Fui ao Cabana do Sol, restaurante, neste domingo, com a minha família. Tímido e pouco afeito aos cumprimentos públicos, coloquei os óculos escuros – para fugir dos eventuais acenos – e entrei no restaurante. Ao sentar-me à mesa, fui cumprimentado por um cliente que estava na mesa ao lado. Respondi o cumprimento com um gesto, do modo que sei fazer, ou seja, de forma bem discreta, tímida, sem estardalhaço, mesmo porque a pessoa que me cumprimentou, apesar de conhecida, eu não sabia sequer de onde a conhecia.
Aproximou-se o garçom, com a solicitude habitual, a quem pedi uma cerveja cristal. Enquanto aguardava a cerveja, meu filho analisava o cardápio. Ele sabia que podia pedir o que quisesse, pois eu sou do tipo que não faz maiores exigências nessa questão – como de tudo, ou melhor, como de nada, vez que vivo eternamente de dieta.
Pois bem, antes mesmo de chegar a minha cerveja, o cidadão, o mesmo que havia me cumprimentando antes, levantou-se e dirigiu-se à minha mesa. Fiquei logo apreensivo, pois quando estou com a minha família só gosto de dar atenção a ela e a mais ninguém – é que sou um pouco anti-social mesmo. O cidadão se aproximou e me disse, baixo, para que os presentes não ouvissem, quase colado aos meus ouvidos:
-Desembargador, desculpe tê-lo cumprimentado pelo nome. Eu sei que vocês não gostam de ser chamados pelos nomes. Por isso estou pedindo desculpas por ter cometido esse erro.
Pronto! Reconheci a voz do cidadão. Agora sabia tratar-se de um dileto colega de faculdade. Estava bem mais gordo ( problemas de saúde, segundo me disse), o que me impossibilitou de reconhecê-lo ao primeiro aceno.
Pedi-lhe desculpas pela desatenção. Não foi por querer. Confesso que fiquei encabulado e a pensar no ocorrido, enquanto aguardava a comida. Disse aos meus filhos da minha inquietação, por não ter reconhecido o meu colega e sobretudo por ele ter imaginado que eu o tratara friamente por não gostar de ser chamado pelo nome.
Tomei uma decisão. Eu não podia ficar com essa questão me alugando a mente. Levantei da mesa, impus a mim mesmo uma quebra de ritual (não gosto de incomodar as pessoas quando estão num restaurante e nem gosto de ser incomodado), fui à mesa do colega para abraçá-lo, reiterar o pedido de desculpa e dizer-lhe que a mim pouco importa ser chamado de desembargador, mesmo porque não é esse o meu nome de batismo.
Na verdade, se existe algo que me incomoda é ser chamado de desembargador, sobretudo pelos meus colegas de primeiro grau. Acho que, em face de uma solenidade, durante uma sessão de julgamento, é aceitável que sejamos tratados de desembargador, afinal, trata-se de uma tradição. Mas na rua, nas esquinas, nos corredores do Tribunal ou em qualquer outra situação que não seja solene, não me apraz ser chamado de desembargador; prefiro ser chamado como fui registrado.
Claro que há quem goste. Claro que há quem se regala com essa situação. Há os que amam ser chamados de desembargador. Para alguns esse nome é mais importante que o nome de batismo. Eu não! E digo isso sinceramente.
Para os que tiverem acesso a este post, peço mais uma vez: chamem-me pelo meu nome de batismo. Deixemos o desembargador apenas para os momentos mais solenes. Sei que não estou pedindo demais.
Quando se depararem comigo pelos cantos da cidade, fiquem certos que dispenso o “bom dia, desembargador”. Um simples e sincero bom dia a mim me basta.