O que eles disseram

O “espírito público” dos parlamentares

RUTH DE AQUINO

é diretora da sucursal de ÉPOCA no Rio de Janeiro
raquino@edglobo.com.br

É emocionante. O espírito público do Congresso ressurgiu com a força das tempestades de verão. O PMDB, muy amigo de Dilma e do povo brasileiro, pressiona por um salário mínimo maior e se lixa para a ameaça de veto do ministro Mantega. O PMDB também se mostra especialmente sensível às necessidades da saúde pública – e só por isso disputa com o PT os cargos no Ministério da Saúde, que tem um orçamento de R$ 77,3 bilhões.

Além dessa preocupação legítima com o trabalhador, os parlamentares vão trabalhar no verão! Bem, na verdade os titulares gozarão de férias, porque deu muito trabalho votar pelo autossubsídio de R$ 26.500. Não é mole reunir em Brasília os congressistas para decidir alguma coisa em dezembro. Com o recesso em janeiro, a Câmara dos Deputados deverá dar posse a 45 suplentes para exercer mandato tampão. O nome é feio, mas a atitude é louvável.

O que seria do Brasil se não tivéssemos esses suplentes em janeiro na Capital ganhando, cada um, R$ 107 mil em subsídios e benefícios? Já que sobra dinheiro no caixa de Dilma e Mantega, e não há risco de inflação, você e eu pagaremos a esses suplentes R$ 4,8 milhões pelo sacrifício de labutar em janeiro. Tutti buona gente, à exceção, claro, de quatro políticos que são réus na Justiça, acusados de participar da máfia dos sanguessugas e do escândalo do mensalão. Coisas do passado, “fatos históricos” como os desaparecidos na ditadura. Quem perde o sono com Ficha Limpa, se nem o Supremo Tribunal Federal conseguiu bater o martelo até hoje?

Ah, temos ainda os senadores de verão, que custarão cerca de R$ 400 mil aos cofres públicos. São suplentes dos que se tornaram ministros e secretários nos Estados. E, como se viaja bastante a trabalho no mês de janeiro, cada senador suplente receberá passagens no valor de até R$ 23 mil, além do salário, auxílio-moradia e verba indenizatória. Você não se sente culpado de ir para a pousada na praia com a família enquanto esse pessoal dá duro no tampão?

Diante de tudo isso, é injusto que apenas uma parcela ínfima dos brasileiros aprove o empenho dos congressistas. Mas, quem sabe, Collor de Mello possa dar aos companheiros o endereço de seu médico especialista em laser que rejuvenesce e apaga todas as manchas – do rosto e, se possível, do currículo.

O que seria do Brasil se não tivéssemos esses suplentes em janeiro na Capital, cada um ganhando R$ 107 mil?

Leitura essencial é o artigo do expoente-mor do Congresso, José Sarney, em importante jornal nacional. Eis um trecho: “Pode parecer um paradoxo, mas a igualdade que a liberdade traz – com o fundamento de que todos somos iguais perante a lei, detentores dos mesmos direitos – (…) leva à solução dos conflitos e ao caminho do progresso e do desenvolvimento”. O sábio maranhense admite: “Nem tudo são flores”. Atribui-se a Sarney a autoria da ideia de pressionar pelo mínimo de R$ 560 ou R$ 580. Seria uma manobra para minimizar a repercussão do aumento de 62% dos congressistas. Dando certo, os louros irão todos para o PMDB.

Mas o eleitor lúcido é cético. Nem a bela loura, com sua delicada tatuagem – “Michel” – na nuca, revelada pela trança de Rapunzel, turvou a vista de quem lê as notícias. O marido de Marcela, hoje vice-presidente, pode mandar na jovem primeira-dama do PMDB, mãe de seu filho e discretíssima musa do Jaburu, mas enfrenta clara dificuldade em disciplinar seus correligionários.

“Não tem sentido o PT expulsar o PMDB da Saúde”, disse o líder peemedebista Henrique Eduardo Alves, como se estivesse sendo expulso do paraíso. Investido de mediador, Temer já afirmou que o PMDB não fará chantagem com o mínimo nem votará contra o governo. O silêncio de Dilma revela a saia justa, mas, se a presidenta já enquadrou um general, bem que poderia dar logo um basta a essa quartelada partidária.

Como um dia disse Lula, lidamos com homens não comuns. Homens cujos filhos marmanjos, de 25 e 39 anos, ganham passaporte diplomático irregularmente. Os passaportes para os Lulinhas foram concedidos pelo Itamaraty “em função de interesse do país” e “em caráter excepcional”. São miudezas irrelevantes.


Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.