PARA NÃO DIZER QUE NÃO FALEI DE ESPERANÇA

Segundo a Mitologia Grega, Zeus criou Pandora, a primeira mulher. Antes de enviá-la à terra, entregou-lhe uma caixa, recomendando que ela jamais fosse aberta, pois dentro dela os deuses haviam colocado, dentre outras coisas, um arsenal de desgraças para o homem – discórdia, guerras, doenças etc. Pandora abriu a caixa, deixando sair todos os males do seu interior, preservando, apenas, a esperança, sem a qual, por óbvio, não seria possível enfrentar as dificuldades que permeiam as nossas vidas.

Na série norte-americana OZ (1997/2003), produzida pela HBO, o detento Augustus Hill, interpretado por Harold Perrineau Jr., em determinado episódio, apareceu gritando desesperado e lamentando o indeferimento de um pleito de liberdade condicional. Um dos colegas de cela, Kareem Said, interpretado por Eamonn Walker, vendo aquela cena insólita, o aconselhou a não se revoltar, pois, afinal era a lei que assim prescrevia, ao que Hill respondeu, argumentando:

-Não é a lei o meu problema. O meu problema é a esperança.

Nos dias de hoje, constato que o nosso problema, é a esperança, que tanto pode ser, metaforicamente, a contida na Caixa de Pandora, quanto a bradada, como lamento, pelo detento da série mencionada.

Diante disso, importa indagar: como não esmaecer a esperança quando testemunhamos líderes de algumas nações, com incontáveis seguidores fanatizados, fazendo pouco, por exemplo, da vacinação como meio eficaz para o enfrentamento de uma doença grave (Covid-19), que já ceifou a vida de milhões de pessoas no mundo inteiro?

Como não fenecer a esperança quando testemunhamos o desvio impune de verbas destinadas à compra de respiradores que salvariam vidas, sabido que a prisão após o trânsito em julgado é um impeditivo real de inflição de penas aos que habitam o andar de cima da criminalidade?

Como não se desesperançar quando testemunhamos profissionais da saúde injetando vento nas pessoas em vez de vacina, nos levando à conclusão de que a degradação moral do homem não tem limites?

Nesse cenário desalentador, convém anotar que a esperança, ao lado da fé e da caridade, são virtudes que se complementam. Por isso, não surpreende que, ao lado da desesperança, coladinho com ela, perdem intensidade, também, a fé e a caridade das pessoas.

Apesar de tudo, é preciso, como um imperativo de sobrevivência, ter fé e esperança. Por isso, a força que me move resulta da esperança – e da fé que ainda não perdi – no ser humano. Contudo, posso escolher depositar a minha esperança, sim, mas no ser humano empático, altruísta e solidário, que não age apenas para satisfazer os seus interesses pessoais, capaz, portanto, de contribuir com o próximo na superação das suas dificuldades, como uma força propulsora, arrebatadora e definitiva da dignidade humana.

Mas é preciso ter em conta que, por maior que seja a minha esperança, ela tende a sucumbir em face dos maus exemplos, sobretudo dos que, podendo ser uma fonte de energia positiva para as pessoas, preferem chamá-las para dançar à beira do precipício, sendo oportuno trazer à colação, nessa linha de compreensão, uma lapidar constatação de Nietzsche, segundo a qual “quando você olha muito tempo para o abismo, o abismo olha para você”.  Daí por que se recomenda prudência aos que, cega e burramente, seguem os maus exemplos e acreditam em falsas pregações.

É isso.

Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.