PEDE AUXÍLIO AO GOOGLE, MEU IRMÃO

É de J.R. Guzzo a seguinte constatação:

“Previsões sobre o que vai acontecer amanhã sempre ficam melhores quando são feitas depois de amanhã. O que temos na vida real é o hoje, só isso – e o grande problema é chegar a alguma conclusão coerente sobre o que está realmente acontecendo hoje. Há uma sugestão honesta para resolver isso; porém, infelizmente, ela dá trabalho, exige esforço mental e não pode ser encontrada no Google. Como não há o mais remoto acordo sobre o dia de hoje – as coisas estão melhores que ontem, ou nunca estiveram tão horríveis? – a única ferramenta disponível para ter alguma ideia decente das coisas é pensar. E pensar, como se sabe, é uma das atividades humanas mais odiadas neste país, sobretudo por aqueles que imaginam saber o que estão falando”.

Perfeito! Mais preciso impossível!

As pessoas se recusam a pensar sobre o hoje. E, para as que se recusam a pensar sobre o hoje, não há o recurso que resolva; nem mesmo o Google é capaz.

Se é verdade que sobre o hoje e sobre o estímulo à reflexão não há disponibilidade nesse site, as informações sobre o ontem estão escancaradas nessa importante fonte de pesquisa.

O grave, daí a razão pela qual estou fazendo essas reflexões, é que, segundo parece, há muitos que, além de se recusarem a pensar sobre o presente, se recusam a dar um passeio no passado, ainda que disponham – e quase todos dispõem – de uma ferramenta de pesquisa da envergadura de um Google.

Creio que se os que pregam hoje – e são muitos! – a volta da ditadura, talvez pensassem melhor se voltassem ao passado, se acessassem o Google e se inteirassem das consequências nefastas de um regime de exceção.

Aquele que pede a volta da ditadura decerto que, ou não a vivenciou, ou não tem a mínima noção do que significa um regime de força, pois, se tivesse, não apelava para a sua volta – nem de brincadeira.

Ditadura não faz – e nem fez – bem a ninguém, em nenhuma parte do mundo. Só mesmo quem não tem a dimensão do que seja uma ditadura pode apelar pela sua volta. Só quem não sabe o que é censura, falta de liberdade de expressão, processos sumários, torturas, desrespeito aos direitos mais elementares pode pedir a volta da ditadura.

É verdade que há em todos nós um sentimento de desesperança em face da ação – ou inação – de muitos que estão no poder, sem a exata dimensão do que significa o exercício desse mesmo poder. Todavia, ainda assim, é melhor que busquemos o aperfeiçoamento da nossa democracia, que construamos uma nova realidade, mas sob o signo de liberdade em vez de um regime de força.

Aos que apelam pela implementação de um regime de força, faço as seguintes indagações:

Você tem a exata dimensão do que significa um regime de exceção, máxime se sob o comando de um desequilibrado e inconsequente?

Você já parou para pensar, desapaixonadamente, que esse desequilibrado pode sufocar a sua liberdade de pensamento e que eventuais mazelas decorrentes do exercício sem peias do poder sequer podem ser denunciadas?

Você já parou para pensar do que é capaz um homem que legisla, julga e executa ao mesmo tempo?

Você nunca se informou do que fizeram as ditaduras sanguinárias pelo mundo?

Você nunca parou para pensar que liberdade não tem preço e nem condição?

Que tal, então, ir ao Google?

Que tal se inteirar sobre o que ele tem a dizer sobre ditaduras pelo mundo?

Você acha justo não eleger seus representantes, ainda que eles não sejam lá essas coisas?

Você já pensou que, se não forem bons, você pode substitui-los no próximo pleito e que isso não seria possível num regime de exceção?

Você já parou para pensar que os nossos problemas decorrem muito mais da nossa incapacidade de escolher bem que em face do regime democrático?

Você já parou para pensar que democracia não tem preço e nem condição?

Você prefere viver em um Estado que protege os seus direitos ou num Estado que os solapa, sempre de acordo com a vontade de um ditador de plantão?

Você tem noção da relevância de poder protestar, gritar e de se insurgir contra o que não concorda ou você prefere ter seu grito contido pelas forças repressivas do Estado?

Se você tem dúvidas, dê um Google aí, amigo.Volte ao passado, via Google; é fácil e está ao seu alcance, bastando um clic no seu smartfone.

Não precisa esforço mental descomunal.

Não precisa sair da cadeira.

Não precisa de força física.

Antes de pedir ditadura, golpe militar, regime de força etc., pegue o seu aparelho celular e vá ao Google para que você tenha uma dimensão do que representa um regime sem liberdades.

Pesquisando sem muito esforço em face do mesmo tema, você poderá conhecer um pouco de Mao-Tsé-tung, de Joseph Stalin, de Adolf Hitler, de Kubiai Khan, de Leopoldo II, de Chiang Kai-shek, de Gengis Khan, de Hideki Tojo e de Pol Pot, só para mencionar apenas nove dos mais sanguinários ditadores que o mundo já abrigou.

Contudo, se depois de auxiliado pelo Google, ainda assim persistir clamando por um ditador, aí o quadro é mais grave.

Eu, de meu lado, com todas as mazelas, com todas as dificuldades, ainda que considere a deformação da nossa representação, ainda assim prefiro um regime democrático, pois quero ter o direito de errar e me corrigir.

Ademais, quero ter o direito de me expressar e responder pelos meus excessos, sempre ao abrigo da lei e em face da ação das instituições democráticas.

Eu quero ser julgado por uma lei que não foi o juiz quem fez.

É sob o império da lei que quero viver.

Se você é do tipo que, como anotou Guzzo, tem preguiça de pensar no presente, que, pelo menos, tenha a humildade de pedir auxílio ao Google para se inteirar do passado.

É isso.

Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

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