Liberdade provisória cumulada com relaxamento de flagrante

Cuida-se de pedido de relaxamento de prisão, por excesso de prazo.
Depois de examinar o pleito em profundidade, entendi devesse indeferi-lo.
Em determinado fragmento, anotei, verbis:

  1. Entendo que, diante de casos desse matiz, a solução mais cômoda – porém nefasta – é fazer o acusado retornar ao convívio social. Mas o signatário não é daqueles que lavam as mãos. Prefiro enfrentar eventual habeas corpus que, sem refletir, na lata, sem discutir, colocar o acusado em LIBERDADE. Esse seria, para mim, o caminho mais fácil a ser trilhado. Prefiro, no entanto, o caminho mais íngreme. A responsabilidade do meu cargo não me permite, sem mais nem menos, colocar o acusado em liberdade.

A seguir, a decisão, por inteiro.

 

PROCESSO Nº 79262006
AÇÃO PENAL PÚBLICA
ACUSADO: DMS
VÍTIMA: JOSÉ FAUSTINO DE FREITAS FILHO

Vistos, etc.

Cuida-se de ação penal que move o MINISTÉRIO PÚBLICO contra DMS, vulgo “Dominguinhos”, por incidência comportamental no artigo 155, §4º, IV, do CP.
DEFENSORIA PÚBLICA, às fls.131/132, pediu o relaxamento da prisão ou a concessão de LIBERDADE PROVISÓRIA ao acusado, sendo aquele em face do excesso de prazo.
O MINISTÉRIO PÚBLICO, instado a se manifestar, pugnou pelo indeferimento do pedido de RELAXAMENTO DE PRISÃO, em face do excesso que se verifica(fls.134/135).
Vieram-me os autos conclusos para deliberar.
Primeiro, a análise pormenorizada do tempo de prisão, excluído o tempo que seu sem culpa do juiz condutor do feito.
Pois bem.
A denúncia foi recebida no dia 26 de maio do corrente, portanto há exatos 189(cento e oitenta e nove) dias.
Eis a equação:

05 dias/maio+30 dias/junho+31 dias/julho+31 dias/agosto+30 dias/setembro+31 dias/outubro+30 dias/novembro+ 1dia/dezembro = 189

Esse tempo de prisão, considerando o número de acusados presos, as dificuldades que se tem para ultimar uma instrução, não é, de rigor, excessivo, a considerar o PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE.
Mas razões outras houve a conspirar contra a ultimação da instrução.
Vou demonstrar a seguir.
O interrogatório do acusado foi designado para o dia 27 de junho do corrente.
Ocorre, no entanto, que o acusado não foi apresentado pela autoridade que o mantinha sob custódia(cf. fls. 50), o que nos compeliu a redefinir outra data para realização do ato, ou seja, o dia 16 de agosto(cf. fls. 51).
Do dia 27 de junho, data inicialmente fixada para realização do ato e a nova data, 16(dezesseis) de agosto, fluíram 40(quarenta) dias, os quais devem ser subtraídos do tempo de prisão até agora alcançado.
Vamos à operação:

189(cento e oitenta dias) tempo de prisão – 40 dias, tempo fluido = 149(cento e quarenta e nove) dias.

O DEFENSOR PÚBLICO decerto indagará as razões pelas quais a audiência foi designada para data tão distante. A resposta a essa indagação é simples: não havia data disponível, pois que, no mês de julho o signatário estava de férias e o juiz designado em substituição, titular da 8º Vara Criminal, tinha outra agenda a ser cumprida.
O DEFENSOR PÚBLICO certamente também perscrutará: que culpa tem o acusado se a autoridade que o mantinha sob custódia não o apresentou. A essa indagação responderei: nenhuma. E aduzo: mas a sociedade também não tem culpa e não deve suportar, por isso, o retorno do acusado ao seu convívio. Direi mais: a omissão da autoridade policial é mais do que justificada, tanto que o MINISTÉRIO PÚBLICO nenhuma providência adotou para apurar sua eventual prevaricação.
Entendo que, diante de casos desse matiz, a solução mais simples é fazer o acusado retornar ao convívio social. Mas o signatário não é daqueles que lavam as mãos. Prefiro enfrentar eventual habeas corpus que, sem refletir, na lata, sem discutir, colocar o acusado em LIBERDADE. Esse seria, para mim, o caminho mais fácil a ser trilhado. Prefiro, no entanto, o caminho mais íngreme. A responsabilidade do meu cargo não me permite, sem mais nem menos, colocar o acusado em liberdade.
Prossigamos na análise do tempo de prisão do paciente.
O acusado, finalmente, foi interrogado no dia 16(dezesseis) de agosto(cf. fls.78/80).
No dia 18 de outubro, todas as testemunhas do rol do MINISTÉRIO PÚBLICO tinham sido inquiridas, ou seja, 145 dias após o recebimento da denúncia, data a partir da qual deve ser contado o tempo de prisão, para os fins colimados no pleito sob retina.
Desse cálculo, nada obstante, ter-se-á que subtrair os 40(quarenta) dias que fluíram em face do motivo de força maior antes mencionado.
Com a nova operação, tem-se o seguinte resultado:

145 dias/prisão – 40 dias/motivo de força maior = 105 dias.

Repito, com 105(cento e cinco) dias, a contar da data do recebimento da denúncia, subtraídos os 40(quarenta) dias decorrentes de motivo de força maior, todas as testemunhas do rol do MINISTÉRIO PÚBLICO tinham sido inquiridas.
Indagar-se-á, certamente: e por que a instrução não está encerrada?
Respondo: por culpa da defesa.
Explico.
A audiência designada para o dia 09 de novembro, para audição das testemunhas do rol da defesa, só se realizou parcialmente, em face da não localização das testemunhas JOSÉ RIBAMAR TORRES e ANTONIO SILVA(cf. fls. 116).
Designado o dia 21 de novembro para a realização do ato, mas uma vez as testemunhas não foram localizadas(fls.124), resultando desse fato a designação de nova data para realização do ato(fls. 128).
Vê-se, assim, que não há excesso a justificar a liberdade do acusado.
Constatado acima que não há razão para o relaxamento da prisão do acusado, devo, agora, examinar o pedido de LIBERDADE PROVISÓRIA.
O pedido em comento não tem melhor sorte.
De efeito, o acusado é contumaz agressor da ordem pública. É o que se infere dos documentos de fls.66/68 e 69/71, e da certidão de fls. 95.
Com essa conduta, com esses maus antecedentes – lato sensu -, o acusado não faz jus ao favor rei que pleiteia, pela singela razão de que, em liberdade, se constituiu em uma ameaça iminente à ordem pública. E a preservação da ordem pública, sab-esse, é uma das finalidade da PRISÃO PROVISÓRIA, ex vi legis.
Com as considerações supra, indefiro os pedidos de relaxamento de prisão e de liberdade provisória formulados por DMS.
São Luís, 11 de dezembro de 2006.

Juiz José Luiz Oliveira de Almeida
Titular da 7ª Vara Criminal

Autor: Jose Luiz Oliveira de Almeida

José Luiz Oliveira de Almeida é membro do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Foi promotor de justiça, advogado, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal da Escola da Magistratura do Estado do Maranhão (ESMAM) e da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

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