Enquanto isso, entre os utopianos

thomas-more-map-utopia“[…]Os utopianos não somente afastam o crime pelas leis penais, como incitam à virtude com honrarias e recompensas. Estátuas são erguidas nas praças públicas aos homens de gênio e àqueles que prestaram à república serviços relevantes. Assim, a memória das grandes ações se perpetua e a glória dos antepassados é um aguilhão a estimular a conquista da posteridade e o incitamento ao bem.

Aquele que afronta um só magistrado perde toda esperança de exercer algum dia qualquer magistratura.

Os utopianos vivem em família.

Os magistrados não se mostram nem orgulhosos nem terríveis; são chamados pais, e, realmente, destes têm a justiça e a bondade. Recebem com simplicidade as honras que às suas funções lhes são rendidas voluntariamente; essas provas de deferência não constituem obrigação para ninguém. O próprio príncipe não se distingue da massa, nem pela púrpura nem pelo diadema, mas apenas por um feixe de trigo que traz à mão. As insígnias do pontífice reduzem-se a um círio que é levado à sua frente.

 As leis são em muito pequeno número e não obstante bastam às instituições. O que os utopianos desaprovam especialmente nos outros países  – infinita de volumes, leis e comentários, que, apesar de tudo, não são suficientes para garantir a ordem pública.

Consideram como injustiça suprema enlear os homens numa infinidade de leis, tão numerosas que se torna impossível conhecê-las todas, ou tão obscuras que é impossível compreendê-las.

Não há advogados na Utopia. Os demandistas de profissão, que se esforçam por torcer a lei, e decidir uma questão com a maior astúcia, foram dali excluídos. Os utopianos pensam que é preferível que cada um defenda sua causa e confie diretamente ao juiz o que teria a dizer a um advogado. Desta  maneira há menos ambigüidade e rodeio e a verdade se descobre mais facilmente. As partes expõem seu negócio simplesmente, pois não há advogados para ensinar-lhes as mil artimanhas da chicana.

O juiz examina e pesa as razões de cada um com bom senso e boa fé; defende a ingenuidade do homem simples contra as calúnias do velhaco.

Seria bem difícil praticar semelhante justiça nos outros países, enterrados num montão de leis, tão embrulhadas e tão equivocas. De resto, todo o mundo na Utopia é doutor em direito; porque, repito-o, as leis são em muito pequeno número e a interpretação mais grosseira e mais material é admitida como a mais razoável e mais justa.s povos é a quantidade[…]

Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

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