Lorotas de um bufão

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Reconheço que sou quase o caso perdido de obsessão pelo trabalho.

Mas já nem gosto de tratar desse assunto, pois pode transparecer pura arrogância.

As pessoas, muitas vezes, não compreendem que trabalhar é apenas uma obrigação e que quando faço esse tipo de registro objetivo apenas prestar contas das minhas ações, enquanto servidor público.

Estou de licença, todos já sabem. Todavia, ainda assim, estou ligado, preocupado com o trabalho. Esse é, talvez, o mais graves dos defeitos que tenho. Eu só me afasto do trabalho materialmente.

Mas que fique consignado, com a devida ênfase: não me regozijo e nem sou feliz por ser assim. Ao reverso, me penitencio, me autoflagelo, algumas vezes.

Eu bem que podia ser diferente, depois de tantas “porradas” que já levei.

Mas não tem jeito! Não arredo o pé!

Quando estou de férias – ou de licença, como estou agora – fico sempre com a sensação de que falta alguma coisa, que não deveria ter me afastado, que me descurei de minhas obrigações.

Hoje, pela manhã, ainda há pouco, como prova da minha obsessão, da minha inquietação, liguei para o meu gabinete e me fiz ciente da situação dos processos da Meta II que ainda aguardam providências.

Conversei com a analista e a secretária e me cientifiquei de tudo. Mas ainda não estou em paz. Eu quero saber mais, muito mais.

É por isso que, apesar de cientificado de tudo, ainda assim entendi devesse verificar, pessoalmente, a quantas andam os processos ainda pendentes de solução.

Amanhã, pela manhã, muito cedo, para dar vazão a esse sentimento de culpa que quase me atormenta, estarei no fórum, tomando pé da situação, em face da famigerada Meta II.

Eu não tenho dúvidas: apesar de estar afastado, minha mente só sossegará quando eu constatar que foram julgados todos os processos da Meta II. Eu sou assim. Infelizmente!

É compromisso assumido: à medida que forem chegando as alegações finais, vou trazer os processos – da Meta II – para casa, para julgá-los, cujas decisões, por óbvias razões, só serão publicadas no dia 17 de dezembro, data do encerramento da minha licença.

O prazo para que se cumpra a Meta II, todos sabem, é 31 de dezembro. Até lá, tenho certeza, todos os processos serão julgados, ainda que, em face disso, tenha que sacrificar os meus dias de licença.

Devo sublinhar que não estou em busca de reconhecimento. Assim o faço por dever de ofício. É a minha consciência que me impõe, que me conduz, que me leva a ser assim.

Claro que para os que não me conhecem, tudo isso pode parecer bravata. Os que me conhecem, no entanto, sabem que sou assim mesmo.

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Indagar-se-á, todavia:

Mas há necessidade de fazer o registro?

De rigor, respondo que não. Claro que não precisava fazer o registro.

E por que o faço, então?

É que nós, magistrados, somos tão mal-amados, somos tão malvistos, mal-afamados, malconceituados, que, muitas vezes, sinto necessidade de demonstrar que não somos – a grande maioria, pelo menos – todos iguais.

Claro que tudo isso pode parecer bobagem. E é mesmo uma bobagem.

Mas quem disso que não sou um bobo?

É possível ler o que acabo de escrever sem ter a sensação, pelo menos, de estar ouvindo lorotas de um bufão?

Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

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