Num tô nem aí

Você, certamente, já ouviu alguém muito próximo verbalizar essa frase. Se a frase é proferida circunstancialmente, tudo bem. Qualquer um de nós pode, em determinado momento, pronunciá-la. Entrementes, se essa frase traduz um estilo de vida, uma pratica de vida, uma profissão de fé, uma doutrina, um norte, um prumo, um caminho a ser seguido, bom, aí é de preocupar.

O cidadão (?) que emprega essa frase como um aforisma, está muito longe de ser um exemplo a ser seguido. Eu tenho muito dificuldade de conviver com quem faz apologia do “num tô nem aí”. Eu tenho, devo admitir, muita restrição a quem, diante de um determinado contratempo, se limita a proferir o apotegma “num tô nem aí”.

O indivíduo é chamado de guloso, obeso, viciado, cachaceiro, safado, trambiqueiro, golpista, trapaceiro, dentre outros predicados, e responde, singelamente: “num to nem aí” para quem se incomoda com o meu vício, minha cachaça, minha gula, com meus trambiques, com as minhas trapaças. E arremata: eu não sou o único safado deste mundo. E, finalmente, obtempera: eu não nasci para consertar o mundo. Esse cara, convenhamos, não tem vergonha. Creia!

 

Convenhamos, quem age dessa forma precisa de aulas de probidade, de retidão, de caráter. Ta precisando de umas aulas de integridade e lisura. Não pode ser um paradigma. É peçonhento, nocivo, pérfido. E preparem uma cela, pois se as instituições funcionarem (?), ele, logo, logo, vai precisar de um abrigo para viver às custas do Estado.

O indivíduo é desleixado, pachorrento, desatento, desinteressado, impontual e omisso. Em resposta a quem o acusa de tudo isso, afirma, simplesmente: num to nem aí para que pensa isso de mim. E conclui: eu não sou o único. Como eu – prossegue o mau caráter – há muitos. Esse cara é, definitivamente, uma péssima referência. Se pai for, deve estar fabricando em casa um “pachorrentinho”, um “desleixadinho”, um “negligentinho”, um “bandidinho” que, decerto, como ele, vai dar muito trabalho à sociedade.

Compreendo que o ser humano que tenha uma formação moral sedimentada, que tenha responsabilidade, que é cioso de suas obrigações, que tem compromisso com o trabalho, com a família, com a sociedade, enfim, tem que estar aí, sim, para as críticas que se fazem em face de suas atitudes.

Nesse sentido eu, por exemplo, estou aí, sim, quando cometo um erro ao decidir. Da mesma forma, estou aí, sim, quando sinto que não fui capaz de decidir com o equilíbrio que se espera de um magistrado. Eu estou aí, sim, quando tenho notícia de que um acusado foi torturado para confessar um crime. Eu estou aí, sim, quando sou obrigado a lidar com quem não cumpre horário. Eu estou aí, sim, quando sei que os meus inimigos procuram, nos bastidores, me prejudicar. Eu estou aí, sim, quando sei que disseminam a informação de que sou arrogante e prepotente para tentarem me desqualificar. Eu estou aí, sim, quando liberam um meliante que, na minha visão, deveria ser mantido preso. Eu estou aí, sim, quando o promotor, o advogado, o acusado e a testemunha chegam atrasados à audiência. Eu estou aí, sim, se tenho que trabalhar sem a mais mínima condição, se não posso concluir uma instrução com brevidade, se sinto que não estou sendo útil à sociedade . Eu estou aí, sim, quando não apresentam o acusado para audiência, quando não cumprem um despacho, quando sou atacado injustificadamente em face de uma decisão, quando não respondo aos anseios da sociedade. Eu estou aí, sim, se recebo meus vencimentos sem ter produzido o que se espera de mim. Eu estou aí, sim, se apontam em mim uma má conduta profissional ou pessoal. Eu estou aí, sim, se, por hipótese, me conduzi mal diante de determinado problema que exigia de mim equilíbrio e sensatez. Eu estou aí, sim, se avalio que o meu procedimento pode ser um mau exemplo aos meus filhos. Eu estou aí, sim, se por algum motivo não honro a palavra empenhada. Eu estou aí, sim, se tenho noticia que esse ou aquele agente público desviou verba destinada à saúde ou a educação. Eu estou, aí, sim, se tenho que lidar com um mau caráter. É assim que eu sou e não vou mudar.

Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

2 comentários em “Num tô nem aí”

  1. ooooi, acabei de ler sua postagem e me deu uma vontade de falar….! Se bem qe é tão engraçado eu so jovem, só tenho 15 anos e meu gosto é mto diferente.., eu me importo sim com o que os meus colegas estão fazendo da vida deles, dizendo que o mundo pode e deve esperar elees amadurecerem, essa padronização dos jovens me enlouquece de tal forma qe é preciso dizer, de algum jeito que eu ESTOU AI SIM, para a hipocresia dos adultos, para o pouco caso de muitos adolescentes, para o tabu de varios assuntos…, eu cansei de querer mudar o mundo, com minhas ideias revolucionarias, e para muitos parecer uma patricinha alucinada!

  2. se quiser conversar, debater, ah sei lá, pra manter contado, podiamos trocar e-mails,gostei de suas ideias, e modo de trabalhar com elas !

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