O dia-a-dia de um magistrado

CAPÍTULO VI

Por diversas vezes, estou cansado de dizer, tenho buscado, junto à Corregedoria, solução para a falta de oficial de justiça nesta 7ª Vara Criminal. De lá não consigo nenhuma manifestação. A mim de tem sido dado o silêncio como resposta.
Pese o exposto, vou prosseguir, pois que não sei ficar inerte, ainda que saiba que nada farão para solucionar o problema.
Mais uma semana se vai, sem que eu produza o que estava acostumado a fazer. Os réus continuam sendo libertados, por excesso de prazo.
Ainda recentemente encaminhei mais um ofício à Corregedoria, onde demonstro minha indignação com a falta de providências.
Leia, a seguir, o ofício em comento e tire as suas conclusões.


“Ofício nº 1139 /2006-GJD7VC São Luís, 04 de março de 2006

EXCELENTÍSSIMO SENHOR
RAIMUNDO FREIRE CUTRIM
CORREGEDOR-GERAL DA JUSTIÇA
NESTA
Dirijo-me a Vossa Excelência, pela quarta vez, para pedir a designação de mais uma oficial de justiça a esta vara, em face de contar com apenas um meirinho, o que tem inviabilizado a realização de audiência, desse fato decorrendo inexorável excesso de prazo, em razão do que já determinei a soltura de vários acusados – não por vindita, mas em face da injustiça de sua prisão, sem uma resposta, a tempo e hora, do Estado.

Pese os três ofícios anteriores, daí não recebi qualquer manifestação.
Desde a minha visão, entendo que, se houvesse boa vontade, poder-se-ia designar um funcionário para suprir a falta do meirinho, até que se resolvesse a questão em caráter definitivo.
É preciso compreender que exercemos uma atividade pública e que o jurisdicionado não deve ser penalizado em face da omissão dessa ou daquela autoridade.
Na semana passada, designadas 22(vinte e duas) audiências – processos nºs 1568/2003, 21436/2005, 5852/2005, 11303/2002, 14776/2003, 1954/2005, 81/2006, 1963/2005, 8080/2005, 19661/2005, 3082006, 8780/2004, 7006/03, 13744/03, 19054/05, 17732006, 17922/2003, 11077/2005, 5323/2005, 9429/2005, 9429/05 e 23742006 – só realizei duas, à falta de condições de trabalho.
Nesta vara o caos está estabelecido! É uma pena. Tanto lutei para moralizá-la!
O povo tem razão! Nós não merecemos o que ganhamos!
A persistir essa situação, vou ser obrigado a colocar em liberdade os mais de oitenta réus presos, por excesso de prazo.
Segue junto a relação de mandados em poder do oficial de justiça e a relação de audiências para o período de 04/04 a 30/04.
Espero que estas duas relações causem algum impacto.
Fico no aguardo da manifestação de Vossa Excelência.
Cordialmente,
Juiz José Luiz Oliveira de Almeida
Titular da 7ª Vara Criminal ”
O ofício acima, malgrado vazado em termos contundentes, não mereceu, a exemplo dos demais, nenhuma resposta.

Dia 03 do corrente encaminhei mais um ofício, nos termos abaixo:

“Ofício nº 177 /2006-GJD7VC. São Luís, 03 de maio de 2006

EXCELENTÍSSIMO SENHOR
RAIMUNDO FREIRE CUTRIM
CORREGEDOR-GERAL DA JUSTIÇA
NESTA
Tenho o dever, ainda que contrariado, de, mais uma vez, dizer-lhe que a 7ª Vara Criminal é, hoje, um exemplo PRONTO e ACABADO do que é a JUSTIÇA no nosso país – capenga, lenta e desacreditada Aqui está tudo parcialmente parado. O único oficial de justiça quase nada produz. Alega falta de condições de trabalho. Já estou agastado de tanto cobrar-lhe resultado. Os processos, de conseqüência, estão parados; os réus, por isso mesmo, estão ganhando a sua liberdade de volta. Aqui não se conclui instrução; aqui não se julga.

Os acusados, disse-o acima, muitos deles perigosos, estão vendo restituída a sua LIBERDADE. Esses mesmos acusados podem – quiçá não aconteça! – nos assaltar na próxima esquina. Nessa hora, ver-se-á o clamor por JUSTIÇA. Nessa hora, lamentar-se-á a omissão das autoridades. Nessa hora, constatar-se-á como dói querer, buscar e não encontrar JUSTIÇA – a tão sonhada JUSTIÇA que, sob minha ótica, é uma QUIMERA.
Ainda tenho a esperança de que se resolvam os problemas da 7ª Vara, que está a reclamar, tão-somente, a designação de mais um oficial de Justiça. É uma decisão tão simples, mas que parece irrealizável, à falta de boa vontade, na minha avaliação.

Devo anotar que, por princípio, não sou de desistir. Sou dura na queda. Não adianta a falta de atenção para com as minhas reivindicações, pois que as farei, reiteradamente, iterativamente, até que se resolva a questão; que que elas terão eco um dia.
Impende consignar que não vou permitir que desconstruam o meu nome dessa forma. Lutei parte da minha para dar dignidade à 7ª Vara Criminal, para, agora, assistir, indignado, a desconstrução de tudo que edifiquei, sem nenhuma perspectiva de solução, que, sob a minha viseira, é simples, muito simples – simplória, até.
A mim não me interessa quais sejam os culpados pela omissão. A mim pouco importa de onde parte a decisão de nomear. Entendo que tenho o DEVER de externar a minha inquietação à CORREGEDORIA, que é a quem se defere, afinal, de lege lata, o poder fiscalizador.
Com essas colocações, fico, ainda desta feita, no aguardo de que Vossa Excelência leve a questão ao conhecimento do Excelentíssimo Senhor Presidente do Tribunal de Justiça.
Fico no aguardo de, pelo menos, um aceno.
Cordialmente,
Juiz José Luiz Oliveira de Almeida
           Titular da 7ª Vara Criminal”

Você, caro leitor, tem esperança que façam alguma coisa para mudar esse quadro?


Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

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