HC, concessão com cassação de liminar

Tenho tido, sempre – como, de resto, todos devem ter – , cuidado extremado  com a concessão de liminar em habeas corpus. É que nem sempre o que parece, à primeira vista,  condiz com a realidade.

É cediço que quando a ilegalidade da prisão salta aos olhos do sujeito do conhecimento, é de rigor que se restabeleça de logo a liberdade do paciente. Todavia, de regra, somente depois de um exame mais verticalizado é que se tem, definitivamente, a certeza de a prisão ser ou não necessária.

Nenhum magistrado deve compactuar com a prisão, máxime a cautelar, se ela se mostra, de logo, ilegal. Diante dessa realidade, outra postura do magistrado não se espera que não seja relaxá-la, em tributo ao Estado Democrático de Direito.

Conquanto devamos nos acautelar quanto à concessão de liminares, elas ocorrem não raro, o que é temerário, pois de uma análise rarefeita, sem nenhum aprofundamento, pode resultar a liberdade de um perigoso meliante ou de um réu propenso a, por exemplo, criar embaraços para instrução criminal e consequente aplicação da lei penal.

Ainda recentemente, a 2ª Câmara Criminal, com voto condutor da minha autoria, restabeleceu a prisão de dois pacientes, favorecidos com uma liminar, depois de constatarmos que, em liberdade, poderiam, à vista de dados concretos, continuar criando obstáculos à instrução criminal.

Infelizmente, pode ter acontecido, agora, de ser tarde a reparação do equívoco. Todavia, ainda assim, decidimos pela volta dos pacientes à prisão, ainda que possa ser muito tarde.

A publicação desse voto objetiva, tão somente, alertar para o óbvio, ou seja, que a concessão de liberdade, via liminar, é um risco que todos deveríamos deixar de correr, conquanto, repito, isso deva ser feito sempre que a prisão se mostra, à evidência, ao arrepio da lei,

A seguir, o inteiro teor do voto.

Sessão do dia 19 de fevereiro de 2015.

Nº Único: 0010841-16.2014.8.10.0000

Habeas Corpus Nº 059526/2014 – São Luís Gonzaga do Maranhão(MA)

Pacientes                      :    M. N. S. de Carvalho e outro

Advogados                   :    Máxima Regina Santos de Carvalho Ferreira e outro

Impetrado                     :    Juízo de Direito da Vara Única de São Luís Gonzaga do Maranhão

Incidência Penal           :    Art. 4º, a, da Lei 1.521/51, e arts. 102 e 104, da Lei 10.741/03

Relator                         :    Desembargador José Luiz Oliveira de Almeida

Acórdão Nº ____________

 

Ementa. Habeas Corpus. Crimes de Usura, Apropriação indébita e retenção indevida de cartão magnético. Prisão preventiva. Alegação de desproporcionalidade da medida extrema. Inocorrência. Acautelamento da ordem pública e conveniência da instrução criminal que se fazem necessárias na espécie. Condições subjetivas favoráveis que, por si sós, não autorizam a revogação do ergástulo. Nova sistemática das medidas cautelares. Insuficiência. Constrangimento ilegal não evidenciado. Ordem denegada com revogação da decisão que a deferiu liminarmente.

  1. É válida a fundamentação do decreto de prisão preventiva que demonstra todas as circunstâncias fáticas relevantes, revelando a necessidade da medida por conveniência da instrução, e para acautelamento da ordem pública.
  2. A interferência indevida sobre vítimas, antes que estas prestassem declarações à autoridade policial, sinaliza nítido intento de alterar a verdade real e embaraçar a instrução criminal.
  3. Pacientes que são conhecidos na cidade por conceder empréstimos a juros exorbitantes, reter documentos para garantir a dívida e apropriar-se de benefícios previdenciários e assistenciais, especialmente de pessoas idosas, revela comportamento nocivo à normalidade das relações sociais, o que autoriza a ergástula preventiva, para acautelar a ordem pública.
  4. Se a pena máxima abstratamente prevista aos crimes imputados aos pacientes ultrapassa 04 (quatro) anos, resta preenchido o requisito disposto no art. 313, I, do Código de Processo Penal.
  5. Predicativos favoráveis, tais como primariedade, bons antecedentes, residência fixa e ocupação lícita, não eliminam, por si sós, a custódia cautelar.
  6. Inobstante a prisão preventiva materialize a ultima ratio do sistema processual penal, a gravidade in concreto da conduta e as peculiaridades do caso concreto podem justificar sua imposição de plano, em detrimento de outras medidas cautelares diversas (art. 319, do CPP), tendo em vista o princípio da proporcionalidade, em seu enfoque proibitivo da proteção estatal deficiente. Doutrina.
  7. Habeas corpus denegado. Liminar cassada.

 

Acórdão – Vistos, relatados e discutidos os presentes autos em que são partes as acima indicadas, ACORDAM, os Senhores Desembargadores da Segunda Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, por unanimidade e de acordo com o parecer da Procuradoria Geral de Justiça, denegar a ordem impetrada, e, ainda, cassar a liminar concedida durante o plantão judiciário, nos termos do voto do Desembargador Relator.

Participaram do julgamento os Senhores Desembargadores José Luiz Oliveira de Almeida (Presidente), José Bernardo Silva Rodrigues e Vicente de Paula Gomes de Castro. Presente pela Procuradoria Geral de Justiça a Dra. —.

São Luís (MA), 19 de fevereiro de 2015.

 

DESEMBARGADOR José Luiz Oliveira de Almeida

PRESIDENTE/RELATOR


Habeas Corpus Nº 059526/2014 – São Luís Gonzaga do Maranhão(MA)

 

Relatório – O Sr. Desembargador José Luiz Oliveira de Almeida (relator): Tratam os presentes autos de habeas corpus, impetrado pelos advogados Máxima Regina Santos de Carvalho Ferreira e Caio Almeida Madeira Campos, em favor de M. N. S. de C. e V. M. de C., apontando como autoridade coatora o juízo de direito da Vara Única Criminal da comarca de São Luís Gonzaga do Maranhão/MA.

Narram os impetrantes que, após informações de que os pacientes emprestavam dinheiro a juros exorbitantes, retendo como garantia de pagamento os cartões das vítimas, a autoridade policial representou pela busca e apreensão na residência dos mesmos, o que foi deferido pelo juízo de primeiro grau.

Relatam, ademais, que a referida diligência culminou na imputação do crime previsto no art. 4º, da Lei 1.521/51[1], e retenção de cartão magnético para recebimento de dívidas, cuja pena máxima é de 02 (dois) anos de detenção.

Prosseguem afirmando que a autoridade impetrada, acolhendo representação da autoridade policial, decidiu pela decretação da prisão preventiva dos pacientes, sob o fundamento de garantir a ordem pública e a regular instrução criminal.

Aduzem, diante disso, que a medida extrema merece ser revogada, tendo em vista as condições pessoais favoráveis dos pacientes, os quais são primários, têm bons antecedentes, são servidores públicos e residem no mesmo endereço há cerca de 30 (trinta anos).

Acrescentam que a segregação em tela afigura-se desproporcional, pois “se condenados forem, e não lhes fosse cabível a substituição da pena, não lhes seria aplicado o regime fechado” (fls. 06).

Alegam, outrossim, que a nova sistemática processual penal introduzida pela Lei nº 12.403/11 dispõe ser a prisão preventiva a ultima ratio, e torna possível a aplicação, na espécie, de medidas cautelares diversas.

Salientam, ainda, que ausência de tipificação, no decreto de prisão, dos crimes que são supostamente imputados aos pacientes, prejudica o direito à ampla defesa.

Requerem, com espeque em tais argumentos, a concessão da ordem, com a expedição de alvará de soltura, em sede liminar e no mérito.

Com a inicial, juntaram os documentos de fls. 11/132.

A liminar foi examinada e concedida durante o plantão judiciário de segundo grau, como se vê da decisão de fls. 134/138.

Alvará de soltura e salvo-conduto, às fls. 139/142.

Em informações (fls. 147/148), a autoridade impetrada faz um breve escorço dos fatos que levaram à investigação criminal dos pacientes, e das razões que a levaram a decretar a custódia provisória dos mesmos.

A procuradora Regina Maria da Costa Leite, no parecer conclusivo de fls. 206/211, opina pela denegação da ordem, para que seja cassada a liminar concedida, por entender que “o Juiz de base apontou a existência de fortes indícios de autoria e de prova da materialidade delitiva, bem como demonstrou com base em fatos concretos, a necessidade da garantia da ordem pública e da conveniência da instrução criminal” (fls. 209).

É o relatório.

Voto – O Sr. Desembargador José Luiz Oliveira de Almeida (relator): Tratam os presentes autos de habeas corpus, impetrado por Máxima Regina Santos de Carvalho e Caio Almeida Madeira Campos, em favor de M. N. de S. de C. e V.  M. de C., apontando como autoridade coatora o juízo de direito da Vara Única da comarca de São Luís Gonzaga do Maranhão/MA.

Preliminarmente, conheço do presente writ.

A impetração sob retina insurge-se contra a segregação preventiva dos pacientes, cujos argumentos sinalizam a desnecessidade da medida extrema, de um lado, em razão dos predicativos alegadamente favoráveis, e de outro, por suposta desproporcionalidade em face de eventual condenação, na qual, segundo afirmam, não implicará na imposição de regime inicial fechado.

Quando a questão fora sumariada, durante o recesso forense, a desembargadora plantonista concedeu, precariamente, a ordem impetrada, nos seguintes termos aqui reproduzidos (fls. 134/138):

[…] tais requisitos da custódia cautelar, a princípio, não despontam claramente evidenciados nos autos, restando apenas consignadas declarações de que  um filho dos pacientes esteve em contato com algumas pessoas envolvidas no caso, sem, contudo, ameaça-las.

Ademais, deve ser ressaltado, que ao proferir a decisão atacada, o Magistrado de primeiro grau não apontou a tipificação do delito.

Com efeito, a ausência de indicação do tipo penal no decisum combatido, além de notoriamente prejudicar o direito de defesa, poderá inviabilizar a segregação cautelar, ante a vedação da custódia preventiva para os crimes dolosos com pena inferior a 04 (quatro) anos, conforme dicção do artigo 313, inciso I, do Código de Processo Penal, com redação dada pela Lei Nº 12.403/2011, […]

Tratando da espécie, este Egrégio Tribunal de Justiça, já decidiu que a prisão preventiva somente se adequa nos crimes cuja pena máxima prevista é inferior a quatro anos, se o agente tiver contra si condenação por outro crime doloso, o que não ocorre no caso dos autos, onde comprovado que os pacientes são primários conforme certidões de antecedentes criminais de fls. 129/130.

De tal modo, com arrimo no artigo 282, § 6º, do Código de Processo Penal, recomenda-se, neste caso, a fixação de medida cautelar diversa da prisão, prevista no artigo 319, do mesmo Diploma Legal.

[…]

Logo, diante do exposto, prima facie, vislumbra-se a possibilidade, em eventual sede de juízo condenatório, da aplicação de benefícios penais, motivo pelo qual, a manutenção da prisão cautelar durante a instrução criminal resta inapropriada, ante a probalidade de ser mais gravosa que a futura reprimenda a ser aplicada.

[…]

(Destaques no original)

A medida liminar em tela não deve continuar.

Em sede de aprofundamento cognitivo, devo dizer que não visualizei o alegado constrangimento delineado na inicial, pois, na esteira do parecer ministerial, entendo que a decisão proferida pela autoridade impetrada, ao reverso do que aduzem os impetrantes, está, sim, fincada em sólida base argumentativa, que demonstra, à toda evidência, a necessidade da prisão preventiva. Vejamos.

Do decreto de prisão preventiva, acostado às fls. 83/89, é imperioso destacar os seguintes fragmentos, litteris:

[…]

Narra a autoridade policial que, os representados são conhecidos na cidade por emprestarem dinheiro a juros exorbitantes, bem como por reterem documentos como forma de garantir o pagamento, principalmente, de pessoas idosas, além de apropriar-se de pensão e outros benefícios previdenciários e assistenciais, dando-lhes aplicação diversa de sua finalidade.

Relata que, após reduzir a termo os depoimentos de algumas vítimas, representou pela busca e apreensão na residência dos acusados, o que foi deferido, tendo resultado satisfatório.

Consta na representação que os representados estão impedindo a produção de provas, pois as vítimas relataram que foram procuradas pelo casal para faltar com a verdade perante a autoridade policial.

Assim requereu a decretação da prisão preventiva dos acusados para que seja garantida a ordem pública e por conveniência da instrução criminal.

[…]

O fumus boni juris (fumus comissi delicti) e o periculum in mora (periculum in libertatis), estão calcados na prova do crime e em indícios suficientes de sua autoria e materialidade delitiva, insculpidos sob a égide do artigo 312 do Código de Processo Penal, com sua nova redação dada pela Lei nº 12.403/2011.

[…]

A prova do crime está caracterizada, face as investigações preliminares feitas, tais como depoimentos das testemunhas e documentos acostados nos autos.

Desta forma, imperiosa nos afigura a decretação ergastulatória preventiva dos representados.

A prisão preventiva é, sem dúvida, uma medida de força, que o interesse social reclama da liberdade individual, com a tríplice finalidade de permitir que o acusado se mantenha acessível à justiça no distrito da culpa, de evitar que ele, por manobras forje a produção nas provas e de obstar ao procedimento de sua atividade delituosa.

A segregação cautelar somente se justifica quando presentes os pressupostos do artigo 312 do Código de Processo Penal, com nova redação dada pela Lei nº 12.403/2011, ou seja, quando for necessária para salvaguardar a ordem pública ou econômica, a instrução criminal ou a aplicação da lei. O que ocorre no presente caso, haja vista que o representado, se permanecer solto pode tentar ludibriar as testemunhas e destruir provas do delito em comento, prejudicando a instrução criminal.

[…]

Na espécie, a presença dos acusados em liberdade, ensejaria graves reflexos na ação da Justiça que necessita estar presente através de medidas efetivas, visando coibir a repetição de atos violentos e prevenindo conseqüências mais graves como medida para garantia da ordem pública.

[…]

(Negritamos)

Pois bem.

A decisão sob retina, mantida em primeira instância após reanálise (fls. 131/132), está indiscutivelmente fundamentada.

De forma minudente e com base em dados concretos assomados dos autos, o juízo apontado coator demonstrou, quantum satis, a necessidade da medida extrema, por conveniência da instrução criminal e para garantia da ordem pública.

O contexto fático da ergástula preventiva aponta não só para a gravidade concreta dos delitos imputados aos pacientes, como também menciona a motivação da representação levada a efeito pela autoridade policial, consistente na interferência indevida que vinham fazendo sobre as vítimas, para que estas alterassem as suas declarações em sede administrativa.

Essa circunstância encontra respaldo nos depoimentos colacionados aos autos, como se vê, à guisa de exemplo, da declaração de Thiago Teixeira Salgado, o qual, no curso do inquérito policial, afirmou (fls. 68/69):

[…] que o filho do casal, de nome ERICH, esteve na casa da declarante no domingo (23.11.2014) e disse para a declarante antes de vir na delegacia prestar esclarecimento que fosse até a casa de seus pais, pois a “NEIDE” iria dizer o que era para a declarante falar nesta Delegacia; […]

Raimunda Fernandes de Oliveira, consoante consta das fls. 73, disse, na seara extrajudicial:

[…] que foi procurada pelo casal, para dizer no seu depoimento na Delegacia que só havia pego R$ 200,00 (Duzentos reais), a juros de 10%, e que o seu cartão de benefício previdenciário só estava retido como o casal há dois meses; que ainda disseram para a declarante que, quando pegasse o cartão na Delegacia retornasse até a casa dela – “NEIDE” e “VAGNER”, para entregar o cartão supracitado. […]

Não se trata, portanto de mera conjectura. Há várias evidências que indicam que os pacientes pretendem embaraçar a instrução criminal, pois, ainda que não haja relatos de ameaças físicas contra as vítimas, há nítidos indícios de que usem do poder de domínio sobre os seus bens para influenciá-las e constrangê-las a agir e dizer de acordo com o que lhes convêm, a ensejar a decretação da medida extrema. Em situação semelhante, o STJ proferiu que:

[…] Conforme analisado pelo Juiz de primeiro grau, duas testemunhas modificaram seus depoimentos em sede policial, sendo inegável a interferência do réu. Dessa forma, a decretação da prisão cautelar demonstra, com dados concretos, que a liberdade do paciente compromete a conveniência da instrução criminal. […][2]

Necessário ponderar, ainda, que a decisão fustigada traz à tona a gravidade in concreto das condutas imputadas aos pacientes, pois, segundo nela consta, estes vinham, há tempo considerável, concedendo empréstimos a juros excessivamente altos, sobretudo para pessoas idosas e beneficiários de programas assistenciais, retendo documentos pessoais como garantia de pagamento das dívidas.

Desde meu olhar, esse contexto fático, somado às declarações das vítima perante a autoridade policial, põe em relevo a necessidade de garantir a ordem pública com a segregação dos pacientes, cuja liberdade põe em risco a normalidade das relações sociais de São Luís Gonzaga do Maranhão.

Nesse particular, entendo que nem mesmo a ausência de tipificação de todos os crimes no decreto prisional conduz à soltura dos pacientes, pois que não entrevejo, a par disso, cerceamento de defesa, tal qual enfatizado na decisão que concedeu a liminar[3].

Em sentido antípoda, compreendo que os pacientes defendem-se dos fatos que lhes são atribuídos, os quais subsumem-se, num primeiro momento, aos tipos penais elencados no art. 4º, a, da Lei 1.521/51[4], e arts. 102 e 104, da Lei 10.741/03[5], cujas pena máxima abstratamente considerada ultrapassa a 04 (quatro) anos, não havendo o que se falar, portanto, em descumprimento ao disposto no art. 313, I, do Código de Processo Penal, nem tampouco que, em caso de eventual condenação, jamais ser-lhes-á imposto o regime fechado.

Destarte, nem mesmo os predicativos favoráveis dos pacientes, ou o fato de serem servidores públicos, são capazes, de per se, elidir a prisão preventiva, porquanto seus pressupostos e requisitos foram demonstrados, à saciedade, na espécie. Enfim,

[…] No tocante à custódia cautelar, é da jurisprudência desta Corte que a primariedade, os bons antecedentes, a residência fixa e a profissão lícita são circunstâncias pessoais que, de per se, não são suficientes ao afastamento da prisão preventiva. Ordem denegada.[6]

No tocante ao pedido de imposição de medidas cautelares diversas da prisão, entendo, a par do exposto, que estas se revelam inadequadas e insuficientes na espécie.

Embora a Lei nº 12.403/2011 tenha acentuado o caráter de ultima ratio da prisão preventiva, não se pode perder de vista que o princípio da proporcionalidade também visa tutelar a sociedade, sob o enfoque da proibição da proteção deficiente, significando que o cárcere, no contexto das medidas cautelares, muito embora materialize o mais violento meio de coerção estatal, ainda mostra-se necessário, em determinados casos. Nesse norte acentua a doutrina:

[…] O princípio da proporcionalidade tem por objeto não apenas evitar cargas coativas excessivas na esfera jurídica dos particulares (proibição de excesso), mas também exigir dos órgãos estatais o dever de tutelar de forma adequada determinados direitos consagrados na Constituição (proibição de insuficiência).

A proibição de insuficiência (Untermassverbo) impõe ao Estado a adoção de medidas adequadas e suficientes para garantir a proteção dos direitos fundamentais, ainda que nem sempre seja simples estabelecer os termos exatos desta proteção. […][7]

Com isso, quero dizer que, no caso concreto, diante do quadro fático acima delineado, a prisão preventiva, para mim, evidencia-se como o único meio idôneo de acautelamento do tecido social e para a conveniência da instrução, mostrando-se, ainda, necessária sua manutenção, pois as medidas previstas no art. 319, do CPP, revelam-se, neste momento, inócuas.

Desta forma, não exsurge dos autos, de forma inconteste, o alegado constrangimento ilegal, de modo que a prisão preventiva deve subsistir.

Com essas considerações, conheço do presente habeas corpus, para, de acordo com o parecer da Procuradoria Geral de Justiça, denegar a ordem, revogando a liminar antes concedida.

Expeçam-se os respectivos mandados de prisão.

É como voto.

Sala das Sessões da Segunda Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Maranhão, em São Luís, em 19 de fevereiro de 2014.

 

DESEMBARGADOR José Luiz Oliveira de Almeida

RELATOR

[1] Art. 4º. Constitui crime da mesma natureza a usura pecuniária ou real, assim se considerando:

  1. a) cobrar juros, comissões ou descontos percentuais, sobre dívidas em dinheiro superiores à taxa permitida por lei; cobrar ágio superior à taxa oficial de câmbio, sobre quantia permutada por moeda estrangeira; ou, ainda, emprestar sob penhor que seja privativo de instituição oficial de crédito;

[2] HC 144.045/RJ, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, QUINTA TURMA, julgado em 04/02/2010, DJe 15/03/2010.

[3] Segundo pacífica jurisprudência dos nossos pretórios, “O acusado defende-se dos fatos narrados na inicial acusatória, não de sua capitulação legal, sendo certo que o Juízo sentenciante pode atribuir a tais fatos definição jurídica diversa, ainda que, em consequência, tenha de aplicar pena mais grave, nos termos do art.

383 do Código de Processo Penal” (AgRg no AREsp 130.331/SC, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 22/05/2014, DJe 29/05/2014).

[4] Art. 4º. Constitui crime da mesma natureza a usura pecuniária ou real, assim se considerando:

  1. a) cobrar juros, comissões ou descontos percentuais, sobre dívidas em dinheiro superiores à taxa permitida por lei; cobrar ágio superior à taxa oficial de câmbio, sobre quantia permutada por moeda estrangeira; ou, ainda, emprestar sob penhor que seja privativo de instituição oficial de crédito;

[5] Art. 102. Apropriar-se de ou desviar bens, proventos, pensão ou qualquer outro rendimento do idoso, dando-lhes aplicação diversa da de sua finalidade:

Pena – reclusão de 1 (um) a 4 (quatro) anos e multa.

Art. 104. Reter o cartão magnético de conta bancária relativa a benefícios, proventos ou pensão do idoso, bem como qualquer outro documento com objetivo de assegurar recebimento ou ressarcimento de dívida:

Pena – detenção de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos e multa.

[6] HC 112642, Relator(a):  Min. JOAQUIM BARBOSA, Segunda Turma, julgado em 26/06/2012, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-157 DIVULG 09-08-2012 PUBLIC 10-08-2012.

[7] NOVELINO, Marcelo. Direito constitucional. 5. Ed. Método, 2011, p.198.

Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

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