Equívocos na dosimetria de pena

A seguir, publico mais uma decisão da minha relatoria, através da qual, mais uma vez, fui compelido a rever a dosimetria da pena importa ao acusado.

Logo na ementa do acórdão eu deixo consignado que  ao individualizar a sanção penal, deve o juiz, analisar, com esmero, todos os elementos que circundam o fato delitivo, a fim de sopesá-los à luz das diretrizes do art. 59, do Código Penal, para que a reprimenda seja fixada de forma justa e fundamentada, e que, ademais, a valoração das circunstâncias judiciais requer argumentação idônea, com base em elementos concretos assomados dos autos, em atenção aos postulados constitucionais da individualização das penas e motivação das decisões.

Infelizmente, tem sido uma regra a exacerbação, sem fundamentação, da resposta penal, o que, a toda evidência, malfere o devido processo legal, visto aqui em suas duas vertentes, quais sejam, na vertente material e instrumental.

SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL

Sessão do dia __ de janeiro de 2015.

Nº Único: 0000183-84.2013.8.10.0058

Apelação Criminal Nº 030188/2014 – São José de Ribamar (MA)

Apelante : Erinaldo Fernandes Lima
Defensora Pública : Poliana Pereira Garcia
Apelado : Ministério Público Estadual
Incidência Penal : Art. 157, § 2º, inciso I, do CPB
Relator : Desembargador José Luiz Oliveira de Almeida

Acórdão Nº _________

Ementa. Penal. Processo Penal. Apelação Criminal. Roubo majorado pelo emprego de arma. Pleito de redução da pena-base. Viabilidade. Análise equivocada das circunstâncias judiciais conduta social e consequências do crime. Mantida a valoração da culpabilidade. Pena-base reduzida. Pedido de afastamento da majorante do emprego de arma. Alegação de utilização de simulacro de arma de fogo. Ônus da prova da defesa. Art. 156, do CPP. Apelo conhecido e parcialmente provido. Redimensionamento da resposta penal.

  1. Ao individualizar a sanção penal, deve o juiz, analisar, com esmero, todos os elementos que circundam o fato delitivo, a fim de sopesá-los à luz das diretrizes do art. 59, do Código Penal, para que a reprimenda seja fixada de forma justa e fundamentada.
  2. A valoração das circunstâncias judiciais requer argumentação idônea, com base em elementos concretos assomados dos autos, em atenção aos postulados constitucionais da individualização das penas e motivação das decisões.
  3. É ressabido que a culpabilidade deve ser compreendida como o juízo de reprovabilidade, devendo ser aferida a maior ou menor censurabilidade do comportamento do agente, ou seja, o grau de reprovabilidade da conduta praticada.
  4. Demonstrada a evidente premeditação e frieza na prática delitiva, é razoável a majoração da pena-base, diante da maior reprovabilidade da conduta.
  5. É vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base. Inteligência da Súmula nº 444, do STJ.
  6. No processo de dosimetria, só é lícita a valoração negativa das consequências do crime quando ultrapassam a gravidade do resultado do delito cominado em abstrato no tipo penal correlato.
  7. O trauma provocado pelo crime de roubo, por si só, não é fundamento idôneo para exasperar a pena-base, devendo ser decotada a valoração respectiva, in casu, à míngua de comprovação idônea de que o resultado delituoso extrapolou o tipo penal.
  8. O emprego de simulacro de arma de fogo na subtração patrimonial, por si só, não tem o condão de afastar a causa de aumento capitulada no art. 157, § 2º, inciso I, do Código Penal, mormente quando a vítima sentiu-se efetivamente ameaçada, e a defesa não se desincumbiu do ônus de provar o alegado, nos termos do art. 156, do Código de Processo Penal.
  9. Apelo conhecido e parcialmente provido. Redimensionamento da resposta penal.

 

Acórdão – Vistos, relatados e discutidos estes autos, ACORDAM os Senhores Desembargadores da Segunda Câmara Criminal, unanimemente, em rejeitar a preliminar suscitada e, no mérito, de acordo, em parte, com o parecer da Procuradoria Geral de Justiça, em dar parcial provimento ao recurso, para redimensionar a pena imposta, nos termos do voto do Desembargador Relator.

Participaram do julgamento os Excelentíssimos Senhores Desembargadores José Luiz Oliveira de Almeida (Presidente), José Bernardo Silva Rodrigues e Vicente de Paula Gomes de Castro. Presente pela Procuradoria Geral de Justiça a Dra. _______.

São Luís, __ de janeiro de 2015.

 

DESEMBARGADOR José Luiz Oliveira de Almeida

PRESIDENTE/RELATOR


Apelação Criminal Nº 030188/2014 – São José de Ribamar (MA)

 

RelatórioO Sr. Desembargador José Luiz Oliveira de Almeida (relator): Trata-se de apelação criminal interposta por Erinaldo Fernandes Lima, através da Defensoria Pública, contra sentença oriunda do juízo de direito da 2ª Vara Criminal do termo judiciário de São José de Ribamar, que o condenou à pena de 06 (seis) anos de reclusão, em regime inicial semiaberto, e ao pagamento de 60 (sessenta) dias-multa, por incidência comportamental no art. 157, § 2º, inciso I, do Código Penal[1].

A persecução criminal teve início com o inquérito policial de fls. 02/35, e com base em elementos colhidos durante a fase pré-processual, o Ministério Público ofertou a denúncia de fls. 0/1 a 0/5, de onde extraio, em resumo, que:

I – no dia 25/01/2013, o corréu Francislino Moraes de Sousa foi preso em sua residência, localizada no bairro J. Lima, fabricando armamento, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, após denúncias anônimas de que sua casa se prestava à fabricação de armas, bem como por suspeitas de que haveria no local uma motocicleta roubada;

II – diante das denúncias anônimas, a polícia efetuou diligência no imóvel de Francislino Moraes de Sousa, onde foi encontrada em um dos quartos da casa, a moto Honda CG 125, de placas NHQ 6669, que verificada a procedência, descobriu-se tratar-se de objeto havido por crime de roubo. Na oportunidade, encontrou-se também material destinado ao fabrico de armas;

III– Francislino Moraes de Sousa admitiu o fabrico de armas, mas, no que se refere à motocicleta, disse tratar-se da quitação de uma dívida de R$ 300,00 (trezentos reais) paga por Erinaldo Fernandes Lima;

IV – Erinaldo Fernandes Lima, por sua vez, confessou que roubou a referida moto a mando de Francislino Moraes de Sousa, “eis que comprou deste uma arma de fogo pelo valor de R$ 300,00 (trezentos reais) e como perdeu para um colega que a pediu emprestado e não mais lhe devolveu” (fls. 0/2), Francislino Moraes de Sousa mandou que Erinaldo Fernandes Lima “roubasse uma moto e lhe entregasse como pagamento. E assim o fez” (fls. 0/2); e

VI – “passando-se como passageiro, Erinaldo Fernandes solicitou corrida de um mototaxista posteriormente identificado como BRUNO EDUARDO MACHADO LIMA, para ir da Cidade Operária a Vila Sarney Filho. Já no percurso, anunciou o assalto, encostando uma arma na nuca da vítima, que deitou-se no chão e não pode ofereceu (sic) reação” (fls. 0/2).

A inicial acusatória veio instruída com os autos do inquérito policial nº 17/2013 – Delegacia Especial do Maiobão, notadamente com os autos de exibição e apreensão de fls. 13, e termo de entrega de fls. 14.

Decisão de recebimento da denúncia proferida em 13 de março de 2013, e citação do recorrente Erinaldo Fernandes Lima, às fls. 69 e 100, respectivamente.

Resposta à acusação apresentada às fls. 110/111.

Durante a instrução criminal foram colhidos os depoimentos das testemunhas Evandro de Sá Sousa, José Ribamar Prisca da Silva, Lusinete de Jesus Pinto dos Santos e Maria Josué Carvalho. As duas primeiras arroladas pela acusação e as duas últimas pela defesa. Na sequência, o acusado foi qualificado e interrogado. Todos os depoimentos foram gravados na mídia de fls. 315.

Após as alegações finais, sobreveio a sentença de fls. 228/235v., que julgou parcialmente procedente o pedido, para condenar o apelante Erinaldo Fernandes Lima, por incidência comportamental no artigo 157, § 2º, I, do Código Penal, à pena de 06 (seis) anos de reclusão, em regime inicialmente semiaberto, e ao pagamento de 60 (sessenta) dias-multa. Ainda na sentença, foi negado ao réu o direito de recorrer em liberdade.

A defesa interpôs recurso de apelação às fls. 251, e em suas razões, às fls. 267/277, requer a reforma da sentença para que a pena-base seja redimensionada para o mínimo legal e que seja afastada a majorante capitulada no inciso I, do § 2º, do art. 157, do CPB.

Nas contrarrazões de fls. 281/282, o Ministério Público manifestou-se pelo parcial provimento do apelo, no sentido de afastar a causa especial de aumento de pena do inciso I, do § 2º, do art. 157, do CPB.

Em seu douto parecer de fls. 319/329, a Procuradora de Justiça Regina Maria da Costa Leite opinou pelo conhecimento e parcial provimento do recurso, a fim de que seja “afastada a qualificadora (sic) contida no inciso I, do § 2º, do art. 157, do CPB, bem como, seja fixada pena-base próximo ao mínimo legal de 04 (quatro) anos de reclusão, devendo igual posicionamento ser adotado no que se refere à pena de multa” (fls. 329).

No que se refere à majorante, entende a PGJ que (fls. 323):

[…] o cancelamento da Súmula 174, do Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento do Recurso Especial 213.054-SP, em Sessão realizada em 24 de outubro de 2001, pacificou-se o entendimento de que a simples atemorização da vítima pelo emprego da arma de brinquedo não justifica a aplicação da causa especial de aumento de pena, caracterizando-se apenas a grave ameaça, que já é inerente ao crime de roubo.

Assentou-se, que a causa de aumento de pena prevista no inciso I, do § 2º, do artigo 157, do Código Penal, possui relação com o emprego de arma idônea para ofender a integridade física da vítima no momento do crime, da qual decorre situação de perigo real. Até porque não se pode aplicar o mesmo quantum de punição a quem utiliza arma dotada de plena capacidade lesiva a quem usa uma arma de brinquedo ou um mero “simulacro”, sob pena de afronta ao princípio da proporcionalidade […].

E no que se pertine ao pleito de redução da pena-base, a PGJ manifesta-se pela sua procedência, ao argumento de que a magistrada sentenciante “baseou-se em elementos inválidos para estabelecer a pena-base acima do mínimo legal, em afronta às normas contidas nos artigos 59 c/c o 68, ambos do Código Penal, bem como ao artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal” (fls. 325).

É o relatório.

Voto – O Sr. Desembargador José Luiz Oliveira de Almeida (relator): Presentes estão os pressupostos de admissibilidade do recurso, razão pela qual, dele conheço.

Consoante relatado, o Ministério Público denunciou Erinaldo Fernandes Lima, porque o mesmo, com sua ação, teria incorrido nas sanções do art. 157, § 2º, inciso I, do CPB[2].

Após regular instrução, o acusado foi condenado à pena de 06 (seis) anos de reclusão, em regime inicial semiaberto, e ao pagamento de 60 (sessenta) dias-multa, advindo, então, o inconformismo recursal sub examine.

A pretensão recursal mira a reforma da sentença para que a pena-base seja redimensionada para o mínimo legal e, para que seja afastada, a causa de aumento contida no inciso I, do § 2º, do art. 157, do CPB.

Os argumentos recursais podem ser assim sintetizados:

I – as circunstâncias judiciais negativamente valoradas pela juíza sentenciante não foram devidamente motivadas; e

II – “a majoração da pena somente tem lugar quando a arma tem real potencial ofensivo” (fls. 269) e que a “simples atemorização da vítima pelo emprego de simulacro não se mostra suficiente para configurar a causa especial de aumento de pena, dada a ausência de incremento no risco ao bem jurídico, servindo, apenas, para caracterizar a grave ameaça já inerente ao crime de roubo” (fls. 270).

Delimitado o âmbito cognitivo de devolutividade recursal, de acordo com a extensão da matéria impugnada, analiso, adiante, o presente apelo.

  1. Breves anotações acerca da devolutividade recursal

Ab initio, necessário se faz anotar que os recursos são informados pelo princípio da voluntariedade, sendo ônus da parte irresignada devolver ao órgão ad quem a extensão da matéria que pretende ser revista. Se o interessado deixa de impugnar determinada parte do julgado, certamente, sofrerá as consequências deste ato; daí porque a doutrina[3] adverte que o recurso é considerado um ônus processual.

Assim, havendo impugnação, v.g., apenas no que tange à dosimetria da pena, significa que a parte conformou-se com a condenação, tratando-se de ponto incontroverso.

Cediço, pois, que, in casu sub examine, o órgão ad quem limitará sua ação ao exame, em profundidade, apenas da parte do julgado alusivo à aplicação da pena, e, eventualmente, matéria de ordem pública passível de ser conhecida ex officio.

Há de se ressaltar, ademais, na esteira da jurisprudência:

  1. Habeas corpus e recurso especial. Não impede o conhecimento pelo STF de habeas corpus contra decisão de segundo grau, que o STJ não haja conhecido de recurso especial interposto do mesmo acórdão, se diversos os fundamentos suscitados em cada uma das duas vias simultâneas de impugnação do julgado. II. Apelação criminal: individualização da pena: devolução ampla. A apelação da defesa devolve integralmente o conhecimento da causa ao Tribunal, que a julga de novo, reafirmando, infirmando ou alterando os motivos da sentença apelada, com as únicas limitações de adstringir-se à imputação que tenha sido objeto dela (cf. Súmula 453) e de não agravar a pena aplicada em primeiro grau ou, segundo a jurisprudência consolidada, piorar de qualquer modo a situação do réu apelante. Insurgindo-se a apelação do réu contra a individualização da pena, não está, pois, o Tribunal circunscrito ao reexame dos motivos da sentença: reexamina a causa, à luz do art. 59 e seguintes do Código, e pode, para manter a mesma pena, substituir por outras as circunstâncias judiciais ou legais de exasperação a que a decisão de primeiro grau haja dado relevo[4].

(Destaques não originais)

No mesmo sentido:

HABEAS CORPUS. CONSTITUCIONAL. PENAL E PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. INCIDÊNCIA DA CAUSA ESPECIAL DE DIMINUIÇÃO PREVISTA NO ART. 33, § 4º, DA LEI N. 11.343/06. ALEGAÇÃO DE MOTIVAÇÃO INIDÔNEA DA SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA E DE REFORMATIO IN PEJUS. PEDIDO DE FIXAÇÃO DA MINORANTE NO PATAMAR MÁXIMO E DE CONSEQUENTE SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE PELA RESTRITIVA DE DIREITO. EFEITO DEVOLUTIVO DO RECURSO DE APELAÇÃO. CORRETA ANÁLISE DAS CIRCUNSTÂNCIAS FÁTICAS NA SEGUNDA INSTÂNCIA. ORDEM DENEGADA.

1 . Não se comprova a presença de constrangimento ilegal a ferir direito da Paciente nem ilegalidade ou abuso de poder a ensejar a concessão da presente ordem de habeas corpus.

  1. Ainda que em recurso exclusivo da defesa, o efeito devolutivo da apelação autoriza o Tribunal a rever os critérios de individualização definidos na sentença penal condenatória para manter ou reduzir a pena, limitado tão-somente pelo teor da acusação e pela prova produzida.
  2. Inexistência de reformatio in pejus e inviabilidade do pedido de substituição da pena privativa de liberdade pela restritiva de direitos.
  3. Ordem denegada[5].

(Destaque não original)

Gizadas tais premissas dogmáticas, passo a analisar a dosimetria da pena, objeto de irresignação recursal.

  1. Da dosimetria da pena. Do redimensionamento da resposta penal

Para uma melhor compreensão, transcrevo a primeira fase da dosimetria da pena aplicada pela juíza de 1º grau, in verbis ( fls. 233/233v.):

[…] percorrendo as circunstâncias judiciais do art. 59 do CP, observa-se a sua culpabilidade evidenciada, tendo o condenado agido com dolo. Sem registros de maus antecedentes, eis que tecnicamente primário. No tocante à sua conduta social percebe-se que não se trata de um caso isolado na vida do réu, conforme se depreende em consulta realizada perante site do Tribunal de Justiça, onde se verifica que o réu responde ao processo nº 38/2010, na Comarca de Buriti e considerando que ele mesmo noticiou, em audiência, que já havia sido processado penalmente, indicando tendência para a prática de crimes; quanto à personalidade do acusado não foram coletados elementos suficientes para a sua valoração. Os motivos são inerentes ao tipo. As circunstâncias foram normais para os delitos dessa espécie. Consequências graves em razão do trauma causada (Sic) na vítima. A vítima em nada contribuiu para a ocorrência do fato criminoso. Assim, fixo a pena-base no patamar de 5 (cinco) anos de reclusão e multa de 60 dias-multa […]. (Sic)

(Destaques nos originais)

Pois bem.

Da leitura do referido trecho do édito condenatório, é possível extrair que na primeira fase da dosimetria, das 08 (oito) circunstâncias judiciais previstas no art. 59, do CPB, 03 (três) foram consideradas desfavoráveis, a saber: culpabilidade, conduta social e consequências do crime. Por essas razões, a magistrada sentenciante elevou a pena-base em 01 (um) ano de reclusão, e 50 (cinquenta) dias-multa, acima dos mínimos legais previstos nos arts. 157, caput[6], e 49, ambos do CPB[7].

Inicio, então, a análise dos argumentos defensivos alusivos à valoração da culpabilidade.

2.1 Da culpabilidade

É ressabido que a circunstância judicial da culpabilidade deve ser compreendida como o juízo de reprovabilidade, devendo ser aferida a “maior ou menor censurabilidade do comportamento do agente, a maior ou menor reprovabilidade da conduta praticada[8]”.

Ainda com apoio na doutrina, transcrevo as seguintes lições:

[…] Culpabilidade

Não se trata da culpabilidade que se mostra como pressuposto à aplicação da pena (não confunda). A culpabilidade é a reprovabilidade da conduta, que é tida como elemento do crime ou pressuposto de aplicação da pena, conforme a teoria adotada, de modo que, afastada a culpabilidade, a sentença será absolutória e não restará aplicada qualquer pena.

Por isso, no momento da aplicação da pena, já não mais se investiga se o réu é ou não culpado, pois tal situação já restou definida em momento anterior do julgado, mais precisamente na parte da fundamentação (motivação) da sentença.

[…] a imputabilidade, potencial consciência da ilicitude e a exigibilidade de conduta diversa são elementos do crime em si, não podendo ser confundidos com a culpabilidade prevista no artigo 59 do Código Penal, a qual se refere exclusivamente ao agente, dizendo respeito à censurabilidade, que nada mais é do que a reprovabilidade de sua conduta.

A circunstância judicial atinente á culpabilidade se relaciona à censurabilidade da conduta, medindo o seu grau de reprovabilidade diante dos elementos concretos disponíveis no caso em julgamento. A adjetivação negativa ou censurável reclama criteriosa pesquisa nos elementos probatórios concretos a referendá-la.

A culpabilidade deve, hoje, ser entendida e concretamente fundamentada na reprovação social que o crime e o autor do fato merecem. Trata-se de um plus na reprovação da conduta do agente.

A circunstância em questão se revela como sendo um juízo de reprovação que recai sobre o agente imputável que praticou o fato ilícito de forma consciente, cuja conduta podia não praticá-la ou evitá-la, se quisesse, desde que tivesse atendido aos apelos da norma penal […][9].

É o grau de censura da ação ou omissão do réu que deve ser valorada a partir da existência de um plus de reprovação social de sua conduta.

Está ligada a intensidade do dolo ou o grau de culpa do agente, as quais devem ser graduadas no caso concreto, com vistas à melhor adequação da pena-base.

Quanto mais reprovável a conduta, maior será a exasperação da pena na primeira etapa do processo de dosimetria, ao tempo em que quanto menos reprovável a conduta, a pena mais se aproximará do mínimo legal previsto em abstrato pelo tipo.

Como exemplos, podemos valorar a frieza e a premeditação, as quais revelam maior intensidade no modo de agir do agente (intensidade maior no dolo) […].

(Destaques não constam no original)

No sentido do que se expôs, há interessante precedente no Superior Tribunal de Justiça, que merece referência, in verbis:

[…] 9. A culpabilidade normativa, que engloba a consciência da ilicitude e a exigibilidade de conduta diversa e que constitui elementar do tipo penal, não se confunde com a circunstância judicial da culpabilidade, que diz respeito à demonstração do grau de reprovabilidade ou censurabilidade da conduta praticada.

  1. O maior grau de reprovabilidade da conduta está fundamentadamente explicitado na vasta experiência do recorrente como administrador público, evidenciada pelos diversos cargos ocupados nos Poderes Executivo e Legislativo, a demonstrar que possuía ele maior ciência das possíveis consequências que poderiam advir dos atos de gestão temerária por ele praticados, e que acabaram por efetivamente ocorrer […][10].

Pois bem. Na hipótese que se apresenta, a magistrada de 1º grau considerou desfavorável a culpabilidade, por estar “evidenciada, tendo o condenado agido com dolo” (fls.233).

Data venia, mas o fundamento suso mencionado não se sustenta, posto que não descreve qualquer circunstância concreta apta a demonstrar um plus de desvalor na conduta do apelante.

Conquanto entenda ser inidôneo o critério de valoração utilizado pela juíza sentenciante para exasperar a pena pela culpabilidade, entendo que, diante do efeito devolutivo contido no presente recurso de apelação, esta Corte está autorizada a rever os fundamentos de individualização definidos na sentença penal condenatória.

Noutros termos, este Tribunal, no exame dessa questão – primeira fase da dosimetria –, não está adstrito aos fundamentos constantes na sentença condenatória, podendo eleger outros que reputar suficiente para manter ou mesmo substituir algumas das circunstâncias judiciais valoradas na sentença, tendo como limite, evidentemente, o quantum de pena fixada, em atenção que dispõe a vedação da reformatio in pejus.

In casu, entendo que o modus operandi da conduta delituosa praticada pelo apelante Erinaldo Fernandes Lima merece uma maior reprovabilidade, ou seja, deve a circunstância judicial da culpabilidade ser negativamente valorada.

Vejamos excertos da sentença de fls. 228/235v., que bem demonstram os fatos e as circunstâncias do roubo cometido pelo recorrente, verbis:

[…] O réu Erinaldo Fernandes Lima atestou que sempre consertava sua moto com o outro acusado Francislino e que este teria lhe falado que fabricava armas, momento em que pediu emprestado uma arma caseira, calibre 12, visando, supostamente, proteger a si e sua residência; que, por sua vez, emprestou tal arma para um colega, que acabou perdendo a mesma, fato que lhe trouxe uma pendência para com Francislino; que acertou com este que lhe conseguiria uma moto marca “pop” como pagamento; que não via outra forma de conseguir senão através do crime, já que estava sem trabalho e por ser usuário de drogas; que fabricou uma arma de buriti para realizar o assalto; que Francislino não sabia que a moto era fruto de roubo e que apenas falou para este que a moto estava em seu poder e serviria de pagamento pela arma não devolvida e que depois acertariam valores a serem eventualmente devolvidos; […].

Quanto ao assalto, aduziu Erinaldo Fernandes Lima que simulou uma corrida de moto-taxi (Sic) para atrair a vítima; que anunciou o assalto encostando o cano da arma na nuca da vítima; que esta de fato acreditou que se tratava de uma arma de verdade; que ninguém sabia do seu plano de roubo da moto […].

(Sem destaques no original)

Pelos excertos acima transcritos, tenho a culpabilidade como bastante reprovável, tendo em vista que o acusado agiu com frieza e premeditação, simulando a solicitação da prestação do serviço de transporte (mototáxi) para, em seguida, subtrair, mediante grave ameaça, a moto da vítima Bruno Eduardo Machado Lima.

À guisa de exemplo, e reforço argumentativo, pondero que já proferi decisão similar, cujo voto restou assim ementado, litteris:

[…] 3. É ressabido que a culpabilidade deve ser compreendida como o juízo de reprovabilidade, devendo ser aferida a maior ou menor censurabilidade do comportamento do agente, a maior ou menor reprovabilidade da conduta praticada.

  1. Demonstrada a evidente premeditação e frieza na prática delitiva, é razoável a majoração da pena-base, diante da maior reprovabilidade da conduta […][11].

Tenho para mim, pois, que a conduta acima delineada, ostenta maior grau de censura, motivo pelo qual, deve mesmo a culpabilidade ser fator de exasperação da pena na primeira etapa do processo de dosimetria.

2.2 Da conduta social

A valoração da conduta social não me pareceu acertada, uma vez que o fato de o réu responder a outro processo criminal traduz-se em clara ofensa ao postulado constitucional da presunção de inocência, bem como ao enunciado da Súmula nº 444, do STJ[12].

Nesse sentido, a 2ª Câmara Criminal tem vários precedentes, a exemplo:

Apelação Criminal. Tribunal do Júri. Art. 121, caput, do CP. Erro ou injustiça na aplicação da pena. Circunstâncias judiciais. Antecedentes criminais. Processos em curso. Violação à súmula 444, do STJ. Conduta social e circunstâncias do crime. Fundamentação idônea. Motivo fútil. Agravante aplicada pelo juiz togado. Recurso parcialmente provido.

  1. É vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base. Inteligência da Súmula 444, do STJ […][13].

(Destaque não original)

Dessa forma, a valoração negativa empregada à conduta social deve ser afastada.

2.3 Das consequências do crime

Por derradeiro, analiso as consequências do crime no processo da dosimetria da pena, ressaltando, desde logo que, para o fim de valoração negativa, devem ultrapassar a gravidade do resultado do delito cominado em abstrato no tipo penal correlato.

A autoridade sentenciante fundamentou que as consequências extrapenais foram “graves em razão do trauma causada (Sic) na vítima” (fls. 233v.).

Pois bem.

Registro, inicialmente, que o trauma provocado pelo crime de roubo, por si só, não é fundamento idôneo para aumentar a pena-base. Diferente seria, se o trauma, devidamente comprovado, extrapolasse o tipo penal.

In casu, a vítima Bruno Eduardo Machado Lima, ouvida apenas na fase administrativa (fls. 04), em momento algum narrou a ocorrência de consequências que pudessem extrapolar o resultado típico, razão pela qual não se justifica o aumento da pena.

Nessa linha de ideias:

 […] As circunstâncias judiciais relativas aos motivos e consequências do crime somente poderão receber valoração negativa quando restar demonstrado elemento que transborda o tipo penal. No que concerne ao trauma psicológico superior ao inerente ao tipo penal sob exame, este deve ficar comprovado […][14].

Na mesma senda:

[…] 3- Não é possível exasperar a pena-base em face das consequências do delito alegando suposto trauma pela vítima, quando esta não tenha se pronunciado sobre o assunto […][15].

Desta forma, de rigor o decote da valoração das consequências do crime, por revelar inegável bis in idem, não havendo nos autos qualquer elemento que justifique a exasperação da reprimenda nesse contexto.

Após a reanálise das circunstâncias judiciais, diante do decote de 02 (duas) das 03 (três) valorações negativas[16], reduzo a pena-base de 05 (cinco) anos de reclusão e 60 (sessenta) dias-multa para 04 (quatro) anos e 06 (seis) meses de reclusão, e 35 (trinta e cinco) dias-multa, cada um equivalente a 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época do fato delituoso.

2.4 Da segunda fase da dosimetria

Consigno, por oportuno, excertos da segunda fase de aplicação da pena realizada pela magistrada a quo (fls. 233v.):

[…] Está presente a atenuante da confissão art. 65, III, “d” do CP, pelo que diminuo a pena em 06 (seis) meses. Sem agravantes. Resta, então, a pena de 4 (quatro) anos e 06 (seis) meses de reclusão e multa de 40 dias-multa […].

Observo que, diante da atenuante da confissão (art. 65, III, d, do CPB), a reprimenda foi reduzida em 06 (seis) meses de reclusão, e ainda, 20 (vinte) dias-multa.

Assim, a pena fixada na primeira fase dosimétrica (ora redimensionada) deve ser reduzida para 04 (quatro) anos de reclusão, e ao pagamento de 15 (quinze) dias-multa, cada um equivalente a 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época do fato delituoso.

2.5 Da terceira etapa da dosimetria

Nesta fase, a magistrada sentenciante majorou a pena em 1/3 (um terço), por entender presente a causa de aumento de pena contida no inciso I (emprego de arma), do § 2º, do art. 157, do CPB.

Como visto em linhas pretéritas, referido incremento é questionado no presente recurso de apelação, com base nos seguintes argumentos, assim resumidos:

I – “a majoração da pena somente tem lugar quando a arma tem real potencial ofensivo” (fls. 269); e

II – a “simples atemorização da vítima pelo emprego de simulacro não se mostra suficiente para configurar a causa especial de aumento de pena, dada a ausência de incremento no risco ao bem jurídico, servindo, apenas, para caracterizar a grave ameaça já inerente ao crime de roubo” (fls. 270).

Pois bem.

Em que pesem os argumentos acima expostos, entendo que o incremento consubstanciado na causa de aumento pelo emprego de arma deve permanecer inalterado.

Cediço dizer que a apreensão e perícia da arma são prescindíveis para a comprovação da majorante do art. 157, 2º, I, do CPB, desde que a prova oral assegure a sua utilização, como é o caso dos autos[17].

In casu, observo que a juíza sentenciante se apoiou nos depoimentos colhidos ao longo da persecução penal para concluir pela utilização da arma no crime de roubo.

Para mim, no que discrepo do Ministério Público de 2º grau, há provas suficientes a legitimar a majoração da pena pelo emprego de arma, sobretudo em face da palavra do ofendido e da confissão do acusado.

A vítima, importa gizar, malgrado não tenha sido ouvida em sede judicial, como suso anotado, foi inquirida em sede policial e, lá, sem dúvidas, noticiou o fato criminoso e não só apontou o acusado como autor do delito, como, também, relatou que (fls.04):

[…] pegou uma corrida na Cidade Operária com destino a Vila Sarney Filho, e lá chegando o passageiro mandou que a vítima parasse a moto e em seguida anunciou o assalto; QUE o assaltante encostou algo em sua nuca e mandou deitar no chão […].

(Sic)

O apelante Erinaldo Fernandes Lima, por sua vez, confirma a versão da vítima. No entanto, alega que na prática delituosa, “usou uma arma feita de talos de buriti enrolado em fita isolante(fls. 09)[18].

Pois bem.

Cumpre ressaltar, que, embora a defesa tenha alegado que a arma utilizada no crime de roubo seria apenas um simulacro, não houve produção de prova nesse sentido. E, conforme preconiza o art. 156 do Código de Processo Penal[19], o ônus da prova da alegação incumbe a quem a fizer. Nesse sentido, confira-se:

APELAÇÃO CRIMINAL. TENTATIVA DE ROUBO. EMPREGO DE ARMA. CAUSA DE AUMENTO. INCIDÊNCIA.SIMULACRO. ÔNUS DA PROVA. DEFESA. NÃO COMPROVAÇÃO. MANTENÇA DA MAJORANTE. TENTATIVA. ITER CRIMINIS. Para configuração da causa de aumento descrita no art. 157, § 2º, inc. II, do CP, é dispensável a apreensão da arma e realização de exame pericial, quando o seu emprego ficar comprovado por outros meios de prova idôneos, mormente o depoimento firme da vítima, que tem especial relevo nos crimes contra o patrimônio. A tese de que o agente portava simulacro de arma de fogo não tem o condão de afastar a majorante quando não restar comprovada nos autos, ônus que compete à defesa, nos termos do art. 156 do CPP. O critério de diminuição da pena deve levar em consideração o iter criminis percorrido. Quanto mais próximo da consumação do delito, menor será a fração e, quando mais distante o resultado, maior será a redução. Recurso conhecido e provido em parte[20].

Na mesma alheta:

APELAÇÃO CRIMINAL – ROUBO TRIPLAMENTE MAJORADO – DECOTE DA CAUSA DE AUMENTO DO EMPREGO DE ARMA DE FOGO – DESCABIMENTO – DECOTE DA REPARAÇÃO DE DANOS – NECESSIDADE – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Constitui ônus da defesa a comprovação de que a arma é desprovida de potencial lesivo, como na hipótese de alegação de uso de arma de brinquedo. 2. Inexistindo pedido específico acerca da indenização quanto à reparação de danos, é de rigor o decote daquela fixada, de ofício, pelo Julgador, conforme entendimento sedimentado neste Colegiado. 3. Recurso parcialmente provido[21].

Insta ressaltar, ademais, entendimento do Superior Tribunal de Justiça Sodalícios:

HABEAS CORPUS. PENAL. ROUBO CIRCUNSTANCIADO PELO EMPREGO DE ARMA DEFOGO. POTENCIALIDADE LESIVA. AUSÊNCIA DE APREENSÃO E PERÍCIA.DISPENSABILIDADE. EXISTÊNCIA DE OUTROS MEIOS DE PROVA (NO CASO,FIRME E COESO DEPOIMENTO DAS VÍTIMAS). INCIDÊNCIA DA CAUSA ESPECIALDE AUMENTO DE PENA. POSSIBILIDADE. ERESP N.º 961.863/RS DESTA CORTE.ORIENTAÇÃO FIRMADA PELO PLENÁRIO DO PRETÓRIO EXCELSO. REEXAME DOCONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. ORDEM DENEGADA.

  1. Em que pese o cancelamento da Súmula n.º 174 do Superior Tribunal de Justiça, que preconizava a possibilidade de aumento de pena na hipótese de intimidação com arma de brinquedo, ou ainda que se discuta a potencialidade ofensiva do instrumento utilizado para a realização do crime de roubo, por ser a arma inapta a efetuar disparos ou por estar desmuniciada, cabe à Defesa comprovar que a causa especial de aumento da pena não restou configurada, pois a potencialidade ofensiva da arma utilizada no roubo é presumida.Precedentes.
  2. Conforme a orientação pacificada nesta Corte por ocasião do julgamento do EREsp n.º 961.863/RS, a ausência de perícia na arma,quando impossibilitada sua realização, não afasta a causa especial de aumento de pena prevista no art. 157, § 2.º, inciso I, do Código Penal, desde que existentes outros meios aptos a comprovar o seu efetivo emprego na ação delituosa. Precedentes desta Corte e do Excelso Pretório.
  3. Dispõe o art. 167 do Código de Processo Penal que o laudo pericial pode ser suprido pela prova testemunhal diante do desaparecimento dos vestígios para o exame do corpo de delito, comona espécie, em que não houve a apreensão da arma.
  4. Esta Quinta Turma, em diversos julgamentos, admitiu que o firme e coeso depoimento da vítima é, por si só, hábil a comprovar o emprego de arma no delito de roubo: HC 116.487/GO, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNESMAIA FILHO, DJe 18/10/2010; HC 159.854/SP, Rel. Min. LAURITA VAZ, DJe 28/06/2010; REsp 1.111.783/RS, Rel. Min JORGE MUSSI, DJe21/06/2010; e HC 135.663/RJ, Rel. Min. LAURITA VAZ, DJe 12/04/2010,v.g..
  5. No caso, o efetivo uso da arma na ação delituosa restou devidamente comprovado, de forma suficiente à caracterização da causa de aumento de pena prevista no art. 157, § 2.º, inciso I, do Código Penal, consoante entenderam as instâncias ordinárias,soberanas na análise da matéria de prova. Assim, para se afastar a referida conclusão, seria imprescindível a realização de um aprofundado exame do conjunto fático-probatório dos autos, o que nãose mostra viável na via estreita do habeas corpus.
  6. Ordem denegada[22].

(Sem destaques no original)

Colaciono, ainda, o seguinte precedente do Supremo Tribunal Federal:

EMENTA: HABEAS CORPUS. PENAL. ROUBO COM EMPREGO DE ARMA DE FOGO. JULGADO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA EM CONSONÂNCIA COM A JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. DESNECESSIDADE DE APREENSÃO DA ARMA E DE PERÍCIA PARA A COMPROVAÇÃO DA CAUSA DE AUMENTO. CIRCUNSTÂNCIA QUE PODE SER EVIDENCIADA POR OUTROS MEIOS DE PROVA. PRECEDENTES. ORDEM DENEGADA. 1. A decisão do Superior Tribunal de Justiça está em perfeita consonância com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. 2. É desnecessária a apreensão e a perícia da arma de fogo empregada no roubo para comprovar a qualificadora do art. 157, § 2º, inc. I, do Código Penal, já que o seu potencial lesivo pode ser demonstrado por outros meios de prova, em especial pela palavra da vítima ou pelo depoimento de testemunha presencial. Precedentes. 3. Compete ao acusado o ônus de provar que não utilizou arma de fogo ou que a arma utilizada não tinha potencialidade lesiva, nos termos do art. 156 do Código de Processo Penal. 4. Ordem denegada[23].

(Destaque não original)

Portanto, a prova da alegação de que o objeto utilizado no delito se tratava de um simulacro de arma de fogo, incumbia à defesa, nos termos do referido art. 156, do CPP, ônus do qual não se desincumbiu.

Ao contrário, observo que o argumento defensivo está insulado e encontra respaldo apenas nas declarações prestadas pelo réu ao longo da persecução criminal. A versão de ter usado arma não verdadeira não é suficiente para afastar a majorante de aumento capitulada no inciso I, do § 2º, do art. 157, do Digesto Penal.

No caso vertente, volto a dizer, o manejo de arma no crime restou evidenciada por meio da consistente prova oral que integra os presentes autos.

Desta forma, deve ser mantida a causa de aumento relativa ao emprego de arma (art. 157, § 2º, inciso I, do CPB).

Quanto ao índice de aumento aplicado pela magistrada a quo – 1/3 (um terço) – por estar no mínimo legal e o recurso ser exclusivo da defesa, o mesmo deve permanecer incólume, restando, dessa forma, a pena definitiva em 05 (cinco) anos e 04 (quatro) meses de reclusão, em regime semiaberto, e ainda, ao pagamento de 20 (vinte) dias-multa, cada um equivalente a 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época do fato delituoso.

Ao lume dessas considerações, conheço do presente apelo, para, em parcial acordo[24] com o parecer da Procuradoria Geral de Justiça, dar-lhe parcial provimento, reduzindo a reprimenda de 06 (seis) anos de reclusão e multa de 60 (sessenta) dias-multa para 05 (cinco) anos e 04 (quatro) meses de reclusão, em regime semiaberto, e ainda, ao pagamento de 20 (vinte) dias-multa, cada um equivalente a 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época do fato delituoso.

Cumpra-se o disposto no art. 201, § 2º[25], do Código de Processo Penal, através de qualquer meio idôneo.

É como voto.

Sala das Sessões da Segunda Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, em São Luís, __ de janeiro de 2015.

DESEMBARGADOR José Luiz Oliveira de Almeida

RELATOR

[1]  Art. 157 – Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência: […]

  • 2º – A pena aumenta-se de um terço até metade:

I – se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma; […].

[2]  Art. 157 – Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência: […]

  • 2º – A pena aumenta-se de um terço até metade:

I – se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma; […].

[3] “[…] o recurso é um ônus processual, sendo que a sua existência depende de expressa manifestação de vontade da parte, por meio de sua interposição. A vontade da parte, portanto, é determinante, sendo a voluntariedade um princípio recursal, derivado do princípio dispositivo.” (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de direito processual civil . 2ª ed. São Paulo: Método, 2010. p. 524).

[4] STF  – HC nº 76156/SP, Relator: SEPÚLVEDA PERTENCE, Data de Julgamento: 31/03/1998, PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJ 08-05-1998 PP-00004 EMENT VOL-01909-02 PP-00268.

[5] STF – HC nº 101.917/MS, Relatora: Ministra CÁRMEN LÚCIA, Data de Julgamento: 31/08/2010, T5 – PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 09/02/2011.

[6] Art. 157 – Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência:

Pena – reclusão, de quatro a dez anos, e multa.

[7] Art. 49 – A pena de multa consiste no pagamento ao fundo penitenciário da quantia fixada na sentença e calculada em dias-multa. Será, no mínimo, de 10 (dez) e, no máximo, de 360 (trezentos e sessenta) dias-multa.

[8] BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal. Parte Geral. 16ª ed. São Paulo: Saraiva, 2011, pág. 664.

[9] SCHMITT, Ricardo Augusto. Sentença Penal Condenatória: Teoria e Prática. 8ª ed. Salvador: JusPodivum, 2014, pág. 113/114.

[10] STJ – REsp nº 1352043/SP, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 17/10/2013, DJe 28/11/2013.

[11] TJMA – APC nº 006640/2014, julgado em 15/05/2014, DJe 21/05/2014.

[12] É vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base.

[13] TJMA – APC nº 004494/2013, julgado em 15/08/2013, DJe 21/08/2013.

[14] TJDF – Acórdão n.747379, 20120110483583APR, Rel. SOUZA E AVILA, 2ª Turma Criminal, Data de Julgamento: 19/12/2013.

[15] TJPR – AC – 832827-4 – Toledo – Rel.: Rogério Etzel – 5ª C.Criminal – Unânime –  Data de Julgamento. 19.04.2012.

[16] Mantida a culpabilidade.

[17] “[…] 1. A Terceira Seção desta Corte, no julgamento dos EREsp n. 961.863/RS, pacificou o entendimento de serem dispensáveis a apreensão da arma e a realização de exame pericial para que incida o aumento na pena por uso de arma em roubo, quando existirem nos autos outros elementos probatórios que levem a concluir pela sua efetiva utilização no crime […]” (STJ – HC 274.279/SP, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 04/11/2014, DJe 17/11/2014).

[18] Versão ratificada em juízo, cuja mídia se encontra às fls. 315.

[19] Art. 156.  A prova da alegação incumbirá a quem a fizer, sendo, porém, facultado ao juiz de ofício: […].

[20] TJ-DF – APR: 20140410029848 DF 0002912-98.2014.8.07.0004, Relator: SOUZA E AVILA, Data de Julgamento: 23/10/2014, 2ª Turma Criminal, Data de Publicação: Publicado no DJE: 04/11/2014.

[21] TJMG –  Apelação Criminal  1.0344.13.002572-1/001, Relator: Des. Paulo Calmon Nogueira da Gama, 7ª CÂMARA CRIMINAL, julgamento em 24/04/2014, publicação da súmula em 09/05/2014.

[22] STJ – HC nº 214981, Relator Ministra LAURITA VAZ, Data de Julgamento: 24/04/2012, T5 – QUINTA TURMA.

[23] STF – HC nº 100187, Relatora  Min. CÁRMEN LÚCIA, Primeira Turma, julgado em 16/03/2010.

[24] De acordo apenas no que se refere ao afastamento da valoração negativa relativa à circunstância judicial conduta social.

[25] § 2o  O ofendido será comunicado dos atos processuais relativos ao ingresso e à saída do acusado da prisão, à designação de data para audiência e à sentença e respectivos acórdãos que a mantenham ou modifiquem.

Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

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