Impronúncia

Processo nº 193802005

Ação Penal Pública

Acusado: C.C. A.dos S.

Vítima: Wilkson Costa da Silva

 

 

Vistos, etc.

 

Cuida-se de ação penal que move o Ministério Público contra C. C. A. dos S., brasileiro, solteiro, torneiro mecânico, filho de Rui Santana Sena dos Santos e Ivonete Brito Amorim Azevedo, residente e domiciliado na Rua Canadá, quadra 17-A, casa 10, Anjo da Guarda, por incidência comportamental no artigo 121, §2º, II, do Código Penal, em face de, no dia 16 de outubro de 2005, por volta das 02h30min, no chamado “corredor da folia”, na Av. Litorânea, nesta cidade, durante a festa do Marafolia, desferindo contra Wilkson Costa da Silva vários golpes de faca, causando-lhe a morte, cujos fatos estão narrados, em detalhes, na denúncia, que, por isso, passa a integrar o presente relatório.

A persecução criminal teve início com a prisão em flagrante do acusado. (fls.07/16)

Auto de apresentação e apreensão do instrumento do crime às fls.16.

Recebimento da denúncia às fls.67/68.

O acusado foi qualificado e interrogado às fls. 84/87.

Defesa prévia às fls. 90/92.

Laudo de exame biológico em arma branca às fls. 134

Durante a instrução criminal foram ouvidas as testemunhas José Ubiratan Lopes Melo (fls.129/130), Marco Aurélio Galvão Rodrigues (fls.131/132), Abraão Jorge Garcia Machado (fls. 131) e Gleydson Amorim Vieira(fls.206/207)

O Ministério Público, em sede de alegações finais, pediu a pronúncia do acusado, nos termos da denúncia. (fls.211/215)

A defesa, de seu lado, pediu que seja o acusado absolvido sumariamente, porque teria agido ao abrigo da legítima defesa ou, na hipótese de pronúncia, que seja afastada a qualificadora e lhe seja concedido o direito de apelar em liberdade.(fls.217/225)

A defesa, noutra oportunidade, pediu a impronúncia do acusado, por faltar o indispensável exame cadavérico, prova material do crime. (fls.236v.)

 

Relatados. Decido.

 

01. Os autos sub examine albergam a pretensão do Ministério Público (res in judicio deducta ), no sentido de que seja pronunciado o acusado C. C. A. dos S. o qual teria assassinado Wilkson Costa da Silva, fato que teria ocorrido no dia 16 de outubro de 2005.

02. A persecução criminal se desenvolveu em dois momentos distintos, ou seja, em sedes administrativa e judicial, tal como preconizado no direito positivo brasileiro.

03. Na primeira fase da persecutio  o acusado, então indiciado, admitiu ter desferido golpes de faca no ofendido, como se vê dos fragmentos a seguir transcritos, litteris:

“…que hoje (16/10/2005), por volta de uma hora da madrugada, estava na Av. Litorânea, participando do Marafolia, quando olhou um rapaz que conhece apenas de vista, brigando com outras pessoas; que com a faca na mão, o tal rapaz disse ao conduzido “eu vou te matar miserável” e depois saiu; que minutos depois o tal rapaz voltou e quis surpreender o autor, tentando golpeá-lo com a faca, no entanto, o conduzido foi avisado por seu primo e conseguiu se desviar; que nesse momento a faca tocou uma barraca e caiu no chão, o conduzido pegou a faca do chão sendo atingido com um chute pela vítima, golpeando a vítima com a primeira facada; que a vítima foi para cima do conduzido tentando tomar a faca, quando este desferiu mais outras facadas na vítima, não sabendo precisar quantas…”.(fls. 10)

04. Na sede periférica da persecução, fase pré-processual, foram ouvidas, ademais, as testemunhas Marco Aurélio Galvão Rodrigues (fls.07), Abraão Jorge Garcia Machado (fls.08), Sérgio Henrique dos Reis(fls.09), José Ubiratan Lopes Melo (fls.30/31), Luis Fernando Maia de Melo(fls.60), Gleydson Amorim Vieira (doc.61/62), Sidney César dos Santos Costa (fls.63).

05. Com esses dados, foi deflagrada a persecução penal em seu segundo momento (artigo 5º, LIV, da CF)( nemo judex sine actore; ne procedat judex ex officio) tendo o Ministério Público (artigo 5º, I, da CF) , na proemial, denunciado o acusado C. C.A.dos S. por incidência comportamental no artigo 121, § 2º, II, do CP, pedindo, alfim, a sua pronúncia, para que seja submetido a julgamento perante o Tribunal leigo.

06. Em sede judicial, a sede das franquias constitucionais (artigo 5º, LV, da CF) , o acusado C. C. A. dos S., confessou a autoria do crime, mas demonstrando ter agido em legítima defesa. ( fls.84/87)

07. Além do acusado foram ouvidas as testemunhas José Ubiratan Lopes Melo (fls.129/130), Marco Aurélio Galvão Rodrigues (fls.131/132), Abraão Jorge Garcia Machado (fls.181) e Gleydson Amorim Vieira(fls.206/207).

08. Do depoimento da testemunha José Ubiratan Lopes Melo destaco os fragmentos abaixo, verbatin:

“…que por volta de uma hora da manhã aproximadamente chegou a vítima acompanhada de Kaká, que ficaram um pouco distante e quando o depoente comprava cerveja jogava uma latinha; que informa que também não viu se a vítima estava armada já que trajava uma camisa bem grande folgada e um bermudão; que determinado momento o depoente subiu o morro acompanhado de um colega de nome Marcos para fazer xixi e quando olhou para baixo já viu uma aglomeração e observou Chystian segurando a camisa da vítima; que depois desta confusão o depoente viu Crystian sair para uma direção e a vítima em outra; quando desceu o morro já viu Crystian ser conduzido por policiais militares algemado com as mãos para trás; que logo depois o depoente viu uma pessoa caída e muito pálida e a princípio não reconheceu que se tratava da vítima já que ela não era tão clara como aquela aparentava; que somente pela manhã foi que o depoente tomou conhecimento que a vítima havia falecido….”(fls. 129)

09. Do depoimento de Marco Aurélio Galvão releva destacas os excertos a seguir, verbis tantum:

“que no dia do fato delituoso o depoente estava de serviço na Av. Litorânea onde estava ocorrendo o evento Marafolia, comandando uma patrulha de cinco homens que por volta das duas da amanhã o depoente foi alertado por populares que apontaram Crystian como autor da agressão armada contra uma pessoa; que Crystian não reagiu e disse que responderia pelo ato que havia praticado; que o depoente lhe deu voz de prisão e saiu à procura da vítima e quando chegou no local havia outra patrulha tomado as primeiras providências e aguardando ambulância de resgate…(fls. 131)

10. Do depoimento de Abraão Jorge Garcia Machado impende transcrever os nacos abaixo, verbo ad verbum:

“…que na data do fato descrito na denúncia recebeu um comunicado, via rádio, de que ‘ uma pessoa havia furado uma outra e que estaria detido com o pessoal dos bombeiros’; que o depoente se dirigiu até o local da ocorrência e lá chegou viu o acusado detido; que não a ver a vítima pois a mesma já havia sido socorrida…”( fls. 181)

11. Do depoimento de Glaydson Amorim Vieira compreendo deva por em relevo os excertos a seguir transcritos, verbum pro verbo:

“…que, determinado momento, o depoente viu quando a vítima apareceu armada com uma faca, partindo para cima do acusado; que o depoente advertiu o acusado, tendo este conseguido desviar-se da faca da vítima, que atingiu o pau de uma barraca; que nessa hora a faca caiu da mão da vítima, da qual se apossou o acusado; que a vítima, ainda assim, partiu para cima do acusado; que a vítima deu um chute no acusado, o qual revidou com uma facada; que em seguida a vítima e o acusado se agarraram, mas o depoente não conseguiu ver mais nada, porque um trio elétrico estava passando e foi tudo muito rápido; que viu a vítima andando, para, depois, cair no chão…”. (fls 206)

12. Com os dados amealhados nas duas sedes – administrativa e judicial – vieram-me os autos conclusos para decidir acerca da admissibilidade, ou não, da acusação imputada ao acusado C. C. A.dos S..

13. Acima, pode-se ver, examinei a prova emoldurada nos autos, nos dois momentos da persecução criminal – momentos administrativo e judicial.

14. Alfim e ao cabo do exame a conclusão a que chego, em face das provas consolidadas nos autos, é que, nada obstante provada a autoria e existência de um crime, não se sabe, verdadeiramente, se o ofendido faleceu e se, de outra parte, a sua morte foi decorrente das lesões que sofrera.

14.01. As dúvidas acerca da morte do ofendido e da causa de sua morte decorrem, fundamentalmente, da falta de prova pericial.

14.02. Diante dessas incertezas, compreendo, pedindo vênia à representante ministerial, que seria um destrambelho sem par pronunciar o acusado.

15. Reafirmo que, diante das provas consolidadas, não sei sequer se o ofendido morreu, efetivamente, vez que a prova testemunhal, nesse sentido, é superficial, quase inconsistente, mesmo porque o falecimento de alguém, em determinadas circunstâncias, só pode ser atestado por um perito.

15.01. E sem cadáver, sem a prova do falecimento, creio que não se pode pronunciar o acusado pela prática de crime de homicídio consumado, que pressupõe, claro, ocorrência do evento morte.

16. Que houve o entrevero entre o acusado e o ofendido, creio que não se pode duvidar. Que o acusado lesionou o ofendido, também não se pode duvidar. Mas não se pode afirmar, com razoável segurança, que as lesões tenham sido causadoras da morte do ofendido. Não se pode afirmar sequer se o ofendido chegou a óbito, à falta do necessário exame cadavérico.

17. Pode-se argumentar, para arrostar esta decisão, que todos sabem da ocorrência do evento morte. Pode ser. Mas, para o deslinde desta quaestio, o que vale mesmo é a prova pericial, tendo em vista a fragilidade da prova testemunhal. Sem ela – e com espeque apenas na prova testemunhal – o que se pode dizer, com certeza, a par do quadro de provas, que houve lesão – ou lesões? – , mesmo porque o acusado não nega tê-la(s) produzido. Mas daí afirmar que a(s) lesão(ões) foi(ram) a causa da morte do ofendido é uma inconseqüência, para dizer o mínimo. E o juiz decide com base em dados emoldurados no processo. Para decidir, o juiz não pode se valer do que comentam na rua, do que se falam nas esquinas. Não vale apenas a íntima convicção do julgador.

18. Como posso, pois, diante da inexistência de prova material que ateste o evento morte, decidir-me pela pronúncia do acusado? Como posso, demais, pronunciar o acusado, se não sei se o evento morte decorreu das lesões por ele produzidas? E se, por hipótese, o ofendido não faleceu?

19. Sei – e não preciso que me lembrem – que a prova testemunhal pode, algumas vezes, suprir a prova pericial. Mas a regra, em se tratando de crimes dolosos contra a vida, é a firmação da materialidade via prova pericial. A prova testemunhal só se admite excepcionalmente. A formação da materialidade através de outras provas, em especial a testemunhal (artigo 167 do CPP), é uma temeridade. É um risco que o magistrado que tenha responsabilidade não deve correr. Não basta, nesse sentido, o convencimento íntimo do julgador, como parece sugerir a redação inicial do artigo 408 do Digesto de Processo Penal.

20. Nessa linha de pensar devo argumentar que sei – e não preciso que me lembrem – que o art. 158 do CPP exige exame de corpo de delito direto ou indireto quando a infração deixar vestígio e que esse rigor é contemperado pelo art. 167 do mesmo diploma legal, ao estabelecer que, quando não for possível o exame de corpo de delito, por haverem desaparecido os vestígios, a prova testemunhal poderá suprir a falta. 

21. Ocorre que, desde meu olhar, a prova testemunhal in casu sub examine não supre a prova pericial, pelas razões que já expus acima, à exaustão.

22. Compreendo que o Ministério Público, a quem se defere a atribuição específica e relevante de propor a ação penal pública, não poderia, ante tamanha omissão da autoridade policial, quedar-se inerte e seguir-lhe os mesmos passos. Deveria, ao reverso, sair à busca da prova material, para que não se tivesse que impronunciar o acusado, provavelmente dando uma demonstração da nossa omissão e produzindo mais uma injustiça.

23. Mas a falta do laudo pericial não produz injustiça apenas contra a vítima. Essa omissão dos órgãos persecutórios pode estender a injustiça ao próprio acusado.

24. Explico. O acusado alega ter agido em legítima defesa. Aqui e acolá há dados que poderiam, em tese, levar o julgador a essa conclusão. Contudo há dados, no mesmo passo, que fazem assomar dúvidas acerca da excludente em comento.

24.01. Para que se pudesse dirimir essa dúvida, mister seria que do acervo probatório constasse a prova material, para que se pudesse, inclusive, aferir a quantidade e a sede da lesão – ou lesões – infligida(s) ao ofendido. Sem a prova material não posso sequer decidir acerca da excludente de ilicitude em comento, prejudicando, assim, a tese da defesa.

25. Diante da superficialidade das provas testemunhais, diante das dúvidas propiciadas pela falta de exame cadavérico, poder-se-ia, sim, invocando o apotegma de todos conhecido – in dúbio pro societate – , pronunciar o acusado, em face do crime pelo qual foi denunciado.

26. Ocorre que não há provas de que o ofendido tenha morrido efetivamente. Não há provas de quantas lesões sofreu. Assim sendo, diante desse quadro de verdadeira insegurança acerca do fato, compreendo que a invocação do aforisma em comento seria uma precipitação. Compreendo que, assim agindo, o magistrado estaria arrostando, sem segurança e calçado em dados quase ficcionais, a tese da defesa.

26. É cediço que decisões de admissibilidade da acusação devem ser prolatadas sem exame aprofundado das provas. Compreendo, nada obstante, que a tese da defesa não pode ser pura e simplesmente rechaçada, sem a mais mínima avaliação; avaliação que, entrementes, não posso fazer, a míngua de prova material acerca da existência do crime e das causas que levaram o ofendido a óbito – se efetivamente faleceu.

27. Impende anotar que há, sim, testemunha que deixa entrever que o acusado apenas reagiu a uma agressão que se fazia iminente.

27.01. Como posso, todavia, concluir se o acusado agiu ou não sob o pálio da legítima defesa, se não há provas acerca das lesões sofridas e acerca da causa mortis?

28. Diante desse quadro, pronunciar o acusado por crime de homicídio seria, desde meu olhar, um despautério, porque, efetivamente, não há, sequer, cadáver.

29. As testemunhas ouvidas em sede judicial dão conta, sim, de que o acusado lesionou o ofendido. Há, até, informações de que se ouviu falar na morte do ofendido. Contudo, os autos não dão notícias, extreme de dúvidas, de que o ofendido tenha falecido, efetivamente.

30. Diante da inexistência de prova material da ocorrência do evento morte e sendo a prova testemunhal rarefeita, o magistrado fica entre a cruz e a espada, sem saber o que fazer, efetivamente. Ou melhor, a única certeza absoluta que tenho é que não devo pronunciar o acusado, sob pena de passar vexame mais adiante.

31. O ofendido faleceu? Diante das provas constantes dos autos respondo que é provável que tenha falecido. Mas, noutro giro, é provável que também não tenha falecido. O ofendido morreu em face das lesões produzidas pelo acusado? Pode ser que sim e pode ser que não. Não sei, sinceramente. Só o exame cadavérico poderia trazer essas informações.

32. De tudo que expus acima quero dizer, tão-somente, que as provas dos autos não me convencem que deva pronunciar o acusado por crime de homicídio consumado.

33. Imaginemos que o signatário, diante do pedido do Ministério Público, entenda deva pronunciar o acusado por crime de homicídio consumado, sem que haja provas efetivas de que tenha ocorrido o evento morte.

33.01. Imaginemos, agora, que o ofendido, no dia do julgamento do acusado, resolva “ressucitar” e aparecer perante o Tribunal vivo, lépido e fagueiro. Como fica, a par desse quadro – que não é improvável, em face das provas consolidadas nos autos – a situação do magistrado que o pronunciou com esteio em provas testemunhas inconsistentes?

34. Não acho, sinceramente, que essa possibilidade seja tão remota, vez que, repito, não há provas de que o ofendido tenha falecido, embora seja muito provável que sim. Mas, nessa hipótese, não se pode trabalhar com essa possibilidade. Em casos que tais tem-se que trabalhar com a certeza do evento. E essa certeza não há nos autos.

35. Imaginemos outra situação, também teratológica. O magistrado pronuncia o acusado, em face de homicídio consumado. Depois de algum tempo, surge, finalmente, um laudo pericial dando conta de que o ofendido não faleceu em face das lesões sofridas. E aí, como fica o magistrado que, precipitadamente, tenha pronunciado o acusado ?

36. O Ministério Público, em alegações finais, concluiu, após o exame das provas, que “os depoimentos do acusado e das testemunhas evidenciam, com clareza cristalina, que a vítima veio a óbito em conseqüências das lesões sofridas”.

37. Compreendo, pedindo todas as vênias, que nenhuma testemunha afirmou, com convicção, que a morte do ofendido se deu em razão das lesões sofridas. Essa constatação, a meu sentir, pelo menos no caso presente, só pode ser feita por jusperitos.

38. De tudo o que restou exposto posso afirmar que não estou convencido da existência de crime de homicídio, razão pela qual compreendo que a impronúncia do acusado é o melhor caminho.

39. Impende grafar, apenas a título de lembrança, que a sentença de impronúncia encerra apenas um juízo de inadmissibilidade da remessa do processo ao Tribunal do Júri para julgamento, não havendo decisão definitiva em favor do acusado, conforme preceitua o artigo 409 do CPP.

40. O Ministério Público, se quiser e se esse for o seu interesse, poderá, sim, diante de prova inconteste da existência do crime e da autoria, oferecer nova denúncia contra o acusado, desde que, claro, não esteja extinta a sua punibilidade.

41. Tudo posto, julgo inadmissível a acusação, para, de conseqüência, Impronunciar o acusado C. C.A.dos S., o fazendo com espeque no artigo 409 do Digesto de Processo Penal.

P.R.I.

Com o trânsito em julgado, arquivem-se os autos, com a baixa em nossos registros.

 

São Luis, 05 de março de 2008.

 

Juiz José Luiz Oliveira de Almeida

Titular da 7ª Vara Criminal

 

Excerto capturado no blog AD SCRIBENDUM ( http://www.assimdecido.blogspot.com) , da responsabilidade do magistrado JOSÉ LUIZ OLIVEIRA DE ALMEIDA, Juiz da 7ª Vara Criminal, de um ABAIXO-ASSINADO dos Juízes Criminais encaminhado à Corregedoria-geral de Justiça.

 Do escólio de Antonio Escarance Fernandes colho o seguinte excerto, verbis:

O predomínio do sistema acusatório e a repulsa à iniciativa do ofendido, sob a alegação, não fundada, contudo, de que ele se move por sentimento de vingança, levou a que o Estado, de regra através do Ministério Público, coubesse a legitimidade para acusar. No Brasil, a Constituição Federal, em seu artigo 129, I, estabeleceu a exclusividade do Ministério Público para promover a ação penal pública, acabando de vez com a ação penal de ofício e não mais permitindo que outros agentes da Administração Pública pudessem oferecer a acusação. (Processo Penal Constitucional, 4ª edição, Saraiva, 2005, p.188)

 Nas sociedades civilizadas somente o Estado é que pode dirimir os conflitos de interesse, por meio do processo, daí a regra do artigo 345, do CP, verbis:

Fazer justiça pelas próprias mãos, para satisfazer pretensão, embora legítima, salvo quando a lei o permite:

Pena – detenção, de quinze dias a um mês, ou multa, além da pena correspondente à violência.

 No sistema acusatório brasileiro “persecutio criminis apresenta dois momentos distintos: o da investigação e o da ação penal. Esta consiste no pedido de julgamento da pretensão punitiva, enquanto que a primeira é a atividade preparatória da ação penal, de caráter preliminar e informativo” (Fernando da Costa Tourinho Filho, Manual de Processo Penal, editora Saraiva, 2001, p.7)

 “Se, como vimos, a persecução penal é dever do Estado, (…) uma vez praticada a infração, cumpre também a ele, em princípio, a apuração e o esclarecimento dos fatos e de todas as suas circunstâncias” (Eugênio Pacelli de Oliveira, Curso de Processo Penal, 4ª Edição, Editora Del Rey, 2005, p. 26)

 Art. 5º omissis.

LIV – ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;

 Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:

I – promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei;

 Artigo 5º. omissis.

LV – aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;

 Art. 408. Se o juiz se convencer da existência do crime e de indícios de que o réu seja o seu autor, pronunciá-lo-á, dando os motivos do seu convencimento. (Redação dada pela Lei nº 5.941, de 22.11.1973)

§ 1o Na sentença de pronúncia o juiz declarará o dispositivo legal em cuja sanção julgar incurso o réu, recomendá-lo-á na prisão em que se achar, ou expedirá as ordens necessárias para sua captura. (Redação dada pela Lei nº 9.033, de 2.5.1995)

 RTJ 81/110 in MIRABETE, Julio Fabbrini. Código de Processo Penal Interpretado. 10ª ed. São Paulo: Atlas, 2003. pág. 493

Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

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