O filósofo alemão Arthur Schopenhauer, absorto diante de um jardim particular, não se dava conta dos olhares de temor e preocupação que ele despertava. A dona da casa, achando que podia ser um ladrão preparando-se para a invasão, decidiu chamar um policial.
O guarda se aproxima e perguntou de forma seca e direta:
– Quem é o senhor?
Reflexivo e provocante, o filósofo responde com um desafio:
– Se o senhor puder me esclarecer isso, eu lhe serei eternamente grato.
Tendo essa história como linha condutora dessas reflexões, antecipo que me incomoda muito constatar que as pessoas persistem em julgar o semelhante precipitadamente, a partir de uma avaliação superficial
É de perquirir-se em face dos juízos precipitados: Se, como advertiu Schopenhauer, as pessoas têm dificuldades de autoconhecimento, como podem ousar julgar o semelhante apenas pelo que lhes parece ser?
Por que as pessoas insistem em prejulgar o semelhante, maldosa, precipitada e impiedosamente, apenas pela carranca e pela sisudez, que, no meu caso – e de tantos outros – são inatas?
Confesso que não compreendo, foge à minha capacidade cognitiva, entender por que as pessoas se prestam aos pré-julgamentos, sobretudo se eles decorrem de uma convivência compartilhada superficialmente.
Compreendo, todavia, que exigir do ser humano que se abstenha de julgamentos precipitados seria exigir muito dele, sabido que o ser humano existe mesmo é para surpreender a cada momento.
As pessoas, infelizmente, são assim. Nesse sentido, não são poucas as que preferem, preferem, por capricho, vingança ou perfídia, a crítica mordaz, danosa e desumana, sobretudo em face dos que elegeram como desafeto.
A verdade é que as pessoas insistem em julgar o semelhante em face das expectativas que criam em relação a ele, e não em face daquilo que efetivamente é, dado que, assim considerado, implica em relações humanas controvertidas.
Não é demais reafirmar, todavia, que não se devem julgar as pessoas pela cor da pele, pela posição social, pelo cabelo, pelas roupas que vestem ou pela sisudez, pois é muito provável que por trás de uma carranca e da sisudez de um casmurro exista um ser humano muito melhor do que se pensa e julga.
É razoável compreender, racionais que somos (?), que, ao compartilhamos apenas alguns momentos das nossas vidas, não nos revelamos por inteiro, disso inferindo-se que qualquer julgamento é fruto de uma precipitação. Daí que, para não antecipar um julgamento sobre o semelhante, é recomendável não fazermos juízos antecipados sobre as pessoas com as quais só convivemos circunstancial e superficialmente.
Digo, para encerrar, que só quem está em condições de emitir juízo de valor sobre o semelhante – mas, ainda assim, com grande possibilidade de estar errado – é quem desfruta de uma convivência compartilhada de forma intensa e profunda, e desde que o julgamento não for seja feito a partir de ideias preconcebidas e preconceituosas.
Para encerrar, uma frase lapidar de Clarice Lispector para a qual chamo a atenção em face do que ela contém de exemplar diante das reflexões aqui encartadas: “Decifra-me, mas não me conclua. Eu posso te surpreender”.
É isso.