O poder da ostentação; a ostentação do poder.

Preparei-me para o carnaval com várias matérias jurídicas, filmes e livros. Como o tempo foi relativamente curto para leitura, me detive na leitura de uns poucos artigos jurídicos e de um livro apenas. O livro em questão é o best-seller Travessuras da menina má, de Mário Vargas Llosa. Nesse romance o autor permeia ficção e realidade.
O peruano Ricardo, um dos protagonistas, morando em Paris, reencontra o amor da adolescência e por ele passa a lutar com sofreguidão. Ricardo ultrapassa os limites do razoável para ter consigo a mulher amada, que só pensa em ostentação, em poder e conforto – prazeres que ele não podia lhe oferecer.
Num dos diálogos entre os dois personagens, Ricardo questiona Lily (um dos nomes adotados por sua amada), agora vivendo no Japão, com o chefe mafioso nominado Fukuda, porque, com tantas posses, continuava andando de ônibus, ao que respondeu que, para os japoneses, seria uma ostentação agir de outra forma. Adiante adverte: “aqui não é bem-visto diferenciar-se dos outros, seja como for”.
Essa passagem do romance me fez refletir. É que, para mim, pode estar aí a explicação do nosso atraso. Aqui no Brasil – e especialmente aqui no Maranhão – as pessoas adoram uma ostentação, vivem para ostentar, adoram parecer superiores. Os homens que estão no Poder adoram se diferenciar dos demais. Os que estão no poder sublimam demonstrar aos mais humildes que “estão podendo”, como se diz vulgarmente.
No Maranhão, se o cargo relevante (rectius: poder) pode oferecer um carro preto, tanto melhor, porque, ostentando, os homens do Poder demonstraram ao cidadão comum que são superiores. E deles se distanciam.
O grave, o que preocupa nessa ostentação com o dinheiro do povo, é que, ao que parece, tem valido à pena ostentar, tem valido à pena lutar pelo Poder, ainda que, para isso, se negocie a dignidade, o caráter. O povo parece dar grande importância a quem demonstra, seja por qualquer símbolo, que está no Poder. Não estar no Poder, não galgar uma ascensão profissional, aos olhos do povo, parece, pura e simplesmente, ser bobo, incompetente, não ter capacidade de vencer. Talvez seja por isso que me questionam tanto porque ainda não sou Desembargador. Ao que parece, pelo que ouço, o único objetivo de um magistrado é ser Desembargador. Por esse cargo, de muita ostentação, o cidadão comum entende que se deva lutar, sejam quais forem as armas. E não adiante tentar argumentar as razões do “fracasso” de não chegar lá. Para o povo, para o cidadão comum, há que se transpor qualquer obstáculo para ascender, pois que, só ascendendo, se pode ostentar o Poder. Afinal, mesmo para o mais simples dos mortais, o Poder fascina.
Impressionante como, no Poder, tudo se transforma. O juiz mais humilde, se alcança o desembargo, passa a ser visto – e agir – de outra forma. No Poder, aquele que, aos olhos do povo era apenas mais um, passa a ser respeitado, requisitado, bajulado. Passa a freqüentar, amiúde, as colunas sociais. No poder, aquele que não tinha platéia para as bobagens que dizia, jamais falará sozinho. Haverá sempre quem o ouça, que estime a sua ostentação, que sorria das bobagens que diz.
Quiçá, repito, não esteja aí a razão do nosso atraso e a razão do progresso do Japão. Os homens que estão no Poder, de regra, só pensam em seu bem-estar pessoal e de sua família.
Ou não é assim!?
Vejo nas ruas de nossa cidade carrões com placas de bronze de determinada Prefeituras, cujo valor ( do carrão) é, muitas vezes, superior ao fundo de participação do município. O que é mais grave é que, quase sempre, os veículos são usados em benefício pessoal. Enquanto isso, no município que proporciona a suntuosidade ao alcaide e sua família, grassa a miséria, o analfabetismo, a mortalidade infantil, etc.
Por essas e por outras razões é que somos um Estado atrasado. Aqui viceja a cultura de que estar no poder é dele usufruir em benefício pessoal, é poder ostentar, parecer superior, engalanar-se.
Prevalecendo por essas plagas o exibicionismo, o Japão continuará crescendo e o Brasil, ficando para trás.
E o Maranhão, como fica? Bom, o Maranhão, ao que parece, durante muitos anos ainda será o campeão da miséria no país, afinal para os nossos homens públicos o que vale mesmo é poder ostentar o Poder.
Pobre Brasil; pobre Maranhão.

Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

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