituto na lida forense, contudo, reconheço que o fiz imbuído de um senso “utilitarista”, e na ocasião, diferentemente do caso sob testilha, o próprio Ministério Público, titular da ação penal, formulou o pedido.

Nada obstante, após refletir, com maior detença e vagar, sou compelido a reconhecer que o instituto da prescrição antecipada não repousa com tranqüilidade no ordenamento jurídico pátrio, e as razões para tanto, as quais já explicitei supra, parecem-me de maior relevo do que o propalado utilitarismo prático.

Isso porque, na minha compreensão, o reconhecimento da prescrição virtual acaba por resvalar em garantias constitucionais inafastáveis do processo penal, ferindo-as frontalmente. O devido processo legal é uma delas, cuja observância, já reconheceu o STF, deve ser observada, inclusive, nas relações de cunho eminentemente privado, no que se convencionou denominar de eficácia horizontal dos direitos fundamentais. Despiciendo dizer, pois, que no processo penal, de feição eminentemente pública, a incidência de seus preceitos é de absoluto rigor.

Não se pode olvidar, também, que o iter procedimental pode resultar em uma sentença absolutória, e o atalhamento desta marcha pode retirar do réu o seu direito a um pronunciamento judicial definitivo sobre o fato criminoso a si imputado, ou seja, de saber se é, efetivamente, culpado, ou inocente, por não ter, v. g., praticado a conduta.

A certeza de uma sentença absolutória, estou convicto disto, confere ao imputado uma sensação de justiça muito mais patente, do que o reconhecimento de que, o Estado-Juiz, diante de sua inércia, não conseguiu exercer o jus puniendi em tempo hábil.

De outro viés, deixo consignado, apenas a título de ilustração, que alguns doutrinadores da seara processual penal apontam pela viabilidade da prescrição virtual, como fundamento hábil ao reconhecimento da falta de interesse de agir, na modalidade interesse-utilidade, o que permitiria ao julgador decidir pelo arquivamento do inquérito policial, ou não recebimento da inicial acusatória, em razão da notória inutilidade da ação penal, cujo desfecho implicaria, inevitavelmente, no reconhecimento da prescrição retroativa com base na pena aplicada.

Nesse sentido, Nestor Távora e Rosmar Rodrigues Alecar nos ensinam:

Já quanto ao interesse-utilidade, este só existe se houver esperança, mesmo que remota, da realização do jus puniendi estatal, com a aplicação da sanção penal adequada. Se a punição não é mais possível, a ação passa a ser absolutamente inútil.

(…)

Em trabalho específico sobre o tema, Igor Teles Fonseca de Macedo chancela que “a prescrição em perspectiva é o reconhecimento da carência de ação (falta de interesse-utilidade), por conta da constatação de que eventual pena que venha a ser aplicada, numa condenação hipotética, inevitavelmente será abarcada pela prescrição retroativa, tornando inútil a instauração da ação penal, ou, se for o caso, a continuação da ação já iniciada”[4].

Na mesma senda, Guilherme de Souza Nucci vaticina:

(…) Segundo cremos, a prescrição virtual merece ser regulada por lei. Enquanto tal situação não se der, conforme o caso, parece-nos deva ser acolhida não para julgar extinta a punibilidade do réu, pois seria decisão ilegal, mas para determinar o arquivamento do inquérito, havendo pedido do Ministério Público, ou mesmo para rejeitar a denúncia ou queixa, por nítida falta de interesse de agir.[5]

Há também julgados nesse norte:

PENAL. PROCESSUAL PENAL. REJEIÇÃO DA DENÚNCIA. ART. 169, DO CÓDIGO PENAL. RECONHECIMENTO DA PRESCRIÇÃO PELA PENA EM PERSPECTIVA. IMPOSSIBILIDADE. OCORRÊNCIA, TODAVIA, DA PRESCRIÇÃO PELA PENA MÁXIMA EM ABSTRATO. RECURSO CRIMINAL DESPROVIDO. 1. O sistema processual penal pátrio exige que a prescrição somente possa ser regulada pela pena concretamente aplicada ou, ainda, pela sanção máxima, in abstrato, cominada ao caso em questão, inexistindo previsão legal para a prescrição antecipada, ou em perspectiva. 2. No caso dos autos, em que pese não prosperar a fundamentação pertinente ao reconhecimento da prescrição virtual, constata-se que a rejeição da denúncia merece ser mantida por outro fundamento, qual seja, pela ocorrência da prescrição da pretensão punitiva pelo máximo da pena em abstrato. 3. Considerando que o crime pelo qual o ora recorrido foi denunciado teria sido praticado em 25 de novembro de 2003 (fl. 86), e que a pena máxima cominada em abstrato para o delito é de 1 (um) ano, além da circunstância de que, nos termos do art. 109, inciso V, do Código Penal, o prazo prescricional para este montante de pena é de 04 (quatro) anos, verifica-se que em 25 de novembro de 2007 consumou-se a prescrição da pretensão punitiva pelo máximo da pena em abstrato, devendo, portanto, ser reconhecida como extinta a punibilidade do recorrido. 4. Falta, portanto, na hipótese, condição para o exercício da ação penal consistente na ausência de interesse de agir do órgão acusador, devendo, por conseguinte, ser rejeitada a denúncia, com base no art. 395, II, do Código de Processo Penal. 5. Recurso criminal não provido[6].

Este argumento, ao que observo, de fato, encontra amparo legal no art. 28, e art. 395, ambos do CPP, e afigura-se, desde meu olhar, mais subsistente do que aquele utilizado para extinguir a punibilidade, já que, neste caso, a inexistência de previsão legal é manifesta, o que, de mais a mais, encontra óbice na orientação sumulada no verbete n. 438 do STJ.

Nada obstante, sua aplicabilidade é restrita às hipóteses de rejeição da inicial acusatória e arquivamento do inquérito policial, e não se amolda ao caso vertente, cujo processo teve seu trâmite regular até antes da fase das alegações finais.

Com as considerações supra, conheço do presente recurso, para, em desacordo com o parecer da Procuradoria de Justiça, decretar a nulidade da sentença de fls. 108/110, que declarou extinta a punibilidade do apelado, com base na prescrição virtual. Por conseguinte, determino o retorno dos autos ao juízo de origem, a fim de que proceda a regular tramitação do feito.

É como voto.

Sala das Sessões da Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, em São Luís, 26 de outubro de 2010.

DESEMBARGADOR José Luiz Oliveira de Almeida

RELATOR


[1] LOZANO JR., José Júlio. Prescrição Penal. Saraiva, 2002, p. 181.

[2] TJ-MA: Recurso em Sentido Estrito n.º 006173/2010. 3ª Câmara Criminal. Rel.: Des. Benedito de Jesus Guimarães Belo. DJ: 05/07/2010.

[3] TJ-MA: Embargos de Declaração n. 005171/2010. 2ª Câmara Criminal. Rel.: Des. Raimundo Nonato de Souza. DJ: 12/08/2010.

[4] TÁVORA, Nestor. ALENCAR. Rosmar Rodrigues. Curso de Direito Processual Penal. 4. ed. JusPodivm, 2010, p. 144.

[5] NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Processo Penal e Execução Penal. 5. ed. RT, 2008, p. 193.

[6] TRF 1 – RECURSO EM SENTIDO ESTRITO – 200738100008383. Rel.: DESEMBARGADOR FEDERAL I’TALO FIORAVANTI SABO MENDES. DJ: 20/01/2009.

[7] A eficácia vertical dos direitos fundamentais é visualizada, nitidamente, nas relações entre o Estado e o Particular, daí porque o seu direcionamento vertical, “de cima para baixo”. O STF, em diversas ocasiões, reconheceu a necessária observância do devido processo legal nas relações privadas, destacando-se o recente caso de expulsão sumária de membro de uma sociedade civil, no qual não lhe foi oportunizada defesa (RE n. …..). A eficácia horizontal decorre, pois, da idéia na qual os indivíduos estão no mesmo patamar, não havendo supremacia, própria das relações do Estado com o particular.

Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

2 comentários em “Prescrição virtual e a Súmula 438, do STJ”

  1. Desembargador,
    Parabéns pelo Voto, ele está muito elucidativo.

  2. A matéria na essência da discussão é pacífica, temos então, duas correntes doutrinárias no direito pátrio em relação a prescrição virtual. Aquela que, entende que não se aplica, amparada inclusive por súmula do STJ, e a corrente vanguardista, que entende que o processo em sua tramitação incomoda, provoca constrangimentos, despesas, desorganiza, por vezes a vida do processado. Em tese é perseguir o inócuo, alimentar o sono do estado-juiz. O processo que se arrasta, se traduz em pena, e na regra geral, tudo é devido à conduta do estado. Não se deve, e permita-nos a ousadia, em defesa do devido processo legal, negar a construção do princípio doutrinário da prescrição virtual. Temos, doutrinariamente, dentre tantos outros princípios jurídicos, a construção da liminar na ordem de habeas corpus, e não se discuta sua utilidade cidadã, reparadora e justa. Igualmente o princípio doutrinário de se quitar as últimas três parcelas da obrigação alimentar para a liberdade do decreto de prisão civil pela falta de pagamento de alimentos. estes princípios não tem e nunca tiveram o preceito legal exposto nos respectivos códigos.A sensibilidade jurídica, aos que defendem a prescrição virtual, permite-lhes afirmar que o princípio do devido processo legal, se firma na aplicação dos princípios do contraditório e da ampla defesa. A falta de previsão instituída, não se traduz em ausência de observação ao princípio do devido processo legal, afinal a fonte primária do direito foram os costumes e adotamos, no direito pátrio, a construção doutrinária.Portanto, o estado-juiz deve aprimorar sua lenta máquina judicial e receber o instituto da prescrição virtual, para reparar a pena que se aplica pela existência do processo sem definição no tempo regular e com prazos fixados nos códigos vigentes. Eis então o princípio de equilíbrio, se cumpra os prazos processuais ou se aplique a prescrição virtual.

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