Pronúncia. O motivo fútil. Afastamento. Divergências anteriores entre o réu e o acusado.

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jose.luiz.almeida@globo ou jose.luiz.almeida@folha.com.br

Cuida-se de decisão de pronúncia.

Acerca das qualificadoras, assim me posicionei, verbis:

No que se refere às qualificadoras, compreendo que deva ser afastada a decorrente do motivo fútil, em face do desentendimento havido, antes do crime, entre o acusado e o ofendido.

Nessa linha de argumentação, sublinho que

A conceituação do motivo fútil exclui qualquer circunstância capaz de ter provocado exaltação ou revolta, ou que explique o impulso com que o agente é levado ao crime. E essa atitude deve ser sempre apreciada pelo juiz, levando em conta o grau de educação do agente, o meio em que vive e outros fatores especiais de cada casa (RJTJESP 113/449).

No exame dessa questão não se pode, outrossim, deslembrar que

Noticiando os autos ocorrência de discussão entre vítima e réu, é o bastante para que se afaste a qualificadora do motivo fútil, prevista no nº II do §2º, do artigo 121 do CP (RT 524/416).

Acerca da qualificadora do inciso IV, §2º, do artigo 121, compreendo, divergindo do Ministério Público, que deva mantê-la, tendo em vista que há fortíssimos indícios de que à vítima não foi dada nenhuma possibilidade de defesa.

Os Tribunais, a propósito, têm proclamado que

Caracteriza meio insidioso, como qualificadora do homicídio, espancar-se pessoa indefesa, com reiterados golpes de facão. Nos casos indicados no inc. IV, do artigo 121,§2º do CP, o que qualifica o homicídio não é o meio escolhido ou usado para a pratica do crime, e, sim, o modo insidioso com que o agente o executa, empregando, para isso, recurso que dificulte ou torne impossível a defesa (RT 733/659).

A seguir, a decisão, integralmente:

Poder Judiciário

Fórum da Comarca de São Luis.

Juízo da 7ª Vara Criminal

São Luis – Maranhão

Acesse meu site – www.joseluizalmeida.com – e saiba o que penso e como decido.

Processo nº 209112007

Ação Penal Pública

Acusado: Jorge da Conceição Oliveira Silva, vulgo “Joca”

Vítima: Isaías Manoel Silva Ferreira

Igualados pela dor

De qualquer tragédia ou catástrofe devem-se tirar lições. Da tragédia que envolveu o vôo nº 447, Air France, linha Rio/ Paris, que caiu no Oceano Atlântico, na noite de 31 de maio, com 228 pessoas a bordo, a lição que se repete, dentre outras tantas, é que, na dor – e no sofrimento – somos todos iguais – rigorosamente iguais.

Na dor e no sofrimento os Quesadas, Suarez Montes, Coquetes, Arrondos, Lenzis, Hochabaeff, Moholts, Sebas, Dubois, Ivanovitch, Giroux e outros são iguais, rigorosamente iguais, aos Silvas, Gomes, Leites, Oliveira, Fonseca, Ferreira, Pereira e outros.

Na dor não existem nacionalidades e posição social. A dor que dói aqui é a mesma que dói na Suécia e no Senegal, no empresário e no trabalhador braçal.

Pretos, brancos, pobres, ricos, bonitos, feios, altos, baixos, crianças, adultos, todos, enfim, somos rigorosamente iguais na dor e no sofrimento.

A dor e o sofrimento não servem apenas para doer e fazer sofrer, mas também lecionam, mostram o caminho, podem levar o incrédulo a Deus – ou afastá-lo ainda mais, não se há de negar.

A dor que dói – e o sofrimento que corrói – em face de uma tragédia – perda de um ente querido, por exemplo – não só ensinam como nos tornam mais humildes. Afinal, a dor e o sofrimento dela decorrentes não distinguem o rei do súdito, o juiz do jurisdicionado, o macho da fêmea, o bonito do feio, o governante do governado, releva reafirmar.

Diante da dor, não há soberba; também não importa a riqueza quando estamos sofrendo em face de algum infortúnio. Em ocasiões dessa natureza, pouco importa a nossa origem, o título que ostentamos ou cargo que exercemos, já que a minha dor é rigorosamente igual à do vizinho, do amigo ou do inimigo.

Na dor não nos preocupa o saldo bancário. Os prazeres da carne, a suntuosidade, a soberba, a inveja, a patranha, tudo isso se revela desprezível, quando se sobrepõem a dor e o sofrimento.

Se é dor, dói – e pronto! Entretanto, faz pensar, faz refletir, visto que tem o poder de mudar o curso, de nos fazer redirecionar as nossas ações – podendo, até, purificar o pensamento, fazendo com que nos tornemos mais humildes, mais alma e menos matéria.

A dor que lancina, que aflige e que danifica, nos apequena a todos e nos fragiliza, além de poder nos mostrar e conduzir, enfim, a caminhos nunca dantes trilhados.

Pena que muitos só reavaliem os seus conceitos diante da dor e do sofrimento. Mas há os que, recalcitrantes, nem mesmo a dor e o sofrimento lhes servem de lição.

O ideal seria que não dependêssemos de uma tragédia para dar valor ao semelhante, para reavaliar os nossos conceitos.

Dor é dor; sofrimento é sofrimento. Não existe mais dor ou menos dor; mais sofrimento ou menos sofrimento. Se é dor, é dor; se é sofrimento, é sofrimento – e maltrata, faz sofrer, faz pensar, refletir, principalmente quando se é racional.

Dor é sofrimento físico e/ou moral. A dor que dói em mim é a que dói em ti, ainda que de matizes diferentes. Mas, igual ou diferente, com uma ou outra coloração, o certo é que a dor dói e maltrata – e vulnera, e fragiliza.

Diante da dor podemos, até, (re) agir de forma diversa. Mas as nossas (re) ações, díspares ou semelhantes, decorrem do mesmo sofrimento – físico ou da alma – da mesma certeza de que diante de uma borrasca, de uma tragédia somos, sim, todos iguais.

A dor nos remete a Deus – para suplicar, para que nos dê força para tolerá-la, ou mesmo para questioná-lo, em face do sofrimento que julgamos não merecer.

Para a dor física ministram-se os analgésicos; para a dor da alma, em princípio, não há remédio, sobretudo para os incrédulos, para aqueles que diante dos olhos só vêem a matéria.

A dor da alma é dor lenta, corrosiva, dilacerante – daquelas que nos levam ao chão e nos fazem questionar por que comigo e não com outra pessoa.

Para a dor da alma o único remédio a ser ministrado, não raro, é deixar o tempo passar. Com o tempo a dor da alma corrói menos – nos faz levantar, até que outra tragédia nos abata, nos faça sucumbir, para relembrar, outra vez que, por mais que não queiramos ver, somos mesmo rigorosamente iguais.

A dor da alma é aquela que deixa um nó na garganta, que faz as lágrimas descerem – muitas vezes sem alterar os músculos de nossa face. As lágrimas são, afinal, a materialização, em gotas, da dor e do sofrimento que nos afligem.

A dor e o sofrimento são partes da nossa vida. É necessário, pois, que, diante de qualquer um deles – ou de ambos – tenhamos a capacidade de renascer, ainda que a dor nos tenha mutilado a alma.

Juiz José Luiz Oliveira de Almeida

Titular da 7ª Vara Criminal

Vistos, etc.

Cuida-se de ação penal que move o Ministério Público contra Jorge da Conceição Oliveira Silva, vulgo Joca, devidamente qualificado, por incidência comportamental no artigo 121, §2º, II e IV, , do CP, de cuja denúncia apanho os seguintes excertos, verbis:

Consta no incluso inquérito policial em epígrafe que na madrugada do dia 19.05.2007 o senhor Isaías Manoel Silva Ferreira, foi agredido a pauladas enquanto dormia em um casebre, no bairro São Raimundo, nesta capital, vindo a falecer logo após ser transportado ao hospital Socorrão II, tendo ali sido constatado como causa mortis traumatismo crânio-encefálico.

Mais adiante, os momentos que antecederam o evento, litteris:

Infere-se da leitura dos autos que no dia anterior a vítima, também conhecida pelos apelidos de Mecânico e Cazuza encontrava-se no Dega Bar em companhia de Jorge da Conceição Oliveira Silva, ambos ingerindo bebida alcoólica. Já no final da noite, por volta de 22h, chegou ao local Carlos Junior Pinto que, convidado pela dupla aceitou prontamente participar da bebedeira.

Noutro fragmento, a ação do acusado, verbo ad verbum:

Algumas horas depois, já em avançado estado de embriaguez, a vítima retirou-se do local alegando que ia dormir, seguindo em direção ao casebre onde costumava passar as noites. Por sua vez, o denunciado e seu colega Junior se dirigiram à casa do primeiro para continuarem a beber. Lá estando, em determinado momento após retornar da cozinha, o denunciado disse ao seu acompanhante que estava sentido falta de “Ali Babá”, nome dado a um facão que possuía, dizendo também que já sabia quem o havia subtraído, e logo saindo em direção ao casebre onde a vítima dormia. Passados alguns minutos o denunciado retornou a sua casa, vindo a se dirigir a Junior mencionando a seguinte expressão: “O cara já era”. Em seguida, colocou algumas peças de roupas em uma bolsa e dali tomou rumo ignorado.

A seguir, constatação do assassinato, verbatin:

Movido pela curiosidade Junior foi pessoalmente verificar o ocorrido, sendo que ao chegar à casa da vítima encontrou-a ensanquentada ensanguentada, praticamente desfalecida, constatando ao lado desta a existência de uma tábua suja de sangue.

A persecução criminal teve início mediante portaria (fls.07).

Auto de apresentação e apreensão às fls. 11 e 36.

Laudo de exame pericial em objeto (pedaço de madeira), às fls. 45/46, e em arma branca, às fls. 246/247.

Exame cadavérico às fls. 52.

Decreto de prisão preventiva às fls. 80/84.

Recebimento da denúncia às fls. 90/91.

O acusado foi qualificado e interrogado às fls. 146/156.

Defesa prévia às fls. 158.

Durante a instrução criminal foram ouvidas as testemunhas Regina Costa Dias (fls.226/228) e Francisco Cardoso da Silva Neto (fls.229/230).

O Ministério Público, em alegações finais, pediu a procedência da acusação, com a pronúncia do acusado apenas no caput do artigo 121 do CP (fls. 276/280).

A defesa, de seu lado, pediu a absolvição do acusado, nos termos do inciso IV, do artigo 415 do CPP ou que, se assim não for entendido, que seja desclassificada a imputação inicial, fazendo-a recair apenas no caput do artigo 121 do CP (fls.295/299).

Relatados. Decido.

01.00. Cuida-se de ação penal que move o Ministério Público contra Jorge da Conceição Oliveira Silva, vulgo Joca, devidamente qualificado, por incidência comportamental no artigo 121,§2º II e IV, do Código Penal brasileiro, em face de ter assassinado, a pauladas, Isaias Manoel Silva Ferreira, fato que teria ocorrido no dia 19 de maio de 2007, no bairro São Raimundo, nesta cidade.

02.00. A persecução criminal se desenvolveu em dois momentos distintos – fases extrajudicial e judicial.

03.00. Na fase extrajudicial ponho em destaque a apreensão do provável instrumento do crime (fls.11).

04.00. Da mesma sede destaco o depoimento da testemunha Francisco Cardoso da Silva Neto, que teve notícia da infração e da fuga do acusado, após a prática do crime (fls.14/15).

05.00. Relevante, ademais, é o depoimento de Marcione Sebastião Sebastiana Silva Campos, que ouviu do acusado dizer que o ofendido “já era”, isso depois de ir ao encontro do mesmo, atrás de um facão de sua propriedade (dele, acusado), ao qual dera o nome de Ali Babá (fls.16/17).

06.00. De relevante no depoimento de Raimunda Maria Oliveira Silva, mãe do acusado, é a informação da fuga do mesmo do distrito da culpa, após o crime (fls. 19/20).

07.00. Pertinente, ademais, é o depoimento de Carlos Júnior, que confirma que o acusado foi à residência do ofendido, em busca de seu facão (Ali Babá) e que, quando de lá retornou, disse que a vítima “já era” (fls.25/26).

08.00. O acusado, finalmente, foi ouvido em sede administrativa, o qual, inobstante, negou a autoria do crime, conquanto admitisse que, em face da suspeita de que teria matado o ofendido, resolveu ir para cidade de Cantanhede, onde passou três meses e alguns dias (fls.37/39).

09.00. Com esses dados encerrou-se a fase extrajudicial da persecução criminal.

10.00. O Ministério Público, tendo às mãos o almanaque administrativo, ofertou denúncia contra Jorge da Conceição Oliveira Silva, vulgo Joça, imputando a ele a prática do crime de homicídio duplamente qualificado e consumado (artigo 121,§2º II e IV, do CP), em face de ter assassinado Isaias Manoel Silva Ferreira.

11.00. O acusado foi citado, qualificado e interrogado nesta sede, a sede das garantias constitucionais (fls. 146/156)

12.00. Do depoimento do acusado destaco os seguintes fragmentos:

I – que o crime não foi praticado intencionalmente;

II – que cedeu um lugar para o acusado se abrigar, mas que não permitiria que ele usasse drogas dentro de casa;

III – que soube que o ofendido estava em sua casa escondido;

IV – que, por isso, ficou procurando o motivo para tirar o acusado de sua casa;

V – que no dia do fato ficou bebendo até quase uma hora da tarde com o ofendido;

VI – que, nesse mesmo dia, o ofendido admitiu que estava usando droga;

VII – que, tendo descoberto que o ofendido usou droga no interior de sua casa, disse a ele que não tinha mais condições de lá permanecer;

VIII – que o ofendido levou na brincadeira e começou a falar coisas bruscas de sua mãe;

IX – que o ofendido saiu dizendo que tinha mantido relação sexual com sua mãe;

X – que a sua mãe chamou a atenção do ofendido por causa desses comentários, mas ele ainda a esculhambou;

XI – que foi tratar com o ofendido sobre isso e também foi esculhambado por ele;

XII – que não partiu para cima do ofendido porque tinha medo dele;

XIII – que foi para casa fazer a sua janta e lá sentiu falta do seu facão (Ali Babá), da faca de cortar carne e das faquinhas;

XIV – que percebeu que o ofendido e Júnior, que estava com ele, lhe desarmaram;

XV – que, por volta das 09h00 da noite, estando em casa, o ofendido chegou;

XIV – que disse ao ofendido para não entrar em sua casa;

XV –que pegou as coisas do ofendido – rede, camisa, etc – mandou que o mesmo seguisse seu rumo;

XVI – que o ofendido lhe ameaçou de morte;

XVII – que o ofendido levou a mão para lhe dar um soco;

XVIII – que ameaçou colocar fogo na casa com o ele dentro;

XIX – que ficou com mede de dormir e o ofendido tocar fogo em sua casa;

XX – que resolveu falar com ele e pedir desculpas;

XXI – que se aproximou do ofendido e ele disse que não tinha nada a falar com ele, acusado;

XXII – que o ofendido passou a desrespeitar a sua mãe;

XXIII – que foi advertido por causa disso;

XXIV – que, em seguida, o ofendido se armou com um pedaço de pau e partiu para cima dele;

XXV – que bateu no ofendido que, provavelmente porque estava embriagado, caiu;

XXVI – que o ofendido ameaçou pegar alguma coisa debaixo de um tablado;

XXVII – que imaginou que o ofendido fosse se armar com o seu facão;

XXVIII – que se armou com um pedaço de pau para, de olho fechado, bater no ofendido;

XXIX – que o ofendido ameaçou se levantar e foi, mais uma vez, atingido pelo acusado;

XXX – que com a outra paulada o ofendido deitou; e

XXXI – que, com medo, resolveu sair em disparada.

13.00. A testemunha Regina Costa Dias apenas teve notícia da ocorrência do crime, vez que, ao tempo do fato, estava em sua casa dormindo (fls.226/228)

14.00. Encerrando a instrução foi inquirida a testemunha Francisco Cardoso da Silva Neto, que, a exemplo de Regina Costa Dias, não estava presente no momento do crime e que, por isso, apenas teve notícia de que o acusado teria assassinado o ofendido (fls.229/230)

15.00. Analisada a prova amealhada, concluo que presentes estão os pressupostos para a admissibilidade da acusação, a fim de que o acusado possa ser julgado perante o Tribunal do Júri.

16.00. As provas produzidas, com efeito, dão conta da ocorrência de um crime doloso contra a vida, cuja autoria, agora se sabe, é incontestável, em face mesmo da confissão do acusado, nesta sede.

17.00. As demais testemunhas, é verdade, não estavam presentes no momento da ocorrência, contudo tiveram notícias do crime, o que evidencia a sua efetiva ocorrência.

18.00. Provada a existência do crime e presentes, quantum satis, os indícios de autoria, tenho que o caminho inelutável, agora, é a pronúncia do acusado, para que possa ser julgado pelos seus pares.

19.00. O acusado, em seu interrogatório, deixa transparecer que apenas reagiu a uma agressão iminente e que, por isso, ao assassinar o ofendido, teria agido ao abrigo da legítima defesa.

20.00. Devo dizer, nada obstante, que, para mim, a prova acerca da excludente da ilicitude em comento não é plena, de modo a autorizar o afastamento da quaestio de exame perante o Tribunal do Júri.

21.00. A excludente de ilicitude da legítima defesa, todos sabemos, em caso tais, só se reconhece se a prova consolidada nos autos deixa entrever, sem nenhuma dúvida, sem nenhuma hesitação, que o acusado tenha, efetivamente, apenas reagido a uma agressão e que o tenha feito, ademais, moderadamente e com o emprego dos meios necessários.

22.00. A mais importante prova produzida – o interrogatório do acusado – não entremostra, com segurança, que tenha, efetivamente, assassinado o ofendido, para proteger a bem jurídico seu de uma agressão atual ou iminente e que tenha feito uso moderado dos meios necessários.

23.00. No que se refere às qualificadoras, compreendo que deva ser afastada a decorrente do motivo fútil, em face do desentendimento havido, antes do crime, entre o acusado e o ofendido.

24.00. Nessa linha de argumentação, sublinho que

A conceituação do motivo fútil exclui qualquer circunstância capaz de ter provocado exaltação ou revolta, ou que explique o impulso com que o agente é levado ao crime. E essa atitude deve ser sempre apreciada pelo juiz, levando em conta o grau de educação do agente, o meio em que vive e outros fatores especiais de cada casa (RJTJESP 113/449).

25.00. No exame dessa questão não se pode, outrossim, deslembrar que

Noticiando os autos ocorrência de discussão entre vítima e réu, é o bastante para que se afaste a qualificadora do motivo fútil, prevista no nº II do §2º, do artigo 121 do CP (RT 524/416).

24.00. Acerca da qualificadora do inciso IV, §2º, do artigo 121, compreendo, divergindo do Ministério Público, que deva mantê-la, tendo em vista que há fortíssimos indícios de que à vítima não foi dada nenhuma possibilidade de defesa.

25.00. Os Tribunais, a propósito, têm proclamado que

Caracteriza meio insidioso, como qualificadora do homicídio, espancar-se pessoa indefesa, com reiterados golpes de facão. Nos casos indicados no inc. IV, do artigo 121,§2º do CP, o que qualifica o homicídio não é o meio escolhido ou usado para a pratica do crime, e, sim, o modo insidioso com que o agente o executa, empregando, para isso, recurso que dificulte ou torne impossível a defesa (RT 733/659).

25.00. A verdade é que, em sede judicial, a prova da autoria está quase que restrita à palavra do acusado, que deu ao fato a versão que mais lhe convinha.

25.01. Jejuno os autos de provas acerca do que efetivamente aconteceu, no momento do crime, o caminho mais correto, na minha avaliação, é manter a qualificadora em comento, para que sobre ela se manifeste o Tribunal do Júri.

26.00. Todos sabemos, mas não é despiciendo redizer, que, nessas questões, eventuais dúvidas devem ser dirimidas em favor da sociedade.

26.01. Assim sendo, não existindo nos autos provas que possibilitem o afastamento da qualificadora sob retina, o caminho, em tributo à parêmia in dúbio pro societate, é a sua manutenção, para que sobre ela decida o Tribunal leigo.

27.00. Tudo de essencial posto e analisado, julgo procedente, parcialmente, a acusação, para, consequentemente,

pronunciar Jorge da Conceição Oliveira Silva, vulgo Joca, brasileiro, solteiro, eletricista, filho de Jorginho dos Santos Silva e Raimunda Maria Oliveira Silva, residente na Rua 31, quadra 96, casa 39, São Raimundo, nesta cidade, por incidência comportamental no artigo 121,§2º, IV, do Digesto Penal, o fazendo com esteio no artigo 413 do Codex de Processo Penal, a fim de que seja submetido a julgamento perante o e. Tribunal do Júri Popular.

P.R.I.C.

Preclusa a via impugnativa, remetam-se os autos à distribuição, para os devidos fins, com a baixa em nossos registros.

São Luis, 25 de junho de 2009.

Juiz José Luiz Oliveira de Almeida

Titular da 7ª Vara Criminal


Essa e outras crônicas – além de artigos, sentenças e despacho – podem ser encontradas no site www.joseluizalmeida.com

Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

2 comentários em “Pronúncia. O motivo fútil. Afastamento. Divergências anteriores entre o réu e o acusado.”

  1. Muito bem elaborada a decisão de pronuncia!

  2. “Na dor não existem nacionalidades e posição social. A dor que dói aqui é a mesma que dói na Suécia e no Senegal, no empresário e no trabalhador braçal.
    Pretos, brancos, pobres, ricos, bonitos, feios, altos, baixos, crianças, adultos, todos, enfim, somos rigorosamente iguais na dor e no sofrimento”.

    Belíssimo, Excelência, belíssimo! Isso é o “bom Direito”, isso é a “perfeita Justiça”. Realmente não compreendo o argumento que vincula a valoração do dano moral à condição econômica da vítima, a pretexto de evitar-lhe o “enriquecimento sem causa”. Como não há causa, se há a dor? E o que a dor tem a ver com condição econômica da vítima, se se trata de reparação e reparação moral, não material? “Na dor não nos preocupa o saldo bancário. (…) Se é dor, dói – e pronto!”. Justíssimo, Excelência. Justíssimo. Com minha sincera admiração.

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