O magistrado, o acusado, o interrogatório, o tratamento arrogante e o direito ao silêncio

 

Cuida-se de artigo no qual reflito sobre a maneira que são tratados determinados acusados.

A seguir, antecipo um excerto do aqui refletido.

 

  1. Acho, sinceramente, uma covardia o magistrado se valer de sua condição para compelir o acusado a usar termos que não conhece, a tratá-lo, v. g., de Excelência ou meritíssimo. Essa injustificável exigência tem alimentado as piadas de mau gosto acerca da atuação de determinados juizes.
  2. Digo mais, o direito de não se auto-incriminar não fica circunscrito ao acusado. Nem mesmo a testemunha está obrigada a afirmar qualquer coisa que possa lhe incriminar. É por isso que, feita a advertência de praxe, é defeso ao magistrado obrigar a testemunha a dizer algo que possa lhe incriminar. O direito ao silêncio, devo grafar, deve ser reconhecido a qualquer pessoa relativamente a perguntas cujas respostas possam incriminá-la (nemo tenetur se detegere)
  3. O direito ao silêncio não pode ser meramente formal. Não basta ao juiz advertir o acusado de que não está obrigado a se auto-incriminar, que tem assegurado, constitucionalmente, o direito ao silêncio. É preciso muito mais. É preciso que se lhe dê condições para exercer esse direito.
  4. Não pode o direito ao silêncio ser uma quimera, uma ficção. Não passará de uma ficção, nada obstante, ser o acusado for sufocado pelo magistrado, que, mais culto, procura tirar proveito da ignorância de quem se posta à sua frente.
  5. É claro que, aqui e acolá, podemos, sim, extrapolar os limites nas nossas inquirições. Assim já procedi algumas vezes e tenho vergonha de não ter tido a capacidade de me policiar. Muitas vezes excedemos os nossos limites por circunstâncias, às vezes, insuperáveis. Afinal, somos todos seres humanos e, por isso, imperfeitos. Diante das nossas imperfeições – e da ciência delas – é que devemos nos policiar, o quanto possível for, para que esses equívocos, essas grosserias e as nossas idiossincrasias não se transformem em arbitrariedades – pura e simplesmente.

A seguir o artigo, por inteiro.


 

O princípio da presunção de inocência, com a vigente Carta Política, ganhou status constitucional [1] e “ tem fundamento na máxima de que ninguém será considerado culpado até que se prove o contrário” [2] ou, na lição de José Afonso da Silva, de que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória.” [3]

O acusado, em face desse princípio, não está obrigado a, por exemplo, se auto-acusar ou a contribuir com a sua própria incriminação. È por isso que, ao iniciar o interrogatório, tem odever de lembrar ao acusado que não está obrigado a falar e, diferente da legislação anterior, não deve adverti-lo de que seu silêncio pode ser interpretado em detrimento de sua defesa.

A Lex Magna de 1988 nada mais fez que seguir a Convenção Americana de Direitos Humanos (1969), o Pacto de São José da Costa Rica e a Convenção Americana dos Direitos e Deveres do Homem (1948). O acusado que, diante do juiz, se nega a falar, ou tergiversa, ou apresenta contradições, não deve, por isso, ser advertido, sabido que não se pode compelir o indivíduo a produzir prova contra si mesmo (nemo tenetur se detegere).

Anoto que, diante da presunção de inocência, “um dos princípios basilares do Estado de Direito como garantia processual penal, visando a tutela da liberdade pessoal”[4], tratar o acusado com rispidez, com incivilidade, com arrogância, prepotência e falta de educação, obrigá-lo a chamar a autoridade judiciária de Excelência, tratá-lo como mentiroso, ameaçá-lo com uma prisão ou condenação, é malferir, à evidência, o princípio constitucional em comento.

De nada adianta o consectário desse princípio, segundo o qual o acusado não é obrigado a falar, a colaborar com a produção de provas em seu desfavor, se é intimidado diante do magistrado, o qual, assim agindo, com essa atitude, põe o acusado em situação absolutamente desfavorável, muitas vezes colaborando, forçosamente, com a sua incriminação.

Anoto, à guisa de ressalva, que tal princípio não pode ser levado às últimas conseqüências a inviabilizar, ad exempli, uma medida de força, somente porque se lhe presume a inocência. Não é isso, definitivamente, o que se pretende nessas linhas. O que pretendo fazer refletir é que essa condição de inocência deve obstar o tratamento desumano e descortês que se inflige, muitas vezes, ao acusado, no limiar ou durante a instrução criminal.

Recordo, à guisa de ilustração, que todos os acusados, aqui no Maranhão, em face mesmo da cultura nele sedimentada, em face de um vício de linguagem, quando o juiz faz qualquer indagação, inicia a sua resposta chamando a autoridade de “rapaz”. Nessa hora, não é recomendável chamar-lhe a atenção, à conta de estar desrespeitando a Sua Excelência. Ouço falar que há juiz que, diante dessa manifestação, absolutamente irrelevante e involuntária, destituída de qualquer sentimento menor, de qualquer malícia, chama a atenção do acusado, de forma grosseira, para que o trate de Excelência ou meritíssimo. É, definitivamente, uma atitude desacertada, descabida e impertinente.

Ora, diante dessa reação da autoridade diretora do interrogatório, impondo ao réu a adoção de uma linguagem que desconhece, não há acusado, por mais experiente que seja, que não se desequilibre. Desequilibrando-se o acusado, cai por terra, no mesmo passo, os argumentos que pretendia apresentar em seu benefício, decorrendo do fato, de conseqüência, que o magistrado, agindo assim, afronta, por via oblíqua, todos os consectários do princípio da presunção de inocência.

Entendo que ao juiz não é dado o direito de tratar com rudeza o acusado, ainda que seja o mais perigoso meliante. Entendo que o juiz deve conduzir o interrogatório – sempre – com equilíbrio e educadamente, deixando o acusado absolutamente à vontade para apresentar a versão que mais lhe convier. É por isso que só inicio um interrogatório quando o acusado e seu procurador, ou defensor – dativo ou público – afirmam que tiveram tempo suficiente para, juntos, articularem a sua linha de defesa.

De nada adiante, no entanto, possibilitar a articulação da defesa, se o juiz, grosseiramente, rispidamente, conduz o interrogatório. Agindo assim, como sói ocorrer,o juiz desmonta qualquer linha de defesa e afronta, à toda evidência, a Carta Política em vigor.

Recordo que trabalhei com um(a) determinado(a) representante do MINISTÉRIO PÚBLICO, que, dentre outras coisas, se incomodava com o fato de o acusado se mexer na cadeira, para um lado e para o outro, chamando-lhe a atenção, de forma deseducada. Esse(a) mesmo(a) representante, se sentia ofendido(a) quando o acusado se dirigia a mim me tratando de “rapaz”. Queria, de qualquer forma, que eu chamasse a atenção do acusado, para que a mim fosse dispensado o tratamento de Excelência. Nunca o fiz, entrementes, exatamente para deixar o acusado absolutamente à vontade, pois que somente à vontade ele é capaz de desenvolver os argumentos de defesa. Não o fiz, não o faço – e não o farei -, ademais, porque entendo que ele não tem cultura para chamar um magistrado de Excelência ou Meritíssimo – muitos dos quais, releva dizer, nem são assim tão Excelências ou meritíssimos.

Nessa mesma linha de argumentação, entendo, de mais a mais, que não é papel do juiz, máxime num sistema garantista como o nosso, preparar armadilha para o acusado, para obrigá-lo a cair em contradição e, de conseqüência, se auto-incriminar, numa afronta, sem disfarce, do princípio da presunção de inocência. Isso pode até ocorrer, mas deve sê-lo naturalmente, não como uma estratégia tendente a induzi-lo a se auto-acusar, posto que “o direito ao silêncio e à não-incriminação não só permite que o acusado ou aprisionado permaneça em silêncio durante toda a investigação e mesmo em juízo, como impede que seja ele compelido a produzir ou contribuir com a formação da prova contrária ao seu interesse”.[5]

No interrogatório que realizei na sexta-feira passada, dia 07, v. g., observei que o acusado, desavisadamente, apresentou duas versões antípodas, para o mesmo fato e caiu em contradição outras vezes. Compreendi, na hora, que deveria permanecer calado, apenas avaliando, analisando, perscrustando, sem adverti-lo do equívoco em que incidira. Entendo que o pior comportamento do juiz, nessa hora, é advertir o acusado da contradição. Não chamei a sua atenção por isso, por ter ciência de que esse é um direito seu – de falar, de mentir, de se contradizer, de apresentar álibis inconsistentes, etc. A Constituição Federal, não é demais reafirmar, lhe assegura até o direito de mentir. Na minha avaliação, acho que o MINISTÉRIO PÚBLICO – que é parte na relação processual – pode, sim, se esse for seu interesse, levantar a questão. Acho que quem não pode e não deve fazê-lo é o magistrado. Essa análise deve ser feita, sim, ao depois, quando for examinar a prova em seu conjunto.

Costumo, é verdade, estabelecer comparação entre o que afirma o acusado em juízo e o que disse em sede administrativa. O faço, entrementes, apenas para dar a ele a oportunidade de contrapor-se à confissão extrajudicial, tomada, quase sempre, em desacordo com as mais elementares regras da educação e do trato com o semelhante – quando não mediante tortura.

No atual estágio, entendo que o magistrado não pode, direta, indiretamente – por via obliqua, por via sinuosa, por qualquer via que seja – transpor, malferir, atentar contra o direito ao silêncio. Obrigar, por exemplo, a acusado, sem qualquer formação cultural, a chamá-lo de meritíssimo, é obrigá-lo a falar sobre o que não sabe, desequilibrando-o diante da autoridade, prejudicando a sua defesa.

/>Desde o meu olhar, qualquer atitude do magistrado que exacerbe a sua relação com o acusado, que já se posta à sua frente em condições absolutamente desfavoráveis, será atentar contra o princípio da presunção de inocência. É por isso que eu, por mais grave que seja o crime, por mais perigoso que seja o acusado, trato-o com urbanidade e respeito, assegurando-lhe, com isso, o seu sagrado direito de só falar aquilo que for do interesse da defesa – sem qualquer tipo de indução e/ou pressão.

A CF estabelece, em seu artigo art. 5.º, LXIII, da Carta de 1988, que “o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado (…)”; e a Convenção Americana sobre Direitos Humanos também assegura “a toda pessoa acusada de delito (…) o direito de não ser obrigada a depor contra si mesma, nem a declarar-se culpada (…)”(art. 8.º, g). (…). Essas franquias podem ser traduzidas, também, na afirmação de que todo preso, todo acusado, tem o direito de ser tratado com urbanidade e respeito pelo juiz – e pelo Promotor de Justiça – a quem não se defere o direito de tratá-lo com rusticidade.

Já assisti, ao longo de minha vida profissional, Promotores de Justiça tratando o acusado com rispidez e grosseria, como se lhe fosse dado esse direito, como se estivesse acima dos interesses da defesa, como se a sua situação não fosse de eqüipolência com a defesa no processo. Essa atitude do MINISTÉRIO PÚBLICO malfere, noutro giro, a par conditio. Não se pode admitir que o MIISTÉRIO PÚBLICO, numa relação processual, se coloque – ou pretenda se colocar – acima da defesa, favorecendo o desequilíbrio processual.

Os profissionais que trabalham comigo sabem que, nem mesmo diante da indiferença do acusado, de sua falta de educação, de sua grosseria, saio da minha posição para humilhá-lo. Não se deve tratar o acusado que se posta à frente de um juiz, já em posição absolutamente desfavorável, com desabrimento, impolidamente. Entendo que nenhum advogado, diante do comportamento acrimonioso de um juiz, deve se calar. Deve, ao contrário, pedir para que seja consignado em ata as palavras e as atitudes desabridas de um juiz para com o seu cliente. Sob a minha ótica o acusado que confessa um crime por ter sido humilhado por magistrado, pode recorrer de eventual decisão desfavorável, alegando cerceamento de defesa.

O direito a não auto-incriminação deve ser colocado acima de eventuais idiossincrasias do julgador. Qualquer forma de coação, qualquer forma de pressão que se exerça sobre o acusado, significa a própria negação do princípio segundo o qual o acusado não está obrigado a colaborar com a sua própria incriminação. Qualquer forma de pressão, seja ela em face de uma simples descortesia, significa, na minha ótica, uma afronta ao direito de não se auto-acusar ( nemo tenetur se detegere)

Tratar o réu com grosseira, com despolidez, sem dar margem para que articule a sua defesa, sem deixar que reflita sobre determinadas indagações, equivale, mutatis, mutandis, às torturas que se faz, ainda nos dias atuais, nas Delegacias de Polícia – torturas que se exacerbam, sobretudo e principalmente, se o acusado é egresso das classes menos favorecidas, que é o que ocorre, de regra.

O magistrado – e a autoridade policial – tem que entender que haverá, quase sempre, outros meios para se chegar à reconstrução histórica dos fatos, que não seja obrigando o acusado a confessar o crime.

Acho, sinceramente, uma covardia o magistrado se valer de sua condição para compelir o acusado a usar termos que não conhece, a tratá-lo, v. g., de Excelência ou meritíssimo. Essa injustificável exigência tem alimentado as piadas de mau gosto acerca da atuação de determinados juizes.

Digo mais, o direito de não se auto-incriminar não fica circunscrito ao acusado. Nem mesmo a testemunha está obrigada a afirmar qualquer coisa que possa lhe incriminar. É por isso que, feita a advertência de praxe, é defeso ao magistrado obrigar a testemunha a dizer algo que possa lhe incriminar. O direito ao silêncio, devo grafar, deve ser reconhecido a qualquer pessoa relativamente a perguntas cujas respostas possam incriminá-la (nemo tenetur se detegere)

O direito ao silêncio não pode ser meramente formal. Não basta ao juiz advertir o acusado de que não está obrigado a se auto-incriminar, que tem assegurado, constitucionalmente, o direito ao silêncio. É preciso muito mais. É preciso que se lhe dê condições para exercer esse direito.

Não pode o direito ao silêncio ser uma quimera, uma ficção. Não passará de uma ficção, nada obstante, ser o acusado for sufocado pelo magistrado, que, mais culto, procura tirar proveito da ignorância de quem se posta à sua frente.

É claro que, aqui e acolá, podemos, sim, extrapolar os limites nas nossas inquirições. Assim já procedi algumas vezes e tenho vergonha de não ter tido a capacidade de me policiar. Muitas vezes excedemos os nossos limites por circunstâncias, às vezes, insuperáveis. Afinal, somos todos seres humanos e, por isso, imperfeitos. Diante das nossas imperfeições – e da ciência delas – é que devemos nos policiar, o quanto possível for, para que esses equívocos, essas grosserias e as nossas idiossincrasias não se transformem em arbitrariedades – pura e simplesmente.

O Supremo Tribunal Federal já decidiu, reiteradas vezes, “o privilégio contra a auto-incriminação – nemo tenetur se detegere -, erigido em garantia fundamental pela Constituição – além da inconstitucionalidade superveniente da parte final do art. 186 C.Pr.Pen. – importou compelir o inquiridor, na polícia ou em juízo, ao dever de advertir o interrogado do seu direito ao silêncio”[6] . Mas, devo dizer, não basta a simples advertência. É necessário que esse direito seja, na prática, verdadeiramente, respeitado. O magistrado que faz a advertência, como mera formalidade, para, depois, na prática, inviabilizar esse direito, age em desacordo com a Constituição Federal. E nada mais repugnante de que um magistrado agindo em desacordo com a Constituição do seu país – mesmo estatuto que jurou defender.

O magistrado não pode tratar o acusado, ainda não julgado, como se condenado fosse. Esse é a lição que deve ser tirada do princípio da presunção de inocência. Essa tem sido a posição dos nossos Sodalícios, à frente o Supremo Tribunal Federal, que já proclamou, repetidas vezes, que “Ninguém pode ser tratado como culpado, qualquer que seja a natureza do ilícito penal cuja prática lhe tenha sido atribuída, sem que exista, a esse respeito, decisão judicial condenatória transitada em julgado. O princípio constitucional da não-culpabilidade, em nosso sistema jurídico, consagra uma regra de tratamento que impede o Poder Público de agir e de se comportar, em relação ao suspeito, ao indiciado, ao denunciado ou ao réu, como se estes já houvessem sido condenados definitivamente por sentença do Poder Judiciário.[7]

Lembro que quando era estudante estive numa audiência em vara criminal e ouvi o magistrado de então lançar impropérios contra um acusado, em face de não colaborar com a apuração do crime, chamando-o de mentiroso e coisas que tais. Essa atitude se deu há muitos anos, é verdade, mas, ao que tenho noticia, ela não tem sido de todo estranha nos dias atuais. Há, até, quem ameace com prisão a atitude do acusado de não colaborar com a sua incriminação, tendo tido a oportunidade o Supremo Tribunal Federal, por causa disso, de afirmar que “A garantia constitucional do silêncio encerra que ninguém está compelido a auto-incriminar-se. Não há como decretar a preventiva com base em postura do acusado reveladora de não estar disposto a colaborar com as investigações e com a instrução processual” [8]

É truísmo, mas reafirmo que o réu tem o direito ao silencio, direito assegurado em nossa Carta Política. Reafirmo, demai
s, que o acusado deve ser lembrado, às claras, desse direito. O inquiridor, na Polícia ou na Justiça, tem o dever de advertir o acusado e de documentar a advertência, sob pena de nulidade do ato.

De nada vale, contudo, afirmar a existência desse direito, documentar formalmente a advertência, e, no mesmo passo, negá-lo com arrogância e prepotência. Lembrar o réu do seu direito ao silencio, mas agir em detrimento desse mesmo direito, equivale a negá-lo, a não adverti-lo, devendo esse ato, por isso mesmo, ser anulado. [9]

O direito ao silêncio, segundo o Pretório Excelso,se “traduz direito público subjetivo assegurado a qualquer pessoa, que, na condição de testemunha, de indiciado ou de réu, deva prestar depoimento perante órgãos do Poder Legislativo, do Poder Executivo ou do Poder Judiciário. – O exercício do direito de permanecer em silêncio não autoriza os órgãos estatais a dispensarem qualquer tratamento que implique restrição à esfera jurídica daquele que regularmente invocou essa prerrogativa fundamental. Precedentes. O direito ao silêncio – enquanto poder jurídico reconhecido a qualquer pessoa relativamente a perguntas cujas respostas possam incriminá-la (nemo tenetur se detegere) – impede, quando concretamente exercido, que aquele que o invocou venha, por tal específica razão, a ser preso, ou ameaçado de prisão, pelos agentes ou pelas autoridades do Estado. – Ninguém pode ser tratado como culpado, qualquer que seja a natureza do ilícito penal cuja prática lhe tenha sido atribuída, sem que exista, a esse respeito, decisão judicial condenatória transitada em julgado. O princípio constitucional da não-culpabilidade, em nosso sistema jurídico, consagra uma regra de tratamento que impede o Poder Público de agir e de se comportar, em relação ao suspeito, ao indiciado, ao denunciado ou ao réu, como se estes já houvessem sido condenados definitivamente por sentença do Poder Judiciário.”[10]

Da decisão suso retiro, à guisa de reforço, dos argumentos emoldurados nesse artigo, o excerto em que o Excelso Pretório afirma que “ o exercício do direito de permanecer em silêncio não autoriza os órgãos estatais a dispensarem qualquer tratamento que implique restrição à esfera jurídica daquele que regularmente invocou essa prerrogativa fundamental.” É dizer, nenhum juiz está autorizado a tratar o acusado como se condenado fosse, restringindo o seu sagrado direito de permanecer calado. A nenhum juiz é dado o direito de menosprezar um acusado, de tratá-lo com veemente indelicadeza, a ponto de constrangê-lo, malferindo, afrontando, à toda prova, o princípio da presunção de inocência, uma das maiores conquistas das sociedades democráticas.

Ainda há tempo daqueles que se utilizam do poder para ameaçar, espezinhar, afrontar determinado acusado, valendo-se de suas prerrogativas, rever os seus conceitos.

NOTAS E REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

[1] CF, art. 5º, omissis.

LVII – ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória.

[2] Araújo, Luiz Alberto Davi e NUNES JUNIOR, Vidal Serrano. Curso de Direito Constitucioal, editora Sraiva, 1998, p. 108.

[3] SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo, 24ª edição, Malheiros Editores, 2004, p. 441.

[4] MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional, editora Atlas, 18ª edição, 2005, p. 103.

[5] OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal, Del Rey, 4ª edição, 2005, p.18.

[6] HC 80949 / RJ – RIO DE JANEIRO HABEAS CORPUS Relator(a): Min. SEPÚLVEDA PERTENCE Julgamento: 30/10/2001 Órgão Julgador: Primeira Turma Publicação: DJ 14-12-2001 PP-00026 EMENT VOL-02053-06 PP-01145 RTJ VOL-00180-03 PP-01001

[7] HC 79812 / SP – SÃO PAULO HABEAS CORPUS Relator(a): Min. CELSO DE MELLO Julgamento: 08/11/2000 Órgão Julgador: Tribunal Pleno Publicação: DJ 16-02-2001 PP-00021 EMENT VOL-02019-01 PP-00196

[8] STF – 1ª TURMA – HC 83.943-6 – Rel. Min. Marco Aurélio DJ 17/09/04). No mesmo sentido: TRF 2ª R. – HC 2004.02.01.012582-7 – 5ª T. – Rel. Des. Fed. Raldênio Bonifacio Costa – DJU 16.12.2004 – p. 212

[9] HC 82463/MG-MINAS GERAIS HABEASCORPUS Relator(a): Min.ELLENGRACIE Julgamento: 05/11/2002Órgão Julgador: Primeira Turma Publicação: DJ 19-12-2002 PP-00092 EMENT VOL-02096-04 PP-00745

 

[10] HC 79812 / SP – SÃO PAULO HABEAS CORPUS Relator(a): Min. CELSO DE MELLO Julgamento: 08/11/2000 Órgão Julgador: Tribunal Pleno Publicação: DJ 16-02-2001 PP-00021 EMENT VOL-02019-01 PP-00196

Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

12 comentários em “O magistrado, o acusado, o interrogatório, o tratamento arrogante e o direito ao silêncio”

  1. Dr. José Luiz:

    parabéns pelo artigo. O senhor demonstrou muita sensibilidade neste artigo, qualidade que falta a muitos operadores do direito neste ato processual que considero tão importante para o acusado.
    Sou defensor público do Estado de SP e atuo privativamente em vara criminal de conhecimento.
    Dia a dia, noto distorções no modo que é conduzido o interrogatório e passo a descrever alguns.
    1) tratamento diferente quando o acusado é pobre ou rico; 2) a ausência de entrevista reservada entre o acusado e seu defensor (já flagrei promotor de justiça esticando o pescoço para ouvir a conversa); 3) a retirada dos coacusados da audiência, nos termos do – inconstitucional – artigo 191, CPP; 4) a falta de diferenciação entre confissão dos fatos e confissão da versão apresentada na denúncia, ou seja, com a classificação provisória (presenciei uma confissão da posse da droga, mas não do dolo de tráfico, não sendo considerado pela sentença condenatória como circunstância atenuante, apesar das palavras do acusado serem usadas como argumento para a condenação); 5) o descaso com a primeira parte do interrogatório, sobre a pessoa do acusado, o que poderia demonstrar, em muitos casos, o porquê da personalidade e conduta social do acusado (abusos na infância, pobreza extrema etc.); 6) abuso de artifícios falaciosos como o argumento das duas vias, ou seja, “o senhor cometeu o crime sem querer?” (ou seja, por querer ou sem querer, cometeu o crime, induz a reconhecer a prática do crime); 7) a transferência do ônus da prova, que seria naturalmente do MP em provar a pretensão punitiva concreta, o juiz esgota a temática sob o fundamento de descoberta da verdade real, que para muitos, inclusive para mim, não passa de um mito e um pretexto para encobrir abusos na instrução.
    Em suma, estes são alguns pontos que considero patológicos no interrogatório, além daqueles que o Senhor já descreveu em seu excelente artigo.
    Estou escrevendo sobre os limites do interrogatório policial no momento da prisão, em especial, pelos policiais militares em face do direito ao silêncio e do direito de não produzir prova contra si. Depois envio o link para sua análise.
    Cordialmente,
    Sidnei F Neves

  2. Li e refleti sobre as suas colocações. Muito bem pensadas, por sinal
    um abraço

  3. Parabéns Doutor, pelo seu artigo, o senhor é a autoridade máxima na área do Direito, e sabe ser humano.

  4. Parabéns pelo artigo! Mais do que ressaltar a posição de garante do JUIZ no Processo Penal de natureza acusatória, penso que esse artigo é uma demonstração de humildade e respeito pelo seres humanos como um todo, mesmo em relação aqueles que, em face de sua condutas desajustadas, talvez não merecessem esse tratamento.
    Advogada no RS.

  5. tenho cinquenta e dois anos de idade e vinte anos de Oficiala de Justiça, convivendo no dia a dia com a desigualdade social e cultural, sem entender onde se encaixa A CONSTITUIÇÃO em todo esse contexto, e finalmente vejo falar de humildade. Qualidade rara entre os magistrados. É, acho que estava errada, preciso mudar meus conceitos, o mundo ainda tem jeito, existe ainda Juiz que sabe que não é “DEUS”.

  6. tenho cinquenta e dois anos de idade e vinte anos de Oficiala de Justiça, convivendo no dia a dia com a desigualdade social e cultural, sem entender onde se encaixa A CONSTITUIÇÃO em todo esse contexto, e finalmente vejo falar de humildade. Qualidade rara entre os magistrados. É, acho que estava errada, preciso mudar meus conceitos, o mundo ainda tem jeito.

  7. Muito Obrigado por essa brilhante reflexão! Eu estou sendo processado por um crime que eu não cometi, enquadrado na Lei Maria da Penha, e o caso será presidido por uma Juiza de Direito! Isso estava me deixando muito inseguro, mas graças a DEUS o senhor me deu ótimas orientações!

  8. Nem doutores alguns juízes não podem ser chamados pq não possuem o título de doutorado. São poucos que possuem. Pouquíssimos.
    Muito usam erroneamente o termo como pronome de tratamento.

  9. Muito bem explicado Dr.José Luiz parabéns. Recentemente em AIJ o juiz compeliu o acusado a se auto incriminar, dizendo que se não o fizesse sua pena seria maior, e se fizesse seria menor. No final, disse que sentenciou na pena maxima por que o acusado não confessou o crime, achei isso um absurdo da parte do magistrado. No final, saiu dizendo que policiais, MP, juizes são todos injustos, e somente advogados com seus criminosos ão justos, achei de uma deselegância da parte dele, não precisava fazer isso. Lembramos que todo acusado tem o direito a ampla defesa, mas muitos magistrados lhes tiram este direito. Inclusive, querem tirar o direito do próprio advogado de trabalhar.

  10. Boa noite Dr. José Luiz, gostei muito do artigo! Tive uma audiência na vara da infância, pelo motivo de ter obtido a guarda provisória de uma criança de 6 anos com o objetivo de adotá-la, mas após dois meses de convivência procurei a vara da infância com o intuito de devolvê-la, argumentando que a convivência estava muito difícil com a família e principalmente pelo motivo das agressões (socos, mordidas, pontapés, tentativa de estrangulamento e empurro~es fortes) que ele envidava contra meu outro filho também adotado de 5 anos, não eram brigas entre os dois, mas em brincadeiras onde o de 6 anos perdia. Na audiência pedi o direito de me explicar, onde me foi dito que não era necessário pelo magistrado, que não era necessário, uma vez que não éramos obrigados a ficar com a criança e que não importava o motivo da devolução, mas sim os agravaos provocados por este ato. o Magistrado nos disse a mim e a meu marido que isso que fizemos mais uma rejeição era pior que a morte para a criança, era um homicídio, e ainda pior que isso, pois quem morre, após morrer não sente mais nada e ele iria levar esse trauma para a vida adulta. A promotora de justiça, disse que essas ocorrências eram normais, seus filhos biológicos também agiam assim e que seriamos desligados do cadastro nacional de adoção, pois entendiam ela promotora, a psicóloga e a assistente social da vara da infância, que nós não éramos capazes de ser pais de mais de um filho e que a respeito do filho que nós já temos estavam muito preocupadas se conseguiríamos ser bons pais , mas que sobre isso nada poderiam fazer. Toda a audiência ocorreu em clima animoso, onde eu e meu marido nos sentimos, humilhados, coagidos, como formiguinhas frente a gigantes. Aceitamos tudo que nos foi imposto não tentamos nos defender frente a tudo que nos disseram, pois era evidente a arrogância, recriminação pelo nosso ato e também a intolerância ao ouvir as resposta que eles nos dirigiam. O Juiz nos disse que tanto as medidas imposta quanto os valores que seremos obrigados a ressarcir não poderiam ser questionados. Imputaram a nós a obrigação do pagamento da assitência psicológica e neuropsiquiátrica até que fosse necessário, pelos melhores profissionais que a vara da infância iria indicar, pois, que na rede plública não havia profissionais competentes para o atendimento da criança. E uma vez que tomamos a liberdade arbitrariamente de procurar um psiquiatra que introduziu medicamento para Hiperatividade, que foi o diagnóstico dado pelo psiquiatra e que a promotora disse duvidar desse diagnóstico e queria uma nova avaliação com um neuropsiquiatra infantil. Gostaria de um esclarecimento sobre a condução dessa audiência, de acordo com oque eu estou lhe colocando. Pois pensava que o motivo da devolução era de interesse na audiência e ainda que eu tinha o direito de me pronunciar a respeito do porque da decisão tomada por mim. Agradeço.
    aguardando uma resposta ansiosamente.

    Elaine C. Rossi

  11. Porto Alegre, 21/05/2018.
    Dr. José Luiz Oliveira de Almeida: Tenho procurado na internet resposta a profundo desconforto que me persegue desde o dia em que estive em audiência judicial, por conta de ato infracional, cometido à guisa de brincadeira, por meu filho de 13 anos e colega seu, em conjunto, contra outro colega dois dois, em sala de aula, presente o professor. Esse ato consistiu na manutenção de um lápis, na posição vertical, a fim de que o terceiro colega, ao sentar, sentisse a presença do lápis e imediatamente pulasse para cima, levando um susto. Era uma brincadeira. Os três, aliás, eram tidos por “os 3 melhores amigos”. A brincadeira deu errado. O lápis penetrou um tanto na região peri-anal. Houve internação hospitalar por 3 dias. Houve risco de comprometimento da saúde(intestinal, articular), depois totalmente afastado, conforme provou laudo do IML. Na sequência, a mãe do menino vítima, em desespero, registrou BO na Delegacia própria. Saltando para o momento da audiência, em 17/05/2018, vem minha atormentação: O primeiro dos meninos a comparecer à sala de audiência, com seu pai, frente ao juiz foi o menino que segurou o lápis sobre o assento da cadeira(não o meu filho). O Promotor não esteve presente durante aquela inquirição. O menino saiu da audiência absolutamente tranquilo, como se não houvesse participado de nenhum ato daquela magnitude. Logo em seguida, meu filho foi chamado à sala de audiência em minha companhia bem como do advogado. O Promotor não estava na sala ainda. O juiz deu início aos trabalhos. Meu filho falou. O Juiz pediu que eu falasse. Eu estava falando, quando irrompeu o Promotor na sala, cerca de 10 min depois. Logo a seguir, fui interrompido, o Promotor dirigiu-se ao meu filho indagando e meio afirmando de chofre: “a intenção era sexual, de humilhar a vítima?” Que meu filho “tinha tido a intenção de fazer o lápis penetrar no canal anal da vítima”. Meu filho, depois do susto inicial, reagiu bravamente àquele adulto insensível dizendo “não, era uma brincadeira, prá quando ele sentisse o lápis, saltar de pé” e não era prá acontecer nada”. Desesperei-me. Reagi com gestos. Senti-me explodindo. Nada falei. E pensei e penso, de onde foi possível ao Promotor extrair aquela ideia tresloucada e atirar de chofre sobre o meu filho, que transita entre a escola e a casa ou a qualquer outro lugar, sempre ou quase exclusivamente conduzido por mim ou minha esposa? Como eu disse antes os infratores são dois. Só que os dois se chamam Rodrigo. Dos relatos do meu filho, temos que o Rodrigo que segurou o lápis, também convidou meu filho a emprestar a ele um lápis para que ele executasse a brincadeira de segurar o lápis. Meu filho nunca se eximiu de haver participado da combinação, e efetivamente, afirma que emprestou o lápis. Mais que isso, meu filho afirma e afirmou sempre, solidariamente ao Rodrigo que segurou o lápis, que a ação foi conjunta dos dois Rodrigos, não obstante diferentes as participações. Ainda,o Rodrigo que propôs a brincadeira e segurou o lápis não foi interrogado pelo Promotor porque o Promotor não estava presente no momento de sua audiência. Por outro lado, meu filho, o Rodrigo que estendeu o lápis ao outro Rodrigo, foi duramente e cruelmente inquirido pelo Promotor. O Promotor, ao que parece, quando inquiriu meu filho achava que estava inquirindo o outro Rodrigo(o que segurou o lápis na posição vertical). Parece que cometeu o crasso erro de pessoa. Fiquei com a impressão de que o Promotor, ao chegar atrasado, pegou o bonde andando, não entendeu o que estava acontecendo, tentou se aprumar perante o Juiz, foi socorrido depois de algum tempo pelo técnico judiciário que lhe esclareceu haver dois Rodrigos como infratores, e, perdido, agiu de forma opressora sobre o meu filho de 13 anos. Vê-se aí o exagero de um adulto, Autoridade que deveria proteger a criança, atacando-a por conta dos erros desse mesmo Promotor, que chegou atrasado, que não sabia quem era quem na condição de infrator e que viu absurda vinculação sexual naquilo que não passou de mera brincadeira, sem qualquer base factual capaz de permitir intenção de atingir objetivo sexual ou de humilhação. Aliás, na própria representação, o Promotor, faz a capitulação como “lesão corporal”, sem nunca haver aventado, nem de leve, qualquer conotação sexual para o lamentável fato que decorreu da brincadeira indevida. Fiquei profundamente amargurado com a violência e opressão que presenciei ser praticada pelo Promotor contra o meu filho, seja porque a hipótese sexual jamais existiu, seja porque o Promotor, desidioso, não se deu conta de que as perguntas e insinuações que dirigiu ao meu filho, que apenas passou o lápis ao seu colega(Rodrigo) não cabiam, por óbvio. Sem falar, claro, que a hipótese flagrantemente exuberante e despropositada do Promotor, teria escassa possibilidade de êxito se alguém a tentasse, pelo simples fato de que o ato de segurar um lápis sobre a cadeira onde outro sentaria está longe de gerar o fim imaginado pelo Promotor de fazer o lápis introduzir-se pelo canal anal adentro. Completa falta de senso do Promotor!!! Então, Dr. José Luiz, inspirado no seu magnífico texto marcado pelo respeito humano que todos devem merecer, mormente as crianças, penso eu, resolvi escrever este comentário, pois notei, nas minhas buscas na internet, que a temática do desvio comportamental, ético e talvez legal por parte de promotores, não é fácil de ser encontrado. Parece até que são perfeitos. Se não são, é mister provocar a discussão. Fala-se muito mal e critica-se muito a Polícia e seus servidores, de quem a propósito, meu filho e eu recebemos tratamento exemplar. Sobre o comportamento impróprio e desviado de Promotores pouco se fala. Ao deixar este comentário tenho a esperança de que eu possa receber subsídio no meu propósito de lavrar em breve meu protesto junto à Corregedoria do Ministério Público ao qual está afeto o Promotor do caso que relatei. A propósito, como se diz, Deus é Pai, pois o Juiz da referida audiência mostrou-se um ser humano pleno de virtudes de respeito e consideração para comigo, para com as pessoas em geral, e, em particular para com o meu filho menor de idade, que, como também percebeu o Juiz, foi humilhado pelo Promotor. O Promotor, não ganhou a causa e não levou. Foi inapelavelmente derrotado pela decisão que sobreveio, da lavra do Juiz, que encaminhou pela conciliação, já que, as crianças são os três melhores amigos, e, os pais, por isso, também o são, de longa data. Porto Alegre, 21/05/2018. Cesar Pedroso Pacheco.

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