Cuida-se de pronúncia.
Ao exame da prova amealhada, consignei, verbis:
- Dos depoimentos tomados ao longo da instrução importa realçar o depoimento de IRACEMA MACIEL RAMOS, companheira do ofendido, tomado no caderno pré-processual, a qual conta, com riqueza de detalhes, como se deu o assassinato do ofendido.
- É verdade que esse depoimento não foi ratificado em sede judicial. Não é menos verdade, entanto, que, apesar disso, deve ser levado em conta, em face dos dados que foram amealhados nesta mesma sede, apontando a autoria na direção do acusado.
Acerca da tese da defesa, aduzi:
- A defesa pediu a desclassificação da imputação inicial, alegando a ocorrência de causa superveniente, absolutamente independente, da qual teria decorrido a morte do ofendido.
- A tese, conquanto não seja absurda, compreendo que deva ser objeto de discussão no julgamento do acusado perante o TRIBUNAL DO JÚRI. Decidir, agora, acerca da tese defensiva, seria usurpar as atribuições do Tribunal leigo, a quem compete, ex vi legis, o julgamento dos crimes dolosos contra a vida.
A seguir, a decisão, por inteiro.
PROCESSO Nº 001.99.006281-4
AÇÃO PENAL PÚBLICA
ACUSADO: M.
VÍTIMA:EMANUEL REINALDO DA SILVA
Vistos, etc.
Cuida-se de ação penal que move o MINISTÉRIO PÚBLICO contra M., devidamente qualificado, por incidência comportamental no artigo 121, do DP, em face de, no dia 09 de abril de 1999, por volta das 18h30, na Rua da Paz, localizada na invasão Vila Magri/Santa Bárbara, juntamente com um menor de 16(dezesseis) anos, Robson Carlos Guimarães Oliveira. vulgo Jipão, ter assassinado, a tiros, EMANUEL REINALDO DA SILVA.
A persecução criminal teve início mediante portaria. (fls.06)
Exame cadavérico às fls. 48.
Laudo de exame em local de morte violenta às fls.62.
Recebimento da denúncia às fls. 79.
O acusado foi qualificado e interrogado às fls.87/88.
Defesa prévia fls. 91/92.
Durante a instrução criminal foram ouvidas as testemunhas EDNA MARIA BARBOSA DIAS (fls.89), SABINA ARAGÃO COSTA (fls.100) e GLAUCIA DOS SANTOS DE SOUSA .(fls.131)
O MINISTÉRIO PÚBLICO, em alegações finais, pediu, alfim, a pronúncia do acusado, nos termos da denúncia. (fls. 182/186)
A defesa, de seu lado, pediu a desclassificação da imputação inicial para crime de lesão corporal, tendo em vista não poder o acusado ser responsabilizado por superveniência de causa absolutamente independente que causou a morte do ofendido, nos termos do artigo 13,§1º, do CP. (fls.188/191
Relatados. Decido.
01.00. O MINISTÉRIO PÚBLICO ( ne procedeta judex ex officio e nemo judex sine actore), com legitimidade ad causam e ad processum, para ocupar o pólo ativo da relação jurídica processual, denunciou M., à alegação de ter malferido o preceito primário do artigo 121 DP.
02.00. Os fatos narrados na denúncia nortearam todo o procedimento, possibilitando, assim, o exercício da defesa do acusado, sabido que o réu se defende da descrição fática, em observância aos princípios da correlação, da ampla defesa e do contraditório.
02.00. Tudo isso porque, sabe-se, entre nós não há o juiz inquisitivo, cumprindo à acusação delimitar a área de incidência da jurisdição penal e também motivá-la por meio da propositura da ação penal.
03.00. Na jurisdição penal a acusação determina a amplitude e conteúdo da prestação jurisdicional, pelo que o juiz criminal não pode decidir além e fora do pedido com o que o órgão da acusação deduz a pretensão punitiva.
03.01. São as limitações sobre a atuação do juiz, no exercício dos poderes jurisdicionais, na Justiça Penal, oriundos diretamente do sistema acusatório, e que são designadas pelas conhecidas parêmias jurídicas formuladas: a) ne procedat judex ex offiico; e) ne eat judex ultra petitum et extra petitum.
04.00. Como de praxe no direito pátrio, em dois momentos distintos produziram-se dados probatórios, em face dos crimes de homicídio, consumado e tentado, imputados a JEFFERSON FERNANDO ALVES.
05.00. Na fase pré-processual foram ouvidas várias testemunhas, dentre as quais destaco o depoimento de IRACEMA MACIEL RAMOS, companheiro do ofendido, que viu o acusado efetuar dois disparos de arma de fogo contra a vítima e sair correndo. (fls.08/09)
06.00. A ofendida viu, ademais, quando Jipão apareceu e efetuou outros disparos contra o ofendido. (ibidem)
07.00. A ofendida aduziu que, apesar dos apelos que fez, Jipão efetuou vários disparos – na cabeça, no rosto, no pescoço, no ombro e na perna do ofendido.(ibidem)
08.00. Na mesma sede avulta com relevância o depoimento de ADAILTON DE SOUSA POVOAS, que viu Jipão atirando no ofendido. (fls.10/11)
09.00. O acusado também foi ouvido em sede extrajudicial, o qual, no entanto, negou a autoria do crime, dizendo que, ao tempo do fato, estava na casa de uma cunhada nominada Edna, localizada na Vila Palmeira.(14/15)
10.00. Com esses dados, e outros tantos, encerrou-se a fase administrativa, donde entrevejo fortíssimos indícios de que o acusado foi, efetivamente, o autor do crime que lhe imputa o MINISTÉRIO PÚBLICO.
11.00 Cediço que, cuidando-se, até aqui, de provas extrajudiciais, não de pode falar, validamente, em admissibilidade da acusação só com esteio nelas, pois que a prova pré-processual, embora relevante, não serve, isoladamente, solitária, para os fins colimados na pretensão punitiva do Estado.
11.01. Faz-se necessário, por isso, prosseguir na análise das provas produzidas, devendo, agora, ser objeto de exame a prova judicial.
11.01.01. Esta, sim, a prova por excelência, pois que bafejada pela ampla defesa e pelo contraditório, corolários do devido processo legal (due process of law).
12.00. Tendo às mãos o caderno inquisitório, o representante do MINISTÉRIO PÚBLICO, órgão oficial do Estado, titular da ação penal pública, deflagrou a persecutio criminis in judicio – afinal, ne procedat iudex ex offico e nulla poena sine judicio – imputando ao acusado M. a prática do crime de homicídio.
13.00. Com a proposta ministerial ofertada buscou o Estado por intermédio do seu órgão oficial (artigo 129, I, da CF), submeter o autor do fato típico a julgamento perante seus pares, pois que, sabe-se, nec delicti manet impunita.
14.00. Na sede judicial o acusado, sob todas as garantias constitucionais, inclusive a de se manter calado, negou a autoria do crime, dizendo que, ao tempo do fato, estava na casa de um cunhado seu, localizada na Vila Palmeira.(fls.87/88)
15.00. Em seguida foi ouvida a testemunha EDNA BARBOSA DIAS, que apenas ouviu falar que o acusado havia assassinado o ofendido, informação que lhe foi dada por SABINA ARAGÃO, companheira do ofendido. (fls.99)
16.00. Dando seqüência à produção de provas, foi inquirida a companheira do acusado, SABINA ARAGÃO COSTA, que disse que, no dia do crime ele estava em companhia do acusado e que não sabia a quem atribuir a prática do crime. (fls.100)
17.00. GLÁUCIA DOS SANTOS DE SOUSA disse que estava em sua residência ao tempo do crime e que viu quando Jipão efetuou vários disparos contra o ofendido. (fls.131)
18.00. GLÁUCIA DOS SANTOS DE SOUSA aduziu que não viu o acusado nessa hora, mais que ouviu da companheira da vítima, que ele, Magno, efetuou disparos contra ela, vítima. (ibidem)
19.00. A testemunha acrescentou que, depois da prática do crime,o acusado sumiu e que só no dia da audiência, doze anos depois do fato, voltou a ver o acusado.(ibidem)
20.00. De tudo que examinei, a considerar os dados probatórios colacionadas nas duas sedes, a conclusão a que chego é de que presentes estão, a mais não poder, a prova da existência do crime e os indícios de autoria, a autorizar a admissibilidade da acusação, para que o acusado seja submetido a julgamento perante seus pares.
21.00. Dos depoimentos tomados ao longo da instrução importa realçar o depoimento de IRACEMA MACIEL RAMOS, companheira do ofendido, tomado no caderno pré-processual, a qual conta, com riqueza de detalhes, como se deu o assassinato do ofendido.
22.00. É verdade que esse depoimento não foi ratificado em sede judicial. Não é menos verdade, entanto, que, apesar disso, deve ser levado em conta, em face dos dados que foram amealhados nesta mesma sede, apontando a autoria na direção do acusado.
23.00. A defesa pediu a desclassificação da imputação inicial, alegando a ocorrência de causa superveniente, absolutamente independente, da qual teria decorrido a morte do ofendido.
24.00. A tese, conquanto não seja absurda, compreendo que deva ser objeto de discussão no julgamento do acusado perante o TRIBUNAL DO JÚRI. Decidir, agora, acerca da tese defensiva, seria usurpar as atribuições do Tribunal leigo, a quem compete, ex vi legis, o julgamento dos crimes dolosos contra a vida.
25.00. Assim enfrentada a tese da defesa, em tributo à competência do TRIBUNAL DO JÚRI, reafirmo que provas consolidadas nos autos, em seus dois momentos, apontam a autoria do crime na direção do acusado, razão pela qual entendo deva ser submetido a julgamento perante seus pares.
26.00. De lege lata, sabe-se e reafirmo, para admissibilidade da acusação, decisão interlocutória de encerramento da primeira fase do rito dos crimes dolosos contra a vida, exige-se a presença de dois requisitos, quais sejam, o da existência do crime e dos indícios de autoria, os quais, reitero, estão presentes no caso sob análise.
27.00. TUDO DE ESSENCIAL POSTO E ANALISADO, JULGO PROCEDENTE A DENÚNCIA, para, de conseqüência, PRONUNCIAR o acusado M., brasileiro, solteiro, vendedor ambulante, filho de Ricardo Venceslau Teixeira e Maria José Ferreira, residente na Av. Sarney Filho, nº 16, Vila Palmeira, nesta capital, por incidência comportamental no artigo 121 do DP, o fazendo com espeque no artigo 413 do DPP, para que o mesmo possa ser submetido a julgamento perante o TRIBUNAL DO JÚRI POPULAR.
25.00. P.R.I.
26.00. Preclusão a via impugnativa, remetam-se os autos a uma das Varas do TRIBUNAL DO JÚRI, via distribuição.
27.00. Dê-se baixa em nossos registros.
São Luis, 23 de dezembro de 2008.
Juiz José Luiz Oliveira de Almeida
Titular da 7ª Vara Criminal