Reflexões, em sede de habeas corpus, sobre a notificação a que alude o artigo 514 do CPP.

Nas informações que publico a seguir fiz algumas reflexões sobre a  notificação a que alude o artigo 514 do Código de Processo Penal.

Antecipo alguns excertos:

 

  1. E por que a notificação se faz necessária? Para que evitar queixas infundadas contra servidores públicos.
  2. Todos sabem que, nas entidades públicas, pode ocorrer – e como ocorrem! – a instauração de procedimentos administrativos apenas por vendeta do superior.
  3. Com a notificação o que se pretende, pois, é possibilitar ao funcionário esgrimir as sua alegações, antes mesmo do recebimento da denúncia,
  4. daí por que, nessa hipótese, a a notificação é imprescindível.
  5. No caso sub examine, nada disso ocorreu. A denúncia ministerial foi feita com espeque em dados amealhados pela Polícia Judiciária, daí porque, nessa hipótese, é prescindível a notificação.

 

A seguir, as informações.

 

Excelentíssimo Senhor

Desembargador José Joaquim Figueiredo dos Anjos

Relator do hc nº 9198/2008 – São Luis(MA)

Paciente: Paulo Roberto Almeida Paiva

Impetrante: Frederico Américo de Oliveira

 

01. Colho o presente para prestar a Vossa Excelência as informações requisitadas, em face do habeas corpus epigrafado.

02. Do writ concluo que a sua ratio essendi está centrada em duas vertentes:

I – falta de notificação do acusado, nos termos do artigo 514 do Digesto de Processo Penal; e

II – incompetência do juízo para processar e julgar o paciente, uma vez que se lhe é imputado crime militar, da competência, portanto, da justiça castrense.

03. A par dessas duas vertentes, vou prestar as informações requisitadas.

04. Primeiro, a falta de notificação.

05. O impetrante, nessa senda, incorre em grave equívoco. De efeito. Nos crimes funcionais, é bem de ver-se-, só é imprescindível a notificação quando a denúncia vem acompanhada apenas de documentos ou justificação.

 E por que a notificação se faz necessária? Para que evitar queixas infundadas contra servidores públicos.

06. Todos sabem que, nas entidades públicas, pode ocorrer – e como ocorrem! – a instauração de procedimentos administrativos apenas por vendeta do superior.

06.01. Com a notificação o que se pretende, pois, é possibilitar ao funcionário esgrimir as sua alegações, antes mesmo do recebimento da denúncia,

 daí por que, nessa hipótese, a a notificação é imprescindível.

07. No caso sub examine, nada disso ocorreu. A denúncia ministerial foi feita com espeque em dados amealhados pela Polícia Judiciária, daí porque, nessa hipótese, é prescindível a notificação.

08. Os Tribunais, à frente do e. Supremo Tribunal Federal, enfrentando questões de igual matiz, já decidiram, interativamente, na mesma alheta, como se colhe da menta a seguir transcrita, verbis:“ A notificação do denunciado, para resposta escrita, prevista no artigo 514 do Código de Processo Penal, só é necessária quando a denúncia vem acompanhada apenas de documentos ou justificação. Não assim, quando precedida de inquérito policial, que a instrui.”

06. O Superior Tribunal de Justiça tem decidido, também reiteradamente, na mesma direção, como dimana da ementa a seguir transcrita, litteris: “ A ação instaurada contra funcionário público pela prática de crime funcional prescinde da notificação prévia prevista no artigo 514 do CPP quando a exordial acusatória tem apoio em inquérito policial em que se aferiram a ocorrência do ilícito penal e os indícios de autoria, hábeis à oferta da peça inaugural da ação. ”

07. De boa cepa que se anote, em face ainda do alegado no mandamus, que o rito processual previsto no artigo 513 e seguintes do CPP, só aplicável nos crimes funcionais típicos, previstos nos artigos 312 a 326, do Código Penal.

09. Nesse sentido a lição de Eugênio Pacelli de Oliveira, como se vê abaixo, verbis: “É importante assinalar, ainda, que o citado procedimento somente será cabível para os crimes assim definidos no Código Penal, sob a rubrica Dos crimes praticados por funcionários públicos contra a Administração em geral. 

10. Adiante, o ilustrado professor concluiu, litteris: “Para os demais, mesmo quando praticados por servidor público, ou quando, ou quando praticados por particulares contra a Administração Pública, o rito será o comum, prevista para cada crime.”

11. No mesmo diapasão a ensinança de Júlio Fabbrini Mirabete, verbis: “Ao mencionar os ‘crimes de responsabilidade dos funcionários públicos’, a lei processual está se referindo aos delitos próprios e impróprios previstos sob o título de ‘Crimes praticados por funcionários públicos contra a Administração em Geral’ (arts. 312 a 326 do CP). 

11.01. Adiante, aduziu:

“São os crimes em que a condição de funcionário público é inerente à prática do delito(delito próprio, portanto), não abrangendo, pois, outros ilícitos comuns, que podem ser cometidos por qualquer pessoa, ainda que a qualidade de funcionário público intervenha como circunstância qualificadora.”

08. Examinada a vertente que cuida da falta de notificação, devo, a seguir, expender considerações acerca da alegada falta de competência deste juízo, em razão da matéria.

09. Nesse sentido, cumpre-me informar a Vossa Excelência que essa questão já foi objeto de exame via mandamus, na 3ª Câmara Criminal (HC 689/2008) como, aliás, informa o próprio impetrante.

10. Esperando ter prestado as informações a mim requisitadas, colho o ensejo para externar minha especial admiração por Vossa Excelência, ao tempo em que me coloca a vossa disposição para qualquer informação adicional.

Atenciosamente,

 

Juiz José Luiz Oliveira de Almeida

Titular da 7ª Vara Criminal

 

 

Notas e referências bibliográfias

 Art. 513. Os crimes de responsabilidade dos funcionários públicos, cujo processo e julgamento competirão aos juízes de direito, a queixa ou a denúncia será instruída com documentos ou justificação que façam presumir a existência do delito ou com declaração fundamentada da impossibilidade de apresentação de qualquer dessas provas.

 Art. 516. O juiz rejeitará a queixa ou denúncia, em despacho fundamentado, se convencido, pela resposta do acusado ou do seu defensor, da inexistência do crime ou da improcedência da ação.

 STF : HC 75.600, Informativo do STF, de 11-12-1998, nº 95

 RT 577/390, JCAT 74/519

 Peculato

Art. 312 – Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio:

Pena – reclusão, de dois a doze anos, e multa.

§ 1º – Aplica-se a mesma pena, se o funcionário público, embora não tendo a posse do dinheiro, valor ou bem, o subtrai, ou concorre para que seja subtraído, em proveito próprio ou alheio, valendo-se de facilidade que lhe proporciona a qualidade de funcionário.

Peculato culposo

§ 2º – Se o funcionário concorre culposamente para o crime de outrem:

Pena – detenção, de três meses a um ano.

§ 3º – No caso do parágrafo anterior, a reparação do dano, se precede à sentença irrecorrível, extingue a punibilidade; se lhe é posterior, reduz de metade a pena imposta.

Peculato mediante erro de outrem

Art. 313 – Apropriar-se de dinheiro ou qualquer utilidade que, no exercício do cargo, recebeu por erro de outrem:

Pena – reclusão, de um a quatro anos, e multa.

Inserção de dados falsos em sistema de informações (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)

Art. 313-A. Inserir ou facilitar, o funcionário autorizado, a inserção de dados falsos, alterar ou excluir indevidamente dados corretos nos sistemas informatizados ou bancos de dados da Administração Pública com o fim de obter vantagem indevida para si ou para outrem ou para causar dano: (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000))

Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa. (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)

Modificação ou alteração não autorizada de sistema de informações (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)

Art. 313-B. Modificar ou alterar, o funcionário, sistema de informações ou programa de informática sem autorização ou solicitação de autoridade competente: (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)

Pena – detenção, de 3 (três) meses a 2 (dois) anos, e multa. (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)

Parágrafo único. As penas são aumentadas de um terço até a metade se da modificação ou alteração resulta dano para a Administração Pública ou para o administrado.(Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)

Extravio, sonegação ou inutilização de livro ou documento

Art. 314 – Extraviar livro oficial ou qualquer documento, de que tem a guarda em razão do cargo; sonegá-lo ou inutilizá-lo, total ou parcialmente:

Pena – reclusão, de um a quatro anos, se o fato não constitui crime mais grave.

Emprego irregular de verbas ou rendas públicas

Art. 315 – Dar às verbas ou rendas públicas aplicação diversa da estabelecida em lei:

Pena – detenção, de um a três meses, ou multa.

Concussão

Art. 316 – Exigir, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida:

Pena – reclusão, de dois a oito anos, e multa.

Excesso de exação

§ 1º – Se o funcionário exige tributo ou contribuição social que sabe ou deveria saber indevido, ou, quando devido, emprega na cobrança meio vexatório ou gravoso, que a lei não autoriza: (Redação dada pela Lei nº 8.137, de 27.12.1990)

Pena – reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 8.137, de 27.12.1990)

§ 2º – Se o funcionário desvia, em proveito próprio ou de outrem, o que recebeu indevidamente para recolher aos cofres públicos:

Pena – reclusão, de dois a doze anos, e multa.

Corrupção passiva

Art. 317 – Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem:

Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 10.763, de 12.11.2003)

§ 1º – A pena é aumentada de um terço, se, em conseqüência da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou deixa de praticar qualquer ato de ofício ou o pratica infringindo dever funcional.

§ 2º – Se o funcionário pratica, deixa de praticar ou retarda ato de ofício, com infração de dever funcional, cedendo a pedido ou influência de outrem:

Pena – detenção, de três meses a um ano, ou multa.

Facilitação de contrabando ou descaminho

Art. 318 – Facilitar, com infração de dever funcional, a prática de contrabando ou descaminho (art. 334):

Pena – reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 8.137, de 27.12.1990)

Prevaricação

Art. 319 – Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal:

Pena – detenção, de três meses a um ano, e multa.

Condescendência criminosa

Art. 320 – Deixar o funcionário, por indulgência, de responsabilizar subordinado que cometeu infração no exercício do cargo ou, quando lhe falte competência, não levar o fato ao conhecimento da autoridade competente:

Pena – detenção, de quinze dias a um mês, ou multa.

Advocacia administrativa

Art. 321 – Patrocinar, direta ou indiretamente, interesse privado perante a administração pública, valendo-se da qualidade de funcionário:

Pena – detenção, de um a três meses, ou multa.

Parágrafo único – Se o interesse é ilegítimo:

Pena – detenção, de três meses a um ano, além da multa.

Violência arbitrária

Art. 322 – Praticar violência, no exercício de função ou a pretexto de exercê-la:

Pena – detenção, de seis meses a três anos, além da pena correspondente à violência.

Abandono de função

Art. 323 – Abandonar cargo público, fora dos casos permitidos em lei:

Pena – detenção, de quinze dias a um mês, ou multa.

§ 1º – Se do fato resulta prejuízo público:

Pena – detenção, de três meses a um ano, e multa.

§ 2º – Se o fato ocorre em lugar compreendido na faixa de fronteira:

Pena – detenção, de um a três anos, e multa.

Exercício funcional ilegalmente antecipado ou prolongado

Art. 324 – Entrar no exercício de função pública antes de satisfeitas as exigências legais, ou continuar a exercê-la, sem autorização, depois de saber oficialmente que foi exonerado, removido, substituído ou suspenso:

Pena – detenção, de quinze dias a um mês, ou multa.

Violação de sigilo funcional

Art. 325 – Revelar fato de que tem ciência em razão do cargo e que deva permanecer em segredo, ou facilitar-lhe a revelação:

Pena – detenção, de seis meses a dois anos, ou multa, se o fato não constitui crime mais grave.

§ 1o Nas mesmas penas deste artigo incorre quem: (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)

I – permite ou facilita, mediante atribuição, fornecimento e empréstimo de senha ou qualquer outra forma, o acesso de pessoas não autorizadas a sistemas de informações ou banco de dados da Administração Pública; (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)

II – se utiliza, indevidamente, do acesso restrito. (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)

§ 2o Se da ação ou omissão resulta dano à Administração Pública ou a outrem: (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)

Pena – reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa. (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)

Violação do sigilo de proposta de concorrência

Art. 326 – Devassar o sigilo de proposta de concorrência pública, ou proporcionar a terceiro o ensejo de devassá-lo:

Pena – Detenção, de três meses a um ano, e multa.

Funcionário público

 Eugênio Pacelli de Oliveira, Curso de Direito de Processo Penal, 4ª Edição,Del Rey, 2005, fls.579

 ibidem

 Júlio Fabbrini Mirabete, Processo Penal, 17ª edição, 2005, editora Atlas, p.604,

 ibidem

Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

Um comentário em “Reflexões, em sede de habeas corpus, sobre a notificação a que alude o artigo 514 do CPP.”

  1. Olá,

    Estou entrando em contato novamente para me colocar à disposição ao esclarecimento de dúvidas referente ao e-mail que enviei no dia 30/04/08, tratando da Parceria Comercial entre o Site Ad Scribendum com a HOTWords.

    Qualquer dúvida ou maiores informações, por favor, entre em contato comigo.

    Abraços,
    Stephanie Sarmiento
    ——————————
    smarques@hotwords.com.br
    http://www.hotwords.com.br
    ——————————
    Phone: 11 3178 2514

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.