A VITÓRIA DOS MELIANTES

O presidente da República editou um decreto que, na prática, facilita a posse de arma de fogo, uma das promessas de sua vitoriosa campanha.
Depois do decreto, o debate foi intenso – e continua aceso -, em face das consequências da facilitação da posse de armas de fogo para o conjunto da sociedade.
Nesse sentido, há antevisões/opiniões para todos os gostos, razão pela qual também me aventuro fazer algumas reflexões em torno do tema, em face do que entrevejo como consequência mais evidente do afrouxamento da posse de arma de fogo e, no futuro, do porte.
Por conta dos debates em torno das consequências do polêmico decreto, há os que apostam no aumento da criminalidade, sob o argumento – que flerta com a realidade – de que, quanto mais armas em mãos dos cidadãos, maior a probabilidade de violência, ainda que o decreto trate apenas da flexibilização da posse.
Há outros que, ao reverso, acreditam que, estando o cidadão de posse de uma arma de fogo – em sua residência ou em seu comércio, por exemplo -, o meliante pensará duas vezes antes de agir, disso decorrendo, por consequência, que a violência contra a pessoa e contra o patrimônio, por exemplo, tenderá refluir.
Noutros ambientes onde o mesmo tema é tratado, há os que entendem, numa outra perspectiva, que a posse de arma estimulará, dentre outras consequências danosas, a violência doméstica, antessala do feminicídio, tão presente nos dias atuais.
Para o meu espanto, ainda há, por outro lado, os que acham que a só liberação da posse de arma de fogo ainda é pouco para desestimular a prática de crimes. Nesse sentido, não são poucos os que almejam, ademais, a liberação do porte de arma de fogo, sempre sob o argumento de que, armando a população, a violência urbana tenderá a arrefecer.
Eu, cá do meu canto, com a experiência que acumulei, devo dizer, tão somente, que, quanto mais armas, mais crimes, e que, ademais, não acredito em solução mágica para enfrentar a criminalidade; como, de resto, ninguém de bom senso acredita.
Nesse panorama, a única certeza que tenho, numa visão diametralmente oposta aos que defendem a posse e o porte de arma de fogo, é que, quanto mais flexível o controle, mais crimes violentos serão praticados.
Desde o meu olhar, em razão da flexibilização da posse de arma de fogo – e do seu porte, no futuro -, numa análise bem particularizada da questão, a mais provável consequência que disso advirá é que ela passará, doravante, a ser o novo sonho de consumo dos meliantes, o novo objeto de desejo dos assaltantes, a potencializar a nossa exposição em face da criminalidade violenta.
Creiam – e espero muito estar errado -, logo, logo, os meliantes, que, antes, atacavam as pessoas nas ruas, nas paradas de ônibus, no comércio e nas residências em busca, preferencialmente, de aparelhos celulares e coisas que tais, flexibilizados o porte e a posse de arma de fogo, voltarão as suas ações, fundamentalmente, para a subtração desse espetacular instrumento de intimidação.
O que poderá resultar, portanto, da flexibilização que se almeja é que, em face dela, os meliantes serão contemplados com mais facilidades para o acesso às armas de fogo, para, depois, infernizarem a nossa vida, em cada logradouro público, em cada esquina da cidade, quando, numa outra perspectiva, o que é mais grave, não estiverem a serviço das organizações criminosas.
É claro, pois, desde a minha compreensão, que, o estar de posse – ou portando – uma arma de fogo, em vez de se traduzir em maior segurança ao cidadão, como, equivocadamente, pensam muitos, se traduzirá em mais violência, ante a perspectiva de que os facínoras serão os verdadeiros beneficiários da flexibilização em comento.
O problema da arma de fogo não é estar em poder – porte ou posse – das pessoas de bem, as quais, por óbvio, não vão sair por aí assaltando nem matando ninguém, salvo em situações excepcionais, mas em mãos de meliantes ou servindo às organizações criminosas, que serão, ao fim e ao cabo, os verdadeiros beneficiários das medidas que favorecem a posse e o porte de arma de fogo.
O tempo dirá se estou com a razão.
Todavia, espero, sinceramente, que a minha análise da questão esteja equivocada, e que, com mais armas em poder do cidadão, testemunhemos o refluir dos índices de criminalidade, no que, definitivamente, não acredito.
É isso.

Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

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