Mandado de segurança

No voto que proferi em face do MS que publico a seguir, provido por unanimidade pelo Pleno do Egrégio Tribunal de Justiça, a questão fulcral condiz com consideração do pagamento da multa infligida ao impetrante, em face dos embargos declaratórios tidos por procrastinatórios, como requisito de admissibilidade do regimental.

Em determinado excerto anotei:

“[…]Após detida e minuciosa análise das alegações expendidas nos autos, entendo que, concessa venia, a interpretação conferida pela autoridade judiciária dita coatora ao preceptivo em causa (art. 538, parágrafo único, do CPC), não se coaduna com a doutrina e jurisprudência majoritárias, e, de outro enfoque, empresta uma interpretação extensiva de forma inadequada, a uma regra processual que impõe sanção ao recorrente.

Explico minhas razões de pensar doravante.

A redação do preceito leva-me a concluir, de fato, que a exigência do recolhimento da multa, como requisito de admissibilidade de qualquer outro recurso, somente ocorre na hipótese de reiteração de embargos protelatórios[…]”

Alfim, concluí:

“[…]Com efeito, o fundamento utilizado pela autoridade impetrada, para não admitir o agravo regimental outrora interposto pelo banco impetrante, qual seja – “[…] a obrigatória comprovação do depósito do valor da multa, não satisfazendo, pois, a determinação do disposto no art. 538, parágrafo único da Lei Adjetiva Civil […]” (fls. 288), deve ser afastado, vez que aquela primeira multa, fixada em 1% (um por cento) sobre o valor da causa, pela interposição de embargos protelatórios, não é, repiso, requisito objetivo de admissibilidade recursal, só adquirindo esta feição em caso de reiteração de embargos protelatórios, como exaustivamente demonstrado linhas acima.

Com arrimo nessas considerações, de acordo com o parecer da Procuradoria Geral de Justiça, concedo a segurança, para anular a decisão monocrática proferido no agravo regimental n. 034480/2010 (n.º único 0016077.85.2010.8.10.0000), e determinar que se proceda ao regular processamento do referido recurso, afastando-se a exigência de depósito da multa de 1% (um por cento) sobre o valor da causa (CPC, art. 538, parágrafo único) como requisito de admissibilidade recursal[…]”

A seguir, o voto, por inteiro.


TRIBUNAL PLENO

Sessão do dia 11 de maio de 2011.

Nº Único: 0018451-74.2010.8.10.0000

Mandado de Segurança nº 037902/2010 – São Luís

Impetrante(s) : B. do N. do B. S.A.
Advogado(s) : M. G. S. P. e outros
Impetrado : Desembargador Jaime Ferreira de Araujo
Litisconsorte : F. X. de S. F.
Relator : Desembargador José Luiz Oliveira de Almeida

Acórdão nº

Ementa. MANDADO DE SEGURANÇA. PROCESSUAL CIVIL. ATO JUDICIAL. DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGA SEGUIMENTO A AGRAVO REGIMENTAL. VIABILIDADE DO WRIT. MÉRITO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. INTENTO PROTELATÓRIO (PARÁGRAFO ÚNICO, DO ART. 538, DO CPC). MULTA. REQUISITO DE ADMISSIBILIDADE RECURSAL. REITERAÇÃO. ORDEM CONCEDIDA.

1. No recurso de agravo regimental, se o relator não reconsiderar sua decisão, deverá submetê-lo ao órgão colegiado, sob pena de subverter a sua lógica, uma vez que a irresignação nele formulada dirige-se, justamente, ao pronunciamento monocrático do relator. Inteligência do art. 557, § 1º, do CPC, e art. 540, do RITJMA.

2. Diante de decisão judicial da qual não caiba recurso com efeito suspensivo, é viável, excepcionalmente, o manejo do mandamus, conforme exegese, a contrario sensu, do art. 5º, I, da Lei n. 12.016/2009.

3. A multa de 1% (um por cento) sobre o valor da causa, prevista no parágrafo único, do art. 538, do CPC, decorrente de interposição de embargos protelatórios, não é requisito objetivo de admissibilidade recursal, só adquirindo tal feição quando os aclaratórios são reiterados, ocasião em que aquela multa poderá ser majorada em até 10% (dez por cento), sendo, a partir de então, exigido o seu prévio recolhimento para qualquer empreitada recursal subsequente.

4. Inteligência do art. 538, parágrafo único, do CPC. Precedentes do STJ. Doutrina.

5. Ordem concedida.

Acórdão – Vistos, relatados e discutidos os presentes autos em que são partes as acima indicadas, ACORDAM os Senhores Desembargadores, por unanimidade, em rejeitar a preliminar suscitada e, no mérito, por unanimidade e de acordo com o parecer da Procuradoria Geral de Justiça, em conceder a segurança pleiteada para anular a decisão monocrática proferida no agravo regimental, nos termos do voto do Desembargador Relator.

Votaram os Senhores Desembargadores José Luiz Oliveira de Almeida, Cleones Carvalho Cunha, Nelma Sarney Costa, Maria dos Remédios Buna Costa Magalhães, José Joaquim Figueiredo dos Anjos, Marcelo Carvalho Silva, Maria das Graças de Castro Duarte Mendes, Paulo Sérgio Velten Pereira, Lourival de Jesus Serejo Sousa e José Bernardo Silva Rodrigues.

Absteve-se de votar, por não ter assistido ao relatório, o Senhor Desembargador Benedito de Jesus Guimarães Belo.

Declarou-se suspeito, por motivo de foro íntimo, às fls. 306 dos autos, o Senhor Desembargador Raimundo Nonato de Souza.

Impedido o Senhor Desembargador Jaime Ferreira de Araújo.

Ausentes, justificadamente, os Senhores Desembargadores Cleonice Silva Freire, Anildes de Jesus Bernardes Chaves Cruz, Raimunda Santos Bezerra, Raimundo Nonato Magalhães Melo e José de Ribamar Fróz Sobrinho e, em gozo de férias, os Senhores Desembargadores Jorge Rachid Mubárack Maluf e José Stélio Nunes Muniz.

Presidência do Desembargador Raimundo Freire Cutrim. Presente pela Procuradoria Geral de Justiça o Dr. Eduardo Jorge Hiluy Nicolau.

São Luís(MA), 11 de maio de 2011.

DESEMBARGADOR Jamil de Miranda Gedeon Neto

PRESIDENTE


DESEMBARGADOR José Luiz Oliveira de Almeida

RELATOR


Mandado de Segurança nº 037902/2010 – São Luís

Relatório – O Sr. Desembargador José Luiz Oliveira de Almeida (relator): Trata-se de Mandado de Segurança com pedido de liminar, impetrado pelo B. do N. do B. S.A., contra ato tido por ilegal, da lavra do Exmo. Sr. Desembargador Jaime Ferreira Araujo.

Da inicial do mandamus colho o seguinte relato fático:

I – que o advogado F. X. de S. F., ora apontado como litisconsorte na impetração, ajuizou ação de arbitramento de honorários advocatícios contra o banco impetrante (processo n. 21226/1995);

II – que no curso daquela demanda, o juízo da 5º

Vara Cível da Capital declarou-se incompetente, ex officio, para apreciação do feito, asseverando tratar-se de relação de trabalho, cuja competência entendeu ser da Justiça do Trabalho (decisão agravada às fls. 62/67);

III – que contra esta decisão, o ora litisconsorte interpôs agravo de instrumento, com pedido de efeito suspensivo, objetivando cassar a aludida declinação de competência do juízo de 1º grau, para, assim, manter a competência da justiça comum estadual (petição às fls. 30/61);

IV – que o referido agravo de instrumento, distribuído à autoridade judiciária apontada coatora, foi por ele dado provimento, monocraticamente, com base no art. 557, § 1º-A, do CPC, e na súmula 363, do STJ (fls. 153/158), mantendo-se o feito em tramitação da justiça comum estadual;

V – que, contra esta decisão, o banco ora impetrante interpôs embargos declaratórios (fls. 165/170), alegando omissão na aludida decisão monocrática que deu provimento ao agravo de instrumento, por não ter se manifestado, expressamente, acerca da assistência judiciária gratuita concedida ao advogado agravante. A interposição dos embargos, segundo disse o impetrante, visou, também, prequestionar a matéria para possibilitar o manejo de eventual apelo extremo;

VI – que a autoridade indigitada coatora, também monocraticamente, rejeitou os embargos de declaração (decisão de fls. 179/185), aduzindo, em suma, inadequação da via eleita para questionar o benefício da justiça gratuita, e, ainda, aplicou ao banco embargante, ora impetrante, a multa de 1% (um por cento) sobre o valor da causa, com supedâneo no art. 538, parágrafo único, do CPC, por considerar o recurso meramente protelatório;

VII – que contra tal decisão, o impetrante interpôs agravo regimental, no qual, em essência, reitera o argumento de não ser possível conceder a gratuidade judiciária ao advogado F. X. de S. F., ora apontado litisconsorte, acrescentando, ademais, que a decisão agravada, oriunda do juízo de 1º grau, está escorreita, devendo ser mantida a competência do julgamento da ação de arbitramento de honorários intentada pelo citado advogado na justiça laboral; e

VIII – que o ilustre Desembargador, apontado coator na impetração, mais uma vez, monocraticamente, com fulcro no art. 557, caput, do CPC, negou seguimento ao agravo regimental interposto pelo impetrante, alegando, em sinopse, ausência de recolhimento da multa de 1% (um por cento) arbitrada na decisão que rejeitou os embargos declaratórios, asseverando tratar-se de requisito de admissibilidade para interposição de qualquer outro recurso. Na aludida decisão, o banco impetrante foi condenado a pagar multa no patamar 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, com fulcro o art. 557, § 2º, do CPC.

Quanto aos fundamentos jurídicos, assevera o impetrante que:

I – o manejo do presente remédio heróico é tempestivo;

II – que o presente writ deve ser conhecido, pois alega que, contra o ato judicial ora fustigado, não cabe outro recurso, é teratológico e não faz coisa julgada;

III – que as multas aplicadas são ilegais, pois os recursos não foram interpostos com propósitos protelatórios, mas, para prequestionar a matéria, e submetê-la a apreciação do colegiado, a fim de possibilitar o manejo de eventuais recursos extremos;

IV – que “[…] verifica-se, pela redação do dispositivo [art. 538, parágrafo único, do CPC], que a condição de admissibilidade para o conhecimento do recurso não decorre do não depósito da multa de 1% (um por cento), mas sim da multa de 10% (dez por cento) […]”, somente na hipótese de reiteração de embargos, e manejo posterior de outro recurso; e

V – que “[…] a exigência de prévio depósito consiste numa decisão teratológica, passível de correção via mandado de segurança […]”, asseverando que a multa pela interposição de embargos protelatórios não é de aplicação imediata, exigível, somente, quando reiterado o embargo.

Com base em tais argumentos, requer:

I – a concessão de medida liminar, para revogar a decisão que negou seguimento ao agravo regimental, para submetê-la a julgamento perante o colegiado; e, no mérito:

II – a concessão em definitivo da segurança, confirmando a liminar pleiteada.

Acostou à inicial os documentos de fls. 26 e 27 (procuração e recolhimento de custas), bem como a cópia integral do processo n. 0016077-85.2010.8.10.0000, no qual se sucederam os recursos acima relatados.

Através da decisão de fls. 311/316, indeferi a liminar vindicada, por não vislumbrar de forma satisfatória a presença do periculum in mora.

A autoridade judiciária indigitada coatora prestou informações às fls. 324/330, de cujos judiciosos argumentos, embasados em farta doutrina e jurisprudência, extraio o seguinte fragmento, que expõe, com clareza e concisão, sua posição acerca da controvérsia suscitada nos autos:

“[…] Nessa senda, entendo que a parte final do parágrafo único do artigo 538 do Código de Processo Civil alcança a primeira multa imposta à parte que tumultua o processo com a oposição de embargos de declaração protelatórios, recaindo sobre tal apenas a limitação de não poder exceder ao percentual expressamente estabelecido de 1% (um por cento) sobre o valor da causa.

Permissa venia aos que entendem de outro modo, tenho que condicionar a incidência do requisito legal em debate somente quando o embargante de má-fé for recalcitrante é dar interpretação inexoravelmente aquém do que preceitua o texto normativo, ferindo de morte princípios processuais basilares em homenagem àquele que litiga de má-fé. […]”

O litisconsorte na impetração, Dr. F. X. de S. F., manifestou-se às fls. 335/353, com os documentos de fls.354/355, asseverando, em sede preliminar:

I – que é incabível o mandado de segurança, alegando que a decisão ora atacada é passível de recurso com efeito suspensivo; e

II – que os embargos declaratórios e o agravo regimental transitaram em julgado, situação jurídica que obsta o manejo do mandado de segurança.

No mérito, em apertada síntese, aduziu:

I – que agiu com acerto a autoridade apontada coatora, dizendo que a multa de 1% (um por cento) pela interposição de embargos protelatórios é imediatamente exigível para qualquer outra empreitada recursal; e

II – que é aplicável a multa de 10% (dez por cento), pela interposição de agravo regimental infundado por parte do impetrante.

O Estado do Maranhão, embora devidamente cientificado, não ingressou na lide, conforme certificado às fls. 356.

A Procuradoria Geral de Justiça, em parecer às fls. 361/372, da lavra do procurador Eduardo Jorge Hiluy Nicolau, manifestou-se pela concessão da ordem, “[…] para que seja revogada a decisão que não conheceu o Agravo Regimental e, por conseguinte, seja afastada a condenação da multa aplicada ao impetrante, com fundamento no art. 557, § 2º, do CPC, no valor de 10% (dez por cento) sobre o valor corrigido da causa.”

É o relatório. Decido.


Voto – o Sr. Desembargador José Luiz Oliveira de Almeida (relator): Cuida-se de Mandado de Segurança com pedido de liminar, impetrado pelo B. do N. do B. S.A., contra ato tido por ilegal, da lavra do Exmo. Sr. Desembargador Jaime Ferreira Araújo.

A ilegalidade apontada, em suma, reside nos seguintes argumentos da impetração:

I – que o depósito prévio para interposição de qualquer outro recurso a que alude o parágrafo único, do art. 538, do CPC, somente é exigível na hipótese de reiteração de embargos protelatórios, cujo valor pode ser elevado em até 10% (dez por cento) sobre o valor da causa. O depósito da multa no patamar de 1% (um por cento), aplicada quando os primeiros embargos são considerados protelatórios, não é, segundo o impetrante, requisito de admissibilidade recursal, como entendeu a autoridade indigitada coatora; e

II – que nenhum dos recursos aviados pelo impetrante (embargos integrativos e agravo regimental) revestiram-se de intento protelatório, mas objetivaram, dentre outros fins, prequestionar a matéria, e submetê-la ao exame colegiado, para possibilitar eventual manejo de recursos extremos.

Antes de trilharmos o exame meritório, cumpre-nos enfrentar as questões preliminares aduzidas pelo litisconsorte passivo na presente demanda.

Alegou o advogado F. X. de S. F., às fls. 335/353, que o presente mandamus não seria cabível, porque o ato judicial ora atacado seria passível de recurso com efeito suspensivo, e, sob outro enfoque, estaria acobertada pelo manto da coisa julgada material.

Os argumentos não convencem.

Conforme ponderou, certeiramente, a Procuradoria Geral de Justiça, o ato judicial ora atacado, qual seja, decisão monocrática do relator do recurso de agravo de instrumento, que negou seguimento à posterior agravo regimental, não cabe outro recurso com efeito suspensivo.

Aliás, é próprio do agravo regimental a possibilidade de concessão de efeito suspensivo, como se deflui do art. 539, parágrafo único[1], do RITJMA. Mas, como essa via recursal foi obstaculizada pelo relator, monocraticamente, negando seguimento ao agravo, a sede mandamental mostra-se adequada.

E, ainda, conforme consignou o ilustre Procurador de Justiça, Eduardo Jorge Hiluy Nicolau, observo que existe uma “[…] flagrante teratologia da decisão vergastada […], diante da ofensa inequívoca ao art. 540, do RITJMA[2], pois tal dispositivo nos leva a concluir, de fato, que só é dado ao relator do recurso, diante de um agravo regimental, julgá-lo monocraticamente, quando resolve reconsiderar sua decisão; caso contrário, a lógica desse recurso o obriga a submetê-lo ao crivo do colegiado, sob pena de perder o seu sentido, vez que a irresignação nele formulada dirige-se, justamente, contra uma decisão monocrática do relator.

O raciocínio é análogo àquele previsto no art. 557, § 1º, do CPC, ou seja, se o relator nega seguimento, monocraticamente, a um recurso, com fulcro no art. 557, caput, do Digesto Processual Civil, desta decisão, segundo o referido § 1º, caberá agravo, “[…] no prazo de cinco dias, ao órgão competente para o julgamento do recurso, e, se não houver retratação, o relator apresentará o processo em mesa, proferindo voto; provido o agravo, o recurso terá seguimento […]” (o sublinhado não consta no original).

Em arrimo a essa linha de pensar, o escol de Cássio Escarpinella Bueno enfatiza:

“[…] Uma vez interposto o agravo interno, ainda é a disciplina do mesmo § 1º do art. 557, o magistrado que proferiu a decisão agravada poderá retratar-se, isto é redecidir, dando provimento, ele mesmo, ao agravo interno. Caso contrário, ato contínuo, levará o agravo interno para julgamento perante o órgão colegiado competente, observando-se, para sua identificação, o regimento interno do Tribunal que integra[3].

Com efeito, tais argumentos só corroboram a inarredável necessidade do agravo regimental, caso não seja reconsiderado pelo relator, ser submetido ao órgão colegiado, em homenagem ao que a doutrina já convencionou denominar de “princípio da colegialidade”.

Por seu turno, o argumento de que a decisão proferida no agravo regimental transitou em julgado é totalmente insubsistente.

A certidão de fls. 355, acostada aos autos pelo litisconsorte, por óbvio, não informa que aquele agravo regimental transitou em julgado, mas, apenas e tão somente, que não houve interposição de recurso especial ou extraordinário, o que, aliás, era de rigor. O trânsito em julgado da decisão demanda inequívoca informação nos autos, através de certidão específica, o que, evidentemente, não é o caso.

Ademais, ainda que se admitíssemos, em tese, a ocorrência do trânsito em julgado sem a respectiva certificação expressa nos autos, observo que o presente mandamus foi protocolado no dia 07/12/2010, exatamente treze dias após a publicação da decisão ora atacada, em 24/11/2010, conforme se vê às fls. 288. Assim, a via heróica foi manejada antes de ter escoado o prazo para a interposição de recurso especial e/ou extraordinário, cujo prazo é de 15 (quinze) dias, revelando, inequivocamente, que a decisão ora atacada não transitou em julgado.

Assim, é manifesto o cabimento da via mandamental no caso vertente, razões pela qual dele conheço.

Gizadas tais considerações, adentro no exame meritório.

A autoridade apontada coatora, relator do agravo de instrumento n. 0016077.85.2010.8.10.0000, em que o ora impetrante figura como agravante, julgou monocraticamente o recurso, com fulcro no art. 557, caput, do CPC, e, desta decisão, o banco impetrante opôs embargos de declaração, os quais o relator, mais uma vez, os julgou monocraticamente, impondo ao impetrante a multa de 1% (um por cento) sobre o valor da causa, por considerá-los protelatórios, com fulcro no parágrafo único, do art. 538, do CPC.

Contra esta decisão monocrática dos embargos de declaração, o impetrante aviou agravo regimental, o qual não foi conhecido, monocraticamente, porque entendeu o impetrado que o depósito daquela multa de 1% (um por cento) já fixada seria condição de admissibilidade de qualquer outro recurso.

Diante de um agravo infundado, aos olhos do impetrado, aquela multa de 1% (um por cento) foi elevada para 10% (dez por cento), na decisão monocrática ora atacada, com espeque no art. 557, § 2º, do CPC.

A controvérsia, portanto, cinge-se em saber se, considerados protelatórios os embargos de declaração, o recolhimento da multa de 1% (um por cento) seria exigível, de logo, para a interposição de qualquer outro recurso, ou somente em caso de reiteração de embargos protelatórios.

Para melhor compreensão, transcrevo o art. 538, do CPC:

Art. 538. Os embargos de declaração interrompem o prazo para a interposição de outros recursos, por qualquer das partes.

Parágrafo único. Quando manifestamente protelatórios os embargos, o juiz ou o tribunal, declarando que o são, condenará o embargante a pagar ao embargado multa não excedente de 1% (um por cento) sobre o valor da causa. Na reiteração de embargos protelatórios, a multa é elevada a até 10% (dez por cento), ficando condicionada a interposição de qualquer outro recurso ao depósito do valor respectivo.

(sem destaques no original)

Após detida e minuciosa análise das alegações expendidas nos autos, entendo que, concessa venia, a interpretação conferida pela autoridade judiciária dita coatora ao preceptivo em causa (art. 538, parágrafo único, do CPC), não se coaduna com a doutrina e jurisprudência majoritárias, e, de outro enfoque, empresta uma interpretação extensiva de forma inadequada, a uma regra processual que impõe sanção ao recorrente.

Explico minhas razões de pensar doravante.

A redação do preceito leva-me a concluir, de fato, que a exigência do recolhimento da multa, como requisito de admissibilidade de qualquer outro recurso, somente ocorre na hipótese de reiteração de embargos protelatórios.

Inicialmente, arrimo-me nos escólios de mais abalizada doutrina.

Nas didáticas lições de Fredie Didier Jr. e Leonardo José Carneiro da Cunha[4]:

“Desse modo, opostos embargos declaratórios, e vindo estes a ser tidos como protelatórios, deve o juiz ou tribunal condenar o embargante ao pagamento de uma multa de até 1% sobre o valor da causa em favor do embargado. Se, ao julgar esses embargos, o juiz ou tribunal persistir no vício alegado ou desse julgamento surgirem novos vícios, pode o embargante opor novos embargos. Caso estes segundos embargos venham a ser tidos também como protelatórios, aquela multa de até 1% passa até 10%, ficando a interposição de qualquer outro recurso (até mesmo uns terceiros embargos declaratórios) condicionada ao depósito prévio do respectivo valor. A multa de 10% – fixada apenas na reiteração de embargos protelatórios – passa a constituir requisito de admissibilidade de qualquer outro recurso que venha a ser intentado pela parte, mesmo que esse recurso não se sujeite, normalmente, a preparo.”

(itálicos no original; destacou-se)

No mesmo norte se pronuncia Daniel Amorim Assumpção Neves[5]:

“[…] Segundo o art. 538, parágrafo único, do CPC, havendo reiteração de embargos manifestamente protelatórios, a multa já fixada em 1% do valor da causa será majorada até o valor máximo de 10% do valor da causa, condicionando-se a admissibilidade – e não a interposição como previsto no texto legal – de outros recursos ao depósito em juízo do valor da multa. […]”

Alexandre Freitas Câmara[6] acentua:

“[…] É importante notar que, ao falar em reiteração dos embargos de declaração protelatórios, está a lei punido a conduta de má-fé reiterada, a reincidência. Não é preciso que os novos embargos de declaração tenham o mesmo conteúdo dos primeiros já considerados manifestamente protelatórios, para que se possa agravar a sanção. Basta que o segundo recurso tenha, assim como o primeiro tinha, caráter manifestamente protelatório.

Havendo a reiteração de embargos protelatórios e o conseqüente incremento da multa, o depósito desta se torna requisito de admissibilidde (e não de interposição como diz a lei: o recurso poderá ser interposto, mas não poderá ser admitido) do recurso que a parte embargante pretenda, eventualmente, interpor contra a decisão embargada. A interposição de novo recurso sem que tal depósito seja feito implicará o seu não-conhecimento, por falta de pressuposto recursal consistente na regularidade formal.”

(sem destaques no original)

Ainda, nesse norte, ensina-nos Misael Montenegro Filho[7], em tom didático:

“[…] A primeira penalidade não impõe maior consequência processual à parte, limitando-se ao seu caráter meramente econômico, o que por vezes não ocorre do ponto de vista prático, sobretudo diante das causas que apresentam valor ínfimo estimado para efeitos meramente fiscais (como nas cautelares, na grande maioria das ações declaratórias, na ação de indenização por perdas e danos com pedido de arbitramento da verba de dano moral etc.)

[…]

De qualquer modo, devemos ressaltado que a imposição da multa, na hipótese tratada, não impede que a parte apresente o recurso seguinte (agravo de instrumento, apelação, recurso especial e/ou recurso extraordinário), o que pode ser interposto sem o recolhimento da multa fixada

Contudo, se houver nova interposição de embargos de declaração, com idêntico propósito protelatório, o quantitativo da multa é elevado a até dez por cento do valor dado à causa, com uma agravante, desta feita com evidente prejuízo processual para o litigante que agiu com má-fé, a saber: só pode interpor o recurso seguinte se efetuar o recolhimento do valor da multa, fixados na decisão dos embargos, comportamento que deve ser manifestado no ato da interposição da espécie principal, em companhia das custas recursais.

(itálicos no original; destacou-se)

A jurisprudência, ao contrário do que afirmou o ilustre impetrado, segue esta mesma linha de pensar.

Nesse particular, importante a observação feita pela Procuradoria Geral de Justiça, segundo a qual nem mesmo o acórdão apresentado pela autoridade impetrada, às fls. 328, lhe serve de fundamento à sua posição, porquanto no “item III” da ementa consignaram os Ministros da 5.ª T. do C. STJ:

“[…] III – Cumpre registrar que a determinação de prévio depósito do valor da multa para interposição de qualquer outro recurso somente ocorreu quando oposto o segundo integrativo. Ademais, é relevante ressaltar que o relator pode optar por valores entre 1% (um por cento) a 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, quando for o caso de condenação à multa, em razão de reiterados embargos de declaração, não sendo obrigado a elevá-la ao teto máximo.

IV – In casu, o depósito do valor fixado a título de multa é pressuposto recursal objetivo para a interposição de qualquer outro recurso, nos termos do art. 538, parágrafo único do Código de Processo Civil.

V – Agravo interno não conhecido.[8]

(sem destaques no original)

No mesmo direcionamento, colho julgado da Corte Especial daquele Sodalício:

“[…] – O não-recolhimento da multa de 5% sobre o valor atualizado da causa, aplicada em razão da reiteração de embargos de declaração protelatórios, impede o conhecimento dos embargos de divergência por ausência de pressuposto recursal objetivo.

– Agravo regimental improvido.[9]

Em recente e lapidar acórdão, proveniente da 4ª T. do STJ, o relator Min. Luís Felipe Salomão, em tom extremamente didático, claro e objetivo, vaticina sobre a referida multa:

“[…] 1. A regra contida no art. 538, parágrafo único do Código de Processo Civil, dispõe que “Quando manifestamente protelatórios os embargos, o juiz ou o tribunal, declarando que o são, condenará o embargante a pagar ao embargado multa não excedente de 1% (um por cento) sobre o valor da causa. Na reiteração de embargos protelatórios, a multa é elevada a até 10% (dez por cento), ficando condicionada a interposição de qualquer outro recurso ao depósito do valor respectivo”.

Assim, inviável se condicionar a interposição de qualquer outro recurso ao pagamento da multa de 1% sobre o valor da causa aplicada no primeiro embargos de declaração.[10]

(sem destaques no original)

Ainda, no mesmo vértice:

[…] 3. A multa de 10% (dez por cento) sobre o valor da causa prevista no art. 538, parágrafo único, do CPC encontra incidência nos casos em que ocorre reiteração de embargos declaratórios considerados protelatórios e desde que tenha havido aplicação da primeira multa de 1% (um por cento). Precedentes. […][11]

(sem destaques no original)

Portanto, o entendimento jurisprudencial assente na Corte Superior de Justiça não dá margens para qualquer dúvida acerca da matéria versada nos autos.

É dizer, considerados procrastinatórios os primeiros embargos, aplica-se a multa de 1% (um por cento) sobre o valor da causa, contudo, esta multa, que realmente só pode ser fixada naquele patamar, não é condição ou requisito de admissibilidade recursal, podendo a parte interpor outro recurso que entender cabível, até mesmo novos aclaratórios.

Somente diante da interposição de um segundo recurso de embargos de declaração (reiteração), e sendo estes também considerados protelatórios, aí sim, haverá a possibilidade de majoração da multa para até 10% (dez por cento), e este valor, ou seja, a multa majorada, é que será requisito de admissibilidade para a interposição de qualquer outro recurso, a partir de então.

A preocupação externada pelo ilustre desembargador apontado coator na impetração, de fato, é louvável, uma vez que sobreleva o princípio constitucional da razoável duração do processo, e também visa desestimular a litigância de má-fé, desencorajando empreitadas recursais nitidamente protelatórias.

Sem embargo de tal entendimento, penso, com mais ponderação, que as regras de direitos impositivas de sanções devem ser interpretadas restritivamente, como sói ensinam lições basilares de hermenêutica jurídica.

Assim, parece-me que a interpretação mais consentânea com o princípio da razoabilidade está emoldurada nas linhas acima, em conformidade com a posição externada pela Procuradoria Geral de Justiça.

Com efeito, o fundamento utilizado pela autoridade impetrada, para não admitir o agravo regimental outrora interposto pelo banco impetrante, qual seja – “[…] a obrigatória comprovação do depósito do valor da multa, não satisfazendo, pois, a determinação do disposto no art. 538, parágrafo único da Lei Adjetiva Civil […]” (fls. 288), deve ser afastado, vez que aquela primeira multa, fixada em 1% (um por cento) sobre o valor da causa, pela interposição de embargos protelatórios, não é, repiso, requisito objetivo de admissibilidade recursal, só adquirindo esta feição em caso de reiteração de embargos protelatórios, como exaustivamente demonstrado linhas acima.

Com arrimo nessas considerações, de acordo com o parecer da Procuradoria Geral de Justiça, concedo a segurança, para anular a decisão monocrática proferido no agravo regimental n. 034480/2010 (n.º único 0016077.85.2010.8.10.0000), e determinar que se proceda ao regular processamento do referido recurso, afastando-se a exigência de depósito da multa de 1% (um por cento) sobre o valor da causa (CPC, art. 538, parágrafo único) como requisito de admissibilidade recursal.

É como voto.

Sala das Sessões Plenárias, do Tribunal de Justiça do Maranhão, em São Luís, 11 de maio de 2011.



DESEMBARGADOR José Luiz Oliveira de Almeida

RELATOR



[1] Art. 539. Omissis. Parágrafo único. O agravo não terá efeito suspensivo, salvo se presentes os pressupostos do art. 558 do Código de Processo Civil.

[2] Art. 540. A petição que, sob pena de indeferimento liminar, contiver as razões de reforma da decisão agravada, será processada nos próprios autos e submetida ao prolator da decisão, que poderá reconsiderá-la ou submeter o agravo, no prazo de cinco dias, a julgamento do órgão julgador competente para apreciação do feito originário. (sem destaques no original).

[3] BUENO, Cássio Escarpinella. Curso Sistematizado de Direito Processual Civil. Saraiva. 2008, v. 5, p. 192.

[4] DIDIER JR, Fredie. CUNHA, Leonardo José Carneiro da. Curso de Direito Processual Civil. 6. ed. Jus Podivm, 2008, v. 3, p. 204-205.

[5] NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de Direito Processual Civil. Método, 2009, p. 636.

[6] CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil. 18. ed. Lumen Juris. 2010, v. II, p. 117-118.

[7] MONTENEGRO FILHO, Misael. Curso de Direito Processual Civil. 5. ed. Atals, 2009, p.

[8] AgRg nos EDcl nos EDcl no Ag 725502/SP, Rel. Ministro GILSON DIPP, QUINTA TURMA, julgado em 12/06/2007, DJ 06/08/2007, p. 620.

[9] AgRg nos EREsp 228139/SP, Rel. Ministro FRANCISCO PEÇANHA MARTINS, CORTE ESPECIAL, julgado em 04/10/2006, DJ 23/10/2006, p. 235.

[10] EDcl nos EDcl nos EDcl no AgRg no REsp 908.187/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 22/03/2011, DJe 25/03/2011.

[11] EREsp 423250/SP, Rel. Ministra ELIANA CALMON, CORTE ESPECIAL, julgado em 10/12/2009, DJe 22/02/2010.

Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

Um comentário em “Mandado de segurança”

  1. Dr. José Luiz com todo respeito que tenho a Sua Excelência como Magistrado, nessa decisão há um serio equivoco que tenho certeza que caso essa decisão não seja corrigida pelo Tribunal Local, irá ser no STJ.

    Primeiro, a tese esposada no Voto condutor utilizou o Mandado de Segurança como uma espécie recursal, ao frisar que a decisão no Agravo Regimental não fez coisa julgada, devido o ajuizamento do remédio heróico.

    Contudo, tal entendimento não se coaduna com o nosso sistema jurídico brasileira, em razão de que o Mandado de Segurança não é recurso, e, sim, uma ação.

    Outro equivico é que a decisão feriu literalmente a própria Lei de Mandado de Segurança que diz que o remédio heroico não pode ser concedido para desfazer coisa julgada, isto é, com certidão expedida pelo Tribunal de Justiça do Maranhão dando conta do transito em julgado da decisão do agravo regimental.

    Por fim, o Tribunal de Justiça do Maranhão deve se ater as prescrições dos Tribunais Superiores, principalmente ao Supremo Tribunal Federal, que através dos seus verbetes Sumulares de n. 267 e 268 servem para a orientação aos demais Tribunais.

    Assim, tal decisão deverá ser corrigida, até porque nunca o Tribunal de Justiça tem autoridade de corrigir uma decisão acobertada sobre o manto da coisa julgada. Aliás, a via adequada seria ação rescisória.

    Um abraço,

    Que Deus nos abençoe

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