Você, que trabalha – ou já trabalhou – numa das muitas varas criminais esparramadas por todo o Brasil, já parou para pensar o que é ser, efetivamente, um juiz criminal?
Se você ainda não parou para pensar, eu já pensei. E, pensando, conclui que, desde minha compreensão, juiz criminal é:
Ter a certeza que, em face da criminalidade que grassa, tudo o que fazemos ainda é pouco e, por isso mesmo, quase imperceptível aos olhos dos jurisdicionados.
Ter que enfrentar os excessos de prazo protagonizados pelas partes.
Ter que prolatar decisão sem o esmero necessário, para ter que cumprir – ou, pelo menos tentar cumprir- os prazos processuais, num prazo razoável.
Ter que suportar o adiamento de audiências pela não apresentação de presos e de testemunhas;
Ter que lidar com os dramas psicológicos das vítimas.
Ter, muitas vezes, de colocar em liberdade quem não a merece, em face de uma simples formalidade.
Ter de lidar com o falso testemunho, sem quase nada poder fazer.
Ter que absolver um acusado por falta de uma prova fundamental, em face da inércia das partes.
Ter que lidar com a impontualidade das partes.
Ter que decidir dentro dos parâmetros legais, ainda que a lei, aos olhos do julgador, seja injusta;
Ter que absolver de por falta de provas, todavia, muitas vezes, com a íntima convicção de que o réu tenha, efetivamente, praticado o crime;
Ter que, por razões superiores, extrapolar os prazos, para, no mesmo passo, colocar em liberdade quem não faz por merecê-la.
Ter a certeza de que a Justiça Penal é discriminatória;
Ter de conviver com jovens desamparados, conduzidos ao mundo da criminalidade em face do consumo de drogas;
Ter que conviver, bem de pertinho, com a impunidade.
Ter que perder o sono, buscando, na calada da noite, solitariamente, uma solução para esse ou aquele processo.
Ter de constatar que a impunidade é uma das causas mais relevantes da violência.
Saber que a absoluta maioria dos que cometem crimes contra o patrimônio são jovens entre 18 e 26 anos;
Não deslembrar que 99% dos jovens que enveredam pelo mundo das drogas são de famílias cujos pais estão separados.
É saber que, nas instâncias periféricas da persecução criminal, ainda se arranca confissões a fórceps.
É, enfim, estar convicto que não atendemos às expectativas da sociedade e que, de rigor, não passamos mesmo de instrumentos de dominação e de manutenção do status quo.