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“[…]Nessa faina oportunista e, sobretudo, inescrupulosa, os postulantes levam a reboque o eleitor, sobretudo o incauto, que vai assimilando o discurso pendular, sem se dar conta que está sendo envolvido em uma artimanha.
Essa demonstração explícita de total falta de convicção dos candidatos é de tamanha envergadura que, do que se vê e se extrai dos discursos, a única convicção que eles parecem ter é a de que, pelo poder, o melhor mesmo é não ter convicção[…]”
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Em notas preliminares – antes, portanto, do tema que elegi para hoje -., vou narrar um fato e fazer um breve registro.
O fato, para ilustrar; o registro, à conta de cautela.
O fato condiz com a minha passagem pela sétima vara criminal; o registro, em face do momento em que estamos vivendo, e em vista da necessidade que tenho de preservar a minha isenção diante de questões políticas.
Primeiro, o fato.
Como juiz da 7ª Vara Criminal convivi com excelentes Defensores Públicos – classe que, pelo zelo e brilho, tem a minha total admiração.
De um determinado Defensor me lembro especialmente por algo que costumava dizer a mim, em face das minhas decisões:
-Posso não concordar com o senhor em muitas coisas, mas reconheço que senhor não surpreende.
Fácil explicar a afirmação.
É que, diante da mesma quadra fática e da mesma conformação jurídica, eu sempre decidia – como o faço até hoje – da mesma forma.
Simples assim.
Não podia – e não pode – ser diferente.
Com essa postura, o juiz prestigia a segurança jurídica e reveste de previsibilidade – e credibilidade, consequentemente – as suas decisões.
É dizer: procuro decidir à vista das minhas convicções.
Sou, enfim, um profissional de convicções, das quais decorrem, às vezes, algumas incompreensões.
Agora, o breve registro.
Não trato de política nos meus artigos.
É o mínimo, aliás, que se espera de quem tem a difícil, árdua e nobre missão de julgar.
Quero ser livre para julgar, sem estar atrelado, preso a uma manifestação imprópria que tenha feito no passado.
Assim agindo, não se poderá apanhar, no passado, uma manifestação da minha autoria que possa colocar em dúvida a minha imparcialidade.
Compreendo que todos nós – magistrados especialmente – devemos ter postura.
É o mínimo que se espera do juiz.
De um juiz se espera, ademais, que seja prudente, que tenha pudor, que seja equilibrado e sensato; esses atributos, decerto, emprestam maior credibilidade às suas decisões.
Pensando assim, ao escrever, escolho temas que me permitam expor o meu pensamento, sem deixar que as minhas preferências aflorem.
Consciente do meu papel e da relevância da palavra, sobretudo da escrita, imponho a mim restrições que não me permitem sair por aí palpitando impensadamente
Não me furto, no entanto, de refletir sobre alguns temas relevantes que permeiam a nossa vida, com o único empenho de instigar, de fazer as pessoas refletirem.
Nesse afã, pretendo hoje expender o meu pensamento sobre algo que tem sido cada vez mais raro, sobretudo entre os que almejam uma outorga popular.
Refiro-me à falta de convicção de muitos candidatos, ou melhor, sobre as convicções de ocasião, as convicções de araque, diria; aquelas que vão sendo apresentadas ao sabor das circunstâncias.
Nesse sentido, observo, com certa descrença, que os candidatos desdizem hoje o que afirmaram ontem, numa atitude arrivista que me leva ao desânimo.
Nessa faina oportunista e, sobretudo, inescrupulosa, os postulantes levam a reboque o eleitor, sobretudo o incauto, que vai assimilando o discurso pendular, sem se dar conta que está sendo envolvido em uma artimanha.
Essa demonstração explícita de total falta de convicção dos candidatos é de tamanha envergadura que, do que se vê e se extrai dos discursos, a única convicção que eles parecem ter é a de que, pelo poder, o melhor mesmo é não ter convicção.
Mudar ao sabor das circunstâncias é o comando, porque, afinal, o que vale mesmo, deve concluir o postulante à outorga, é fingir acreditar naquilo que o eleitor quer que ele finja que acredita.
Nesse cenário, a mim me transparece translúcido que as convicções que dizem ter os candidatos, são, na verdade, apenas a face mais perversa de um oportunismo político que incomoda.
Nesse ambiente, temas relevantes – maioridade penal, pena de morte, tortura, aborto, liberação da maconha, dentre outros – vão sendo, apresentados, geridos, discutidos de acordo com as conveniências impostas pela pugna eleitoral, sem a mínima convicção.
Nesse panorama desalentador, lembro, à guisa de exemplo, que alguns, que outrora tinham a mais firme convicção de que a Lava-Jato era um ambiente de pérfidas arbitrariedades, hoje, por pura esperteza, destacam a sua importância no combate à corrupção.
Ademais, os que outrora usaram de fakes news para delas tirar proveito eleitoral, hoje, constrangidos, e em situação adversa, as abominam com todas as forças de suas “convicções”.
Vou além, em vista do que tenho testemunhado.
Os que ontem renegaram o juiz Sérgio Moro, muitos dos quais o apontavam até como um criminoso digno de cadeia, hoje, “convictos”, enaltecem o seu trabalho, apontando-o como um exemplo de magistrado, reservando a ele apenas críticas pontuais.
Testemunho, ademais, com a mesma inquietação, que os que ontem esbravejavam contra as prisões provisórias e as delações premiadas, hoje, pasmem, pregam, por interesse político, a imediata prisão de desafetos, para forçarem-lhes, quem diria, a aderirem à deleção premiada.
Não param por aí as convicções de conveniência.
Com efeito, os que antes queriam distância das forças de Centro do espectro político, nos dias que antecederam ao pleito que hoje se encerra delas se aproximam e agora veem nelas as virtudes que antes não viam.
Da mesma forma, movidos pelos mesmos sentimentos, os que pregaram outrora contra o Bolsa Família, hoje pensam até em ampliá-la, prometendo o que o orçamento público não poderá suportar.
Com essas e outras tantas manifestações oportunistas, que transformam o pleito eleitoral numa batalha de convicções de conveniência, vamos às urnas eleger o novo presidente da República, na certeza de que, seja qual for o eleito, a sua escolha se dará em face das convicções que ele não tem, mas que, por conveniência, finge ter.
O bom de tudo isso é que essas convicções oportunistas se dão num ambiente democrático, que deve sempre ser enaltecido, cumprindo lembrar, por oportuno, um velho adágio segundo o qual “A cura para os males da democracia é mais democracia”.
É isso.
*Artigo veiculado no Jornal Pequeno no dia do segundo turno da eleição presidencial