Habeas corpus. Concessão

P.P.N.P. foi citado por edital, a cujo chamamento não atendeu, tendo o juiz do feito, por isso, entendido devesse decretar a sua prisão.

A citação em comento foi, ao depois, anulada, tendo em vista a comprovação de que os meios de citação pessoal  do paciente não tinham sido exauridos.

A despeito da nulidade da citação ficta, pelas razões antes anotadas, a prisão do paciente foi mantida.

O paciente, em sede de habeas corpus, argumentou que, por isso, estava submetido a constrangimento ilegal, já que a sua prisão tinha sido decretada em face de uma informação irreal, ou seja, a sua não localização.

Do voto que apresentei, em face do HC em comento, em determinado excerto anotei que “… a nulidade da citação implica em reconhecer, definitivamente, a falta de substracto fático-jurídico da prisão preventiva…”.

Noutro fragmento, consignei, na linha de pensardo STJ,  que a nulidade da citação implica na contaminação de todos os demais atos processuais subsequentes, sendo inviável confinar os efeitos da nulidade para determinados atos, em virtude do princípio da causalidade.

Não deixei de anotar, por entender relevante, que a prisão cautelar do paciente havia sido decretada, unicamente, com base na impossibilidade de sua localização, que também serviu de fundamento para a citação editalicia, razão pela qual entendia que, agora, em face da nulidade suso apontada, não havia motivos para manutenção da prisão do paciente.

Publico, a seguir, o voto que apresentei, em face do HC sob retina:

PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL

Sessão do dia 14 de junho de 2011.

Nº Único: 0002456-84.2011.8.10.0000

Habeas Corpus  Nº 012022/2011 – São Luís

Paciente : P.
Impetrante : C.
Autoridade Coatora : Juíza de Direito da 11ª Vara Criminal da Comarca de São Luís-MA
Incidência Penal : Art. 213, c/c 226, II, do CPB
Relator : Desembargador José Luiz Oliveira de Almeida

Acórdão Nº 103036/2011

Ementa. HABEAS CORPUS. CRIME DE ESTUPRO. IMPOSSIBILIDADE DE LOCALIZAÇÃO DO PACIENTE. APLICAÇÃO DO ART. 366, DO CPP. CITAÇÃO POR EDITAL E DECRETAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA. ESGOTAMENTO DOS MEIOS DE LOCALIZAÇÃO PESSOAL. NULIDADE RECONHECIDA. CONTAMINAÇÃO DE TODOS OS ATOS SUBSEQUENTES. PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE. ORDEM CONCEDIDA.

1. A citação é ato processual necessário à inequívoca ciência do acusado acerca das imputações criminosas contra si formuladas. Por conseguinte, sua efetivação pela via editalícia só é admitida em última hipótese, quando esgotados os meios de localização pessoal do denunciado.

2. A nulidade da citação implica na contaminação de todos os demais atos processuais subsequentes, sendo inviável confinar os seus efeitos para determinados atos, em virtude do princípio da causalidade.

3. Se a base empírica da prisão preventiva e da citação editalícia são as mesmas (impossibilidade de localização do paciente), a nulidade do ato citatório implica em reconhecer a falta de substrato fático-jurídico para a ergástula cautelar.

4. Precedentes do STJ.

5. Ordem concedida para revogar, em definitivo, a prisão preventiva do paciente, e anular a sua citação editalícia e todos os demais atos processuais subsequentes.

 

Acórdão – Vistos, relatados e discutidos os presentes autos em que são partes as acima indicadas, ACORDAM os Senhores Desembargadores da Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, por unanimidade e de acordo com o parecer da Procuradoria Geral de Justiça, em conceder a ordem impetrada, confirmando a liminar anteriormente deferida, e revogar, definitivamente, a prisão preventiva do paciente, declarando nula a citação editalícia, e todos os atos processuais subsequentes, que deverão ser refeitos, nos termos do voto do Desembargador Relator.

Participaram do julgamento os Excelentíssimos Senhores Desembargadores Antônio Fernando Bayma Araújo (Presidente), José Luiz Oliveira de Almeida e Raimundo Nonato Magalhães Melo. Presente pela Procuradoria Geral de Justiça a Dra. Domingas de Jesus Froz Gomes.

São Luís(MA), 14 de junho de 2011.

DESEMBARGADOR Antônio Fernando Bayma Araújo

PRESIDENTE

 

 

DESEMBARGADOR José Luiz Oliveira de Almeida

RELATOR


Habeas Corpus  Nº 012022/2011 – São Luís

 

Relatório – O Sr. Desembargador José Luiz Oliveira de Almeida (relator): Trata-se de habeas corpus com pedido de liminar, contra ato da MMª. Juíza de Direito da 11ª Vara Criminal da Comarca de São Luís-MA, impetrado por C., em favor de P.

Argumenta o impetrante, em síntese:

I – que o paciente está sendo processado, pela prática, em tese, do crime previsto no art. 213, c/c 226, II, do CPB, cuja denúncia foi recebida em 25/11/2003;

II – que a diligência citatória restou frustrada, em razão do Meirinho não ter localizado a rua em que reside o paciente, o que motivou sua citação pela via editalícia, e, por conseguinte, a decretação de sua revelia, com a aplicação do art. 366, do CPP (suspensão do processo e do curso do prazo prescricional);

III – que a autoridade judiciária apontada coatora, atendendo ao pleito ministerial, decretou a prisão preventiva do paciente em 14 de fevereiro de 2007, levando em conta, sobretudo, a sua alegada fuga do distrito da culpa;

IV – que, somente em 27 de abril de 2011 foi expedido o mandado de prisão, sendo efetivado em 05/05/2011;

V – que aquela citação por edital é nula, asseverando que deveria o magistrado, antes, ter esgotado as possibilidades de localização do réu; e

VI – que, em razão da referida nulidade da citação, a prisão preventiva também está maculada, porque embasada, única e exclusivamente, na suposta fuga.

Com fulcro nesses argumentos, requereu, liminarmente, a revogação da prisão preventiva, com a expedição de Alvará de Soltura em favor do paciente, e no mérito, que seja decretada a nulidade da citação, confirmando-se a revogação daquela medida cautelar extrema.

Instruiu a inicial com os documentos de fls. 17/204, dentre os quais, cópia do processo de origem, e cópias integrais de decisões que embasam seu pedido.

Impetrado durante o plantão judiciário de 2º grau, o desembargador plantonista, na decisão exarada às fls. 206/208, concedeu parcialmente a liminar, apenas para nulificar a citação editalícia, mantendo, todavia, a prisão preventiva.

Distribuído o processo a esta relatoria, o impetrante atravessou, às fls. 213/216, pedido de reconsideração da decisão liminar, asseverando, em síntese, que a nulidade da citação implica no desfazimento de todos os atos posteriores, sobretudo, a prisão preventiva, tendo em conta que esta se embasou, exclusivamente, na suposta fuga do paciente, que, por sua vez, também serviu de fundamento para a citação editalícia.

Convencido, a priori, do acerto de tais argumentos, deferi o pleito de reconsideração, às fls. 218/221, revogando, liminarmente, a prisão preventiva do paciente.

A autoridade judiciária apontada coatora prestou suas informações às fls. 224, juntando aos autos cópia integral do processo de origem (fls. 225/348).

Em seu douto parecer lançado às fls. 351/356, a Procuradora de Justiça Domingas de Jesus Froz Gomes opinou pela concessão da ordem, confirmando as decisões liminares já deferidas.

É o relatório.

 Voto – O Sr. Desembargador José Luiz Oliveira de Almeida (relator): Trata-se de habeas corpus com pedido de liminar, contra ato da MMª. Juíza de Direito da 11ª Vara Criminal da Comarca de São Luís-MA, impetrado por C., em favor de P.

Preliminarmente, conheço do presente writ, eis que atendidos os requisitos legais de admissibilidade.

No presente writ, pretende o impetrante, fundamentalmente, que seja decretada a nulidade da citação editalícia do paciente, porquanto alega que não foram esgotados os meios necessários para localizá-lo. Consequentemente, postula a revogação da prisão preventiva do paciente, já que sua causa fática-jurídica (suposta fuga e decretação da revelia), em seu entender, é nula.

Consignei, já em sede de cognição sumária, que “[…] inobstante o ilustre desembargador plantonista tenha entendido, num exame prelibatório, declarar nula aquela citação por edital, em minha compreensão, concessa venia, esta matéria diz respeito ao mérito da impetração, cujo pronunciamento depende de cognição mais aprofundada, atribuída ao órgão colegiado, após as informações e manifestação da Procuradoria Geral de Justiça. […]”

Pois bem.

Ao examinar o pleito de reconsideração, já havia esboçado, aprioristicamente, as razões pelas quais entendi que a prisão do paciente era nula, asseverando que “[…] pude perceber que sua causa fático-jurídica centra-se na impossibilidade de localização do paciente, a qual também motivou, por sua vez, a decretação de sua revelia e a aplicação do art. 366, do CPP. […]”

Agora, em sede de cognição exauriente, na qual avulta o exame da aventada nulidade da citação por edital, reafirmo, com absoluta convicção, que este ato processual levado a cabo pelo juízo apontado coator é nulo, porque foi efetivado sem antes esgotar as possibilidades de localização pessoal do paciente, o que poderia ser feito, ad exempli, com a expedição de ofícios ao TRE/MA e à Receita Federal, cujos bancos de dados, geralmente, possuem informações mais atualizadas a respeito dos eleitores e contribuintes, respectivamente.

A nulidade em causa é assim reconhecida porque, como é ressabido, as comunicações dos atos processuais através de editais são considerados meios fictos de levá-los ao conhecimento do interessado. Daí porque só são admissíveis em última hipótese, por não possibilitarem ao réu a inequívoca ciência a respeito de determinado ato processual. A ofensa ao contraditório, com efeito, é manifesta, porque o seu exercício pressupõe, logicamente, conhecimento prévio, para possibilitar a manifestação posterior.

Nesse norte, já assentou a jurisprudência do STJ:

[…]

1. Não há qualquer nulidade a ser reconhecida na citação editalícia ocorrida após a efetiva verificação de que o réu se encontrava em lugar incerto e não sabido, sendo esgotados todos os meios para tentar localizá-lo. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça.

[…]

6. Habeas corpus denegado.[1]

(sem destaques no original)

No mesmo diapasão:

HABEAS CORPUS. ESTUPRO. CITAÇÃO POR EDITAL. REVELIA. NÃO ESGOTAMENTO DE TODOS OS MEIOS PARA A LOCALIZAÇÃO DO ACUSADO. NULIDADE. PRISÃO PREVENTIVA FUNDADA NA FUGA DO PACIENTE. INSUBSISTÊNCIA. ORDEM CONCEDIDA.

1. Pacífico o entendimento do Superior Tribunal de Justiça de que devem ser esgotadas todas as diligências possíveis para a localização do réu antes de se determinar a citação por edital, sob pena de nulidade.

2. Sendo o paciente procurado, na mesma data marcada para a realização da audiência de interrogatório, tão somente no endereço residencial por ele fornecido, nada se mencionando sobre a tentativa de encontrá-lo na fazenda onde estava trabalhando, tampouco o oficial de justiça ter retornado outro dia à sua residência, fica evidenciado o constrangimento ilegal.

3. Tendo em conta que o paciente se encontra recolhido há mais de dois anos, e que a custódia foi imposta, antes do trânsito em julgado da condenação, unicamente em razão de ele não ter sido encontrado, mostra-se razoável assegurar-lhe o direito de responder ao processo em liberdade.

4. Ordem concedida para anular o processo a partir da citação por edital do paciente, inclusive, garantindo-lhe, ainda, o direito de responder ao processo em liberdade, se por outro motivo não estiver preso.[2]

(sem destaques no original)

Reitero, ademais, que “[…] a nulidade da citação implica na contaminação de todos os demais atos processuais subsequentes, sendo inviável confinar os efeitos da nulidade para determinados atos, em virtude do princípio da causalidade, conforme já se pronunciou o STJ[3]. […]”

Assim, a mácula do ato citatório por edital implica na contaminação de todos os demais atos processuais, que deverão ser refeitos, por se tratar de vício insanável.

Reafirmo, ainda, que a prisão cautelar do paciente havia sido decretada, unicamente, com base na impossibilidade de sua localização, que também, serviu de fundamento para a citação editalícia.

Assim, a nulidade da citação implica em reconhecer, definitivamente, a falta de substrato fático-jurídico da prisão preventiva, tal como consignei em sede de cognição sumária, avultando a ilegalidade da medida.

Com essas considerações, conheço do presente habeas corpus para, de acordo com o parecer da Procuradoria Geral de Justiça, confirmar os efeitos das decisões liminares de fls. 206/208 e fls. 218/221, e revogar, definitivamente, a prisão preventiva do paciente, declarando nula a sua citação editalícia, e todos os atos processuais subsequentes, que deverão ser refeitos.

É como voto.

Sala das Sessões da Primeira Câmara Criminal, do Tribunal de Justiça do Maranhão, em São Luís, 14 de junho de 2011.

DESEMBARGADOR José Luiz Oliveira de Almeida

RELATOR


[1] HC 141.808/PE, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 03/02/2011, DJe 21/02/2011.

[2] HC 115.849/MT, Rel. Ministro HAROLDO RODRIGUES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/CE), SEXTA TURMA, julgado em 27/04/2010, DJe 14/06/2010.

[3] […] I –  A nulidade de um ato, uma vez declarada, causará a dos atos que dele diretamente dependam ou sejam conseqüência, a teor do art. 573, § 1º, do CPP. (Precedentes). II – A princípio, a declaração da nulidade do processo a partir da citação editalícia, acarreta a nulidade, por derivação, de todos os atos processuais subseqüentes. (Precedentes). Writ concedido. (HC 28.830/SP, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 02/12/2003, DJ 19/12/2003, p. 527).

Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

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