Ligeiras reflexões sobre a prova testemunhal, em face de um pedido de liberdade provisória

Hoje, dia doze de dezembro, lancei um despacho nos autos do processo crime 21743/2007, em face de um pedido de liberdade provisória. Nesse despacho reflito sobre eventuais defeitos da prova testemunhal. Foram reflexões breves, sem maiores pretensões. Penso que, ainda assim, vale à pena refletir comigo.

Abaixo, pois, o despacho.

Processo nº 217432007

Ação Penal Pública

Acusado: E. T. S. e outro

Vítima: Paulo Eugênio Costa Pereira

 

Vistos, etc.

 

01. Cuida-se de ação penal deflagrada pelo Ministério Público contra E. T.S.e C. M. S.R. por incidência comportamental no artigo 157, §2º, I, II e IV, do CP.

02. Os acusados foram presos em flagrante no dia 16 de setembro do corrente, e preso ainda se encontram.

03. O acusado E. T. S. pediu a sua Liberdade Provisória.(fls.42/46)

04. O Ministério Público, instado a se manifestar, opinou pelo deferimento do pleito, extensivo ao co-réu C. M. S. R.(fls.128/130)

05. Vieram-me os autos conclusos para decidir.

06. A instrução está encerrada. Os acusados, portanto, em liberdade, não poderão criar qualquer óbice à produção de provas.

06.01. Encerrada a instrução, posso concluir, ademais, que os acusados, pese o crime que se lhes imputa a prática o Ministério Público, podem, sim, ser beneficiados com a sua Liberdade Provisória, pois que, por tudo que vi e ouvi, não representam um perigo à ordem pública, malgrado não tenham boa conduta social.

07. Os acusados, vejo, também, das provas consolidadas, têm domicílio nesta comarca, do que se pode inferir, de mais a mais, que, em liberdade, tudo está a indicar, não fugirão do distrito da culpa, para inviabilizar eventual inflição de pena.

08. Claro que essas afirmações são feitas por um ser falível (juiz), em face de depoimentos prestados por seres humanos, sujeitos, por isso, a toda sorte de influência – boas ou más; positivas ou negativas.

08.01. Com reflexões supra quero dizer que posso, sim, estar enganado, ao decidir-me pela concessão da Liberdade Provisória aos acusados.

08.01.01. Infelizmente, ao magistrado ainda não foi dado o dom da premonição. Ao magistrado, da mesma forma, também não foi dado o poder de incursionar pela mente humana.

08.02.02. O que o magistrado pode fazer é o que estou fazendo agora: decidindo com base nas provas consolidadas nos autos, as quais, por serem eminentemente testemunhais, carregam consigo incertezas e impropriedades, inelutavelmente.

08.01.03. Em face de eventuais incertezas, das inevitáveis impropriedades, dos possíveis vícios que contaminam a maioria das provas testemunhais, nada, ou quase nada, se pode fazer. Apesar de tudo, é com base nelas que tenho que decidir acerca da liberdade dos acusados.

09. É preciso convir que todos os depoimentos, em qualquer processo, trazem neles incrustadas as idiossincrasias, as emoções e as paixões das testemunhas, contra os quais nada se pode fazer.

09.01. Os depoimentos idiossincráticos, emocionais e apaixonados permeiam qualquer instrução criminal. Nós não podemos fugir dessa realidade. Apesar disso, é com supedâneo neles que, quase sempre, temos que decidir, correndo todos os riscos, todos os perigos – inclusive de fazer uma injustiça.

10. Com espeque, pois, nos depoimentos tomados ao longo da instrução, posso concluir que os acusados fazem por merecer a sua Liberdade Provisória.

11. Um detalhe: um dos acusados, E. S., foi preso exatamente no dia que seu filho nasceu. Até a data atual, por conta deste processo, o acusado ainda não pode conviver com o seu filho, o que, para mim, é um castigo por demais relevante, o qual decerto, o fará refletir acerca do crime que cometera, movendo-o para o caminho do bem e para convivência pacífica em sociedade.

12. O acusado C. M. S. R., tal qual E.T. S., também faz por merecer a sua liberdade provisória, pois que também não representa perigo à ordem pública, não mais poderá criar empecilhos à produção de provas e nem se furtará de receber a correspondente reprimenda legal, na hipótese de vir a ser condenado.

13. Assim sendo e de conformidade com o parecer da representante ministerial, concedo aos acusados E.T. S. e C. M. S. R. Liberdade Provisória, o fazendo com espeque no parágrafo único, do artigo 310, do Digesto de Processo Penal.

14. Expeça-se Alvará de Soltura.

15. Tome-se-lhes o compromisso.

São Luis, 11 de dezembro de 2007.

Juiz José Luiz Oliveira de Almeida

Titular da 7ª Vara Criminal

Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

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