Os tolos no poder

A crônica que (re) publico a seguir, foi veiculada na edição do dia 1ºde novembro, do Jornal Pequeno.
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Sébastian Roch Nicolas Chamfort, que viveu no século XIX, foi um dos mais brilhantes satíricos de sua época. Suas máximas, publicadas depois da sua morte, revelaram-no um mestre do aforisma e um crítico voraz e impiedoso.

Nicolas Chamfort tinha intensa aversão aos tolos, sobre os quais definia, depois de indagar:

– O que é um tolo?

Para, impiedosamente, responder:

– Alguém que confunde seu cargo com sua pessoa, seu status com seu talento e sua posição com uma virtude.

Depois, diagnosticava, com a mesma acidez:

– Um tolo, ansiando com orgulho por alguma condecoração, parece-me inferior a esse homem ridículo que, para se estimular, fazia com que suas amantes pusessem penas de pavão em seu traseiro.

Basta olhar em volta para ver que, nos lugares por onde andamos, nos ambientes que frequentamos, nas rodas de bate-papo, nas confraternizações, em qualquer ambiente, enfim, estamos, quase sempre, próximos de muito tolos, travestidos de autoridade.

Quem convive com as autoridades submergidas em tolices, sabe do que estou falando.

É mais comum do que se imagina, encontrar um ser humano fantasiado de autoridade, mostrando-se, no mesmo passo, aos olhos dos circunstantes, como apenas mais um bobalhão.

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Não é incomum encontrar, encarapitados no poder, tolos que sublimam as virtudes que não têm, para chamar a atenção para suas idiossincrasias, para as suas abomináveis, execráveis fanfarronices.

O mais grave nessa questão é que, por serem tolos, não são capazes de perceber o que todos percebem, ou seja, que não passam de uns babacas, que pensam que têm o talento que não têm.

Conforme tenho constatado, os tolos esquecem que só o cargo, que o poder apenas, a vaidade e a prepotência, jejunas de sensatez e inteligência, não fazem milagres.

É comum, mais do que comum – e não se há de negar, não se há de obscurecer – conviver com autoridades que pensam que são o próprio cargo; por isso, são mesmo uns tolos, uns bobocas embriagados e desnorteados em face do naco do poder que têm sob controle.

É por isso que, quando os tolos assumem um posto de relevo, adicionam ao seu nome a autoridade que nele se revela. O magistrado Estulto Estúpido da Silva, por exemplo, se é ungido à 2ª ou 3ª instâncias, incorpora ao seu nome o título que decorre do cargo, passando, doravante, a ser nominado desembargador ou ministro Estulto Estúpido da Silva. E não ouse chamá-lo apenas de Estúpido ou Estulto, pois ele costuma encarar essa atitude como uma ofensa, uma afronta, um desrespeito. Ele exige do inferior hierárquico, ou de qualquer outra pessoa que supõe ser inferior, subserviência incondicional.

A verdade, a mais cristalina verdade é que, como bem definiu Sébastian Chamfort, depois da ascensão, o tolo pensa que, por milagre, tornou-se um virtuoso, um homem talentoso e cheio de bons predicados.

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É ou não é assim? Ou estou enganado?

Você, caro leitor, conhece, ou não, tolos fantasiados de autoridade? Conhece, ou não, um mentecapto imaginando-se talentoso em face do cargo que exerce?

Você, amigo leitor, já se deparou, ou não, com um paspalhão que, tendo ascendido – sob quaisquer condições, pisando no pescoço dos adversários, jogando o jogo rasteiro da gentalha -, imagina-se o mais capacitado, o mais competente dos homens, apenas em razão da posição que ostenta, circunstancialmente?

Pare, pense e responda às indagações supra. Creio que não encontrará nenhuma dificuldade, pois, muito próximo de você, há algum desses “virtuosos”, ostentando um baita rabo de pavão.

*Juiz Titular da 7ª Vara Criminal

e-mails: jose.luiz.almeida@globo.com ou jose.luiz.almeida@folha.com.br

Blog – www.joseluizalmeida.com

Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

Um comentário em “Os tolos no poder”

  1. A tolice começa quando a vaidade absorve a humildade.

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