Trago a lume, para ilustrar, dois fatos assustadores, dentre os
muitos que têm sido noticiados nos últimos dias, fruto das paixões políticas
mais extremadas, que, para mim, homem médio, são injustificáveis; isso sem
falar dos atos antidemocráticos que se espalham pelo país.
O primeiro condiz com a notícia veiculada na imprensa
nacional dando conta do enforcamento de um menor de 7 (sete) anos, por
um policial civil, em face de ter mencionado o nome de um determinado
candidato à presidência da República.
O segundo fato restou traduzido, assustadoramente, numa
pesquisa do Datafolha, segundo a qual sete entre dez brasileiros têm medo
de ser agredido por causa de política, fruto de eventos da natureza do fato
antes destacado.
Os fatos em comento, aos quais se somam tantos outros de
igual matiz, mostram-nos, a toda evidência, que estamos diante de uma
situação de quase descalabro, vivendo dias de fúria, vendo famílias, até
então unidas, fragmentadas, cindidas, divididas, em face de posições
políticas.
Nesse cenário, li, dia desses, fruto do bom humor dos que
ainda guardam alguma lucidez, que, depois das eleições, as reuniões
familiares se transmudariam em verdadeiras audiências de conciliação,
tamanha as divergências que decorrem das paixões políticas mais
exacerbadas.
Pelo que tenho testemunhado, nada obstante, as dissenções,
em alguns casos, são tão graves que conciliação não haverá, fruto da
toxidade que impregnou a alma de alguns fanatizados.
O que todos temos visto, em face dessa irracional paixão
política, são verdadeiras “guerras” – guerras fratricidas mesmo – travadas em
ambientes outrora cordatos, a contaminar as relações mais comezinhas, em
detrimento mesmo, numa visão holística, da paz social, na medida em que as
dissenções alcançaram, para minha estupefação, até, as casas religiosas,
outrora relevante instância de controle social.
Confesso-me estarrecido e desalentado com atitudes que
beiram à irracionalidade, em face das querelas que decorrem do alinhamento
político de parcela relevante da sociedade; atitudes que, consigno, nada tem
a ver com o exercício da cidadania, que não se confunde com o alinhamento
político acrítico, asséptico, insensato e radical dos que, vivendo numa
realidade paralela, se deixam levar pelo fanatismo; fanatismo que esgarça as
relações sociais, nelas inclusas as relações familiares, que deveriam, ao
reverso, ser sublimadas e enaltecidas, mas que têm cedido às dissenções
acerbas, cuja consequência mais cintilante é o soterramento da paz social.
Indago-me, sem encontrar resposta, como pode alguém, com
o mínimo de bom senso e descortino, defender, sem restrição, sem exame
racional e crítico, determinados agentes políticos, sobretudo se dessa falta de
cuidado resultar prejuízo às suas relações pessoais e familiares?
Compreendo, sim, que as preferências políticas devam, sim,
ser exaltadas. Todavia, compreendo, no mesmo passo, que essa sublimação
precisa ser ponderada – não fanatizada, enfim – pois a adesão radical e sem
discernimento crítico pode levar – e tem levado – à conclusão de que quem
pensa diferente do que pensamos pode ser tratado como inimigo, e, não,
como deve ser, como parceiro na consolidação de uma sociedade plural,
pluralidade que deve ser enaltecida como algo natural numa sociedade
democrática.
É isso.