Tenho dito e redito, afirmado e reafirmado, que o Poder é para ser exercido com moderação e, sobretudo, equilíbrio. O Poder, ademais, é para ser exercido de acordo com o ordenamento jurídico, de conformidade, enfim com a Constituição e normas infraconstitucionais. Nessa perspectiva, repudio, com veemência, o tratamento descortês e arrogante que se tem dispensado aos acusados nos processos-crime, sobretudo porque egressos das classes menos favorecidas.
Tenho a mais plena convicção de que o magistrado que destrata, desrespeita, agride com palavras um acusado, além de abusar do poder, afronta a constituição, pois que dispensa ao acusado tratamento degradante e o compele a se auto-acusar, quando, sabe-se, o réu não é obrigado a falar ou contribuir com provas que possam vir em detrimento de sua defesa ( nemo tenetur se detegere)
Por que estou voltando ao tema? Porque hoje, agora mesmo, acerca de um hora, comecei a ler o livro de Saulo Ramos, Código da Vida, no qual ele narra um episódio estarrecedor que testemunhou como advogado, numa ação penal privada que patrocinou, em nome do ex-presidente Jânio Quadros, contra a jornalista Adelaide Carraro, que escrevera um livro, no qual incluíra um capítulo narrando fatos libidinosos, envolvendo vários políticos, dentre eles Jânio Quadros, de quem teria sido amante.
Jânio Quadros, indignado, contratou os serviços profissionais de Saulo Ramos, que propôs uma ação penal privada contra a indigitada jornalista.
A ação penal foi distribuída ao magistrado Edmmond Acar, o qual, segundo Saulo Ramos, seria um bom juiz, mas que tinha por hábito mandar palavrões durante as audiências.
Pois bem. No dia da primeira audiência, todos chegaram reverentes e sentaram à mesa de audiência e ficaram aguardando a chegado do magistrado. Quando o magistrado entrou na sala de audiência, dirigiu-se à ré, e determinou que a mesma ficasse em pé, afirmando, a todos estarrecendo, que “em sua vara puta não sentava”.
Advertido pelo advogado de defesa em face desse tratamento, o magistrado disse em sua defesa que estava tratando a ré com o mesmo vocabulário que ela tratou as vítimas em seu livro.
Todos ficaram em silencio. O Juiz, então, pegou o livro objeto da controvérsia, entregou-o à interrogada e determinou que ela lesse as dez primeiras páginas.
Lidas as páginas como determinado pelo magistrado, ele, em seguida, recolheu o livro e ordenou que ela escrevesse o que havia lido, do jeito que lhe viesse na memória.
Passaram-se longos minutos e ela nada escreveu. O magistrado (?), em face dessa atitude da ré, deu um murro na mesa e indagou, com veemência: Quem escreveu esse livro? A jornalista, apavorada, respondeu: Acidinho Campos.
O juiz, diante dessa resposta, dirigiu-se aos presentes, concluindo:
“Estão vendo? A polícia bate, tortura pessoas para obter confissões. Aqui o réu confessa apenas sob um tratamento psicológico adequado”
Reflita sobre isso e responda: nos dias atuais, vigendo a Constituição cidadã, você conhece algum juiz que age exatamente assim?
Será que, nos dias atuais, com a sedimentação da democracia, em pleno Estado Democrático de Direito, ainda há magistrados que tratem os acusados com rispidez, com descortesia, com arrogância, dando murro na mesa?
Se você conhece algum magistrado que nos dias atuais repete a atuação do magistrado em comento, informe-me. Prometo manter sigilo.
o magistrado agiu folcloricamente. Hoje não sei se seria possível uma atitude como esta.
Dentro da sala de audiências dizer que “em sua vara puta não sentava” com certeza o Juiz iria ter uma reclamação correicional. Não lhe parece?
Aqui no RS tinha um juiz, hoje já falecido, que dizia coisas folclóricas em audiência.Por exemplo: no tempo em que as contestações na Justiça Trabalhista eram lidas – “contestação espada, lida e juntada aos autos”. Excelência, espada, pergunta o serventuário? Sim, comprida e chata.É claro que para a ata só foi “contestação lida e juntada aos autos”.
O nosso POder é sobretudo, um Poder DEVER.