Direito em movimento

Na decisão que publico a seguir, entendi que o decreto de prisão preventiva do paciente não estava devidamente fundamentado.

Ressalto, em determinado fragmento, aquilo que todos já sabemos, ou seja, que a prisão cautelar, por ser medida excepcional, deve estar arrimada em  fatos concreto que a justifiquem.

Ressalto, ademais, que o juízo valorativo da gravidade genérica do crime imputado ao paciente, desvinculado de qualquer fato concreto a justificar a implementação da medida extrema, autoriza a concessão da ordem pleiteada, por estar o paciente submetido a constrangimento ilegal.

A seguir, o voto.

PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL

Sessão do dia 9 de agosto de 2011.

Nº Único: 0003523-84.2011.8.10.0000

Habeas Corpus Nº 017226/2011 – Timon (MA)

Paciente : R. D. X. N.
Impetrante : B. Á. M. M. e outra
Impetrado : Juiz de Direito da 6ª Vara Criminal da Comarca de Timon/MA
Incidência Penal : Art. 121, c/c art. 14, II, do CP
Relator : Desembargador José Luiz Oliveira de Almeida

Acórdão Nº 104815/2011

Ementa. HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO TENTADO. PRISÃO PREVENTIVA. GRAVIDADE GENÉRICA DO DELITO. DECISÃO CARENTE DE FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. ORDEM CONCEDIDA. LIMINAR CONFIRMADA.

1. A decisão que decreta a prisão preventiva deve estar apoiada em elementos reais, que justifiquem a necessidade da medida, trilhando os pressupostos e requisitos legais constantes nos artigos 311 e 312, do CPP.

2. O juízo valorativo da gravidade do crime imputado ao paciente, desvinculado de qualquer fato concreto, não constitui fundamentação idônea a autorizar a custódia cautelar.

3. Ordem concedida para, confirmando a liminar já deferida, revogar a prisão preventiva do paciente.

 

 

Acórdão – Vistos, relatados e discutidos os presentes autos em que são partes as acima indicadas, ACORDAM os Senhores Desembargadores da Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, por unanimidade e de acordo com o parecer da Procuradoria Geral de Justiça, em conceder a ordem impetrada, confirmando a liminar anteriormente deferida, nos termos do voto do Desembargador Relator.

Participaram do julgamento os Excelentíssimos Senhores Desembargadores Raimundo Nonato Magalhães Melo, José Luiz Oliveira de Almeida e Antônio Fernando Bayma Araújo (Presidente). Presente pela Procuradoria Geral de Justiça o Dr. Eduardo Jorge Hiluy Nicolau.

São Luís (MA), 09 de agosto de 2011.

DESEMBARGADOR Antônio Ferando Bayma Araújo

PRESIDENTE

 

 

DESEMBARGADOR José Luiz Oliveira de Almeida

RELATOR

 

 


Habeas Corpus  Nº 017226/2011 – Timon

 

Relatório – O Sr. Desembargador José Luiz Oliveira de Almeida (relator): Trata-se de habeas corpus preventivo, impetrado em favor de R. D. X. N., contra ato praticado pelo MM. Juiz de Direito da 6ª Vara Criminal da Comarca de Timon/MA.

Segundo consta na inicial do mandamus, o paciente encontra-se ameaçado de sofrer constrangimento ilegal, em seu direito de liberdade, em virtude do decreto de prisão preventiva, desprovido de fundamentação jurídica, expedido pela autoridade apontada como coatora.

De acordo com o impetrante, o paciente foi denunciado pela suposta prática do crime de homicídio, em sua forma tentada, oportunidade em que o órgão ministerial requereu a decretação de sua prisão preventiva, o que fora deferido pela autoridade judicial.

Argumenta que a decisão proferida pelo juiz de base limita-se a apontar, de forma genérica, a presença dos requisitos autorizadores da custódia cautelar, violando o princípio da motivação das decisões judiciais.

Sustenta, ademais, que, ao decidir pelo ergástulo preventivo do paciente, o juiz a quo afirma que a medida se faz necessária para “impedir que volte a delinquir”, sendo que se trata de réu primário, detentor de bons antecedentes, trabalhador e que possui residência fixa.

Assevera que o decreto prisional em tela é ilegal, posto que não configura meio idôneo para restringir a liberdade do paciente, fazendo-se necessária a apresentação de fator que justifique a efetividade da medida.

Alegando a presença dos requisitos fumus boni iuris e periculum in mora, requereu a concessão liminar da ordem de habeas corpus, com a expedição de salvo-conduto em favor do paciente.

Instruiu o writ com os documentos de fls. 17/85.

A liminar pleiteada foi por mim concedida, nos termos da decisão constante às fls. 92/94, ocasião em que solicitei à autoridade coatora as informações de praxe, as quais foram juntadas às fls. 98.

A Procuradora de Justiça Maria dos Remédios F. Serra, em manifestação às fls. 103/106, opinou pela concessão da ordem, confirmando a liminar deferida, aduzindo que a decisão ora fustigada não está concretamente fundamentada.

É o sucinto relatório.


Voto – O Sr. Desembargador José Luiz Oliveira de Almeida (relator): Trata-se de habeas corpus contra ato do MM. Juiz de Direito da 6ª Vara Criminal da Comarca de Timon/MA, impetrado pelo advogado B. Á. M. M., em favor de R. D. X. N..

Preliminarmente, conheço do presente habeas corpus, eis que atendidos os pressupostos legais de admissibilidade.

A linha argumentativa da ação em apreço concentra-se na alegação de constrangimento ilegal, ante a ausência de fundamentação da decisão que decretou a prisão preventiva do paciente.

 Após detida análise das razões expendidas na inicial, bem como dos documentos que a instruem, não restam dúvidas de que a decisão proferida em sede de liminar deve, agora, ser confirmada.

O atual ordenamento jurídico, em especial quando se trata de restrição ao direito de liberdade, não admite que a decisão que decreta a custódia provisória seja desmotivada, nem que utilize mera repetição de termos legais, sem qualquer referência às circunstâncias do caso concreto.

Na espécie, observa-se que o Ministério Público ofertou denúncia contra o paciente pelo crime previsto no art. 121, c/c art. 14, II, do CP, e, na mesma oportunidade, pugnou pela decretação de sua prisão preventiva ao argumento de que se encontravam presentes os pressupostos autorizadores da medida (fls. 18/21).

O juízo de base, ao receber a denúncia, atendeu ao pleito ministerial e decretou a custódia cautelar do paciente, limitando-se a afirmar:

[…] No caso em tela, trata-se de tentativa de homicídio, onde se faz necessário a decretação da Prisão Preventiva para a garantia da ordem pública, no intuito de impedir que o mesmo continue delinqüindo […]

É evidente que a segregação acautelatória do paciente prescinde de motivação válida.

A autoridade impetrada, como é possível observar através da cópia da decisão constante às fls. 23/24, omitiu-se em analisar a real ocorrência dos requisitos que autorizam a prisão preventiva, previstos no art. 312, do CPP.

Decisões deste jaez, como é ressabido, não se amoldam às garantias constitucionais da não culpabilidade e motivação. Nesse norte, já assentou a jurisprudência:

EMENTA: HABEAS CORPUS. PRISÃO PREVENTIVA. REQUISITOS DO ART. 312 DO CPP. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. CONSIDERAÇÃO TÃO-SÓ A GRAVIDADE ABSTRATA DO CRIME. FUGA DO ESTABELECIMENTO PRISIONAL. AUSÊNCIA DE ADITAMENTO AO DECRETO DE PRISÃO. FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO. ORDEM CONCEDIDA. 1. Em matéria de prisão processual, a garantia constitucional da fundamentação do provimento judicial importa o dever da real ou efetiva demonstração de que a segregação atende a pelo menos um dos requisitos do art. 312 do Código de Processo Penal. Sem o que se dá a inversão da lógica elementar da Constituição, segundo a qual a presunção de não-culpabilidade é de prevalecer até o momento do trânsito em julgado da sentença penal condenatória. 2. A mera referência vernacular à garantia da ordem pública não tem a força de corresponder à teleologia do art. 312 do CPP.[1] […]

A prisão cautelar, como é cediço, é medida excepcional e deve ser decretada apenas quando devidamente amparada pelos requisitos legais previstos na legislação de regência, em observância ao princípio constitucional da presunção de inocência ou da não culpabilidade, sob pena de antecipar a reprimenda a ser cumprida quando da condenação definitiva[2].

Ressalta-se, ainda, que o juízo valorativo da gravidade genérica do crime imputado ao paciente, desvinculada de qualquer fator concreto ensejador da configuração dos requisitos do art. 312, do CPP, não constitui fundamentação idônea a autorizar a prisão cautelar.

Importante registrar, ademais, que, após a vigência da Lei 12.403/2011, a necessidade da prisão preventiva deve passar por um filtro de ponderação e análise escalonada, só sendo cabível quando as demais medidas cautelares previstas no art. 319, do CPP não se mostrarem idôneas.

A despeito das informações prestadas pela autoridade indigitada coatora (fls. 98), vale consignar, conforme observado pelo Ministério Público em seu parecer, que não podem suprir a ausência de fundamentação e consequente ilegalidade do decreto prisional.

Dessa forma, com as considerações supra, concedo a ordem de habaes corpus para revogar a prisão preventiva do paciente na ação penal que se cuida, expedindo-se contramandado de prisão, sem prejuízo, contudo, de que nova custódia cautelar seja decretada, desde que com fundamentação idônea.

É como voto.

Sala das Sessões da Primeira Câmara Criminal, do Tribunal de Justiça do Maranhão,em São Luís,  09 de agosto de 2011.

 

 

DESEMBARGADOR José Luiz Oliveira de Almeida

RELATOR


[1] STF – HC 101705 / BA. Rel.: Min. AYRES BRITTO. 1ª T. DJ: 29/06/2010.

[2] STJ, HC 182.736/SP, Rel. Ministro GILSON DIPP, QUINTA TURMA, julgado em 14/06/2011, DJe 01/07/2011.


Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

Um comentário em “Direito em movimento”

  1. O juiz atualmente terá uma grande dificuldade em decretar a prisão preventiva quando receber um auto de prisão em flagrante, visto que as primeiras medidas cautelares elencadas no art 319 do CPP têm como finalidade garantir a ordem pública, aplicação da lei penal e a instrução criminal. Tenho um grande receio da sensenção de impunidade. E mais, o descrédito do instituto da fiança quando, reiteramente, for quebrada pelo beneficáio. Teremos então que retornar à velha prática do decreto de prisão preventiva por carimbo. Quanto à medida da tornozeleira eletrônica é de constitucionalidade duvidosa. E o aparato estatal não tem condicões financeiras e administrativas de implementar a fiscalização efetiva sobre os beneficiários. Uma lei de 1º mundo para ser aplicada nos rincões paupérimo do terceiro mundo. Vamos aguardar!!!!!

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