Refletindo sobre processo penal, Francesco Carnelutt (As Misérias do Processo Penal) destaca que o papel do juiz náo está somente no reconstruir um fato; tem que ir além, até penetrar na alma do acusado.
Diz ele, a propósito, que “quando, em um processo por homicídio, se está certo de que o acusado, com um tiro de pistola, matou um homem, não se sabe ainda dele tudo quanto precisa saber para condená-lo”.
O homicídio, prossegue, nessa linha de argumentação, “não é somente ter matado, mas ter querido matar. Isto quer dizer que o juiz não deve limitar a sua indagação somente ao exterior, ou seja, as correlações do corpo do homem com o resto do mundo, mas deve descer, com a indagação, na sua alma”.
O mesmo Carnelutti, mais adiante, arremata, no que interessa para essas reflexões: “ o perigo mais grave é o de atribuir ao outro a nossa alma, ou seja, de julgar aquilo que ele sentiu, compreendeu, quis, segundo aquilo que nós sentimos, compreendemos, queremos”.
Pois bem. Na sessão de ontem, é verdade, destaquei a produtividade dos juizes concorrentes à promoção. Mas não o fiz, como alguns pensam, para me contrapor àqueles que afirmam que nós pouco produzimos. Fi-lo,sim, porque era um imperativo legal, um critério objetivo ao qual tinha que fazer menção, porque tinha que motivar a minha decisão. E digo mais: não destaquei a produtividade dos juízes do Maranhão, mas dos juízes inscritos para promoção por merecimento, o que, convenhamos, é bem diferente.
É que, como tem sido veiculado e comentado, parece que eu, na sessão de ontem, absolvi os juízes do Maranhão dos seus pecados, dos nossos pecados, o que não é verdade.
Os que pensam dessa forma decerto se julgam no direito de substituir a minha alma, as minhas angústias e as minhas convicções.
Eu continuo achando que podemos produzir mais, que podemos fazer muito mais do que fazemos.
Eu continuo achando que o juiz deve estar junto ao jurisdicionados o tempo que for necessário, em face mesmo do que representa a sua presença física na comunidade onde presta o seu labor.
Eu continuo achando que o Poder Judiciário tem uma dívida – histórica, registro – para com seus jurisdicionados, que precisa ser resgatada.
Eu continuo achando que poderíamos – todos nós, juízes, e, sobretudo, os desembargadores – ser mais humildes e admitir que, podendo, ainda fazemos pouco para atender às expectativas da sociedade.
Mas , voltando à sessão de ontem, convém destacar, em face da relevância do fato, que os juízes que se inscreveram para promoção tiveram o cuidado de provar que realizaram audiências às segundas e sextas-feiras, ou tentaram – pelo menos – justificar por que não o fizeram.
Quanto à produtividade, convém anotar que, entre os concorrentes, só dois tiveram produtividade alta, dado por mim destacado ao tempo da composição da minha lista.
O mais que se comente ou que se especule é apenas uma malsã tentativa de questionar a minha alma – o que pensei, senti e pretendi dizer.
Mas, advirto, ainda com Carnelutti, ninguém conseguirá atribuir a mim a sua alma, ninguém sentirá por mim o que sinto; ninguém conseguirá, jamais, se apossar das convicções, pela singela razão de que elas são frutos da minha história, das minhas conquistas e das minhas inquietações.
Desembargador José Luiz, por gentileza como é mesmo aquela frase que o Sr. sempre cita em seus arrazoados orais sobre convicção do julgador em matéria penal e quem é o autor? No aguardo. Armando Serejo.