Sentença absolutória. Posse ilegal de arma de fogo. Fato ocorrido no período de anistia. Atipicidade da conduta.

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jose.luiz.almeida@globo.com ou jose.luiz.almeida@folha.com.br

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É cediço, pois, que se a conduta do acusado foi praticada no período abrangido pela abolitio criminis, vez que o possuidor da arma de fogo de uso permitido poderia, de boa-fé, entregar a arma à polícia ou registrá-la, até data determinada, a sua absolvição se impõe, ex vi legis.

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Cuida-se de ação penal que move o Ministério Público à alegação de malferimento dos artigos 14 e 16 do Estatuto do Desarmamento.
De imediato entendi que a arma de fogo apreendida não era de uso restrito.

Nesse sentido, consignei, verbis:

  1. Após exaustivo exame da prova consolidada nos autos devo dizer, no que discrepo do MINISTÉRIO PÚBLICO, que nenhuma das armas apreendidas é de uso restrito, daí que deve ser afastada, de logo, a incidência penal no artigo 16 do ESTATUTO DO DESARMAMENTO.

Em seguida, corrigi o equívoco do Ministério Público, ao descrever o crime de posse de arma de fogo e clasificá-lo como porte ilegal de arma de fogo.
Em determinados fragmentos consignei, litteris:

  1. Afastada a incidência do artigo 16 do Estatuto do Desarmamento, sobrevive a imputação em face do artigo 12 do mesmo Estatuto, a considerar que houve um equívoco por parte do MINISTÉRIO PÚBLICO acerca da capitulação.
  2. Antes de apreciar a questão de fundo importa dizer que, em casos que tais, não se pode confundir posse de arma de fogo com posse de arma de fogoÉ consabido que com o advento do ESTATUTO DO DESARMAMENTO essas condutas restaram muito bem definidas. 
  3. A posse, v.g., consiste em manter arma de fogo no interior da residência ou no local de trabalho.O porte, por sua vez,pressupõe que a arma esteja fora da residência ou do local de trabalho.Simples, assim.

Noutros excertos, a concluir pela atipicidade da conduta do acusado, expendi os seguintes argumentos, verbis:

  1. Para mim, apresso-me em dirimir a dúvida, o fato que se imputa a prática ao acusado é atípico.
  2. É que o crime de posse ilegal de arma de fogo ocorreu entre os dias 23 de dezembro de 2003 e 31 de dezembro de 2008, no período da vacatio legis, em face da prorrogação dos prazos a que aludem os artigos 30, 31 e 32 da Lei 10.826/2003, segundo a MP nº 417/2008 antes mencionada.
  3. É dizer: como a conduta atribuída ao acusado é de possuir arma de fogo e munições, ambas apreendidas em sua residência, essa situação se enquadra nas hipóteses excepcionais dos artigos 30, 31 e 32 do ESTATUTO DO DESARMAMENTO antes mencionados.
  4. É cediço, pois, que se a conduta do acusado foi praticada no período abrangido pela abolitio criminis, vez que o possuidor da arma de fogo de uso permitido poderia, de boa-fé, entregar a arma à polícia ou registrá-la, até data determinada, a sua absolvição se impõe, ex vi legis.


A seguir, a decisão, de corpo inteiro.

Continue lendo “Sentença absolutória. Posse ilegal de arma de fogo. Fato ocorrido no período de anistia. Atipicidade da conduta.”

Sentença condenatória. Nova definição jurídica atrabuída ao fato. Emendatio Libelli. Inteligência do artigo 383 do Codex de Processo Penal

 
 
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O acusado, posso concluir das provas produzidas, não sofreu qualquer influência do mundo exterior, não foi compelido a praticar o crime em face de uma coação que não pudesse resistir e não agiu ao abrigo de quaisquer excludentes de ilicitude previstas em nosso direito positivo.
O acusado cogitou a realização do crime e colocou em prática o seu plano, dando causa ao resultado que foi, já se sabe, a diminuição do patrimônio do ofendido.
O acusado, através de sua ação, deixou transbordar o seu querer íntimo, fazendo ingressar no mundo fenomênico a sua ação, depois de elaborada no plano intrapsíquico.
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Cuida-se de sentença condenatória, em face do crime de furto.
O acusado foi denunciado, inicialmente, por crime de roubo. Ao longo da instrução não restou provada a violência ou a grave ameaça, disso resultando a desclassificação da imputação inicial.
Ao dar nova definição jurídica ao fato expendi os seguintes argumentos:

  1. Nesse sentido, importa sublinhar que nem mesmo o ofendido foi capaz de descrever a ameaça ou a violência, disso se inferindo a necessidade de dar-se nova definição jurídica ao fato, ex vi legis (artigo 383, do Digesto de Processo Penal).
  2. Ao que deflui da prova, a verdade é que restou tipificado o crime de furto, consumado e qualificado pelo concurso de pessoas, e não o crime de roubo, como pretende o MINISTÉRIO PÚBLICO.
  3. O juiz pode, ex vi legis, sem modificar a descrição do fato contido na denúncia, atribuir-lhe definição jurídica diversa, ainda que em consequência tenha de aplicar pena mais grave.
  4. In casu, o fato de se reconhecer que o crime que praticou o acusado foi furto e não roubo, não implica em nenhum prejuízo para a sua defesa, tendo em vista que a sentença guarda correspondência com os fatos narrados na denúncia.
  5. Nessa linha de pensar e à guisa de ilustração, registro, forte na melhor interpretação jurisprudencial, que “A correlação entre a imputação e a sentença constitui uma das mais relevantes garantias do direito de defesa amparado no texto constitucional. Qualquer distorção havida, sem atenção ao artigo 484 do CPP, representa violação desse princípio básico e acarreta nulidade da sentença. Permite-se ao juiz dar nova definição jurídica diversa da que consta da denúncia, somente na hipótese de os fatos relatados, dos quais se defende o acusado, subsumirem-se com precisão no novo tipo e em todos os seus elementos (AC 5.916-SP, 5ª T., rel. André Nabarrete, 16.05.2000, v.u., RTRF – 3ª Região 471/130).
  6. Da denúncia pode-se ver, sem muito esforço que, com a nova definição jurídica, não se hostiliza a ampla defesa, pois que os fatos em razão dos quais se defendeu o acusado se subsumem ao tipo penal do artigo 155 do CP.

A seguir, a sentença, integralmente.
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Homicídio culposo. Absolvição. Culpa exclusiva da vítima

“No tráfego viário, é ressabido, tem vigência o princípio da confiança, a ser observado pelos motoristas para a adequada aplicação das normas de direção, em homenagem à segurança na circulação de veículos. Deve-se, pois, confiar que o condutor segue as regulamentações e regras de trânsito, a fim de delimitar a esfera do previsível.”
Juiz José Luiz Oliveira de Almeida
Titular da 7ª Vara Criminal

Antecipo, a seguir, alguns fragmentos da decisão.

 

  1. Tivesse a acusada desenvolvendo, no momento do fato, ad exempli, velocidade excessiva, e, em face disse, tivesse atropelada a ofendida, poder-se-ia afirmar que agiu de conformidade com o artigo artigos 302, do CTB
  2. Mas não! O que ocorreu mesmo foi que a vítima, de inopino, provavelmente bêbeda, desceu do canteiro central da pista, provocando, com sua ação, o acidente do qual resultou a sua morte.
  3. Posso afirmar, portanto, que a única responsável pelo acidente foi a própria vítima. E quando tal acontece, não se pode responsabilizar o condutor do veículo atropelador, pois que não agiu com culpa – não foi imprudente, nem negligente.
  4. Não se pode dizer que quem trafega numa avenida de grande movimentação de veículo deve estar esperando que alguém, subitamente, atravesse a rua. Isso, para mim, não seria agir com prevenção. Seria muito mais que isso. Seria pura adivinhação.

 

Segue a decisão, por inteiro.

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Sentença absolutória. Insuficiência de provas.

 

Tenho dito – e vou repetir  –  que não se faz cortesia com o direito alheio. Não se pode brincar de fazer justiça. Se Ministério Público não foi capaz de provar o que alegou, que, então, suporte o desfecho absolutório. É o mínimo que se espera de o juiz garantista, num sistema da mesma forma garantista.
Juiz José Luiz Oliveira de Almeida
Titular da 7ª Vara Criminal

 

Cuida-se de sentença absolutória, em face da inexistência de provas suficientes de que o acusado tenha sido o autor do crime.

Antecipo, a seguir, excertos relevantes da decisão.

    1. Não se condena por condenar, não se decide com espeque em suposições, em conjecturas. Condenação exige prova plena, escorreita, induvidosa – do fato e da autoria – na dúvida, em relação a esta ou em relação àquele, tem aplicação, às inteiras, o brocardo in dúbio pro reo.
    2. O acusado cometeu o crime? Pode ser que sim, pode ser que não.
    3. Todas as vezes que, ao término do exame das provas, o espírito de quem julga for assaltado por dúvidas, por incerteza, o caminho a ser trilhado é, sempre, o que conduz a absolvição.
    4. O  fato, não se tem dúvidas, ocorreu, efetivamente. Todavia, convenhamos, a prova da autoria não é inquestionável.
    5. Nem mesmo os policiais que prenderam o acusado –  os quais, muitas vezes, são implacáveis  nessas questões –  foram capazes de afirmar, com convicção, tenha sido o acusado o autor do crime. Melhor dizendo: não tiveram dúvidas de que não tinha sido ele o autor do crime.

 

Agora, a decisão por inteiro. 

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Não se condena apenas para dar satisfação à sociedade.

Cuida-se de sentença absolutória, em face do crime de trânsito (homicídio culposo).
Em determinado excerto reafirmei, com a necessária ênfase, a inviabilidade de se prender e punir apenas para dar satisfação á sociedade, como se colhe dos fragmentos abaixo:

  1. Nenhum de nós, por mais que nos imaginemos acima do bem e do mal, está autorizado, a, no uso das nossas atribuições, agir desavisadamente, negligentemente, sem rumo e sem norte, desabridamente, em detrimento das garantias constitucionais de um acusado, por mais que ele possa parecer indigno aos nossos olhos.
  2. Punir o acusado, sem provas de que tenha sido negligente, imprudente ou imperito, é um destrambelho, um despautério, uma falta de respeito, pura e simplesmente, para com um cidadão de bem – até que se prove em contrário -, além de se traduzir em uma afronta aos mais comezinhos princípios que norteiam as decisões judiciais.
  3. É possível, sim, que o acusado, ao tempo do fato, desenvolvesse velocidade superior à permitida. É possível, sim, que estivesse embriagado. É possível, sim, que o acidente tenha ocorrido em face de sua imprudência. Mas é possível, também, que o acidente tenha sido provocado pelo condutor do fusca bege antes referido.
  4. Da velocidade excessiva, da embriaguez do acusado, da sua imprudência, inobstante, tinha que fazer prova o Ministério Público. Não o fazendo, deve suportar a inviabilidade de sua pretensão e a conseqüente absolvição do acusado.
  5. Nessa linha de argumentação, decidir pela condenação do acusado é o mesmo que decidir com base em suposições. E, a meu sentir o magistrado que decide, afastando-se do quadro de provas, apenas para dar uma satisfação à sociedade, não é digno do cargo que exerce.

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Sentença absolutória. Insignificância da lesão. Atipicidade.

Na decisão a seguir publicada, reconheci, em determinado fragmento, com humildade, que jamais deveria ter recebido a denúncia, em face da insignificância da lesão.

O fiz nos termos abaixo, verbis:

  1. Foi nesse contexto que, infelizmente, lancei nestes autos o despacho de recebimento da denúncia, que, de rigor, nunca deveria sequer ter sido ofertada, em face da insignificância da lesão.
  2. É quase certo que, cuidando dessas e de outras questões irrelevantes para o direito penal, tenhamos, noutras oportunidades, deixado de lado questões muito mais importantes, como os crimes de roubo, por exemplo, cujos autores têm infernizado a vida de todos nós.

 

Enfrentando o mérito, com o reconhecimento da insignificância da lesão, anotei, dentre outros fundamentos, litteris:

  1. A subtração de um litro de mel, convenhamos, somente à primeira vista estaria compreendido na figura típica do artigo 155 do CP.
  2. Analisada, no entanto, com o devido desvelo, a sua real importância, conclui-se que não está a merecer a atenção daquele que se considera o ramo mais radical do ordenamento jurídico, qual seja, o direito penal.
  3. A conduta do acusado, impõe-se reconhecer, foi absolutamente irrelevante, daí que a ofensividade ao direito do ofendido foi mínima, daí poder-se afirmar que a perigosidade social da ação do acusado foi nenhuma, em face do reduzidíssimo grau de reprovabilidade do seu comportamento.

 

Adiante, obtemperei, na mesma senda:

  1. Analisada a ação do acusado, em conexão com os postulados da fragmentariedade e da intervenção mínima do Estado em matéria penal, há que se excluir a própria tipicidade penal, examinada na perspectiva de seu caráter material.

A seguir, a sentença, por inteiro.

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Sentença absolutória.

Na sentença que publico a seguir chamo a atenção para o seguinte fragmento, em face do equívoco do Ministério Público, a propósito da imputação feita aos acusados.

  1. Releva anotar, ademais, que se os acusados, com seus golpes, provocaram, como aponta a denúncia e as alegações finais do Ministério Público, lesões de natureza grave e gravíssimas, praticaram um só crime, contra duas vítimas diferentes, pela capitulação mais grave, pois só há uma agressão contra cada vítima, desdobrada em vários atos, não sendo factível, com efeito, que possam ser julgados por lesão grave e gravíssima, em face mesmo da absorção daquela por esta.

A seguir, a sentença, por inteiro.

Continue lendo “Sentença absolutória.”

Sentença absolutória, em face do crime de estupro.

Cuida-se de sentença absolutória, em face do crime de estupro.

No excerto assim, capturado no corpo da decisão a seguir publicada, estarrecido, sublinhei, verbis:

  1.  Confesso, francamente, que não sei como o Ministério Público chegou à conclusão da existência do crime, com espeque em provas inconsistentes e com esteio, fundamentalmente, na palavra da ofendida, que destoa, discrepa, à toda evidência, do laudo pericial.

Noutro fragmento anotei, litteris:

  1.  A cópula vagínica, tudo leva a crer, houve sim. Mas não se pode dizer, com base em dados amealhados ao longo da instrução probatória, que não tenha sido consentida.

Expendendo as minhas conclusões definitivas, consignei, verbis: 

  1. Para mim, sempre a par do quadro probatório, se dissenso houve – e pode ter havido mesmo – ele não foi enérgico; foi simbólico, sem rebeldia, platônico, sem convicção, passivo e inerte, razão pela qual compreendo que deva absolver o acusado, à míngua de provas de que, efetivamente, tenha afrontado o artigo 213 do Codex Penal.

A seguir, a sentença, por inteiro:

Continue lendo “Sentença absolutória, em face do crime de estupro.”