Removendo os obstáculos – Carlos Lacerda, Policarpo Quaresma, “Coronel” João Duque e a Politica no Maranhão

Numa campanha eleitoral fazem de tudo. Atacam pela frente, atacam pelas costas, compram votos, mentem, iludem, fazem promessas delirantes, traem a confiança dos eleitores, montam esquemas inimagináveis para amealhar votos.

Juiz José Luiz Oliveira de Almeida

Titular da 7ª Vara Criminal

Cuida-se de crônica na qual reflito sobre eleiões.

Antecipo o seguinte excerto.


  1. Pelo menos aqui no Maranhão é assim. Comprade fica mal com comprade, filho desonra pai, irmão desonra irmão, cunhado(a) ataca cunhada(a), sócio rompe com sócio, adversários se unem, correligionários rompem, agridem Juiz, agridem Promotor, atacam delegados de Polícia, derrubam Secretário de Estado, contratam advogados para processar adversários, não pagam os advogados contratados, se casam, descasam, fazem panfletos, fundam jornais, atacam o Poder Judiciário quando perdem uma demanda, para, no mesmo passo, o elogiar se o sucumbente foi o adversário. O bom juiz de ontem é o canalha, o desonesto e corrupto de hoje, bastando que decida contrariando os seus interesses. Ninguém presta e todo mundo presta. Ninguém tem honra e todo mundo a tem. Tudo depende das circunstâncias e dos interesses em jogo.
  2. Pobre Maranhão!

 

A seguir, a crônica por inteiro

Estamos num ano eleitoral. Estamos em 2006. Março de 2006. As próximas eleiçóes – proporcional e majoritária – ocorreráo no dia 03 de outubro. Daqui a seis meses, portanto.  

Apesar disso, apesar da distância que nos separa do dia do pleito, desde o início do ano a campanha eleitoral já começou. Há muito tempo! Não importa se a lei a proibi agora. O próprio presidente da República já disse, sem reservas, que já está em capanha há muito.

Aqui no Brasil é sempre assim. Muito antes do período definido em lei, os candidatos começam a se atacar – e atacam, também, quem aparece em seu caminho como um obstáculo. Aqui no Brasil – e no Maranhão especialmente – não se espera a data de inicio da propaganda eleitoral. É preciso, sem demora, agora, já, tirar o adversário do caminho – se preciso, denegrindo a sua imagem, fazendo-o aparecer diante da opinião pública como um malfeitor, ainda que, no passado, o tenha apresentado como um homem de bem, empreendedor e honesto.

Nessa luta sem trégua, é preciso, sob quaisquer condições, tirar o inimigo – inimigo, sim, aqui não se tem adversários – do caminho, como se fosse um excremento que se arranca por baixo com uma pá de lixo.

Por essas plagas eles sintetizam a luta renhida contra o adversário – ou quem se meta em seu caminho – utilizando-se de máximas populares que, para eles são verdadeiros axiomas: É chegada a hora, dizem, de “vaca não conhecer bezerro”, da “onça beber água”, de quem “for podre que se quebre” , de que “quem pode mais chorar menos”.

E por aí vão, tirando do caminho os obstáculos, agredindo, atacando, achincalhando, menosprezando, desrespeitando – ainda que seja a própria família do adversário, a instituição mais sagrada das muitas que temos. Ou a sua própria família, se conveniente for. Na luta pelo poder, na visão deles, só não pode perder.

Pelo menos aqui no Maranhão é assim. Comprade fica mal com comprade, filho desonra pai, irmão desonra irmão, cunhado(a) ataca cunhada(a), sócio rompe com sócio, adversários se unem, correligionários rompem, agridem Juiz, agridem Promotor, atacam delegados de Polícia, derrubam Secretário de Estado, contratam advogados para processar adversários, não pagam os advogados contratados, se casam, descasam, fazem panfletos, fundam jornais, atacam o Poder Judiciário quando perdem uma demanda, para, no mesmo passo, o elogiar se o sucumbente foi o adversário. O bom juiz de ontem é o canalha, o desonesto e corrupto de hoje, bastando que decida contrariando os seus interesses. Ninguém presta e todo mundo presta. Ninguém tem honra e todo mundo a tem. Tudo depende das circunstâncias e dos interesses em jogo.

Pobre Maranhão!

Numa campanha eleitoral fazem de tudo. Atacam pela frente, atacam pelas costas, compram votos, mentem, iludem, fazem promessas delirantes, traem a confiança dos eleitores, montam esquemas inimagináveis para amealhar votos.

E fazem tudo isso de forma sórdida, mesquinha, vil, torpe, cavilosa, sagaz, solerte. Nessa hora, pelo poder, vale tudo. Para enganar, vale tudo. Não há limites nesse sentido. Não há honra a ser respeitada. Não se respeita o princípio da autoridade. Vale a manha, a lábia, o logro, a malícia, a esperteza, a cavilação. Só não vale ser correto, probo, austero, escrupuloso. O eleitor não tem o direito de saber a verdade. É necessário mantê-lo iludido. O que importa mesmo é vencer. Se preciso, saqueam os cofres públicos.

Tudo faz parte de um jogo mesquinho, abjeto, sórdido. São assim as campanhas eleitorais por essas bandas. Quando mais se ataca o adversário, quanto mais se o coloca em situação desconfortável, melhor, pouco importando a dor infligida à sua família, a situação desconfortável dos seus filhos no colégio, entre os amigos, no prédio onde mora. Nada mais importa. O que importa mesmo é não entregar o poder ao adversário. Pelo poder vale tudo. Há uma máxima, pelo menos aqui no Maranhão, que dita a conduta, o rumo dos candidatos: “amigo não tem defeito; os adversários, se não têm, colocamos”.

Aqui no Maranhão é assim e assim deve ser em todo Brasil. Os inimigos de outrora podem ser os amigos de hoje. Se tinham efeitos, não os têm mais; os amigos de antanho e inimigos de hoje, se virtudes tinham, não mais as têm.

Poucos, raros, raríssimos foram os Juizes Eleitorais que passaram incólumes durante o período eleitoral. Eu próprio fui vítima, pelo menos duas vezes desses ataques sorrateiros e irresponsáveis. A primeira vez foi em Presidente Dutra. Lá os adversários do prefeito, à época Remi Soares, me acusaram de ter recebido uma fazenda com mais de duzentas cabeças de gado, para fraudar as eleições. Espalharam a noticia para desqualificar o pleito, tanto que, com essa notícia, trouxeram a questão para o TRE – sem sucesso, conduto. O mal se destruiu sozinho. Nunca provaram nada e nem jamais provarão

O segundo ataque, que não cheguei a colher mais detalhes, deu-se aqui em São Luis. Na disputa entre Roseana e Cafeteira, na qual o jogo sujo chegou ao paroxismo. Temendo uma derrota que parecia iminente, os Sarney encontraram no meu trabalho solução para, nos Tribunais, contestaram o pleito.

Assim pensando, assim maquinando, representaram contra mim no Tribunal Regional Eleitoral, porque, imaginavam, com a anulação da minha contagem de votos, tinham esperança de que, na recontagem, reverteriam uma derrota que parecia iminente – e por poucos votos. Pensaram, creio, que se perdessem, mas anulassem os trinta mil votos da 10ª Zona, teriam condições de reverter a derrota no tapetão.

Com esse maquiavélico objetivo, contra mim representaram, preventvamente, para, depois, retirarem a representação, imediatamente após concluírem ter ganhado a eleição por uma pequena margem de votos.

A representação em comento, por isso, sequer foi divulgada na imprensa do grupo. Seria diferente, no entanto, se tivessem sido derrotados. Triste de mim, de minha honra e de minha família, se não tivessem ganhado as eleições. A minha historia de vida, a minha honra pessoal e minha posição na sociedade, hoje, se tivessem perdido a eleição majoritária, seria outra – diametralmente oposta. Eles teriam, seguramente, me atacado, sem piedade, porque é assim que tratam quem se mete em seu caminho.

Um caudilho da Bahia, o “coronel” João Duque , um malfeitor de 67 anos, disse certa feita a Carlos Lacerda, na década nos anos 1937, que, em política, não há assassinato, há remoção de obstáculos”.

Por cá é assim mesmo que se trata quem intercede no caminho dos que lutam, sem trégua, pelo poder. Já tentaram me remover do caminho, com se eu fosse um entulho – ainda que, diferente do “Coronel” João Duque, não pretendessem a minha morte.

A minha história é apenas um dos muitos exemplos que se têm de entulhos a serem removidos do caminho de quem quer o poder a todo custo.

O correto, corretíssimo juiz Milton Bandeira, que teve a infelicidade de presidir eleições em Caxias, também foi inclementemente atacado – sem pena, sem dó e sem limites.

Hoje vejo ser atacado um outro juiz, também de elevada estatura moral, o Dr. Alexandre, de Coroatá. Ele não terá sossego. Vai pagar por crime que não cometeu, só porque teve a infelicidade de estar em Coroatá, onde a briga pelo poder não mede conseqüências. Para um dos grupos, o que não está no poder, o Dr. Alexandre é um entulho que precisa ser removido. Pelo visto, o “Coronel Duarte” fez escola pelas bandas de Coroatá.

Várias, incontáveis, são as histórias nesse sentido. Não tenho como contá-las nesse espaço. Deixo os registros para outra oportunidade, se necessário.

Aqui no Maranhão, o estado mais pobre da Federação, com os piores indicadores sociais, o mote da campanha é desonrar o adversário. E de forma constante e eficaz, até que a mentira se transforme em verdade.

Os meios de comunicação estão, quase todos, alugados para esse fim. O rádio, o jornal, a televisão, cada mídia, a seu tempo e modo, disputa um naco dessa pocilga, dela estando ausente, para confirmar a regra, jornalistas da melhor estirpe, cujos nomes não relaciono para não definir, por exclusão, os que, sob a minha viseira, alugam a sua consciência, fazendo o jogo dos que lutam pelo Poder. Pelo Poder, eu disse! Nada mais que isso! Essa luta renhida, cruenta, ensanqüentada não é pelo e para o bem do Maranhão.

Os adversários por essas plagas, chafurdam na lama – no resto do Brasil não deve ser diferente, chafurdam na lama – uns mais, outros menos, mas a lama é a mesma. Se necessário, levam para a pocilga quem não comunga de suas sandices, de suas sujeiras. Um dia pretenderam me levar para esse chiqueiro. Não conseguiram e não conseguirão. Podem, até, macular a honra de quem não se filia às suas trapaças, mas não compram a consciência de quem não a colocam à venda.

Para se colocarem acima das instituições, os “canditados” temporões achincalham os agentes públicos que não comungam de suas porcarias, que ainda insistem em barrar as suas pantominas.

Enodoando os agentes do Poder Judiciário, por exemplo – como fizeram um dia comigo e Milton Banderia e como fazem, hoje, com Alexandre e Jorge Moreno -, pretendem esses péssimos homens públicos enfraquecer a própria instituição, que no passado já lhes serviu de abrigo.

Enfraquecendo as instituições, os malfetores escancaram as portas para o embuste, o engodo, a impostura, a invencionice, a mentira.

Assim o fazem, porque, infelizmente, ainda há quem lhes sirvam de anteparos, quem lhes abram as portas dos Tribunais , para legitimar as suas farsas, as suas trapaças.

A campanha oficial ainda não começou oficialmente, mas antecipo dizendo, em face do que estou assistindo, na política local e nacional, que teremos uma das campanhas mais vergonhosas de que se tem notícia.

Os ataques de Carlos Lacerda a Getúlio Vargas, perto dos ataques recíprocos que veremos aqui no Maranhão, nada luta pelo Poder Executivo, serão afagos, briga de compadres. Brigas de moleques de rua, disputando uma pipa. Brigas de peladeiros, disputando uma bola nos campos de várzea.

Se o tenente Policarpo Quaresma – o Major Quaresma, do romance de Lima Barreto – , vivesse nos dias de hoje, se assistisse pela televisão, se ouvisse no rádio ou lesse nos jornais os ataques que se fazem, reciprocamente, os nossos homens públicos, se vivesse hoje e constatasse o nível de corrupção a que se chegou, o nível de descrédito das instituições e do que são capazes de fazer os homens públicos pelo Poder, certamente passaria noites insones pensando quanto mal fizeram e fazem à sua terra querida.

Eu de cá indago: até quando o Maranhão resistirá? Até quando a nossa terra querida, mas esquecida, desprezada, despudorada, pelos nossos homens públicos, sofrerá as conseqüências da inação (ou ação?) dos trapaceiros, dos violentadores das consciências?

Eu, como Quaresma, também amo o meu Estado por inteiro e dele tenho dó pela maneira como vem sendo tratado, ao longo de nossa historia, pelos nossos homens públicos.

Estou quase perdendo a esperança!

 

 

Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

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