Pela adoção de critérios objetivos(amplos) para promoção por merecimento no âmbito do Poder Judiciário

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“[…]É por isso que, na minha visão, a aferição da produtividade de um magistrado deve ser feita, repito, a partir do conjunto da sua obra; nunca, sob qualquer fundamento, apenas em relação aos dois últimos anos que antecederem à promoção.

O mais temerário critério, reafirmo, sem temer pela exaustão, é avaliar um magistrado apenas pelo que produziu nos últimos dois anos que antecederam à promoção, olvidando-se da sua história. Isso, a meu sentir, pode estimular o ócio e, até, a esperteza. E a ociosidade e esperteza, no pior sentido da palavra, não podem ser apanágio de um magistrado, não podem definir uma promoção por merecimento.

O magistrado que, ao longo de sua carreira, teve uma ação linear, pautada na retidão e no desvelo, não pode ficar em situação de inferioridade, apenas porque, nos dois anos anteriores à promoção, prolatou menos sentenças que aquele que deixou para fazê-lo apenas por conveniência dessa mesma promoção[…]”

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Desde que fui promovido para a Corte da Justiça, tenho refletido, com insistência, acerca dos critérios para promoção por merecimento no âmbito do Poder Judiciário, por entender que os critérios atualmente aceitos não são suficientes para os fins colimados.

De qualquer sorte, insta consignar, com a necessária ênfase, que tenho assistido, por ocasião das promoções por merecimento, à observância, por todos os colegas, de dados objetivos, fornecidos pela Corregedoria, o que, convenhamos, já foi um avanço memorável, pois que desobriga o juiz da odiosa prática de pedir votos aos desembargadores.

De rigor, posso dizer, salvo alguma exceção, os promovidos têm sido os mais operosos, pelo menos à luz do que tem sido possível avaliar, à falta de dados mais pormenorizados.

O certo e recerto, ao que tenho vivenciado, é que a aferição da qualificação e da produtividade de um magistrado, para os fins de promoção por merecimento, não é tarefa fácil, e pode, até, em alguns casos, não ser a mais apropriada. Em face dessa constatação/inquietação, depois de ter avalizado incontáveis promoções, pude concluir que a avaliação de um magistrado para fins de promoção por merecimento, deve ser feita considerando o conjunto da sua obra, de sua história na instituição, e não diante dos frios dados estatísticos circunscritos a um determinado período de sua ação judicante.

Deve-se, a meu sentir, além do que se faz nos dias atuais, rastrear, esmiuçar, com o necessário rigor, a sua conduta pessoal – até onde importe para os fins almejados – e a sua atuação profissional nas comarcas pelas quais passou. É de especial relevância, dentre outras, a informação acerca da fixação de residência no seu local de trabalho, conforme estabelece a CF. Nesse sentido, entendo que o juiz que não mora na comarca e que, por isso, passa a maior parte do tempo noutra cidade, deveria, de pronto, ser alijado de promoção por merecimento.

Vou além. É preciso excogitar, no exame da produtividade, por que um determinado magistrado deixou para produzir, com espantoso desvelo, exatamente nos dois anos que antecedem a promoção por merecimento, quando, ao longo dos anos pretéritos, deixou de fazê-lo com a mesma intensidade. Nessa linha de pensar, não se pode descurar que pode ocorrer, sim, de um magistrado/candidato acumular processos para sentença, optando por julgá-los apenas no período anterior à promoção, ou seja, nos dois anos que a antecedem, ou seja, exatamente por ocasião da coleta dos dados estatísticos.

É por essas e outras questões que entendo mais do que relevante que a promoção por merecimento de um magistrado se faça à luz de sua história na instituição, à luz do conjunto de sua obra; nunca, portanto, em face apenas de um determinado período, pouco importando se exista legislação fixando esse marco temporal.

De tudo o que acima expus, pode-se chegar a seguinte conclusão: nem sempre quem mais prolata sentenças nos anos imediatamente anteriores à promoção é, necessariamente, o magistrado mais operoso e, por isso, mais merecedor da promoção pelo critério de merecimento. Só a história do magistrado e dos processos em curso na sua vara – ou comarca -, com efeito, terá o condão de dizer da sua produtividade, da qualidade do seu trabalho, do seu esmero e dedicação. É dizer: só o conjunto da obra de um magistrado será capaz de retratar, com o mínimo de fidedignidade, ser ou não ser ele merecedor de uma promoção por merecimento.

É por isso que, na minha visão, a aferição da produtividade de um magistrado deve ser feita, repito, a partir do conjunto da sua obra; nunca, sob qualquer fundamento, apenas em relação aos dois últimos anos que antecederem à promoção.

O mais temerário critério, reafirmo, sem temer pela exaustão, é avaliar um magistrado apenas pelo que produziu nos últimos dois anos que antecederam à promoção, olvidando-se da sua história. Isso, a meu sentir, pode estimular o ócio e, até, a esperteza. E a ociosidade e esperteza, no pior sentido da palavra, não podem ser apanágio de um magistrado, não podem definir uma promoção por merecimento.

O magistrado que, ao longo de sua carreira, teve uma ação linear, pautada na retidão e no desvelo, não pode ficar em situação de inferioridade, apenas porque, nos dois anos anteriores à promoção, prolatou menos sentenças que aquele que deixou para fazê-lo apenas por conveniência dessa mesma promoção.

Diante dessas considerações, impende indagar: E a história do magistrado na instituição? E os anos de dedicação? E a dedicação full time? E a fixação de residência na comarca? E a assistência em tempo integral à população, ao cidadão? E os projetos sociais que realiza? E a excelência de suas decisões? E forma elegante e cortês com que trata as partes envolvidas no conflito? E a sua pontualidade? E a sua credibilidade e respeitabilidade junto à comunidade? E o esmero com que decide? E o fato de realizar audiência, de segunda a sexta, pela manhã e pela tarde? Isso tudo não vale?

É justo, a partir dessas reflexões, promover quem só produziu significativamente nos dois anos que antecedem à promoção, em detrimento do(a) candidato(a) que dedicou toda a sua vida ao trabalho?

Acredito que a produtividade de um magistrado, candidato à promoção por merecimento, só pode ser aferida, em toda a sua dimensão, se a Corregedoria se determinar pela realização de uma avaliação criteriosa na vara – ou comarca – da qual é titular e, também, nas comarcas – ou varas – pelas quais passou. Essa avaliação, releva dizer, não é inviável, e pode ser feita com o necessário vagar, sem açodamento, sem preocupação em promover com muita brevidade; nesse caso, a demora seria por uma boa causa.

Na aferição da produtividade, digo mais, não se pode deixar de atentar para as peculiaridades de cada vara, juizado ou comarca, razão pela qual entendo que, primeiro, deve ser feita uma avaliação por área. Os juízes das varas de família, por exemplo, devem ser avaliados conjuntamente; não podem ser avaliados com a adoção dos mesmos critérios de avaliação que se adotam para um juiz de uma vara criminal. Em seguida, ou concomitantemente, avultam de importância a pontualidade, o nível intelectual, o aperfeiçoamento técnico, o tempo despendido para prolatar uma decisão, para o lançamento de um despacho ordinatório, para entrega do provimento judicial, as sentenças eventualmente anuladas, o número de audiências designadas e realizadas, dentre outros.

Com as considerações expostas – não exaustivamente, registre-se – , reafirmo que, desde a minha avaliação, se a produtividade dos magistrados não for realizada com critérios objetivos mais amplos, que envolvam a sua história na instituição, pode ocorrer de os dados coligidos não traduzirem, fielmente, a verdade, disso resultando que pode, sim, ocorrer de um magistrado menos dedicado ser promovido, em detrimento daquele cuja história registra ter se dedicado devotado integralmente a difícil tarefa de julgar.


TEXTO REPUBLICADO, EM FACE DAS INCORREÇÕES CONSTATADAS NA PRIMEIRA PUBLICAÇÃO.

Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

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