Tortura não mais

“[,,,]Criminosos, por piores que tenham sido seus crimes, têm direito à Justiça, ao respeito e a um tratamento humano edigno proporcionado pelo Estado. Até porque somos nós que pagamos, não um brutamontes qualquer que usa o cargo, o distintivo e o poder fugaz para descontar no outro suas mágoas da vida[…]”

Eliane Cantanhede

Sabe qual a principal notícia, entre a vinda de Barack Obama em março, a discussão do salário mínimo, o presidente do TCU recebendo uma baba para palestras em órgãos que o tribunal investiga, o pobrezinho do Maranhão pagando rios de dinheiro para ex-governadores?

Na minha opinião, é a notícia publicada hoje pelo jornalista Evandro Éboli no jornal “O Globo” de que a Secretaria de Direitos Humanos vai enviar ao Congresso um projeto criando uma comissão especial para… investigar tortura nas prisões!

Muito se fala, com justo horror e asco, da tortura, das mortes e dos desaparecimentos de militantes políticos ocorridos durante o regime militar (1964-1985), mas a gente finge que não vê, não sabe, nunca ouvir falar em tortura de preso pobre e jogado em cadeias e penitenciárias pelo país afora.

Dá tontura só de pensar no que esses homens e mulheres passam nas cadeias, muitas vezes tratados como seres sub-humanos e roucos de tanto gritar sem que ninguém os ouça e os acuda, afora ONGs e voluntários esparsos e corajosos.

Para lembrar de um caso emblemático: aquele menina trancafiada numa cela só de homens no Pará, estuprada, maltratada, humilhada, marcada no corpo e na alma para todo o sempre.

Pelo projeto, a comissão terá onze membros, incluindo médico, psicólogo, arquiteto e assistente social, entre outros, e terá o poder de entrar nas cadeias e penitenciárias sem aviso prévio, sem consentimento dos diretores. Pode também ir atrás de uma denúncia, anônima ou não, ou simplesmente decidir ir por vontade própria.

A ideia vem do secretário anterior, Paulo Vannuchi, e foi bem encampada por sua sucessora, Maria do Rosário. Eles e ela – a comissão – têm a cara do Brasil que a gente vai construindo aos trancos e barrancos: um país mais desenvolvido, mais democrático, mais justo e mais humano.

Criminosos, por piores que tenham sido seus crimes, têm direito à Justiça, ao respeito e a um tratamento humano edigno proporcionado pelo Estado. Até porque somos nós que pagamos, não um brutamontes qualquer que usa o cargo, o distintivo e o poder fugaz para descontar no outro suas mágoas da vida.

Matéria capturada na Folha Online, de autoria de Eliane Cantanhêde que é colunista da Folha, desde 1997, e comenta governos, política interna e externa, defesa, área social e comportamento. Foi colunista do Jornal do Brasil e do Estado de S. Paulo, além de diretora de redação das sucursais de O Globo, Gazeta Mercantil e da própria Folha.

Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

Um comentário em “Tortura não mais”

  1. O crime de tortura parece ter um tratamento diferenciado pelos aplicadores do direito. Ocorre o mesmo com o crime de abuso de autoridade, os delitos de trânsito, os crimes eleitorais, os crimes contra o sistema financeiro, os crimes contra a economia popular, os crimes ambientais, os crimes contra o consumidor e, entre outros, os ditos “crimes de colarinho branco”.

    A experiência prática demonstra (em que pese não apareça nas estatísticas) que quem possui maior propensão à prática de tais delitos são os abastados homens públicos e seus apadrinhados, são as autoridades políticas, os que exercem poder e autoridade, os servidores de primeiro e segundo escalão (em regra), os detentores do capital, os que podem comprar eleições, os que podem comprar carros, os banqueiros, os donos dos meios de produção, os grandes sonegadores, os que enriquecem rápida e vertiginosamente a conta dos cofres públicos, etc.

    Naquelas categorias de delitos o fato parece importar menos. É a categoria das pessoas, a casta, a família, a estirpe social, o poder econômico, que parece importar mais.

    Há uma explicação quase lógica para tudo isso: os pais têm a tendência natural de proteger os filhos. Ou seria darwinismo social?

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